Usina de Letras
Usina de Letras
69 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62236 )

Cartas ( 21334)

Contos (13264)

Cordel (10450)

Cronicas (22537)

Discursos (3239)

Ensaios - (10367)

Erótico (13570)

Frases (50634)

Humor (20031)

Infantil (5434)

Infanto Juvenil (4769)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140808)

Redação (3307)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1960)

Textos Religiosos/Sermões (6191)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Poesias-->Atunnus - coletânea -- 09/08/2002 - 14:47 (Régis Antônio Coimbra) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Atunnus



18 de abril de 2002



--------------------



A cigarra

18 de março de 2002



Ah! barulhentos hemípeteros

que cantam, como nós

senão para espantar os males

para atrair o sexo conveniente



Só pensam naquilo!

com uma abnegação atávica

maior que a dos humanos viciados

em sexo, crak ou o que for



Eu canto

não para espantar os males

nem para atrair o sexo mais ou menos oposto



Canto para embelezar

o sexo, os males

a vida...

ou pelo próprio canto

mais ou menos belo



Canto para atrair a mim mesmo

como forma de invocar a mim mesmo

como Pessoa a invocar, sem encontrar nada

a si mesmo como os que espíritos invocam



Ao cantar

diferente da cigarra

conheço-me



E, de quebra

volta e meia aparece uma fêmea

que não sei se aprecia música

ou qualquer pretexto...



--------------------------



Cinzas

23 de março de 2002



Vejo-te

e encanto-me contigo

mas não muito

Pois penso demais em mim

demais em outras

demais em coisas demais



Vejo-te e

sem dar por isso

aprumo-me

numa atitude dominante

viril e tal

mas nem tanto

Pois já cumpri todos

os serviços militares ou sexuais obrigatórios



Vejo-te

e contemplo êxtases e felicidade

temperados por anticlímax e dor

que já vivi bastante

e prefiro lembrar com nostalgia

que repetir com cefaléia, lombalgia ou dor de corno...



Alguma brasa

com a brisa fresca que trazes

anuncia alguma chama

Mas sou mais cinzas

para minuciosa análise

psicológica, política, arqueológica

que carvão negro

ou papel branco

para amores crônicos

ou paixões rápidas



----------------------



A foto que enviaste

4 de abril de 2002



Não sei se és louca

não sei se és chata

não sei se falas dura

rápida, dementemente

ou mentes demais



Mas és bonita



Ou estás linda

na foto que enviaste

(não exatamente para mim)

e pode nem ser tua



Não sei se és louca

não sei se és chata

não sei se mentes de mais

etc



Intrigaste-me, porém,

deveras e profundamente

com o que escreveste

autodescreveste

ou com a foto que enviaste



Em todo caso

moras longe

e posso me apaixonar por ti

sem tanto medo



Mas existe o perigo

de me corresponderes

e não ser por cartas



Talvez procures

aquilo de que fujo

porque procuro

e já me fez tão mal...



Serás?



Já fiz mal a tantas moças

cujo sofrimento fez-me tão mal

que não me recomendo

em parte por altruísmo

em parte por horror

por medo



Cansei da desilusão de desiludir...

logo, cansei do amor?



Mas alguns remédios são piores que as doenças...



---------------



Estado de necessidade

4 de abril de 2002



Sei que ando te negando

Confesso que venho te evitando

Admito que ando te caçando

Concordo que ando te enganando

Reconheço que ando até inventando histórias...



Mas nem te conheço tanto assim

ou nada

e estou perdidamente apaixonado



Estou louco

estou perdido

estou desesperado

e já só tua lembrança me consola



Não mereço...

mas tenho todo o direito a tudo isso

e muito mais

Graças a

ou apesar de

ti

Ou meu delírio a

teu respeito

tua obscenidade

nossa santidade

Minha relevância

existência

ou persistência



Enfim

reitero

Tua graça

minha desgraça





------------------



Todo mês, toda noite

4 de abril de 2002



Se sangras todo mês:

ou vives na abstinência

ou usas pílula de hormônio

com descontinuidade

(não segues o Dr. Elsimar Coutinho)



Se desde o começo

sempre sangraste

todo santo ou herege mês...

então és nulipara

e incrivelmente regular



Se quiseres

posso-te tentar um filho dar...

(se não inverter as posições

nas devidas conjunções carnais

como na frase anterior)

se bem que te vou dar, acho, é trabalho

e tu é que vais me dar um filho



O importante é que és mulher

logo: chata

louca

esquisita



O problema é que és linda

e padeço de tua presença

distante de minha ferida

que sangra em ti

todo mês

como entumece

comicha e arde

em mim

toda noite



-----------------



Querida arquiteta

4 de abril de 2002



Urbaniza-me uma vida

arquiteta-me um lar

decora-nos um cantinho de amor



Em troca

eu moro contigo

lado a lado e muito mais

inclusive alado

no espaço mais que interior

subjetivo

de nossos sonhos

dores e prazeres

partilháveis



----------------



Fantasma amoroso

4 de abril de 2002



Não sei que mortes

de minha alma mortal

deram-me a ilusão

de que te amo



Não sei que dores

de minha vida banal

trouxeram-me o delírio

de nossa vida ideal



Não sei que falta

em meu quotidiano estéril

fez-me querer-te

um filho fazer-nos



Não sei que futuro

nosso tempo contado

reservou para nós

nos fazermos presentes



Não sei quanto tempo

nossa mútua ausência

nos assombrará

com esse horror e fascínio



Não sei... não sei...

