A Frente Internacional das Farc e a fronteira brasileira
Marcelo Rech
14/05/2007 - 23h05
A decisão do governo brasileiro em conceder asilo político ou o status de refugiado ao colombiano Francisco Cadena Collazzos, também conhecido como Olivério Medina, atende a um dos objetivos das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) e prejudica os esforços empreendidos para o combate ao terrorismo naquele país e em toda a região.
Hoje, Medina vive na cidade de Medianeira (PR), mas já tem como seu sucessor no Brasil, o guerrilheiro Orlay Jurado Palomino, também identificado pelos nomes de Antonio Benavides, Mauricio Valverde, Hermes Aguilar e Comandante Santiago.
Informações do governo colombiano asseguram que Orlay Jurado participou do seqüestro e morte da filha do ex-presidente paraguaio, Raul Cubas Grau, Cecília Cubas, assassinada depois de 148 dias de cativeiro. A motivação do seqüestro era arrecadar dinheiro para a montagem de uma organização das Farc no Paraguai.
No entanto, no âmbito da sua política externa, o Brasil age como se as Farc não existissem, embora haja fortes evidências de que a guerrilha também estaria por trás da organização e treinamento de grupos armados separatistas bolivianos, com presença próxima à fronteira brasileira.
Atualmente, as Farc têm cerca de 11 mil homens espalhados nas diversas frentes, estrategicamente fixadas nas fronteiras com o Brasil, Venezuela, Peru, Equador e Panamá.
Sobre a linha fronteiriça com o Brasil, atuam três frentes, a 16, a Primeira e a Frente Amazônica, a mais nova com três anos apenas. As três contam com 700 guerrilheiros e atuam na região que abrange os departamentos de Guaínia, Vaupés e Amazonas.
Outras duas frentes, 44 e 39, com 400 homens (200 cada), atuam em Guaviare e Vaupés (44) e Vichada (39), como frentes de apoio às três que atuam sob a linha da fronteira.
Na fronteira com a Venezuela, são sete frentes, a 59, com 220 homens, em La Guajira; 41, com 320 homens, em César; 20 e 33, com 180 homens, em Santander; 45 e 10, com 490 homens, em Arauca; e 16, com 360 homens, em Vichada e Guaínia.
Na fronteira com o Peru, atuam duas companhias da Frente Amazônica, com 500 homens, nos departamentos do Amazonas e Putumayo.
Na fronteira com o Equador, são outras quatros frentes, 2, 32, 48 e 29, mais as companhias Jacinto Matallana e Arturo Medina, somando um total de 480 homens nos departamentos de Nariño e Putumayo.
As companhias atuam como forças especiais destacadas para operações específicas de terrorismo.
Na fronteira com o Panamá, atuam as frentes 5, com 360 homens, em Antioquia; 58, com 150 homens, em Antioquia; e 57 com 200 homens, em Urabá e Choco.
Várias dessas frentes atuavam no centro do país, mas deslocaram-se para as zonas de fronteira justamente por conta do endurecimento das ações do governo.
Quando as operações se intensificam, os guerrilheiros das Farc passam facilmente para o outro lado das respectivas fronteiras.
Dentre os objetivos da Frente Internacional das Farc no exterior, estão a promoção de eventos com a participação de ONGs, movimentos de esquerda e simpatizantes; difusão das reivindicações da guerrilha; manutenção do intercâmbio com grupos terroristas internacionais e contato com bandas de traficantes de armas; negociações das extorsões e seqüestros, realizados contra companhias multinacionais e estrangeiras; investimento e lavagem do dinheiro resultante de seqüestros, extorsões e da venda de drogas.
Dentro dessa ótica, realizam treinamentos de táticas e técnicas terroristas urbanas e rurais com integrantes do IRA e ETA, têm contatos com grupos radicais na Ásia, mas não há confirmação de relações de tipo ideológico de fundamentalismo islâmico, árabe ou mulçumano.
Além disso, a Frente Internacional atua na integração de grupos subversivos latino-americanos e trabalha para alterar as relações diplomáticas, consulares e comerciais da Colômbia com os países vizinhos, e intensificar as atividades internacionais contra o apoio dos Estados Unidos à Colômbia, por meio do Plano Colômbia.
Ainda de acordo com o governo colombiano, desde o final de 2006, as Farc trabalham para consolidar as relações clandestinas com outros grupos subversivos e terroristas; fortalecer a presença clandestina na Europa; e aperfeiçoar e assegurar as redes e rotas de tráfico de armas e drogas.
Neste sentido, colocou-se em prática a estratégia de utilizar membros de ONGs simpáticas às Farc, para testemunharem contra as Forças Armadas da Colômbia, protegerem o dinheiro da organização em contas no exterior e internacionalizar o conflito como forma de promover incidentes de transcendência diplomática.
Como temas de propaganda, utilizam a debilidade do governo colombiano, denunciam o Plano Patriota como uma seqüela do Plano Colômbia, criticam as Forças Armadas da Colômbia, não aceitam o rótulo de Organização Narcoterrorista (ONT), defendem que as Farc se constituem numa organização militar legítima que merece ser reconhecida como combatente e que lidera um movimento político igualmente legítimo.
Através do seu pessoal no exterior, integrantes ou colaboradores, as Farc atuam numa mesma linha, a de que a cooperação regional contra a organização não é necessária e que se deve reduzir a ingerência dos Estados Unidos na Colômbia.
Também defendem a eliminação das milícias privadas, a interrupção das atividades de combate ao terrorismo e ao narcotráfico, e se busca incrementar os laços com a Europa.
Para as Farc, uma das prioridades é desqualificar internacionalmente o Plano Colômbia, pois o mesmo afeta suas finanças, por isso, considera que para chegar ao poder é necessário um trabalho centrado na liberação de zonas territoriais de forma progressiva.
Para tanto, contam com a cooperação de países vizinhos que, num determinado momento de dificuldades, possam brindar seus integrantes com a figura do asilo político, como ocorreu com Olivério Medina, no Brasil.
Entretanto, o Brasil resiste em reconhecer que as Farc trabalham na organização de uma rede terrorista no continente, com objetivo de alterar a governabilidade naqueles países onde a repressão é maior.
(*) Marcelo Rech é jornalista, especialista em Relações Internacionais e Estratégias e Políticas de Defesa, e editor do InfoRel.
Correio eletrônico: inforel@inforel.org.
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