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Contos-->CADE AS VIOLETAS -- 06/07/2002 - 11:55 (guido carlos piva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Sonhei que morri... Pelo que percebi morri de repente! Em prin-cípio a minha sensação foi de espanto! Como nuvem leve, flutuan-do pelo espaço fui parar à frente da porta do céu. Melhor assim, quando em vida sempre ouvira dizer que, após a morte, o céu seria o melhor lugar para se ir!
O local estava apinhado de defuntos “frescos”! Quando me dei conta, estava em meio ao empurra-empurra formado pela turma dos desprevenidos como eu! Que sufoco! Quase desisti! Deu-me vontade de ressuscitar! Todos, apavorados, tentavam a qualquer custo entrar no tal de Paraíso. Um anjo loiro, de barbas e cabelos encaracolados, junto à porta, tentava organizar a balbúrdia:
— FAÇAM FILA! Ninguém ultrapassa esta porta sem que antes eu possa analisar e vasculhar as bagagens contidas em cada cora-ção!
Bagagens do coração!? Quando ouvi o que aquele anjo dizia quase morro outra vez... De susto! Como ele poderia saber o que havia dentro do meu coração!? Com certeza ele estaria blefando! Fiquei apreensivo.
A cada triagem feita o autoritário e forte anjo, permitia ou não a entrada das pessoas mortas que se acotovelavam a sua frente! Os barrados eram sumariamente postos em outras filas. Uma, onde dois brutos diabões, de chifres e olhos vermelhos, carimbavam a palavra “INFERNO” em todas as testas. Outra, de menor tamanho, em que as pessoas iam sendo dirigidas a um ônibus com destino a um local chamado ”CALDEIRÃO BRANDO”, via “PURGATÓRIO”.
Passei a suar frio! A cena, além de vexatória, era amedrontado-ra! Em vida estive muito ocupado para ter tempo em poder me preocupar com essas bobagens que diziam sobre céu e inferno. Nunca imaginei ter que passar por essa amarga experiência; ao menos tão cedo! Entretanto, naquele momento passei a compre-ender que nada podia fazer para evitar àquela tamanha humilha-ção? Fiquei aflito. Percebi: o anjo não estava blefando!
Pensamentos começaram se embaralhar em minha cabeça, que-ria me livrar daquela incômoda situação o mais rápido possível. Procurava encontrar uma maneira de tentar me desvencilhar da-quele problema a todo custo. Mas era inútil, por mais que tentasse não conseguia encontrar uma saída!
Pensei em procurar um telefone celular... Ligar para o Dr. Alen-car, um deputado amigo meu de grande influência junto aos meios políticos. Ele, com toda certeza, iria me livrar de todo aquele sufo-co. Aí sim, queria ver aquele Anjo barbudo ter que engolir toda à-quela sua prepotência! Ele iria ver com quem estava falando! Foi quando, mais uma vez, a voz forte do anjo explodiu no ar:
— HEI!... VOCÊ AÍ! Você mesmo que está pensando em encon-trar um celular! Pare de pensar o impossível! Aqui não existe tele-fone! Aqui nada se pode fazer sem que eu perceba! Nem pensar! Pode parar! Se você tiver um pouquinho só de paciência, logo logo poderá falar com seu amigo deputado pessoalmente. O tal de Alen-car ainda hoje estará nessa mesma fila lhe fazendo companhia!
Tremi de raiva! Estarreci-me diante daquela nua realidade. Eu, homem importante; sempre rodeado por amigos influentes da so-ciedade, bajulado por todos, devidamente reconhecido como dou-tor em assuntos gerais; ser, sem a menor cerimônia, humilhado, achincalhado, impedido até de pensar!... E o pior: por um anjo des-conhecido! Com quem ele poderia imaginar que estivesse falando? Com um qualquer? Com alguém de sua laia? Pensei em retrucar! Queria falar com o seu patrão. Queria ver aquele anjo se ajoelhan-do aos meus pés, implorando o seu emprego de porteiro de volta! Juro! Pensei! Ou melhor, tentei pensar... Outra vez, a sua voz irri-tante encheu o ar cortando os meus pensamentos:
— Pare de pensar o absurdo! Espere chegar a sua vez! Não fique imaginando o impossível! Aqui, a lei é a realidade dos valores invi-síveis aos olhos insensíveis do mundo!
Morri de raiva, ou melhor, “remorri”!... Morto já estava! Sem mais nada poder fazer, revoltado, resolvi seguir o seu conselho: fi-quei desolado aguardando a minha vez! Quieto... Muito quieto! Irremediavelmente só e morto!

