O direito resolve a crise?
Álvaro Pedreira de Cerqueira (*)
Diretor do Conselho Nacional de Entidades
- CONNACEN -
27.10.2008
Sob o título “O direito e a crise”, o Estado de Minas publicou artigo do ilustre Presidente do Instituto dos Advogados de Minas Gerais, Dr. José Anchieta da Silva, em 18.10.2008, a respeito da crise financeira que eclodiu este mês no mundo, e que passo a comentar.
O autor aludiu aos dois sistemas jurídicos ocidentais dizendo que “O Civil Law adotado pelos povos de origem latina tem na lei a fonte primaz e a diretriz maior de seu sistema. O Common Law, baseado na jurisprudência está sedimentado no direito dos `casos`.” Desde logo convém comparar o desempenho da economia dos países latino-americanos, que adotam a Civil Law, com a economia dos países anglo-saxãos, que seguem a Common Law, pelos respectivos níveis de PIB por habitante.
Com a Common Law temos Inglaterra, Estados Unidos da América, Rep. da Irlanda, Canadá, Austrália e Nova Zelândia, cuja média de PIB por habitante era de US$25.613 em 2002. Já com a Civil Law temos Brasil, Argentina, Chile, Panamá, Venezuela, Jamaica, Uruguai, Rep. Dominicana, El Salvador, Peru, Equador, Colômbia, Guatemala, Paraguai, Guiana, Bolívia, Haiti e Nicarágua, cuja média de PIB por habitante era de US$2.406 em 2002, ou apenas ridículos 9,39% da média dos países que seguem a Common Law. (Fonte: Countries of the World - Gross Domestic Product (GDP) per capita – 2002).
Não resta dúvida de que um dos fatores que contribuem para o muito superior desempenho econômico das sociedades que usam o direito consuetudinário, ou dos costumes, é a adoção da chamada Common Law, bem mais prudente. Enquanto os latino-americanos adotam a Civil Law, ou direito positivo, com leis elaboradas pelos “sábios” legisladores latino-americanos.
Continua o autor: “Uma de suas marcantes característlcas (da Common Law) é a vaIorização da chamada auto-regulação dos mercados, prescindindo da mediação do Estado criador de normas para dlrlgir a bem-sucedida atividade privada.” A história tem demonstrado a evidência empírica de que o Estado regulador do mercado comete muito mais erros do que as possíveis falhas do mercado. De acordo com Ludwig von Mises (1881-1973), da Escola Austríaca de Economia, o intervencionismo do Estado no mercado não realiza os seus fins pretendidos. Em vez disso, ele altera o mercado. E aquela distorção precisa de ajuste. O resultado é mais distorção, conduzindo a mais intervenção e à concomitante estagnação causadora muitas vezes de falência de negócios, como ocorre na presente crise.
Em continuação, o Dr. Anchieta escreveu: “A sociedade moderna, independentemente de quaisquer ideologlas ou sistemas políticos, não pode prescindir da presença do Estado quando estão em jogo os interesses de seus cidadãos. O primeiro responsável pela paz social, quando as crises se instauram, há de ser o Estado organizado. A este cabe a tarefa de reorganizar as estruturas socials e econômicas quando estas se desorganizam em prejuízo dos cidadãos.” Ora, no caso do Brasil o Estado é um voraz predador da sociedade, tanto que sua Receita Federal tem como símbolo um leão, o rei dos predadores. Tem carga fiscal de 40% sobre o PIB, mas os poucos cidadãos que podem ainda pagam por fora para ter saúde, educação, segurança e reparos de veículos destruídos em estradas e ruas esburacadas. Logo, trabalham cerca de seis meses só para sustentar o Estado, com retorno pífio para os pagadores de impostos.
Como pode a sociedade confiar no Estado, que aqui tem um fim em si mesmo, para lhe proteger? A sociedade brasileira é que serve o nosso Estado mercantilista, dos “amigos do rei”. As nossas leis positivas são feitas para isso. A Constituição de 1988 é uma espécie de Código de Manu, da antiga Índia, que regulava os privilégios dos marajás. Basta examinar os salários e aposentadorias do funcionalismo, especialmente dos magistrados, cujos privilégios são escandalosos, como disse há poucos dias o ex-presidente FHC, em comparação com os dos trabalhadores em geral do setor privado.
(*) Administrador pela FGV-SP
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