A escrivaninha bagunçada com fitas de vídeos, livros, cinzeiro sujo, relógio, controles remotos, revista e papeis diversos.
CORTA PARA: O ventilador gira.
CORTA PARA: Dado dorme tenso, ele esta encolhido e com os punhos cerrados(detalhe).
DADO: Jovem de aproximadamente 20 anos.
CLOSE, no relógio despertando às 10:30. Dado se espreguiça.
CORTA PARA, BANHEIRO: Dado entra no banho.
CORTA PARA, QUARTO: Dado coloca a roupa.
CORTA PARA, COZINHA: CLOSE no rádio que toca música, a empregada cozinha alguma coisa.
DETALHE: Os pães saltam da torradeira.
DETALHE: Duas torradas num prato, dado passa requeijão numa, geléia de morango noutra.
DETALHE: Dado mastiga o último pedaço do sanduíche agridoce.
CORTA PARA: DETALHE, Dado escova os dentes.
CORTA PARA: SALA, Dado coloca o tênis.
EXT. AVENIDA PRIMAVERA. DIA
Dado desce a Av. Primavera de bicicleta.
EXT. MORRO. ESTRADA DE TERRA. DIA
Dado sobe o morro com sua bicicleta, sobe até chegar na casa de Maíra.
EXT. HORTO . DIA
Em meio a um horto florido, Maíra cuida de suas flores. Agachada ela observa Dado chegando até ela. De longe:
MAÍRA
Dado!!!
DADO
Maíra!!!
MAÍRA: Linda garota branca, ela parece estar equilibrada e madura para a idade, uns 17 anos.
Riso simpático de Maíra e tímido de Dado. Dado chega até Maíra, se agacha. Os dois se cumprimentam com um beijo na face.
MAÍRA
Estava com saudades de você! Você sumiu!?
DADO
Eu precisava tirar um tempo para pensar, preciso falar contigo.
MAÍRA
Hum... Surpresas?
DADO
É... Bem provável.
MAÍRA
Então vamos entrar.
Os dois se levantam.
MAÍRA
Também tenho surpresas para você.
INT. CASA DA MAÍRA. SALA. DIA
A casa da Maíra é composta por uma sala e uma cozinha, um banheiro (que fica no fundo da cozinha) e dois quartos, mas o que chama a atenção é a grande janela no estilo rústico que dá para um verde interminável, é por onde também entra a luz do sol. Ouve-se o cantar dos pássaros e de vez em quando uma leve brisa atravessa a sala. Maíra e Dado entram pela porta já aberta, Dado senta perto de uma mesa de canto e há várias fotos na parede, Maíra vai ao banheiro.
MAÍRA
Espere um instante que eu vou ao banheiro!
Dado fica a observar as fotos na parede. Dai chega Aninha.
ANINHA: É uma menina com no máximo 4 anos de idade, Em uma mão ela traz uns papéis com uns rabiscados coloridos e na outra mão dois lápis de cera.
DADO
Oi Aninha!
ANINHA
Oi!
DADO
O que isso na sua mão?
ANINHA
Desenho.
Aninha deita no chão e começa a desenhar.
DADO
O que você esta desenhando?
ANINHA
Minha casa.
Chega Maíra trazendo uma garrafa de vinho e duas canecas de plástico de cor vermelha para dado, e azul para Maíra. Ela senta de frente para Dado.
MAÍRA
Ai, ai, ai Aninha! Olha a bagunça!
DADO
Deixa ela!
MAÍRA
Hum, que nada! Se deixar ela bota a casa de cabeça para baixo.
Maíra serve o vinho.
MAÍRA
Encontrei perdido na geladeira.
DADO
Logo de manhã assim?
MAÍRA
Ah o que que tem? Vinho faz bem, não sei se eu li ou se alguém me contou que na Europa eles bebem vinho o dia inteiro, até as crianças bebem vinho por lá.
DADO
Tudo bem então.
Eles brindam e bebem o vinho.
MAÍRA
E é bom que descontrai, eu tenho uma história muito louca para te contar.
DADO
Eu também.
MAÍRA
Ah mais eu vou falar primeiro, Estou muito ansiosa.
DADO
Não parece.
MAÍRA
Então, é como se eu tivesse num limbo, meio que anestesiada, está difícil discernir o que está me acontecendo, to meio perdida, sem saber o que fazer.
DADO
Mas o que aconteceu?
