Parece ser absolutamente individual o significado da fala e, mesmo quando falamos as mesmas palavras, a definição pode variar de pessoa para pessoa.
Por isso, a comunicação é algo extremamente difícil e duvidosa.
Para a nossa surpresa, é comum pensarmos uma coisa e falarmos outra; quem escuta, pode ainda escutar e pensar numa outra. E o pior de tudo é que achamos que o outro falou exatamente aquilo que compreendemos. É um terrível erro pensar que o outro pensa aquilo que pensamos.
Intermináveis discussões assentam-se em cima do que, supostamente, foi dito.
É através da arte de escutar que o espírito se enche de fé e devoção e que nos tornamos capazes de cultivar a alegria interior e o equilíbrio da mente.
A arte de escutar permite alcançar sabedoria, superando toda ignorância. Então, é vantajoso nos dedicarmos a ela, mesmo que isto nos custe a vida.
"A arte de escutar é como uma luz que dissipa a escuridão da ignorância. Se somos capazes de manter nossa mente constantemente rica através da arte de escutar, não temos o que temer. Este tipo de riqueza jamais nos será tomado. Essa é a maior das riquezas.” (Dalai Lama / "O Livro de Dias, Sextante")
As palavras não são importantes, diz Márcio Lúcio de Miranda, portanto podemos dizer qualquer coisa contraditória, qualquer coisa absurda, qualquer coisa desconexa, porque o propósito é somente criar. As palavras são secundárias; os silêncios entre as palavras são prioritários!"Estou usando palavras para criar intervalos de silêncio." ( "Quem Tem Medo de Escutar" )
Antes de colocar na tela seu maravilhoso quadro da Trindade, o pintor russo André Rublev permaneceu 19 anos em silêncio. Feita de adoração, esta dimensão de silêncio amadureceu seu projeto.
O silêncio é de ouro, diz a sabedoria do povo. Mas esta mesma sabedoria conhece bem o valor da palavra. São Bento aconselhava um monge: ‘faça silêncio, a não ser que tenha a dizer algo mais importante que o silêncio’.
Dialogar não significa apenas falar. Significa também – e principalmente – ‘ouvir, escutar o outro’. E neste sentido são sábias as palavras do Eclesiaste quando alerta que “há tempo para falar e tempo para calar, tempo para falar e tempo para ouvir.”
Em nossos lares, cheios de ruídos e gritos, cada um deveria se fazer a pergunta: ‘há quanto tempo não escuto ninguém?’
Portanto, nossos ouvidos podem ser traiçoeiros, mas, se bem tratados e cuidados, podem tornar-se excelentes aliados. Depende só de checarmos, a cada momento, se realmente estamos escutando o que está sendo dito.
Não há delícia maior do que termos a percepção de alguém nos escutando, com toda a atenção. É um prazer encontrarmos uma pessoa que acompanhe cada palavra do que estamos dizendo e que é capaz de nos compreender – ‘com todo o coração’.
Se é bom ser escutado, também é ótimo escutar, ‘estar disponível para o outro’, com toda a tranqüilidade. "Não é bastante ter ouvidos para ouvir o que é dito. É preciso também que haja silêncio dentro da alma", escreveu o poeta português Fernando Pessoa sob o pseudônimo de Alberto Caeiro.
É isso – ‘silêncio dentro da alma’. Não dá para escutar ninguém se os pensamentos estão nos atropelando sem cessar, se estamos pensando no que temos de fazer daqui a pouco. É preciso estar calmo, aberto, atento ao momento presente para poder ouvir com atenção.
"Escutar é uma experiência transformadora. É testemunhar a existência", diz o psicólogo e professor paulista Miguel Perosa.
Escutar é mesmo um grande exercício - que poucos dominam. "Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado um curso de escutatória’. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir", escreveu o escritor e psicanalista paulista Rubem Alves no livro "O Amor que Acende a Lua".
Quem fala demais não deixa o outro falar. E, é claro, não abre espaço para ouvir. Ouvir é saber escutar, é saber esquecer um pouco de si mesmo enquanto o outro fala. Ouvir é aprender a ficar quieto esperando o que outro tem para dizer.