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Artigos-->A honestidade pela honestidade -- 23/05/2007 - 15:11 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
BAILE DE DEBUTANTE DA LIA: A HONESTIDADE PELA HONESTIDADE



Sérgio Monteiro Medeiros (*)



quarta-feira, 23 de maio de 2007

http://www.claudiohumberto.com.br/Artigos/tabid/290/articleType/articleview/articleID/87572/Default.aspx



Uma das melhores definições de “chato” que já encontrei é a que diz ser o sujeito que adora falar de si o tempo todo. É uma faceta apenas... mas como é chata!



E já nesse ponto, você deve estar se perguntando: “o que esse sujeito acha que isso tem a ver com o que ele pretende escrever”? Bom, é que eu resolvi me aventurar a falar sobre o assunto porque a minha esposa, Eunice, sugeriu-me que eu o fizesse para dar vazão ao meu inconformismo. “E daí?”. Daí que eu não poderia iniciar – ou terminar, tanto faz – uma pretensa crônica sobre o título em questão deixando de dar crédito a quem merece. E “PT (PONTO, dos tempos do telegrama tradicional, numa linguagem cifrada incompreensível para a geração pós-internética) saudações”.



Mas deixemos de chatice e vamos logo ao tema.

Você já ouviu comentários do tipo: “fulano é desonesto, mas eu deito a minha cabeça no travesseiro e durmo tranqüilo o sono dos justos”? Esqueça! É a mais pura balela. Os tais fulanos deitam e dormem em paz, em casas suntuosas e bem protegidas, descansando seus corpos cansados, e ricamente nutridos nos melhores restaurantes, sob camas “box”, tamanho king size, colchões absurdamente macios e anatômicos, cobertos por lençóis de seda (ou de algodão egípcio fio “500”, ou do mais puro linho) e edredons e travesseiros de penas de ganso, importados do primeiro mundo. Você acredita que eles dormem mal? Convenhamos...

A questão é diametralmente outra. O fato é que o honesto não se conspurca, não chafurda, por que se o fizer não terá a paz que tanto aprecia e cultiva. Ambos – honesto e desonesto – dormem o “sono dos justos” (mutatis mutandis, pois que os paradigmas pessoais informam a convicção “do que é justo”). É compreensível e muito razoável que seja assim, pois ambos agem consoantes suas intrínsecas naturezas. Nada a estranhar, portanto.



Quem, quando criança, não aprendeu (e apreendeu, pois bem que podem ter-lhe tentado ensinar, mas o mundo está cheio de descaminhados) que troco dado a mais se devolve – seja muito ou seja pouco -, é bastante improvável que chegue, na fase adulta, a ter comportamento honesto, digno, honrado, probo, ou, no popular, acorde com a moral e os bons costumes. Nós da área jurídica sabemos: “dia do pendura”, só uma vez por ano. Aqui devo fazer um parêntesis, pois com 18 anos de bacharelado em Direito, somente há três vim a saber do que se trata. Não é um costume nacional (calma galera, sem duplo sentido, please!), mas no dia 11 de agosto os acadêmicos (frise-se!) de Direito dão um xexo – entenda-se, calote - nos restaurantes (alguns tentam, vai ... os gerentes e donos de estabelecimentos não andam tão cooperativos, é de geral sabença) a fim de festejar (comemorar fica melhor) a data da criação do primeiro curso jurídico nesta Terra Brasilis, o da Faculdade de Direito do Largo do São Francisco, em São Paulo/SP. É fato isolado, pois, a se celebrar a tempo e modo, e não em qualquer ocasião.



A ocasião faz o ladrão! Quem cunhou – e quem o repercute ingenuamente – que me perdoe, mas se trata, sem sombra de dúvidas, de um dito popular bem sem-vergonha. O ladrão faz a ocasião! Como se vê, a ordem dos fatores pode ser de extremada relevância, com a vênia dos matemáticos. O desonesto está sempre à espreita, à espera do momento de “enfiar a mão na cumbuca”, locupletar-se ilicitamente, furtar, roubar, fraudar, desviar, apropriar-se, porque é da sua estirpe ser amigo do alheio. “Mas ele era pobre...” Nas favelas está repleto (a grande maioria!) de gente da melhor qualidade, que sofre mas não se entrega! “Ele não teve outras oportunidades...” Mas na primeira que se apresentou despiu-se da decência e se lambuzou! “No fundo ele é boa pessoa...” O inferno está cheio de boas intenções! E por aí vai...



Quem é honesto mantém-se honesto, e não para receber honrarias, reconhecimento, medalhas (medalha, medalha, medalha, medalha... síndrome de Muttley; tal personagem, esclareço, para os mais novos, tratava-se do cachorrinho do Dick Vigarista, aquele peçonhento que azucrinava a Penélope Charmosa no desenho animado “Corrida Maluca”) pelos princípios que traz consigo, apesar de toda a adversidade, de toda a injustiça (o mundo está “lleno”), pois não pode trair a sua própria natureza.



