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Contos-->língua -- 10/02/2002 - 22:17 (Rafael Vieira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Nélson de Abreu tivera uma infância pobre, morou em um casebre, com sua família humilde. O pai, servente de pedreiro, a mãe, lavadeira. Ainda assim, teve oportunidade de estudo no colégio público, a bem da verdade por ser a apenas duas casas vizinhas à sua casa. Não teve a mesma sorte com relação à saúde; não havia hospitais por perto, e com os pais impossibilitados de conduzi-lo a um, acabou sofrendo com uma doença quase extinta, a paralisia infantil.
Enquanto os garotos brincavam, Nélson, impossibilitado, tornou-se uma traça de livros da biblioteca de sua escola, voltando para casa apenas na hora do jantar. Era um modo de se distrair, esquecer a prisão da cadeira de rodas doada pela comunidade local, e o fato de não poder participar das diversões de seus colegas de classe. Já através dos livros, tal barreira não existia: Nélson era pirata, detetive, astronauta, e o que mais conseguisse pegar para ler. Tornou-se xodó das professoras, e orgulho do pai.
Conforme crescia, o gosto pela leitura continuava o mesmo, mas mudavam os temas. Dedicou-se aos contos, jornais, poesia, livros didáticos; sabia que através dos estudos poderia tentar partir para uma vida melhor que a do pai.
Entretanto, seu gosto não se dava apenas por livros. Influenciado pelos vários contos amorosos que lera, desenvolveu um sentimento pelas mulheres, desacostumadas a galanteios como os versos que ele decorava exclusivamente para recitar e poder trocar intimidades com sua preferidas. Preferidas sim, porque enquanto os outros garotos jogavam bola, Nélson apenas observava as garotas, dispunha de tempo para conversar com elas, chamava a atenção com seu intelecto, e também virou um grande mimo das moçoilas da redondeza.
Com tamanha dedicação aos estudos, conseguiu progredir na vida, entrara para uma faculdade, pública, do contrário provavelmente perderia a oportunidade, para cursar Letras.
Sabendo inclusive a falta que papai rico faria, e já acostumado a seu ritmo de dedicação, Nélson continuou sendo um grande leitor, e agora escritor. Um de seus professores, admirado com a voracidade intelectual deste aluno, conseguiu uma oportunidade para que ele pudesse trabalhar em um jornal, fazendo a revisão.
Quanto às garotas, ah...ele não parava, sempre com Beaudelaire ou Blake fazendo-lhe companhia, junto também, de autores menos consagrados como literários, os autores dos livros didáticos. Embora cause certo estranhamento, tudo era muito bem pensado: Nélson era, obviamente, incapaz de ter uma relação sexual. Entretanto, talvez fosse mais capaz de proporcionar maior prazer com sua língua e dedos do que a maioria com o falo.
A época como estagiário revisor do jornal foi um grande salto. Além de evoluir em sua condição, também firmou namoro sério com Lúcia, colega de emprego, mais uma a cair em seus charmes orais. Com o salário de ambos, puderam alugar um quarto-e-sala no Baixo Leblon.
Passou em cerca de um ano à redação, de fato, seria perder um talento, criador de um estilo próprio desenvolvido da amálgama de tantos lidos, e foi cuidar de uma seção da página de esportes. Novamente, outro fato que pode causar estranhamento, mas tem uma explicação bem plausível: Nélson nunca pode jogar as peladas na vizinhança, mas observava atentamente os jogos, o que o gabaritava a escrever com a autoridade que muitos ex-atletas talvez não tivessem.
Recebeu do jornal um computador, para facilitar seu trabalho, poderia tão só escrever de sua casa e enviar através da internet suas crônicas, para impedir a locomoção dificultosa. Locomoção, aliás, que evitava, usando apenas para acompanhar alguns jogos no Maracanã, São Januário ou Laranjeiras, sobretudo neste, para acompanhar seu tricolor.
Sua vida passava a ser essa: fazia seu próprio horário, acordava, lia copiosamente até o almoço, preparado por Lúcia, que agora, com o salário do marido e as baixas exigências de seu padrão de vida, pedira demissão para poder cuidar exclusivamente dele, principalmente por causa de sua impossibilidade para muitas situações, escrevia de tarde e lá pelas sete parava tudo, quando dava atenção à mulher, depois do jantar, pontualmente servido por ela nesse horário.
Se a vida estava boa para o escritor, para sua mulher, nem tanto. Sentia falta do emprego, à tarde Nélson não gostava se ser incomodado quando escrevia ou assistia a um jogo pela televisão, e ainda havia o agravante da falta do sexo “normal”.
“Nélson, eu te amo, você bem sabe, mas estou com um problema” e contou o que lhe afligia. “De fato, você sabe como gosto de meu trabalho, e infelizmente não posso resolver a questão do seu prazer, já faço o que posso...” suspirou e continuou “façamos assim...cedo-lhe um direito. Pode arranjar um amante. A bem da verdade, não posso considerar traição, pois conta com minha anuência, e além disso, ele pode dar uma coisa que não posso.”
Lúcia demorou a consentir, mas acabou por. Só havia duas restrições que Nélson lhe impusera: não poderia chegar atrasada para lhe fazer o jantar ( as noites continuariam sendo suas, tudo de acordo com o cronograma), e ela não poderia beijar a boca do amante, pois aí sim seria a troca de algo que Nélson poderia lhe fazer por alguém eventualmente melhor, o que seria bem difícil.
Os dias se passaram assim. Durante a semana, de vez em quando, Lúcia ia encontrar seus amantes, voltava para fazer o jantar e se entregava para Nélson, e nos fins de semana, levava-lhe ao estádio em que houvesse o grande jogo da rodada, ia para a casa de outro e voltava para buscá-lo no estádio, já ouvindo toda a crônica a ser escrita, prontinha em sua cabeça.
Por mais normal que a situação parecesse a ambos, Lúcia começava a se sentir incomodada, afinal de contas, mesmo com a aquiescência de seu marido, ainda era seu marido! Largou, então, um dia o amante, e voltou para casa, pensando. “Nélson, cometi um erro, uma injustiça, você é tão bom para mim, eu o escolhi mesmo sabendo da sua limitação, não foi certo o que fiz!...”
Abriu então a porta de casa, dirigiu-se ao quarto, único da casa, que de noite servia de quarto mesmo e de tarde era o escritório de Nélson. Ainda que ele não suportasse interrupções em seu trabalho, sentia que o que tinha a dizer era tão importante, tirar-lhe-ia um peso da cabeça, nem iria bater à porta, e assim o fez, escancarando-a para, depois de ter ensaiado tão bem seu discurso, ficar sem palavras ao ver uma mulher que nunca vira antes sentada com a genitália na boca de seu marido.
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