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Artigos-->FORMAÇÃO DE PALAVRAS NOVAS NO PORTUGUÊS DO BRASIL -- 15/11/2001 - 01:33 (Aparecido Donizete Rossi) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Neste trabalho, escolhemos dez palavras que apareceram na mídia escrita num período, em sua maioria, de aproximadamente uma semana durante o mês de Dezembro/2000 e, como ficou constatado na consulta de obras de referência, são palavras que não fazem parte do léxico dicionarizado da língua portuguesa escrita no Brasil, portanto podemos considerá-las como novas.

São palavras criadas, em sua maioria, para servirem a um contexto específico, carregadas de um alto teor semântico que exige uma certa afinidade (entenda-se esta afinidade como o fator falante, e portanto leitor, nativo) entre texto e leitor. Entretanto, o processo de formação dessas palavras não foge, em absoluto, dos processos normais de formação de palavras na língua portuguesa propostas por Antônio J. Sandmann (1992, 32-61). Vejamos como isso se dá.



As palavras escolhidas foram:



1. "Bill Pinton" (Folha de São Paulo, 09/12/2000, Ilustrada, p. E9)

2. "engorda-marido" (Folha de São Paulo, 06/12/2000, Ilustrada, p. E9)

3. "Galisteta" (Folha de São Paulo, 08/12/2000, Ilustrada, p. E11)

4. "paniagua" (Folha de São Paulo, 24/11/2000, Ilustrada, p. E9)

5. "peemedebistas" (Folha de São Paulo, 10/12/2000, Brasil, p. A8)

6. "supercoerente" (Folha de São Paulo, 12/12/2000, Ilustrada, p. E9)

7. "telessexo" (Folha de São Paulo, 12/12/2000, Ilustrada, p. E9)

8. "trépoca" (Folha de São Paulo, 12/12/2000, Ilustrada, p. E9)

9. "Viagrado" (Folha de São Paulo, 08/12/2000, Ilustrada, p. E11)

10. "webaholic" (Superinteressante, n.º 10, Outubro/2000)



1. Bill Pinton



Temos aqui uma modificação feita num nome próprio. Na palavra Pinton temos um processo de formação que Sandmann (1992, 58) classifica como um tipo especial de formação de palavras: trata-se do cruzamento vocabular.

Pinton seria um tipo debochado e irônico de cruzamento vocabular, pois a pessoa que escreveu o artigo em que essa palavra aparece, cruzou a palavra pinto com o sobrenome do ex-presidente dos Estados Unidos, Clinton. Neste caso, a primeira palavra, que definitivamente não se refere ao filhote da galinha, mas sim a uma nomenclatura chula do órgão genital masculino, foi cruzada com Clinton para fazer o leitor recordar do famoso escândalo Monica Lewinsky, um caso de assédio sexual nas dependências da Casa Branca entre o então presidente e uma estagiária.

Segundo Sandmann (1992, 59), traço que caracteriza muitos cruzamentos vocabulares é a sua especificidade semântica, isto é, eles vêm muitas vezes carregados de emocionalidade, sendo que esta é depreciativa, às mais das vezes, e com pitadas de ironia (...).



2. engorda-marido



Nesta construção deparamo-nos com um processo comum de formação de palavras na língua portuguesa: a composição. Observamos a aproximação de duas bases e a presença de duas sílabas tônicas, uma em cada palavra. Também observamos que se trata de um composto formado por dois substantivos.

Sandmann (1992, 41) classifica a relação de palavras da mesma classe gramatical em dois tipos, que ele chamou de compostos subordinativos e compostos coordenativos. No caso de engorda-marido, observamos o mais comum, segundo Sandmann, dos dois: o composto subordinativo, em que temos uma estrutura necessariamente binária e, no caso em questão, marido está sendo especificado por engorda, formando uma seqüência determinante-determinado.

Já se tomarmos o contexto em que o composto se insere, vamos notar algo interessante, uma vez que ele está adjetivando bolo, numa seqüência determinado-determinante, a mais comum na língua portuguesa. Além disso, há até uma certa carga semântica, uma vez que bolo engorda-marido está sendo usado num tom pejorativo para se referir a um aspecto físico do Ministro da Justiça (que no contexto é nomeado de Sinistro da Justiça, numa referência ao significado de acidente que pode ser atribuído a sinistro). Poderíamos até dizer que temos, segundo Sandmann (1992, 42), um composto metonímico.