Exemplifico. No ano passado um estimado amigo perdeu o pai, já felizmente idoso, aos 86 anos de idade. Foi um homem que veio de muito baixo, morou em casa de madeira caiada de branco e, aos quatorze tornara-se, face à morte prematura do avô paterno desse amigo, arrimo de família. Isto, associado a outros fatores, o impediram de fazer um curso - hoje lugar-comum - superior. Fez carreira, começando como contínuo, no Banco do Brasil, onde veio a se aposentar no cargo de superintendente, quando então assumiu a presidência do Banco do Estado. Não se enriqueceu, e o que mais surpreendia esse grande amigo, era que ele, filho caçula, com menos da metade da idade do pai, pudesse ter acumulado patrimônio quase duas vezes superior ao de seu genitor. E isso o orgulhava... pelo exemplo de honestidade do pai, que jamais se deixou cegar pelas tantas ocasiões de se enriquecer (defraudando o patrimônio público).



Com a morte do pai, tão amado, o que sempre traz recordações aos que ficam, o meu amigo narrou-me (ainda no velório, e me autorizou recentemente o relato, ante o compromisso de omitir nomes e datas, pelo que, saliento, não cometo aqui nenhuma apropriação indevida de fatos da vida alheia) uma passagem de sua vida que o surpreendia de diferentes formas.



Ele contava então 15, 16 anos. Acostumara-se a ouvir comentários sobre o “sucesso econômico” de alguns funcionários públicos – diferentemente de seu pai, repita-se -, e um dia anunciou: “Pai, quero ser fiscal da Fazenda”, ao que o pai redargüiu: “Pedro (nome fictício), eles ficam ricos por que ganham propina. É isso o que tu queres”?. Calmo, ouviu, assim de supetão, a decepcionante resposta: “Sim pai, por que não, já que nada lhes acontece, não são punidos.” A resposta estarrecedora: “Está certo meu filho, se é assim que tu pensas...” O tempo passou e o “projeto de corrupto” tornou-se um obscuro (ele assim se declara), mas íntegro juiz de Direito, o que enchia de contentamento seu pai. “Só então compreendi”: (confidenciou-me) “meu pai, homem de pouca conversa e muitos exemplos, fizera o que estava ao seu alcance, construíra os fundamentos e, quase certo, confiou que eles suportariam o prédio que se erguia, fato que, acredito piamente, explica aquela então incrível e inesperada reação, pois que desacompanhada da mais tênue censura que fosse. Mas o melhor foi que ele viveu para comprová-lo”.



Hoje, entrementes, nossos homens públicos dão péssimos exemplos! Não é novidade, claro, mas mera reiteração. E isto não os impede, todavia, todos sabemos – o pior cego que não quer ver é o culto -, por mais amplas e bem urdidas que sejam as redes de corrupção que implantem e cinicamente comandem (por vezes, até, continuam a se dirigir ao povo em tom adequado ao horário nobre, eleitoral), de seguir em frente, sob as bênçãos do povo, vez que desinformado, mal informado e mal educado (aqui, refiro-me à dimensão acadêmica, eis que interfere na capacidade volitiva). Mas o povo não é o culpado, e mil vezes a democracia mais defeituosa à ditadura “mais perfeita“, ungida dos melhores propósitos.



Contra esse estado de coisas (neste ponto, destaco, afasto-me do discurso mais geral sobre a honestidade para serpear a trilha da “honestidade” administrativa), uma das jóias da coroa veio a lume no ano de 1992 (isso mesmo, ironicamente, justo no governo daquele presidente que sofreu impeachment), foi a Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992), que contempla severas (mas justas) sanções de índole administrativa, civil e política aos agentes públicos (incluo os agentes políticos, conquanto isto esteja longe de ser pacífico). Não se tratam de ilícitos penais, incumbe decalcar.



Passados quase 15 anos (a lei foi sancionada no dia 2.6.1992), o balanço que se faz, lamentavelmente, não pode ser positivo. A ação de improbidade administrativa, que tem sede constitucional (a Carta Federal é seu fundamento de validade direto – indireto é de todo o ordenamento jurídico, óbvio), vem sendo dilapidada em sua força construtiva, de soerguimento de padrões éticos e de posturas administrativas, por decisões judiciais de duvidoso lastro, que podem levar, na prática, à derruição de um dos mais notáveis instrumentos de defesa da moralidade administrativa que este país já concebeu.



O que se pode e deve, legitimamente esperar, é que os nossos julgadores de boa vontade invertam essa triste tendência, surpreendam-nos, dando novo fôlego à ação de improbidade administrativa. E podem fazê-lo sob o pálio de argumento dos mais singelos: a honestidade pela honestidade.





(*) Sérgio Monteiro Medeiros - autor da obra LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA: comentários e anotações jurisprudenciais (Juarez de Oliveira, 2003), é Procurador Regional da República lotado na PRR3 (São Paulo/Mato Grosso do Sul) e mestre em Ciências Jurídicas, área de concentração Direito Econômico, pela Universidade Federal da Paraíba.









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