se o presente

na presença

não será de grego



Não sei

mas arriscando ou não

se ou enquanto vivo

arrisco



Não te toquei

não senti teu cheiro

teu calor

teu hálito



Mas tua assombração arrepia-me

empertiga-me

faz-me suspirar

a desejar-te e fazer-nos agudamente vivos



Teu espectro é meu próprio fantasma

como de um membro amputado

que eu nem sabia ter



Eu te amo com o mais patético

ou sagrado

de meu amor próprio:

a necessidade de acreditar

numa vida de valor infinito

enquanto durarmos



----------------------



Tuas fronteiras

4 de abril de 2002



Ao ver-te

desterrei-me

tornei-me apátrida

estrangeiro em qualquer lugar

errante



Ao ver-te

soube que nunca fui cosmopolita

apenas perdido

sem saber disso



Ao ver-te

vi para onde ir

qual asilo necessito

que visto de qual permanência buscar

embora tudo seja impermanente

exceto a impermanência



Mas se for para errar

que seja contigo

em teu campo

em teu seio

em teus montes



Deixa-me gozar

os prazeres da espeleologia

em tuas fronteiras

em tuas entranhas



Deixa-me acertar

meus ritmos

meu equilíbrio

meus ciclos

em teu fuso

horário ou mensal

oral ou pélvico



Deixa-me aprender teu idioma

tua prosódia

teus costumes

tua tradição

tua contracultura



Deixa-me adentrar

teus lindos lindes

onde minha carência

com a tua

complementa-nos

opulentos



---------------



Revolta

4 de abril de 2002



Volto, revolto

torno e entorno

contorno e retorno



não há velocidade de escape

que me faça sair de tua gravitação



Tento fortalecer-me

e minha força mais me força

a buscar-te



Tu me atrais tanto

quanto te desejo

num círculo

virtuoso e vicioso

em curto-circuito



Só quero partir

para voltar



Só me revolto

para me render



----------------



Quero que morras

4 de abril de 2002



Quero que morras

toda noite

as pequenas mortes

provocadas

por minha lança

intrometida

em tuas entranhas



E compreendas

meu sono imperativo

após meu sumo jorrar

em teu cadinho

onde formulas hipóteses

de reprodução sexuada



Que nossas pequenas mortes

mais ou menos simultâneas

ao menos arrisquem

novas pequenas vidas

que nos transcendam



-----------------



Se eu fosse eterno

5 de abril de 2002



Nosso amor reina

como guerra fria

ou diplomacia quente



Cobiço-te

e desprezas-me

equilibradamente



Nada posso

e nadas queres

de mim



Tudo amo

e nada tenho

de ti



A essa assimetria

daria graças

eternamente



Mas há também a mulher que passa

meu bicho carpinteiro

e a hereditária mortalidade



-----------------



Cara encarquilhada

5 de abril de 2002



Tuas rugas e manchas

são indício dos muitos verões

que passaste ao sol



Tuas gengivas sem dentes

são indício da dieta

de riqueza mal administrada



Pensei que fosses camponeza

obrigada a trabalhar sob o sol

mas me contas de veraneios



Pensei que os dentes se gastassem

mas me falas de primitiva ortodontia

e complicações higiênicas



Definitivamente

a idade conta...

e a conta cobra



--------------



Vida noturna

5 de abril de 2002



Na noite escura

vejo com o tato

como o gato

com os bigodes



Na noite escura

tua careta

como a da gata

expressas sonora



----------------



Olhares dos gatos

5 de abril de 2002



Na noite clara

império dos bastonetes

todos os gatos são pardos



As íris de dia fusiformes

adaptam-se redondas à noite



-------------



Os gatos de Jerusalém

5 de abril de 2002



Em Jerusalém

os gatos também

são domésticos



Mas em lugar nenhum

são domesticados

ao contrário dos donos



----------------



Bodas

5 de abril de 2002



Equivocamo-nos

o que é um bom começo

ou, enfim,

começo



Ela encantou-me

a contragosto

e aceitou-me

abnegadamente



Sou catastrófico

e a decepcionei

previsivelmente



Ela aceitou-me

generosamente

e reclamou

só para se acalmar



Com o tempo

pior

até o rancor passou

e passamos



Se rompêssemos

fracassaríamos

e talvez vivêssemos



Nosso triunfo

foi viver

sobrevivendo



Depois de tudo

mal lembramos-nos

em tons róseos



Pois o fim

inexorável

foi ainda pior



---------------



Proporções

8 de abril de 2002



Quando falta humildade

sobra humanidade



Quando falta humanidade

sobra humanidade



Quando falta amor

não há saudade



Quando sobra saudade

sobra amor



Quando gente morre

sobram outros



Quando todos morrerem

não haverá problema



----------------



Sou mais ou menos um

8 de abril de 2002



Não sei dos demais

e nem plenamente de mim

mas sou mais ou menos um



Preciso de ti

para mais ou menos dois

talvez três ou quatro...

ou zero



Seis bilhões que se danem



----------------



Poemas inúteis

8 de abril de 2002



Meus poemas são inúteis

ou não bem seriam poemas

seriam depois publicidade

seriam durante terapia

seriam duras lições



Meus poemas por vezes não são inúteis

e costumam não ser tão bons

ou não principalmente poemas



Meus poemas costumam ser resmungos

mas semanas depois viram poemas

Quando a publicidade, a terapia e a lição caduca

e sobra o poema... quando sobra



---------------



Problemas com menbros

8 de abril de 2002



Recentemente alguém reclamou de "problemas com alguns menbros"



Imagino que estava com a perninha do m enfiada em local incômodo



------------------



O amor cansa

8 de abril de 2002



Meu amor não cansa

pois é já o que restou

quando a paixão cansou



Pela manhã tenho ereção

mas não exatamente tesão

pois quero remanchar

mais que transar



À noite me aconchego

e até transamos

como uma coisa natural

que fazemos "de passagem"



O toque chama

o beijo que chama

o tesão

que incendeia...



