Motivos de mulher na ignota floresta amazônica de Margarete Prado (comentário)
Maria Alzenir Alves Rabelo Mendes
Motivos de mulher na ignota floresta amazônica: produção de escritoras acreanas das décadas de oitenta e noventa é o título da Tese de Doutorado defendida pela Professora Margarete Edul Prado Lopes de Souza, na Universidade Federal da Bahia. A autora é professora titular do Departamento de Letras da Universidade Federal do Acre, onde, além da atividade docente, coordena o Núcleo de Estudos da Mulher e desenvolve um projeto de pesquisa na área de Literatura sob perspectiva dos Estudos Culturais e da Crítica Feminista.
Desse prisma, a pesquisadora lança-se ao trabalho analítico sobre a literatura das amazônidas do Acre, contempladas nos dois volumes que a estudiosa entrega ao leitor que terá, não apenas, uma referência a mais para a pesquisa bibliográfica na área de Teoria e Crítica Literárias. Mas também um estudo pioneiro focado para as relações de gênero e uma fonte de valor histórico-documental sobre um conjunto de textos até então desconhecidos, de uma literatura também desconhecida, até mesmo, pela maioria dos acreanos.
Boa parte desses escritos encontravam-se nos guardados de cada escritora, outra parte, embora já estivesse publicada, somava-se àqueles textos que, assim como quem os escreveu, destinava-se ao rol das coisas esquecidas. O resgate desse material, além de trazer à luz o discurso literário da mulher do Acre, contribui para ampliação e renovação do acervo literário local, e para o estabelecimento de critérios definidores de uma cultura que, via de regra, tem sido olhada sob as lentes projetadas sobre a Amazônia.
A autora indaga sobre as razões do “esquecimento” para com a literatura feita por mulheres. E perscruta os aspectos ideológicos em torno da temática, articulando as relações de gênero com os fatores contextuais de ordem sócio-econômica de modo a identificar os pontos de contato entre a literatura e a história do Acre, estabelecendo ligações com noções de gênero, alteridade e identidade.
Ao se debruçar sobre uma escrita quase anônima, a pesquisadora traz à cena, não somente a literatura de autoria feminina, investiga também o papel social da mulher, sua atuação nas relações de gênero na sociedade onde a mesma está inserida, reconstrói percursos, identificando os lugares marcados socialmente para essas mulheres até então mais ignotas que a “ignota floresta amazônica” na construção histórica do Acre.
Oportunos e emblemáticos são os questionamentos levantados quanto à condição feminina no Acre, sobre o percurso intelectual de sua produção literária, sobre a visão que elas têm do lugar de onde escrevem como espaço geográfico e sócio-cultural. E Como conseqüência do “descortinamento” dos problemas levantados no decorrer do seu trabalho investigativo, as “descontinuidades”, desprestigiadas pela história tradicional, são recuperadas juntamente com a literatura das “margens”.
A cada capítulo de Motivos de mulher na ignota floresta amazônica ... o leitor é envolvido tanto quanto a autora que imprime no texto um forte sentimento de “acreanidade” ao versar sobre “os temas da mulher” acreana na lida diária no espaço da floresta e dos rios, ao lado, ou não, de um parceiro, rodeada pelos filhos pequenos, ou sozinha, embrenhando-se “mata adentro” ou migrando para a cidade não menos perigosa que a selva.