3. Galisteta



Nesta palavra, temos uma referência ao sobrenome de uma personalidade: trata-se de Adriane Galisteu. A palavra, ou sobrenome, Galisteu, quando mencionada pela mídia, já carrega a carga semântica de referência à pessoa, não sendo necessário mencionar-se o nome todo.

Vemos neste caso a junção de duas palavras: o nome próprio Galisteu + o substantivo teta, formando um composto que Sandmann (1992, 58) classificou como cruzamento vocabular. Esse tipo de composto geralmente tem um valor depreciativo, irônico, etc, e é o que parece ocorrer nesta palavra: pelo contexto, o autor está ironizando uma particularidade do físico da referenciada (teta no sentido de glândula mamária feminina).



4. paniagua



No trecho do texto que escolhemos, esta palavra aparece duas vezes: uma com P maiúsculo e outra com p minúsculo. No primeiro caso, refere-se à pessoa do novo presidente do Peru; no segundo refere-se ao estado em que as pessoas se encontrarão (observe-se a sátira): a pão-e-água (expressão popular).

Quanto à palavra paniagua, trata-se de um processo de composição, pois juntam-se as bases pani (de origem latina pane = pão) com água. É interessante ressaltarmos que a base pani (encontrada desta forma nos dicionários consultados), é muito utilizada pela língua portuguesa, daí encontrarmos as palavras já dicionarizadas panificar, panificadora, panificador.



5. peemedebistas



Neste exemplo, temos um caso muito interessante de formação de palavras: o uso de um tipo especial e de um tipo comum do mesmo tipo de formação: a derivação. Ocorre aqui um caso de abreviação e de sufixação, segundo as tipologias de Sandmann.

Partamos inicialmente de PMDB, sigla de um partido conhecidíssimo do povo brasileiro que abrevia Partido do Movimento Democrático Brasileiro e que compõe a base da palavra em questão. Esta sigla não forma uma seqüência de acordo com a estrutura silábica da língua portuguesa, portanto foi escrita obedecendo à nomenclatura dos fonemas constituintes, resultando: pê+eme+dê+bê -> peemedebe.

Em seguida, acrescentou-se a esta palavra um sufixo muito produtivo em português: -ismo, que carrega o significado de ser especialista, defensor ou seguidor de algo, na mesma linha de esportista, geneticista, dentista, etc.



6. supercoerente



Um aparente caso de derivação por prefixação mas, em nossa concepção, duas características parecem derrubar esta hipótese: a presença de duas bases, pois temos uma sílaba tônica em super (su) e outra em coerente (ren), fato que não ocorre na derivação (que tem apenas uma sílaba tônica); e o fato de que super também pode aparecer sozinho em outros contextos (ex.: ela é uma pessoa super). Sendo assim, consideramos supercoerente um caso de composição por prefixação.

Super é um prefixo de origem latina classificado como erudito, que carrega o significado de grande, excesso, etc. Colocado junto da palavra coerente, temos um composto que indica coerência excessiva. É interessante lembrar ainda que, no contexto, a palavra é usada num sentido irônico, ou seja, na verdade quer dizer justamente o contrário do que expressa.



7. telessexo



Aparentemente, teríamos aqui um caso de derivação por prefixação. Entretanto, uma análise mais aprofundada da formação da palavra leva-nos a crer que estamos diante de um caso de cruzamento vocabular, que é um tipo de composição. Neste caso de cruzamento, sua carga semântica não é depreciativa, mas chama-nos a atenção a maneira como ele foi formado.

Tele (de origem grega) é normalmente utilizado como prefixo para indicar à distância, longe. É justamente o que ocorre em telefone, telecomunicação, telecinese, telescópio, etc. Entretanto, na formação de telessexo, tele teve seu significado utilizado no sentido de telefone, um dos compostos de que faz parte. Ou seja, o sentido primeiro de telessexo é, na verdade, sexo por telefone, que é o que primeiro vem à mente do falante nativo, só depois sendo relacionado ao sentido original de distância expressado em telefone. Além disso, também temos nesta palavra duas sílabas tônicas (té e sé) e, portanto, duas bases.

A mesma coisa ocorre em tele-trívia (cujo uso mais conhecido está presente num quadro homônimo apresentado no programa Vídeo Show, transmitido aos sábados pela Rede Globo), em que trívia é um empréstimo do inglês que já adaptou-se (pois recebeu acento) ao português, e significa conhecimentos de detalhes sobre eventos passados, pessoas famosas, esportes, etc. Tele é usado aqui no sentido de televisão, e não de à distância, longe. Daí tele-trívia = conhecimentos de detalhes sobre televisão.



8. trépoca



Nesta palavra, temos um caso claro de derivação por prefixação. Trata-se da junção do prefixo latino tre-, que indica três, em quantidade de três, com o substantivo época. Note-se a crase que ocorre entre a vogal final e de tre- com a vogal inicial e de época, conservando-se a tonificação do acento.

Aparentemente, poderíamos achar que o significado desta palavra seria três vezes época, ou mesmo três épocas. Entretanto, uma palavra com este significado não é comum à língua portuguesa e, além disso, não faz muito sentido o significado três épocas fora de contexto. Contudo, se levarmos em conta o texto em que aparece a palavra, observaremos que o próprio autor acaba explicando seu significado que, segundo ele mesmo, relaciona-se a algo muito velho, ultrapassado.



9. Viagrado



Nesta palavra, utilizando as concepções de Sandmann apenas, teríamos um caso de derivação por sufixação. Trata-se da junção da palavra Viagra, que é nome próprio de um medicamento, com o sufixo –ado, um sufixo nominal que indica o estado de alguém devido ao uso de alguma coisa. Portanto, Viagrado (observe-se a conservação da letra maiúscula para enfatizar que se trata mesmo de referência ao medicamento) indicaria, pelo próprio contexto em que a palavra foi usada, o estado de quem toma muito Viagra ou do viciado em Viagra. Observe-se também o tom pejorativo e satírico que o autor fez do uso desta palavra.





10. webaholic



Temos aqui um típico cruzamento vocabular distinguido por Sandmann (1992, 59) na mesma linha da palavra workaholic, utilizada como exemplo pelo autor. Palavras desse tipo são empréstimo diretos do inglês e, o interessante, o cruzamento vocabular deu-se em inglês (!).

A palavra workaholic refere-se ao viciado em trabalho. Sendo assim, por webaholic entendemos que seja o viciado em Internet. Observemos como se deu o cruzamento: -holic constitui originalmente parte da palavra alcoholic na língua inglesa, que designa o viciado em álcool, e é formada por derivação sufixal, uma vez que o sentido de viciado está no sufixo –ic. O que ocorreu foi que pegou-se toda a parte final dessa palavra (inclusive o sufixo que especifica o determinado), afixou-se um a para que pudesse quebrar encontros consonantais que não são comuns no inglês (daí -aholic), atribuiu-se o significado de viciado, e cruzou-se com substantivos como work (trabalho), dando workaholic; web (teia, trama, tela, também uma das designações de Internet), dando webaholic; chocolate (chocolate), dando chocaholic.

Como a língua inglesa tem bastante influência mundialmente, não é de se espantar e seria até engraçado se começarmos a realizar cruzamentos vocabulares do tipo trabalhoholic ou futeboholic.



Concluindo, pelos exemplos analisado (que são pouquíssimo para se chegar numa conclusão científica), notamos que o cruzamento vocabular, na formação de palavras novas em língua portuguesa, é bastante produtivo. Notamos também que, pelo menos nesse pequeno grupo de palavras, a derivação pareceu-nos não mais ser a principal recorrência para formar novos vocábulos, ficando mais restringida à formação de atualizações do léxico já existente.



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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA



SANDMANN, A. J. Morfologia Lexical. SP: Contexto, 1992.



BIBLIOGRAFIA CONSULTADA



CUNHA, C. e CINTRA, L. F L. Nova Gramática do Português Contemporâneo. 2.ª ed., RJ: Nova

Fronteira, 1985.



Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa



Grande Dicionário Larousse Cultural da Língua Portuguesa



Longman Dictionary of Contemporary English



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