Mas gozas tão rápido

que fico paranóico

sobre teres aprendido

ou desistido



Parece que um resto de paixão

tem ciúmes do amor



E o contraste é tal

que nas recaídas na paixão

tenho sérias dores nas costas

que comemoro alegremente



----------------



Em consignação

8 de abril de 2002



Como não me vendo

como não me compram

como mal me ofereço

considero-me em consignação



Passada a temporada

que não sei de quanto tempo será

ou se aturarei até um fim natural

devolver-me-ei ao pó



-------------------



Animismo

8 de abril de 2002



Primeiro aprendi

que o boneco não sofre

que o gato não arquiteta

que a fé não cava

que o bom senso não existe...



Depois descobri

que muitas pessoas não refletem

não sofrem...

ao menos não do mesmo jeito



Mais tarde sofri

pois paixões iludem

ódios cegam

e vice-versa



Hoje constatei

que eu mesmo não sou

o que penso

justo por ser humano

pessoa e tal



---------------



Desiguais

8 de abril de 2002



Desigualmente

mentimos boas intenções

que eram mesmo boas



Desigualmente

esfregamo-nos

e sem tirar a roupa

gozaste na minha mão...

e deixaste-me na mão

conforme a praxe desigual



No segundo encontro

lembrei-me de ir-te

lá pelas tantas

logo tirando os sapatos

e entendeste imediatamente

o que talvez já planejaras



Sem calças

ali, num canto impróprio

respiramos desiguais

contorcemo-nos desiguais

em ritmos desiguais

até gozos desiguais

com conseqüências desiguais

riscos desiguais

tudo desigual



Mas desigualmente

ambos celebramos o bordão:

"viva a diferença!"



----------------



Muito além do coito anal

8 de abril de 2002



Meu lado feminino não dá o cu

não faz boquete

não se fantasia de mulher

não tem tesão por homens



Já bati punheta para um amigo

e foi muito bom para mim também

que não senti tesão... mas gozei

não ejaculei nem nada

mas tive um barato estranho...

algo como um desfalecimento



Mas meu lado feminino é sapatão...



Acho que foi meu lado gay

ou santo

que bateu punheta para meu amigo

e gostou



Não sei do que

nem sei explicar como

mas gostei



Estranho amor

sem beijos

sem carinhos

mas com muito amor

ou algo assim

talvez amizade mesmo



----------------



Opções

9 de abril de 2002



Todas as opções

têm senões



Por isso são opções

não deduções



As virgens imaculadas...

que se danem

imaculadas



--------------------



Felicidade finita

10 de abril de 2002



Estou feliz

mais ou menos feliz



Estou bem

mais ou menos bem



Estou

mais ou menos estando



Sou finito

não existo desde sempre

nem para sempre

e mesmo agora

não absolutamente



Jamais serei plenamente

outra coisa exceto parcial

uma perspectiva

de graças e desgraças

que compões minha relativa

felicidade...



