Usina de Letras
Usina de Letras
74 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62236 )

Cartas ( 21334)

Contos (13264)

Cordel (10450)

Cronicas (22537)

Discursos (3239)

Ensaios - (10367)

Erótico (13570)

Frases (50634)

Humor (20031)

Infantil (5434)

Infanto Juvenil (4769)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140808)

Redação (3307)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1960)

Textos Religiosos/Sermões (6191)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
cronicas-->A puta que lia Hegel -- 01/02/2002 - 22:39 (Fábio Feldman) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Alberto adorava aqueles ambientes. Toda a variedade, a mistura de informalidade nua e clima de negócios, a atmosfera mítica por detrás das piscantes luzes vermelhas e dos sedentos corpos ocultos pelas várias portas, tudo aquilo trazia enorme excitação ao homem. Era tão melhor ali do que em casa...
Pois o hábito de visitar tais estabelecimentos (muito mais pela emoção e artificidade do que por necessidades fisiológicas, diga-se de passagem), levou Alberto a desenvolver outro fetiche. O ato propriamente dito passou, pouco a pouco, a ser um mero detalhe. Alberto era um observador, um genuíno voyeur. Ficava horas perambulando por entre os corredores, observando atento ao que todos aqueles corpos nus faziam com seu tempo ocioso. Muitas se entregavam à pose. Esticavam-se ao pé da porta, mexiam em certas partes de suas anatomias, procurando através de extrema falta de sutileza, elevar sua sensualidade. Outras viam tv, ouviam rádio ou simplesmente relaxavam, deitadas e entregues ao infortúnio. Mas as que mais interessavam ao homem eram as pequenas "intelectuais". Desnudas, aguardando o pagamento do aluguel, estas se punham a ler livrinhos baratos para chamar a atenção dos homens. Eram geralmente as mais belas, aquelas que não precisavam de pose para enfeitiçar ninguém. Seus corpos perfeitos seduziam dezenas de macacos atentos à porta apertada, a fim de conferir o material. Poucos eram, todavia, os que se atreviam a entrar: elas eram demais para qualquer ser humano.
Os livros que liam, segundo Alberto, que até isso olhava, eram um misto de pulp fictions e novelas mexicanas. Os típicos livretos de banca de jornal, recheados de menções eróticas e histórias de amor lacrimosas. Nosso amigo nunca se relacionou com tais garotas. Eram esnobes. Não sabiam fazer amor, mesmo lendo constantemente sobre ele. Talvez fosse exatamente por isso.
Porém, certa noite, Alberto teve uma surpresa. Uma garota novata, deitada em lençóis de seda, atraía dezenas de olhos afoitos às suas curvas, Como era bela! Tão branca e loira, sua pele tão macia e sensual. Os cabelos ondulados pareciam ondas douradas em um oceano paradisíaco de fim de tarde. La belle de jou no rendez-vous do centrão da cidade. E enquanto ninguém tirava os olhos de seus seios, sexo e nádegas divinas, o homem caiu as vistas sobre sua leitura. Seria possível? Aproximou-se mais, como se fosse indagar pelo preço de uma relação. Adentrou o quarto, expulsando indiretamente os outros voyeurs. Inclinou-se sobre o ouvido da mulher e perguntou:
_ Hegel?
E com olhar safado, ela respondeu:
_ Meu favorito...
Uma meretriz que lia Hegel! Seria possível? O homem ficou gigantesco e nem sequer quis saber o preço. Trancou a porta e fascinado por tamanha formosura, pós-se se despir afoito.
_ Estou impressionado...
_ Porque leio Hegel?
Ambos deitados começam a se tocar. Fazia anos que Alberto não se sentia tão excitado. Era tão mais bela que todas as outras. Tão mais macia. E tão mais...tão mais...
_ Qual seu nome?
_ ... Segredo de estado!
_ Certo. Posso lhe fazer uma pergunta, Segredo de estado?
Ela se deita sobre seu corpo e acaricia-lhe o peito, descendo lentamente em direção ao órgão exposto.
_ ...Claro...
_ O que uma garota como você faz aqui? Quer dizer, não que eu esteja reclamando, mas...
_ Hum... gosto daqui. É tranquilo. Me dá tempo pra ler.
Ela se coloca sobre o homem, que já geme de paixão. O encaixe é genuíno.
_ E quando começou?
_ Faz tempo. O espírito absoluto iluminou minha mente e tive essa idéia. A tensão entre pólos opostos, no caso meu bolso e meu estómago, acabaram me obrigando...
_ ...sim...
_ Não faço só sexo, sabe? Eu faço poesia!
_...oh...isso...
_ Luto contra a morte da arte.
_ Vai meu bem, vai....
_ Calma aí meu amor! Sou como a história: flexível mas tenho meu ponto fixo! Assim você quebra minha espinha!
_ Perdão.
_ E cuidado com essas pernas...chega pra lá... assim...bom...gostoso... você está dentro de mim como os homens dentro da sociedade!
_ O quê?... Ah, Hegel...
_ Oh meu bem, isso...vai... aumente minha elasticidade da mesma forma que o saber aumenta o espírito do mundo!
_ ...ah...espírito do mundo...sim...
_ Mexa esse quadril, querido! Precisa ser dinàmico, feito a lógica hegeliana!
_ Isso já está começando a...
_ Oh! Sim...sim....
_ Está chegando lá?
_ Dependo do que você quer dizer por `lá´. Sua indagação ambígua me é muito filosófica. Cadê a dialética da coisa?
_ Ai meu saco!
_ Tá machucando?
_ Não, não...continua.
_ Aposto que você me vê como um vegetal.- diz a mulher melancolicamente, meio que se lembrando de algo.
_ Um vegetal?
Fazendo um malabarismo incrível, ela se estica toda e alcança o livro prostrado na cabeceira. Em cima do homem começa a ler.
_ "A diferença entre um homem e uma mulher é a mesma que existe entre um animal e uma planta"...
_ Hum...estou quase...vai...vai...
_ ... "O animal corresponde mais ao caráter do homem, a planta mais ao da mulher"...
_ Vai minha plantinha! Me leva! Me leva!
_ Antes de você entrar estava refletindo...Acho isso tão machista.
_ Vem pro seu macho, vem...
_ Quer saber, cansei de Hegel! Eu não sou uma planta coisa nenhuma!
Retirando-se de dentro do homem, levanta-se e veste um hobby.
_ O que você está fazendo?
_ Essa nossa transa me fez pensar... não foi o espírito do mundo que me trouxe para esse bordel... foi a experiência material!
_ Experiência... olha aqui, eu paguei e quero tratamento completo! Que história é essa de sair antes do fim!
_ É tudo dinheiro, não é? Pois bem, aqui está seu dinheiro! Não serei mais explorada por vocês, ricos burgueses! Agora serei do povo! Chega de exploração! Cheguei ao limite de minha força de produção!
_ Volte aqui agora!
_ Abaixo a divisão social do trabalho! Não serei mais usada por vocês, lobos capitalistas!
_ Era só o que me faltava... uma puta marxista!
A mulher abre a porta, posiciona-se no meio do corredor e urra bem alto:
_ Trabalhadoras do mundo: Uni-vos!
E vai embora.
Alberto nunca mais voltou ao bordel e virou partidário do PFL.
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui