----- Entrecruzado de melopeias nostálgicas ao correr dos suores trágicos da vida, terá tido como origem prática as meretrizes das vielas lisboetas que, nas tascas de Alfama, da Mouraria e da Graça, inicialmente sob velhos e desafinados pianos e mais tarde entre os acordes plangentes da inventada Guitarra Portuguesa, jogavam chalaças e promessas libidinosas aos vadios desordeiros da Lisboa oitocentista. Apenas e em rigoroso ré, que era o tom exclusivamente admitido, as empregadas de mesa de então fadavam e enfadavam os faias vertidos para tais lides: tomava pois corpo e alma deveras o Fado, inigualavelmente retratado na tela mágica de Malhoa, delirante de alfobre severino e vimiosamente pincelado. Mais de meio século demorou o pintor a dar o paladar das suas tintas aos olhos da "bela vida" portuguesa, como se ressuscitasse de um mundo integral os cegos astutos e inversores que presumiam viver de olhos abertos. Nesse desfio, o entretecimento da função fabricou a fogo lento em seu ventre aquela que viria a encimar o ponto limite da escala fadista e enfim definitivamente coroá-la: Amália e até ela, quiçá após ela, tudo e mais nada!