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Cronicas-->Vide Bula -- 02/02/2002 - 02:04 (Fábio Rabello) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Imagino que poucas pessoas já dedicaram alguns segundos de suas vidas para pensar nas bulas de remédios. Ao contrário do que imaginamos, elas não aparecem do nada dentro das caixas dos medicamentos. E também não surgem por geração espontànea, como poderíamos muito bem pensar. Alguém, não muito romàntico e nem um pouco otimista, teve de escrevê-las.
Os autores de bulas de remédios são deveras seres muito misteriosos. E deve ser exatamente por isso que muitos duvidam de suas existências. Não conheço alguém que conheça algum autor de bulas. Eu também nunca conheci um, mas tenho quase certeza de que eles existem. Isso mesmo ! Eles existem e se utilizam da Língua Portuguesa para produzirem suas magníficas obras farmacológicas.
É, não parece, mas tudo aquilo que lemos nas bulas está escrito em Português. Mas convenhamos, se estivesse em Hebraico, Japonês ou qualquer outro idioma esquisito, não faria a menor diferença. Talvez até nos ajudaria. Isso certamente faz dos autores de bulas seres ainda mais cativantes, mais misteriosos e superiores, como poderiam acreditar alguns de seus leitores assíduos - uma classe de hipocondríacos intelectuais. Imagine...

- Oi ! Sentindo alguma coisa nova hoje ?
- Lógico, graças a Deus !
- E aí, já terminou de ler o "Síndrome de Wolff - Parkinson - White " ?
- É incrível, pena que estou no último capítulo. E você ?
- Bem... Também estou terminando de ler minha nova aquisição. Chama-se " Estenose Subaórtica Hipertrófica"
- Ah ! é bárbaro. Já o li duas vezes...
- Mas o mais marcante, pra mim, foi mesmo o "Síndrome de Wolff - Parkinson - White ". E o "Taquiarritmia por Intoxicação Digitálica ", então ? Nem me fale... Já o leu ?
- Estou começando. Que suspense... Será que ele vai ter alguma reação adversa no final ?
- No final ele...
- Não conta o final, não conta o final...

Acredito até que não seja feito de propósito, mas o autor de uma bula de remédio, quando está trabalhando em sua obra, parece querer transferir toda sua emoção, seus sentimentos e até mesmo suas síndromes para nós, de forma real, concreta. E conseguem !
Pegue a bula de algum remédio que realmente você tem de tomar - ou não - e comece a lê-la. Em alguns casos, à medida que a leitura vai sendo feita, os sintomas vão aumentando. Você começa a desistir da idéia de ter de tomá-lo. Ao menos que você já estiver sentindo que está para morrer. E, mesmo assim, você prefere a morte a se arriscar a sentir todas aquelas reações adversas. Depressão mental, fraqueza, fadiga, sonhos vividos, distúrbios visuais, desorientação de tempo e espaço, alucinações, náuseas, perda temporária da memória, catatonia... Já pensou você começar a ter uma catatonia ? Deve ser horrível a sensação de poder adquirir, de uma hora para outra, algo que você nem sabe o que é !
Pior ainda se, sem querer, você tomar uma superdosagem, tamanho o seu desespero frente ao que você acabara de ler na bula.. Tudo bem, não precisa se apavorar. Neste caso, como diz a bula, tudo o que você deve fazer é esvaziar o conteúdo gástrico, tomando o cuidado para não haver a aspiração pulmonar. Em seguida, é só administrar atropina - atropina ? - (0, 25mg) , caso não haja o bloqueio vagal. E pronto, você está salvo ! Mas lembre-se que isso é válido apenas se não houver o bloqueio vagal. As bulas não são realmente fascinantes ? Seria impossível vivermos sem elas, não seria ?
As bulas também nos avisam quando não devemos tomar o medicamento a que elas se referem. Esses autores...Só mesmo através deles para sabermos que não devemos tomar tal medicamento se sofrermos de bloqueio beta - adrenérgico, o que pode facilitar a condução induzida pela atividade simpática. Ainda bem que eles nos avisam. Já pensou ? Mas será que eu, ou mesmo você, sofre de bloqueio beta - adrenérgico ? É exatamente isso que nos desperta tamanho fascínio por esses escritores sombrios. Eles nos conhecem tão bem e, no entanto, nós não sabemos nem se eles existem, de fato. A relação autor de bula - leitor é, sem dúvida, a relação mais platónica que pode existir. E, exatamente por isso, temos que tomar todo o cuidado possível para não nos tornarmos apreciadores aficionados de sua produções, sob a pena de sofrermos uma enorme decepção. Explico:
Os autores de bulas jamais dão autógrafos e se recusam a aparecer em qualquer talk- show. Eles Jamais fornecem entrevista. Seus trabalhos mais recentes são lançados em absoluto silêncio, sem qualquer tipo de divulgação. O único jeito de saber se há algo de novo lançado é ficar atento e visitar periodicamente a farmácia mais próxima. Também não adianta procurar um novo lançamento pelo nome do autor. São todos escritores anónimos. E lembre-se: de posse de mais uma nova obra, dê atenção especial à posologia. As crianças não devem ler mais do que dez ou quinze linhas, duas vezes ao dia. Em adultos a dose inicial deve ser de aproximadamente cinco ou seis parágrafos, também duas vezes ao dia. Em alguns casos mais graves, recomenda-se dois capítulos diários, antes da principal refeição e ao se deitar.
Não desaparecendo os sintomas, fique atento. É muito provável que você já é integrante da seleta classe dos hipocondríacos intelectuais.



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