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Cronicas-->NO ELEVADOR -- 21/03/2002 - 23:51 (Marco Aurélio Bocaccio Piscitelli) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
NO ELEVADOR



Parece um dia como qualquer outro. Aquele das pessoas que vivem na chamada urbe. Horário para despertar, horário para sair, falta de tempo para tudo, tudo fora de horário.

Chega o elevador. O morador prepara-se para entrar no plano dos passantes, dos veículos, das árvores. Depois será uma sucessão de semáforos, buracos, obras, rampas, escadas, até chegar ao ponto. Talvez, ainda, a caminho do trabalho, pedras "no meio do caminho". Nesse sobe-desce da vida, da bolsa, do elevador, os planos são patamares que ressituam vontades, desejos, posições, destinos. O elevador não é panoràmico. O pensamento todo lá fora; a atenção, ali, dentro. A porta do fosso, ou melhor, do andar fecha; a do elevador encarcera os corpos. Uma pequena descida e ele pára. As luzes mantêm-se acesas. A janelinha gradeada mostra tudo: parede, cimento, laje pura. Essas engenhocas costumam enguiçar sempre no desnível, onde a porta não abre, que não adianta abrir para um paredão imóvel.

O ocupante empalidece, tem um curto-circuito mental. Leva tempo para dar-se conta do casal em pànico, o qual também não nota o morador já convalescido.

Lá fora, o tempo segue o seu ritmo implacável. No contêiner, acumula-se, as pessoas envelhecem antes dele. O ar continua a entrar porque as aberturas não deixam de existir. Mas é como se fosse preciso ir ao encontro dele. Resiste a penetrar nos pulmões, a produzir atmosfera de O2. A energia para aguentar o tranco de um elevador trancado vai ficando rarefeita. Se faltar a elétrica, os três podem ficar sem nenhuma.

"Capacidade licenciada: 420 Kg ou 6 pessoas de 70 Kg", a única leitura disponível. Nada mais para enlevar o espírito ou reduzir a tensão de nervos. Traçar planos...que planos? se só há um fixo. Os cabos de sustentação - três - o morador havia contado num dia de manutenção. Estava seguro de que a máquina operava com redundància. Segundo o técnico da empresa, um já era suficiente para suportar o peso dos presos.

Naquela última instància do existir, a circunstància com que os hereges não contam para se converter bate à porta. Tudo ali se investe de plenos poderes: passos, conversas, um som distante, o aspirador de pó em uso. De repente, as partes envolvidas no litígio abandonam o silêncio e instauram um momento de descoberta. Acionam o alarme. Tantos o tocam, que mais parece cabeça de santo em lugar de peregrinação religiosa. Às vezes, para buzinar, outras para brincar de simular acidente e outras, ainda, até por engano. O som, que já é fraco, mais serve para consumo interno. É mais fácil escutar as pessoas lá fora xingando a demora do elevador, recorrendo à escada de incêndio, do que alguém tratando de estabelecer o nexo causal com a ocorrência.

A estadia inusitada num espaço tão pequeno ia degelando a contrição permanente de condóminos em dias rotineiros. Pouco a pouco, a clausura do acaso abre portas para confissões íntimas e planos de fuga solidários.

O dia radiante, a vida sintomática das ruas incitam a recomeçar a jornada interrompida. Meio-dia. Se a tarde for inteira, o dia está ganho. O par se apressa para retomar as pendências do dia anterior com os acréscimos do mal-começado. O morador, aturdido, desnorteado, parece não encontrar a saída da imobilidade.

- O senhor quer uma carona? - sugere a mulher. - Para onde está indo?

- Não, obrigado. Acho que vou almoçar e tirar uma sesta.

- Nós ainda estamos com o café da manhã na garganta.

- Pois o meu virou água de transpiração. Não vou arriscar nas águas que podem rolar até o final do dia.

- Não imagina como nos ajudou a aliviar a aflição desta manhã.

- Verdade? E vocês também não sabem como me ajudaram a manter o controle emocional. Nem tudo foi tão monótono assim. Éramos vizinhos e nem suspeitávamos do fato. Quantas vezes não nos cruzamos durante o funcionamento normal do elevador?
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