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cronicas-->FraseANDO -- 14/05/2000 - 14:54 (Ricardo Borges) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Algumas frases me fazem viajar no tempo, revisitar momentos esquecidos, quartos abandonados de minha vida. Volto a ser o que fui, o que deixei de ser. São frases que ouço, que leio. Frases de músicas, de livros, de conversas; frases soltas, quase absurdas, colhidas ao acaso. Frases que parecem ter algum poder mágico sobre mim.
"Vem buscar o dinheiro...", ouvi alguém falando ao telefone, no orelhão público. Logo me lembrei das histórias que meu tio íris contava quando eu passava as férias da escola na casa dele. A casa ficava num sítio afastado, com muitas árvores e bichos. Eu me sentia o próprio Pedrinho, do Sítio do Pica-pau Amarelo. Uma dessas histórias me fazia tremer de medo: uma vez, quando andava por um caminho no mato, meu tio teria ouvido uma voz chamá-lo. "íris, tem um tesouro enterrado aqui. Você vai ficar rico, vem buscar!" Era uma alma penada de um velho avarento que, em vida, enterrava dinheiro e objetos valiosos. Só conseguiria se libertar quando alguém pegasse o tesouro. "Não preciso do teu dinheiro. Volta pro teu lugar e descansa em paz!", teria respondido meu tio, dando as costas para a tal alma penada. Eu ficava imaginando que meu tio era o homem mais corajoso e honesto do mundo. Meus primos diziam que também já tinham ouvido a voz, só pra me assustar ainda mais. A escuridão sempre me provocou pànico.
Essas associações mentais despertam os monstros adormecidos em algum lugar de nosso inconsciente. "Ouviram do Ipiranga às margens plácidas..." Vejo-me na fila do pátio da escola, cantando o hino nacional sob um sol inclemente. A professora já tinha avisado na sala de aula: quem cantasse errado teria que escrever várias vezes a letra, até aprender. Quando chegava na parte do "Ó pátria amada, idolatrada, salve, salve..." meu coração batia mais rápido. Não por ufanismo, mas por medo de confundir os trechos do hino - como até hoje confundo.
E quase todos os ditados populares me fazem lembrar a minha mãe. Ela é mestre em ditados. Tem um pra cada ocasião. Alguns eu nunca consegui entender completamente: "Pelo santo se beija o altar", "Quem puxa aos seus não degenera", "Quem tem besta não compra cavalo". Só há pouco tempo descobri o significado desta última frase, depois de sentir na pele; ou melhor, no lombo. Essa pérola filosófica não me deixa esquecer o meu trabalho e esse governo, que há muito tempo não precisa de cavalo.
Algumas frases são traiçoeiras. Elas tomam conta de nós, feito um vírus. Hoje passei o dia pensando em algo banal que ouvi na rua, depois de trombar com um desconhecido. "Olha pra frente". Fiquei atordoado, pedi desculpas e remoí a frase, tentando degluti-la por horas. Cheguei à conclusão de que preciso mesmo "olhar pra frente", ser menos saudosista, dar as costas ao fantasma e seu tesouro de velhas moedas. Que fiquem pra trás as frases incompletas, as frases-feitas e os mal-entendidos. Sigo em frente e que Drummond me acompanhe. Amém!

Ricardo Borges
lucionogeno@bol.com.br
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