...ou, quando estou deprimido,

sobre os mesmos fatos,

minha infelicidade



-----------------



Sonho a dois

10 de abril de 2002



Meti-me em teus sonhos

como meta realista

mas temo ser ilusão

como sou vaidade

e tenho aflições

que exacerbas



Meti-me em tua cama

como tempero picante

mas temo enfadar-te

pois sou aconchego

e tenho preguiças

depois que me exaures



Meti-me em tua vida

como príncipe encantado

mas temeria o desafio

de continuar encantado

não fosse o encanto

com que me encantas



---------------



Diversas ausências

10 de abril de 2002



Quando lembro

dos encontros seguidos de desencontros

revivo e padeço



Quando caduco ressinto-me

dum amor que sozinho ainda sinto

primeiro me encanto

com o belo fantasma



Mas logo me assombro

com a aridez da falta

pior que a solidão



Quando esqueço as dores

as mágoas, os revezes

esqueço-me de mim

e nesse estado de ausência

sinto o alívio fantástico

de um gozo místico



Mas logo retorno

entre aliviado e fragilizado

para o desafio de mim mesmo



Quando contigo em frente

ponho-me de lado

dissolvo-me em teu olhar

e tenho uma folga

de minha mente e tensões

que me escorrem para o peito

e extremidades sensíveis



Perco-me em teu corpo

que se agita e canta meu

junto ao que eu tinha e dei-te

quando deitamos à dança

em que partilhamos essa perdição

que nos salva

por enquanto



-----------------------



A praga humana

10 de abril de 2002



De vão em vão

por pernas e lábios de moças

vou-me



Quando eu me for

não irei senão para onde estava

ou nem estava

antes de vir a existir



Mas deixarei lembranças

e descendência



E se eu não deixar

outros deixarão

pois muitas deixam



---------------



Na medida

10 de abril de 2002



Em minhas mãos

teus seios e umidade

expressam valores

que me inflam a vaidade



Em minha boca

teus lábios e acidez

temperam minha vida

em contrastes harmônicos



Em minha luxúria

teus ímpetos precipitam

meu central extremismo

em teu palpitante aconchego



Em minha vida

tua realidade e loucura

reviram meu sonho

num quotidiano encantado



-------------------



Fobias

10 de abril de 2002



Baratas e ratinhos

são mais ou menos involuntários

trocadalhos dos carilhos



O próprio caralho é uma metáfora

com o apelo de vilão

do pênis nosso de cada dia

normalmente humilde e cabisbaixo

menos que caralho ou pênis

mero pipi



Também o bigodinho a Clark Gable

hoje ridículo

não é exatamente para ser bonito

mas para arrepiar

mesmo sem encostar



Como a barata que te sobe

imaginariamente

pela perna

aquele bigodinho roça

imaginariamente

na ponta de teu nariz

e na borda de teus lábios

superior ou pélvicos



Quanto

sem bigodinho ou baratas

te arrepias toda de prazer

quando mordisco teu cangote

o arrepio é o mesmo do medo ou nojo

mas como te entregas

gozas



-----------------



Fobias II

10 de abril de 2002



Virar sapo, barata, ratinho...

não temo nada disso

nem temo causar medo



Temo é que te acostumes comigo

e não te arrepies mais ao meu toque



Temo que me não mais desejes ou odeies

apenas compreendas e aceites



E temo mesmo isso lamentar

se nem mesmo isso eu tiver



------------------

Fobias III

10 de abril de 2002



Não temo

antes aspiro

ser abocanhado

por tua aranha



Caranguejeira peluda

que esconde

molusca vulvípede

que se abre como uma flor

com um toque

um beijo

um olhar



Que pisca

em torno de minha sonda

encarnada em tuas mais profundas

carnes carnívoras

com visgo e viço

até eu me render

exausto de me entregar

à tua entrega



-------------------



Fugirei

11 de abril de 2002



Quando me convier

fugirei

esconder-me-ei

fingir-me-ei de morto

e mentirei que nunca fujo



Não darei ao inimigo

o benefício de escolher

quando o enfrentarei



Não darei ao inimigo

o benefício da certeza

da verdade de minhas palavras



Não darei ao inimigo

o benefício da certeza

sobre as aparências



Não darei ao inimigo

o benefício da posição de vilão

e a mim o ônus de ser o mocinho



Tentarei vencer de todas as formas

inclusive, se necessário,

por impasse

ou exaurindo o oponente

fazendo-o correr em meu encalço

ou baixar a guarda

por me supor covarde



Usarei golpes baixos

e reclamarei de golpes baixos

(o mais clássico dos golpes baixos)



Quando fraco

fugirei

quando forte

encurralarei

quando em equilíbrio de forças

emboscarei



Não me entregarei à covardia

de esconder-me sob a máscara do heroísmo



Por isso é que sou pacifista

pois a guerra não é para mim um fim

apenas um meio



Mas também não sou um pacifista

pois a paz não me é um fim em si tampouco



O fim sou eu mesmo e o que, amando,

identifico como extensão de mim mesmo



---------------------



Atum... Ah! Thunnus...

11 de abril de 2002



De tão pescadas

tuas espécies rareiam



Cardumes restam

com poucos peixes

todos muito jovens

muito pequenos



Quando haverá

novamente grandes?



Pobre atum...



Na cadeia alimentar

o Homo sapiens sapiens

come o Thunnus thynnus thynnus...



Mas há já perspectiva de domesticação...



Sem isso...

só a Periplaneta americana está segura



----------------------------



Hilda está só

13 de abril de 2002



Hilda está só. Entrega-se, então, ao hábito de rabiscar padrões nas linhas

de cadernos escolares. Nada de mais. Nada muito meticuloso. Por vezes

mantém-se dentro das linhas.; por vezes sai um pouco das linhas. Não vai nem

muito rápida nem muito lenta. Apenas rabisca, horas e horas, linha a linha,

página a página, caderno a caderno, caixa a caixa. As florestas que se

danem.; os catadores ou recicladores que se embebedem e arruinem Hildas,

filhos, gerações. Não que precisem de ajuda para tanto...



O monge medita

13 de abril de 2002



O monge medita. Inicialmente ainda pensa em Hilda. Depois o treinamento

vence e não pensa em nada. Fica assim por horas. Depois dorme. Viverá até os

87 anos, quando morrerá de complicações precipitadas por um câncer de

próstata. Alguns monges iniciantes e ainda incertos quanto às maravilhas da

meditação e do nada comentarão que toda aquela porra meticulosamente

preservada só podia dar nisso... mas nosso monge não pensará em nada. Sua

vida terá sido basicamente sono e meditação. Um santo. Sua morte, um sono

sem sonhos... ou uma meditação permanente.



Ana ama

13 de abril de 2002



Ana ama. Como se isso não bastasse, ama-me.



Clóvis é gay

13 de abril de 2002



Clóvis largou seu namorado imaginário para casar com uma mulher feia. Ela

ficou convencida pois Clóvis é mais convencido ainda.



Amo Catarina

13 de abril de 2002



Catarina na verdade tem outro nome. Na verdade nem é como lembro. Mas quando

a vejo, sei que a amo. Ainda bem que ela não me corresponde. Ela na verdade

pensa que me corresponde... mas não me corresponde, pois está enganada a meu

respeito.



Vinícius ama três

13 de abril de 2002



Não ama nenhuma nem três em particular. Apenas três quaisquer, trocadas ao

longo do tempo. Vinícius também é múltiplo, com duas cabeças e vários

semi-cérebros que não somam um sequer. Cheira cocaína e não come ninguém,

mas é muito viril como provedor de encrenca e soluções bizarras para

problemas que não existiam. Ele próprio não existia até nascer, como todos

nós. Portanto: tudo bem. Quando o dinheiro acabar, talvez fique

interessante.



Um pato morreu

13 de abril de 2002



Todo dia morre algum. Geralmente muito mais. Esse, convencionalmente

esperto, pensou que o possível lucro futuro compensaria o certo prazer fugaz

de torturar, mutilar e depois, bem depois, matar.



Mais de vinte invasores em minhas terras

13 de abril de 2002



Dou graças a Deus pelos mais de vinte que invadiram minhas terras.

Hospitaleiro, insisti para que as invadissem terra a dentro. Hoje fazem

parte da família, pois também minha mulher e filhos comeram da horta a parte

onde os reciclei, com o cuidado de finamente moer ossos e dentes.



-----------------------



Decepções

13 de abril de 2002



Primeiro quis amor

para nós

feliz para sempre



Depois quis ser amado

profundamente

para sempre



Depois quis ser amado

mas não demais

para sempre



Depois quis amar

profundamente

para sempre



Depois quis amar

mas não demais

para sempre



Depois apenas quis

diversas coisas

já não para sempre



Depois montes de coisas

que nem sei

se para sempre



Depois morrerei

de qualquer coisa

para sempre ou nunca mais



-------------------



Parafuso

13 de abril de 2002



Com um longo parafuso, atravesso-te lentamente os olhos de têmpora a

têmpora, fixando-te solenemente a um poste cívico. Ainda vives e mesmo

gemes, o que prova, a princípio, que o novo e espetacular método de

crucificação pode ser viável, eficaz e econômico. Espero que vivas ainda

vários dias ao suplício público para que esse método possa se tornar novo

padrão. Não! nenhum sofrimento será em vão. A nação, agradecida, maldiz-te,

frustrada apenas por não ter mais partes sensíveis ou simbólicas para

torturar ou mutilar. Mas a consciência de que ainda tens momentos de

razoável consciência é mais do que satisfatória... e educativa.



------------------



Agradecimentos

13 de abril de 2002



Agradeço à minha mãe

ao meu pai

aos meus professores

a todos esses

que me tanto ensinaram

ou não atrapalharam



Mas de todas as honras

as maiores desonras

foram os prêmios por simpatia

e as menções honrosas



Os prêmios, por favor

quero em dinheiro



O reconhecimento

em dinheiro



A imortalidade

não morrendo



----------------



Eu votei e gostei

13 de abril de 2002



Eu votei nos mesmos

e de novo gostei



Nada é perfeito

escolhe-se o melhor



Sou filho da puta

com todo o respeito

não acredito em lorotas

de mães virgens



O dinheiro da pinga

com inédito crédito

foi para a compra

de argamassa e tijolos



E a demagogia apocalíptica

milenarista, pseudo-comunistas

às custas de lorotas místicas

ainda consegue prêmios!



---------------



Atraso

13 de abril de 2002



Em tempos de lanterna

claramente publicada

ainda há quem espere vento

para colher tempestades



Também...

tais caras de popa

pegando a lanterna

em vez de reforçarem

suas poucas luzes

de certo a enfiariam

gozariam

e dir-se-iam

(pois só sabem reclamar)

enrabados



----------------



Incoerentes

13 de abril de 2002



Há quem alfabeste

indeciso ou incoerente

incluindo cá

mas esquecendo

ou censurando

ípsilon e dobrevê



----------------



Eutanásia

13 de abril de 2002



Para que complicar? Convidado de honra, o embebedamos levemente e, quando

cochila profundamente, colocamo-lhe uma máscara para que respire a mistura

especialmente pobre em oxigênio. Sem o alerta do excesso de gás carbônico,

ele nem se da conta de que sufoca, perde de vez qualquer chance de recobrar

a consciência... e dez minutos depois está irreversivelmente morto.



"Morreu dormindo" e variações tentam amenizar a dor dos correligionários.

Estava velho, octagenário, ultimamente dizia algumas bobagens

inconvenientes, mas não absurdas o bastante para serem inócuas. Dessa vez

não precisamos matar colateralmente nenhum piloto de helicóptero ou

parentes, nem tivemos o embaraço de não encontrar o corpo. Aprendemos com a

experiência... e, ironicamente, com os consultores ex-comunas...



---------------



Beleza progressiva

14 de abril de 2002



O tempo que me vai

passando-me esfarrapa

o rosto, roupas e tramas



Mas há remendos

há complementos

há suturas e laços

conjugais e corretivos



Aprendo-me vivo

aprendo-me renovado

a gozar os cansaços

as canseiras

os arrepios dos suores

do próprio rosto

que labuto

com prazer



Há quem reclame

e há certa beleza nisso

como em todo kitsch

que já foi comedido

e elegante um dia



Houve dias

em que te ouvi

e dias que te cuspi



Houve dias

que nos amamos

e dias que não



O tempo ajeitou-nos

inclusive afiando

as arestas regeneráveis



Eu te amo por mil acidentes

que não seguiram o roteiro



Se me odeias

ainda assim

agradeço



----------------



Amores pendentes

15 de abril de 2002



Meus velhos amores

não são meus

senão desejos

ou fantasias



Não foram felizes

e acalentam-me

mal lembrados



Não os esqueço

sem os ter compreendido

sem os ter bem conhecido



Não as esqueço

algumas

sem as ter comido



O que de mim

lembro superior

como tolo e infantil

releio e descubro

demasiado parecido

senão igual



Tanto que aprendi

meramente mais acumulou-se

com a mesma regra

sobre as mesmas obsessões

os mesmos vícios

em inevitáveis virtudes



O que fiz

acumulou-se

em desafio crescente

que me desfez



Todo o amor que tive

voltou como paixão

de loucas mulheres

que não suportei

corresponder



Quero ainda uma amiga

bonita, divertida e terna

que me queira um pouco

(não muito! ou disfarce...)

para um leve amor

que não rime

como os demais

com dor ou crime



----------------------



O acordo

15 de abril de 2002



Caído, bobamente contemplava meu pau decepado à minha frente, enquanto o

outro, ensangüentado por minha vergonha, um pouco adiante fantasiava

estuprar minha amada. Ela olhava-me com dó e despeito... em certa

redundância provocante, enquanto volta e meia fingia dores e desonras.



Recolhi-me a minha insignificância emasculada que nenhuma cirurgia plástica

desfigurou. A luta fora armada mas justa. Não dei queixa. Disse que foi

acidente sabendo que acreditariam que fora auto-mutilação... na verdade a

forma mais comum de castração, apesar dos temores e fantasias... ou justo

por tais temores e fantasias dos demais homens.



Muitas mulheres ainda não me só amaram como gozaram. Em minha mão, em minha

boca, em minha escultura de enxertos e prótese que simulavam másculo ou, se

eu quisesse, brocha. Mas eu continuei tão insensível quanto antes dos

abençoados corte irregular e infecções. Não há prótese para o que não falta.



O outro teve com ela suas noites de triunfo e vigor, enquanto outras,

tolamente, lambiam minhas feridas, como se eu as sentisse ou lamentasse. Mas

a monstruosidade ia além de nós três, como um nó impossível. E ele sabia

disso e conforme enfraquecia, estremecia.



O tempo passou e o desvaneceu. Drogas, dietas, esclerose e acúmulo de

traumas e culpas injustas o deixaram louco de se estrangular os testículos,

furar os olhos e passar horas tentando colocar o pau para dentro do próprio

ventre. Nos últimos dias a ajudei com sua higiene. Nos momentos de lucidez,

ele me perdoava.



Quando ele descansou, casamo-nos. Não sei se por amor ou cumplicidade no

crime perfeito: homicídio concomitante ao duplo, mas sem pressa, suicídio,

no qual vivemos felizes até hoje.



--------------------



Casal longevo

15 de abril de 2002



Lá pelas tantas

não nos mais vimos

não nos mais tocamos

não nos mais beijamos

não nos mais amamos



Entramos num ritmo

que chamam de casamento

de relações comedidas



Patrimônio

carreira

filhos



Cresceram

se multiplicaram

e perderam a importância



Quando nos encontramos

ignorados pelos demais

obsoletos para o resto

reconhecemo-nos

insuportáveis



Suportamo-nos mais um pouco

e acabamos nos gostando

mais um pouco



O suficiente

e eficiente



Até por falta de opção

e profissionalismo

consolemo-nos

até que a morte

nos reitere

desencontrados



----------------



Juncos

15 de abril de 2002



Entre os juncos que outrora

dariam o substrato das laudas

encontrei a experiência

que digitei

nostálgico

ao teclado

na página eletrônica:



No calor

sobre a balsa

teu odor

me abraça



Há tantos inconvenientes

mosquitos, caramujos, protozoários...



Mas a febre é outra

a favorecer nossos gametas



----------------



Jaculatória

16 de abril de 2002



Ela fora culta e crítica

mas após o acidente

ficou apenas linda

algo misteriosa

e com um ar poético



Continuou gostosa

talvez até mais quente



Uma vez

precipitou meu gozo

não só com o seu

tão espasmódico

mas com a ressonância

de e um resto de reflexão

que pouco antes

gemeu esquizofrênica:



Ai, meu querido

tem uma coisa

jaculatóra gostando

dentro de mim

pra fora!



----------------



Qual estado mínimo

16 de abril de 2002



Há quem se diga favorável e quem se diga contrário ao "Estado mínimo". Eu

sou liberal e digo-me favorável. Há comunas (podem achar esse termo

antiquado ou depreciativo... mas como me chamam de "neo-liberal" também de

modo ou com intenção claramente depreciativa, que agüentem) e outros que se

dizem desfavoráveis. Mas isso é dizer pouco.



A expressão "Estado mínimo" é historicamente associada aos liberais

clássicos... os quais, ao contrário do que muitos supõem, são muitos e

conflitantes em muitos aspectos. Simplificando o necessário para isso não

virar um tratado, os liberais defendiam um "baixar a bola" para o estado

mercantilista. A questão não era sobre o tamanho, embora envolvesse o

tamanho, mas sobre o foco e papel do Estado.



O estado mercantilista tomava e gerenciava as iniciativas comerciais como,

ao lado da diplomacia, forma alternativa de guerra: meio manter ou expandir

a soberania e influências. Os cidadãos ainda eram mais súditos que cidadãos,

quer como clássicas "buchas de canhão", quer como empreendedores entre

reféns e dependentes, quando não parasitas, do Estado. O liberalismo foi a

discussão sobre as vantagens e desvantagens de dirigir mais ou menos essas

iniciativas. "O mínimo", curiosamente, não determina um muito ou pouco, mas

um não demais nem de menos, mas como a direção centralizada era então

relativamente excessiva e relativamente contraproducente, passou à história

e discursos demagógicos antiliberais e liberais utópicos como proposta de

sistemático encolhimento da intervenção estatal.



