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Poesias-->Vai e Vem -- 23/06/2002 - 00:19 (Lilian Lucht Carneiro) |
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VAI e VEM
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>A frondosa macieira
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>Distingue-se aos nossos olhos.
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>Galhos e ramos lascados
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>Folhas secas, flores estéreis
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>A centenária macieira
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>Tão firme sobre suas raízes
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>Tão maldita em seu voluptuoso fruto
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>Que ainda condena outras vidas.
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>Sob a sagrada macieira
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>Um corpinho se lança
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>A desejar um embalo,
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>Tão santo em seu modo vil.
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>Menininha no balanço...
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>Fita no cabelo,
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>Vestidinho no joelho
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>E olhos no infinito
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>Querendo alcançar onde ninguém alcança
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>Maldito sonho de criança
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>Um sonho tão vazio.
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>Ela quer... mas seus pés não tocam o chão.
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>Ela quer... mas sozinha nem dá para tentar
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>Possuir aquele céu... ser possuída pelo ar
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>E mergulhar numa brincadeira de ir e voltar.
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>Do nada, surgem mãos em suas costas
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>E uma voz tão serena, que sussurra bem baixinho:
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>"Vai minha pequena...
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>Vem que vou te ensinar a brincar."
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>Um pequeno impulso e lá está ela
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>Olhos vidrados no céu que irá conquistar
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>Sem perceber que o caminho é longo ainda
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>E que dá medo ao se trilhar.
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>Vai e vem...
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>Num balanço sonolento
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>Que desperta aos pouquinhos
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>A vontade de mais voar.
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>Vai e vem...
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>O vento batendo de mansinho
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>Nas faces coradas
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>Da garotinha que ainda sabe sonhar.
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>Vai e vem...
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>O céu que era tão inalcançável
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>Parece chamar: Vem... vem...
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>E a voz às suas costas: Vai... Vai...
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>Vai e vem...
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>Mãozinha estendida querendo agarrar aquela estrela perdida.
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>Um vôo tão alto mas tão restrito
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>Preso pelas cordas daquele mundo que ela queria abandonar.
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>Vai e vem...
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>Ela fala para as mãos que a impulsionam:
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>"Pára... não quero mais ir e voltar!"
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>E não escuta mais e voz serena
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>Apenas um murmúrio de satisfação...
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>Vai e vem...
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>Voa o laço de seu cabelo.
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>Vai e vem...
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>Seu vestido baila no ar
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>E fere toda a pureza daquele tabernáculo dantes imaculado.
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>Vai e vem...
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>Os ramos arranham seu rosto
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>Escrevendo uma triste história em sua face.
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>Vai e vem...
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>E as lágrimas lavam toda a inocência de seu semblante.
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>Vai e vem...
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>Olhares esquadrinham das janelas
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>Vislumbram indiferentes
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>Uma brincadeira mais do que letal
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>Afinal, pensam eles, toda flor nasce para ser um dia violada
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>Por mãos, por olhares... conceitos.
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>Vai e vem...
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>Ela sente as mãos em suas costas,
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>Que a profanam em cada toque cheio de lascívia.
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>E ela escuta sua voz rouca gritar:
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>"Quero descer... não quero mais brincar!"
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>Vai e vem...
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>"Você não pode parar Pequena...
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>A vida é uma brincadeira. É essa brincadeira"
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>A resposta quebra seu mundo
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>E gera mais no fundo
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>Um desejo de também ensinar a brincar.
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>Vai e vem...
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>Vai e vem...
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>Nessa repetição louca
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>De vindas e idas
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>De mãos e de lábios
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>De corpos e de almas
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>De medo e desejo
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>De vida e de vida
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>De vida e de morte...
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>Morte
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>Vai e vem...
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>E lança seu corpo no ar
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>E larga as amarras do balanço
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>E desfruta por um lapso de tempo
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>A delícia de verdadeiramente voar
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>Ela foi... mas voltou
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>E quando tocou o chão
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>Sentiu toda a dor
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>De quem abandona seu vício.
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>Os cabelos emaranhados...
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>O vestido tingido de vermelho...
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>Mãos sujas... olhos inchados...
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>Coração dilacerado.
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>O vento tornou a ser ameno
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>Mas era frio.
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>Não ia e voltava.
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>Era e estava.
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>Estava sozinha.
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>Sozinha e com medo...
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>Mãos... e a voz serena
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>Declarando carinhosamente:
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>"Vai minha pequena, pára de chorar...
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>Vem que vou curar tuas dores...
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>E te ensinar uma nova brincadeira de ir e voltar..."
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