É, de fato, curioso observar o quanto as trajetórias dos compositores são tão diversificadas; falo sob o ponto de vista do processo criativo. Há uma tendência geral em admirar com todo o fervor a carreira de um Bruckner, onde, após anos de tentativas, o sucesso fora atingido apenas à altura dos 40 anos, aos trancos e barrancos. O velho mestre é o exemplo do tipo do compositor cuja evolução é progressiva. Mozart e Schubert compartilham do mesmo destino de carreira, sendo que as suas vidas encurtadas nos dá a impressão de que eles tinham muito mais a oferecer. Sebastian Bach e Beethoven são diferentes. A sensação que nos dá o corpo de obras desses mestres é de uma absoluta perfeição em termos de desenvolvimento e versatilidade. Bach e Beethoven possuem fases de progressos distintas e chegam ao final da vida com uma coleção de invenções completas, ou seja, quando morreram, eles já haviam dito tudo que tinham de dizer. Mozart, não. No limiar de sua morte restou uma promessa de algo mais.
Vejamos, por exemplo, o caso de Stravinsky e Vivaldi. Stravinsky consegue mostrar em seus primeiros balés uma linguagem genuinamente nova, entretanto sua carreira, na maturidade, se perde na busca frenética de sintetizar linguagens do passado. Seus métodos versáteis na maturidade já não atingem o mesmo sucesso dos balés iniciais. Isso nos dá uma certa sensação de que Stravinsky se perdeu.
Vivaldi apresenta um quadro menos criativo. Sua linguagem no L’Estro Armonico opus 3 é, de fato, algo estimulante, original. Criou um reboliço em toda a Europa.
Estabeleceu esta brilhante linguagem aos 34 anos. Muitos anos depois, já com seus 47 anos, escreveu as famosas Quatro Estações, que não apresenta nenhuma novidade técnica. O que eu quero dizer é que Vivaldi não disse nada de novo além do L’Estro Armonico. Vivaldi não evoluiu. Escreveu, de fato, o mesmo concerto dezenas de vezes. Por este motivo não é um gênio no sentido de Bach, pode ter criado um universo novo, mas não foi além. Bach foi.
Essa coisa do artista começar com uma linha e evoluir para algo superior nos faz lembrar da evolução linguística de um Piet Mondrian, que passou paulatinamente da representação pictórica distorcida para o gênero abstrato geométrico.
Acho que o artista mais completo é aquele que possui uma evolução técnica contínua em sua carreira e consegue aperfeiçoar ao máximo sua versatilidade sem perder as estruturas básicas ou a essência, que desde o começo, servia de padrão para a sua forma de se expressar e sentir o mundo.