A experiência mostra, entretanto, que para controlar o Estado e as tribos ou

panelas que se fortalecem ou formam dentro de Estados e federações mais ou

menos formais, infra ou intra estatais (máfias, cartéis, sindicatos...) é

necessário fortalecer o Estado. Como caso clássico, o poder de polícia -

administrativa, judiciária ou mesmo militar, com cacetete, espada,

fuzil... - de um Estado nação precisa ele próprio de policiamento. E isso

explicita que a estrutura estatal é ela própria um dos grupos interessados

que precisa ser regulado... pelo Estado?



Numa vertente mais viciosa, poder-se-ia chegar ao cúmulo de uma fiscalização

do poder de fiscalização do poder de fiscalização... do estado. Com quantas

redundâncias quanto se queira ou consiga pagar. Numa vertente mais virtuosa,

haveria relativo equilíbrio e harmonia de poderes complementares (os

clássicos legislativo, judiciário e executivo somados a variações como nosso

ministério público e entidades mais ou menos organizadas como ONGs, partidos

políticos, imprensa, lideranças religiosas e culturais diversas).



A natureza, o mundo e a história são liberais no sentido pejorativo do

termo. Vale tudo o que vence, ainda que por pouco tempo. Os extremistas

(reacionários, progressistas...) eventualmente trazem avanços e benefícios.

Não dá, de antemão, para saber o que vai dar mais ou menos certo. E sucessos

de séculos podem depois serem revisados como atraso, estagnação ou lenta

marcha para o precipício, assim como fracassos fulminantes podem ser

apontados como momentos de glória excepcional, atacada por todos os lados...

Na tribuna liberal da história, o mercado da demagogia ou elitismo é que faz

suas apostas e, assim, atribui maior ou menor valor. Se isso se dá mediante

democracia direta e linchamentos, deputados e corrupção, tirania esclarecida

ou sanguinária... varia. Tudo é diplomacia, logo: guerra por outros meios

(inclusive as guerras, que nunca são "puras"... sempre envolvem adjetivos).



Agora, se os governos "de oposição", de esquerda absoluta, não relativa a

uma direita concreta, resolvem-se fazer de mínimos quando se trata de

impedir invasões de terras, resta aos desassistidos organizarem-se para

defender seus direitos constitucionais. E aí surge um paradoxo: as polícias

são profissionais e podem contar com grandes e especializadas tropas capazes

de dissuadir multidões na base da porrada ou mera conversa com os porretes à

vista. Os proprietários particulares ou seus contratados, encurralados em

menor número, podem não ter o sangue frio ou efetivos suficientes para

enfrentar invasores à base do corpo a corpo, foice contra escudo e porrete.

Por mim, que entrem em pânico e matem todos os sem terra... mas o estado

deveria proteger os proprietários contra os sem terra e os sem terra contra

seus líderes ou relativa incapacidade.



Exceto se querem mártires para justificar mais violências contra os

proprietários que não sejam do partido, cujas propriedades não tenham sido

distribuídas pelo partido. É um investimento que já saiu pela culatra outras

vezes. O estado mínimo não deve ser reduzido a um partido ou à multidão...

mas se quiserem apostar, a estupidez política é lícita. Por exemplo, o

programa eleitoral do PT em torno de lamentável jogo com "nós" e "eles"

parece ser legal... embora pareça-me um corvo que irá comer os olhos de quem

o está criando. Mais uma vez, por mim, tudo bem...



-----------------



Humanidade

17 de abril de 2002



Somo-nos interessantes

não por sermos bons

mas por sermos humanos



Somo-nos bons

não por bonzinhos

mas por complexos



Se fossemos bons

no vulgar sentido

seríamos bonzinhos



Se fossemos bonzinhos

nem teríamos sobrevivido

nem seríamos admiráveis



Se fossemos bons

indiscriminadamente

não o seríamos para nós



Nem nada

para nada



Bom demais

é ruim demais



----------------



O belo da vida

18 de abril de 2002



Na vida

o belo

é a vida



A dor

a cor

o amor

são rimas



Nessa linha

o belo

e o belum

são bélicos



A guerra é bela

e a beleza é bélica...



Conclusões poéticas...



Idiossincrasias disfarçadas

em fatalidades impessoais...



Aliás

idiossincrasias são

mesmo

fatalidades impessoais

insanas ou não



-------------



Compaixão

18 de abril de 2002



Todos deveriam cometer

ou pelo menos planejar

e antegozar

crimes hediondos

sangrentos

covardes

frios

perversos



Sem isso

não temos compaixão

nem pelo próximo

nem por nós mesmos

que não somos santos

como alguns deliramos...



-------------------



Pau, cu, xota e outras metáforas

18 de abril de 2002



Cu e xota



Nunca vi meu cu

nem quero ver



Noto que para algumas mulheres

suas xotas são algo assim

como meu cu para mim

algo indispensável mas constrangedor

e que, constrangido, não funciona...



Pau e xota



Com meu pau

dou-me bem

com muito prazer



É bonito

limpo

e prático



(e é limpo por que é prático...

bonito por me dar prazer)



Diante da xota

de uma mulher amada

não tenho nojo



Acho-as

como as provo

saborosas, bonitas

ternas e cheirosas



Mas as mulheres

parecem ter nojo ou horror

das alheias e próprias



Com alguma razão

que entendo

quando não estou encantado

pela portadora

de uma com a qual

estupro-me



Como traduzir "útero"



Como traduzir

para o universo masculino

a expressão

"isso tocou-me profundamente

lá no útero..."



