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Artigos-->Unificação da língua: brincadeira e perfumaria -- 01/02/2008 - 16:31 (Jefferson Cassiano) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Pode-se reformar uma casa. Pode-se reformar uma peça de roupa. Pode-se, há quem acredite, reformar um homem. Mas será possível reformar uma língua? A proposta de unificação da língua oficial dos países lusófonos indica que, ao menos para alguns acadêmicos e políticos, a reforma é não só possível como necessária.

A casa, a roupa e o homem são reformados quando estão em mau estado, rotos ou defeituosos. O uso compromete a qualidade ideal de paredes, de tecidos e de personalidades. Entram em ação, então, os decoradores, as modistas e os cônjuges para remodelar ambientes, vestidos e companheiros, seguindo uma subjetividade, um gosto bem pessoal.

A língua é um fenômeno social que também passa diariamente pela prova do uso. Aliás, para haver língua é preciso que se faça uso dela. Mas usar a língua, ao contrário de desgastá-la, quebrá-la ou sujá-la, apenas a enriquece. Diferente do sapato velho que pede meia-sola, a língua sequer envelhece. Línguas morrem, fechadas em si mesmas, se não forem usadas. Não há notícia, porém, de línguas velhas pedindo remendos.

Sob essa ótica, a língua não pode ser reformada por vontade de uma pessoa ou de um grupo pequeno de pessoas. Ao mesmo tempo, toda língua contém um mecanismo de auto-reforma permanente que é exatamente o que a mantém viva. Quando esse mecanismo falha, é que a língua morre. Quem coordena o processo de reciclagem da língua não é a academia nem a câmara, mas os verdadeiros donos da língua-viva: a coletividade de usuários dessa língua. No caso do idioma português, eu, você e mais 250 milhões de pessoas no mundo.

Ainda assim, as reformas oficiais das línguas são um fato. O Brasil passou por duas em menos de quarenta anos. A primeira aconteceu em 1943 e foi responsável pela sintonização da ortografia brasileira com a de Portugal. Estavam oficialmente banidos os exageros etimológicos como “pharmacia”. A outra, em 1971, entre várias medidas, eliminou acentos diferenciais, como o que era usado no pronome “êle” ou no substantivo “côr”, além de banir o acento obrigatório de palavras terminadas em certos sufixos, como “sómente". Agora, estamos à beira de mais um pacote de mudanças motivadas por uma antiga pretensão de unificação ortográfica global do idioma português.

As reformas devem ser vistas como acontecimentos normais na história de uma língua. Ainda que, em princípio, uma reforma lingüística decretada seja impossível, os interesses oficiais são sempre uma força a ser considerada na contínua formação de um idioma. O fato de que as alterações de gabinete mexam sempre e apenas na relação ortografia-fonética, ou na maneira de escrever e pronunciar as palavras, mostra que esse é o máximo de interferência que os auto-declarados “donos da cultura” conseguem produzir. Caem os acentos, muda a grafia disto ou daquilo, reescrevem-se os manuais, e as ruas continuam falando e escrevendo como bem entendem e fazendo a verdadeira revolução. A língua sempre foi duas: uma de cartório e outra de carteado.

Enfim, se sou contra o acordo de unificação da língua portuguesa ou a favor dele? Nem contra, nem a favor, muito pelo contrário. Para começar e terminar, não haverá unificação alguma. “Fila” continuará sendo “bicha” em Portugal e “bicha” continuará sendo um disfemismo noBrasil. Se é divertido para alguns brincar de mudar regras de acentuação, de demitir o trema que ninguém emprega há tempo, de incluir letras que na prática nunca haviam saído do alfabeto (k, y e w são novidade para alguém?), muito bom para eles. Que brinquem o quanto quiserem! Caso a reedição de livros e apostilas gere mais empregos, será ótimo. Enquanto isso, nós continuamos a usar a língua como quisermos, onde quisermos e o quanto quisermos. Ao fim e ao cabo, a reforma da casa da língua portuguesa, com certeza, está mais para um arrastar de móveis com direito, vá lá!, a uns novos bibelôs sobre a mesinha de centro. Perfumaria.

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