MAÍRA
Neste fim de semana eu conheci uma pessoa e me apaixonei completamente por ela... Você vai me dizer, como assim se apaixonou, da noite para o dia? Sem mais nem menos. Mas é assim que me sinto, caidinha por ela.
DADO
Ela?
MAÍRA
Ela! Vê se pode? Fui conquistada por uma menina! E ainda por cima mais nova do que eu. Tentei fugir, mas o seu olhar foi de uma persistência, e suas palavras foram de uma crueldade de verdades que me inquietavam absurdamente. Beija-la foi uma libertação.
DADO
Mas o que ela disse para te beijar?
MAÍRA
Ela não me disse nada, só que num certo momento ela cometeu um atrevimento.
DADO
Um atrevimento?
MAÍRA
Um atrevimento...
DADO
Que atrevimento?
MAÍRA
Um atrevimento que não vem ao caso...
DADO
Como assim, não vem ao caso, conta logo! Vai acabar me contando mesmo.
MAÍRA
Não! Esse atrevimento só cabe a mim e a ela, não vou te contar não!
Dado dá uma risada enquanto pega a garrafa de vinho e enche as duas caneca
DADO
(para ele mesmo)
Tem que rir!
MAÍRA
(RINDO)
Mas o que foi? Do que esta rindo?
Pára Dado, sabia que você iria rir.
DADO
Não é isso!
MAÍRA
E o que eu devo fazer?
PAUSA.
DADO
Eu não perderia esta chance!
Eles riem
MAÍRA
Agora é a sua vez!
DADO
Não sei se vai fazer muito sentido agora.
MAÍRA
Não acredito! Vamos diga!
DADO
Não sei?!
MAÍRA
Se ficar ai dentro apodrece... Você veio aqui me contar e não vai me contar?
DADO
É uma menina.
DADO
Uma menina!
DADO
Também estou apaixonado, completamente. E sai de casa hoje decidido a dizer tudo o que eu sinto. E é por isso que estou aqui, estou me declarando para a menina que mais amo neste mundo neste momento.
PAUSA. Ela puxa a cadeira e senta ao seu lado.
MAÍRA
Não sei o que dizer.
DADO
Pensei em chegar aqui cheio de razão e dizer com afirmação: Maíra, vamos parar de perder tempo! Não vê que nos amamos. Mas depois do que me disse agora, vejo que estava enganado, pura ilusão. Porra! Mas que amizade é esta de se compreender só com o olhar, de acordar com o impulso natural de procurar o outro, isto, quando não dormíamos juntos, juntos, agarrados, saciados só pelo cheiro, pelo barulho da respiração...Ah,ah,ah, puta que o pariu! Como é que pode, eu estava tão certo...
MAÍRA
Você acha que eu também não confundi, que não questionei, que não desejei? Por vários momentos estive a um palmo de me declarar, de me entregar.
DADO
Sério?
MAÍRA
Claro seu bobo. Você não percebeu?
DADO
É, sim, mas Achei que eu pudesse estar enganado.
MAÍRA
Eu achava que isso iria acontecer mais cedo ou mais tarde. Eu tentava dizer, mas o peito apertava...
DADO
E ficava difícil respirar...
MAÍRA
Então eu fugia do pensamento, quase que para poder respirar.
DADO
E você chegou à alguma conclusão?
MAÍRA
A nenhuma, me apaixonei por Clara antes de qualquer conclusão.
Uma pequena PAUSA entre eles, Dado se espreguiça na cadeira.
DADO
Ahhhh, que merda... (se espreguiçando na cadeira).
MAÍRA
Como é que você esta se sentindo?
DADO
Aliviado!
Maíra se levanta da cadeira e senta no colo do Dado. Dado está de cabeça baixa enquanto Maíra faz cafuné em seus cabelos.
MAÍRA
Vai mudar alguma coisa?
DADO
Acho que sim.
MAÍRA
Eu te amo muito.
DADO
Eu também.
MAÍRA
Estou preocupada contigo, não queria te ver triste.
DADO ( cantando á capela)
Ah eu não vou chorar
Eu vou é cantar,
porque a vida continua.)
E eu não vou ficar no meio da rua,
Esperando que alguém me dê a mão, me dê a mão,
Me dê a mão.
Maíra fica surpresa com a reação de Dado e após se olharem por alguns instantes, Dado comete o atrevimento de beijar suavemente a boca de Maíra.
Do chão, Aninha observa os dois se inspirando para mais um de seus desenhos em giz de cera.