Penso que haveria homofóbicos

problemas em dizer

"isso tocou-me profundamente

lá na próstata..."



Séculos passaram

até que "útero"

perdesse ou tivesse atenuadas

certa conotação misógina

como em "histeria"

no sentido original



E "próstata"

lembra antes câncer

que orgasmo...



E orgasmo pela próstata

soa como algo pior que a morte

para não poucos...



----------------



Poetas e revoluções

18 de abril de 2002



Venham os poetas bradando

suas rimas ou outros truques

engajados contra algo ruim

em favor de algo não melhor

com métodos equivalentes



Venha um poeta alto

para uma mina encurtar

pouco abaixo do joelho

de ambas as pernas



Venha outro

de pau grande

para outra mina

fazê-lo vir a dedicar

nostálgico

a poesia erótica



Venha mais um

perdido

encontrar uma bala

que o corresponda



Venha mais outro

sofisticado

cair numa emboscada

para ser torturado

de modo sofisticado

até uma longa sobrevida

pior que a morte



Venha um poeta braçal

para que machados

o façam se reinventar

ou desistir



Fome

diarréia

artilharia



Que a guerra inspire os poetas

e os poetas embalem os infantes

infames ou infantis

para as guerras morrinhas

de gente pobre contra gente pobre

lutando por burocratas

de partidos comunistas

ou fundos de pensão capitalistas



Morram mais como azarados

que qual heróis

como se cantarão

os que morrerem só depois

que os primeiros

que os segundos...

que os milhonésimos



Morram devagar

aos poucos...



Ou sobrevivam

para cantar a glória

de suas misérias



Ou para inspirar

o canto panegírico de uns



Ou o meu

apenas justo



Mas

como todos

parcial



E não me venham atacar

que lhes enfio a caneta nos olhos

ou quebro-lhes as cabeças com o teclado



Pois a mão humana não é para bater

é para pegar algo com o que bater



Ou acariciar



Quem me trata

escolhe e colhe

como trata



----------------



Toques e cutucões

18 de abril de 2002



O que me toca

mais fundo

por vezes

é o mais suave

ou superficial



Um olhar

maroto

numa foto

antiga

de criatura que só conheci

velha ou amarga

já me tocou

mais

que beijos

de jovens

doces



Resmungos

amargos ou duros

de bem criadas jovens

já me cutucaram mais

que gritos ou gemidos

da agonia terminal

de velhas bem gastas



Frases engasgadas

já me doeram mais

que queixas plenas

de rancor ou raiva



Toques já me cutucaram mais

que cutucões

como cutucões já me tocaram mais

que toques



Dores me tocaram ternamente

como carinhos ofenderam

ofensas honraram

e golpes confortaram



Para um apanhar

é necessário outro para bater

e um não querer ou poder brigar



Para gozar

é preciso se entregar

mesmo que para ninguém



Ninguém:

metáfora confortável,

neutra ou pavorosa

de cada um para si

intimamente



-------------



O melhor general

18 de abril de 2002



O melhor general

é calmo, gentil, amoroso

pois de tão cruel

sanguinário e violento

não o precisa mais ser

como é



Alguns ótimos

não precisam

parecer o que são

pois outros

já padeceram



--------------



Separações e soluções

18 de abril de 2002



Mergulho-me no mar

salgado das lágrimas

anteriores aos portugueses

a Fernando Pessoa

e suas epopéias

quase críticas



Dissolvo-me iônico

contraditório

ambivalente



Um pouco mais de sal

e mesmo ainda ativos

ácidos e bases

nas águas da história

que passam

comigo

que passo



Antes

mais fundo

mais elementar



Um gosto

salgado visceral

de estar vivo



Quase isotônico

com meus sangue

suor e lágrimas



Não somos poucos

não devemos demais

não somos o sal da terra

e nossa lágrimas...

são uma gota nos oceanos



Mas uma única pessoa

pode ser mais que tudo isso

para mim ou muitos



Posso ser eu mesmo

para mim ou para ti

Podes ser tu

para ti ou para mim



Melhor, talvez,

se o fôssemos

enquanto podemos

uns para os outros



Mas não podemos

nem queremos



Queremo-nos

um ao outro

o que é bem diverso



Somos salgados

como o mar

eventualmente amargos

como venenos

ou doces

como outros venenos



Vitais ou fatais

conforme a dose

ou a condição

de cada um

num dado instante

ou companhia



Quem amei

ainda amo



Mesmo que também odeie

ou que me também odeie



Mesmo que ternas

ou gostosa de mil outras maneiras

ácidas, doces ou agridoces

façam-me precisar

sentir nojo

para não apenas ter

mas recair

numa saudade

e mais tormentos



E as perdas concretas

objetivamente irreversíveis

por desencontros ou morte

dão-me as heroínas privadas

da epopéia afetiva

perfeitas por incapazes

de sequer se desmentirem



As soluções

após os soluços

podem e costumam

ser piores

que os problemas



Mas como saber

se não resolvemos?



E o fim inevitável

é a solução final

que até pode aliviar

mas não melhora



Pois acabar

(um amor, uma história, uma vida...)

não é melhorar



Mas acabar é inevitável

de modo precipitado ou caduco...



E esse poema não é uma exceção

Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui