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Contos-->Nuca -- 28/05/2000 - 22:46 (Andréa Estevão) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Nuca


Ele era perigosamente nuca. Entrei na altura do Maracanã, 21:37. Ele já estava. Dois bancos a frente, fileira oposta. .Aquela olhada em volta pra checar sem muita atenção o ambiente e, de repente, nuca. Nuca morena. Os cabelos curtos deixavam aquela parte do corpo indecente a mostra. Meus olhos não conseguiam se desgrudar daquele pedaço de pescoço. Globo ocular, suas próprias leis, e ele olhou pra trás. Olhos nos olhos, susto. Seu rosto era perturbadoramente parecido com o de um amigo. . A indecisão do quase reconhecimento demandou um instante a mais. Seria a Índia? Não era. Capturados os dois naquele hiato. O acaso conquistara sua nova América! Praça da Bandeira. Buscando me refazer do bem, mal entendido observei o casamento perfeito entre mastro e flâmula. É preciso atar-se em alguns pontos para estar livre sem estar perdida, dançar ao vento. Qual o meu eixo?

Nuca. Lá estava ela. Imantada, intensiva, masculina. Céus! Além de perigosamente nuca o homem era também perigosamente boca. Carnuda, viril. Aquela boca macia aos olhos- massagearia qualquer parte do corpo em que tocasse. Só pensava nos grandes lábios. Armadilha. Trapaça da libido, do instinto, dos hormônios. Me faz esquisita o que não tem nome nem sentido. Disfarcei um interesse para o lado de fora do ônibus. O homem olhava com a insistência do apetite. Pude notar, olho no padre, outro na missa, a gula. Nesse momento, a pessoa que estava ao meu lado levantou-se. Tentei um sossega cadela seguido de um salmo. Qualquer artifício de transcendência era vão. Frio na espinha. Pra quem se debruçava, mudar de lugar era nada. Ele estava ansioso. Dedos e palma se impacientavam com o cano frio. Ele era iminência . Pude ver as mãos, as unhas. Pensei ter encontrado uma razão para não ceder. Não gostei das unhas meio compridas. Tive nojo. Cemitério do Catumbi. Lembrei que os fâneros crescem mesmo depois da morte. O homem de unhas meio compridas ameaçava como a morte. No sentido oposto. A situação era toda batimento cardíaco. O vizinho do homem-nuca-boca se levantara. Ele era mais: era perigosamente coxas. O sangue se avolumou nas artérias. Nenhum obstáculo nos separava. Macho e fêmea e fome. A atração era tamanha que tive que segurar com força pra não ser arrastada até lá. As curvas do desejo mais acentuadas do que as do caminho. Ele me olhava sem retórica. Era um convite. Não. Um chamado. Se eu aceitasse, estaria convertida. Religião das entranhas. Bandeira desfraldada, aceitaria tudo. Mais ainda, porque era o que eu queria. Aceitaria e daria também. Tudo. Sem dizer nada. Só gemidos e suspiros e arfar. Espasmos, suor, cheiro, líquidos. Na parada mais próxima. Na rua. Legítima e vagabunda como uma mulher de verdade.

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