Na fila havia gente de todos os tipos: velhos; jovens, mulheres, todos se impacientavam aguardando a devida permissão para po-der entrar no céu! Pelo que percebia, somente as crianças; passa-rinhos, cachorros e borboletas, entravam sem ser molestados por aquele anjo que, incrivelmente, havia descoberto o que pensei!... O QUÊ!... Descoberto o que pensei?! Opa!... COMO?! Como ele poderia ter feito isso? Como?! Foi aí... Exatamente nesse meu desespera-dor momento que passei a compreender: a minha situação era real e extremamente delicada! Compreendi: até a minha liberdade de pensar estava sendo vetada por aquele anjo cabeludo! E o muito pior, ele não estava para brincadeiras!
Imaginem! Eu, morto; sem amigo, sem telefone, sem o meu ad-vogado, sem poder sequer pensar! Sem ao menos encontrar al-guém conhecido! Estava inevitavelmente só e abandonado! Bom... A bem da verdade, para não dizer que não havia visto ninguém co-nhecido, enquanto ouvia o anjo falar, eu notei, de relance, o seu Benício, um velho vizinho meu que há muito havia falecido. Lem-brei-me dele, era uma pessoa muito boa. Quando vivo, passava os dias regando e tratando das flores de seu jardim bem à frente da janela de meu quarto! Quando nos vimos, ele apenas sorriu, e sor-rindo, fez-me um aceno e tranqüilo entrou pela porta do céu carregando um ramalhete de violetas.
Sem encontrar mais nenhuma outra solução para resolver a mi-nha desesperada situação, tentei me acalmar. Passei a prestar a-tenção na maneira pela qual os outros desprevenidos, como eu, es-tavam se comportando na fila.
Um homem, aos berros, gesticulando nervosamente, insistia em querer voltar a viver. Jurava, sem a sua presença a “sua” empresa estaria em maus lençóis! Jamais poderia deixá-la sob a tutela de estranhos, sobretudo nas mãos de seu cunhado: um aproveitador irresponsável! Contudo, por mais que argumentasse, ninguém ou-via os seus apelos!
Uma mulher, tentava subornar — claro, somente com palavras: ali não existia dinheiro! — a quem conseguisse levá-la de volta a sua casa. Aflita, dizia que seus filhos e o seu marido deveriam es-tar muito preocupados com a sua demora, visto que, junto com o seu amante, havia sido atropelada por um caminhão de lixo em uma avenida movimentada! Gritava! Ninguém lhe dava a mínima atenção!
Outro homem, dizendo-se religioso, exigia privilégios para a sua pronta e “merecida” entrada no céu! Argumentava: quando em vi-da, tinha adquirido um pedacinho daquele céu! Sua fala era em vão!
Avaros reclamavam pela falta dos seus “dinheiros!” Donos da verdade tentavam explicar os motivos que os levaram a não ter pedido perdão a todos que haviam magoado! Perdiam tempo! Suas explicações não eram sequer ouvidas!
Em meio a esse mar de lamúrias fui me conformando; aceitando e aprendendo a realidade presa e escondida dentro deste espaço de tempo que chamamos vida! Passei a entender, os valores que sempre tive como imprescindíveis a ela: orgulho; fama, dinheiro, poder, tinham ido por terra, ou melhor, por céu abaixo! Compreen-di, naquela hora, tudo o que eu pudesse tentar fazer não iria mu-dar o veredicto do anjo! Estava só e à mercê de um julgamento cu-ja ré seria minhas próprias atitudes do passado! Quando assim conscientizei-me, ouvi a voz do Anjo pedindo para que eu me apro-ximasse...

Com o olhar frio, mediu-me dos pés à cabeça! Colocou a sua mão na altura do meu coração... E, após um breve e angustioso momento, em atitude de reprovação, balançou a sua cabeça loira... Fez um muxoxo... E disse com voz firme e forte:
— Xi! A sua situação perante este céu é “complicada”, não posso decidir sozinho. Vou ter que falar com o ”Chefe”... Sei lá, talvez um “purgatoriozinho”... Não sei!...
“BIP!... BIP!... BIP!... Era o meu celular que tocava! Acordei as-sustado. O seu som me salvou do cruciante julgamento! Ufa!... que alívio! Era um sonho! Sonolento, atendi...”:
— Alô...
— Alô!... Aqui é do gabinete do seu amigo, o deputado Alencar. Infelizmente ele faleceu esta madrugada! O seu corpo será velado na Assembléia...?!?! _ Não quis ouvir mais nada!
Atordoado pela notícia, lembrei-me das palavras proféticas do Anjo:... “O tal de Alencar ainda hoje estará nessa mesma fila lhe fazendo companhia!” Petrifiquei-me! Seria coincidência ou ainda continuava sonhando?!
Levantei-me sobressaltado, corri à janela a fim de me certificar de estar mesmo acordado! Queria tomar um pouco de ar, recom-por-me do sonho ou pesadelo que acabara de ter.
Ao olhar à rua, avistei a casa abandonada de meu vizinho Bení-cio! A terra do seu jardim dava mostras que havia sido recente-mente revolvida, e... PASMEM! As violetas que até o dia anterior, ali estavam plantadas, naquela manhã não existiam mais! Assus-tado, sem dar-me conta que continuava completamente só, olhei para o céu... E sem saber a quem... Gritei:
— “CADÊ AS VIOLETAS?!”

O que sobrou da história:

“HÁ SONHOS, ENTRE SONHOS, SEM PORQUÊ E SEM RAZÃO! OUTROS FAZ PENSARMOS... SE É SONHO OU INTUIÇÃO?!”

GUIDO CARLOS PIVA
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