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Contos-->ALÉM DA IMAGINAÇÃO -- 07/07/2002 - 18:22 (guido carlos piva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Tratando-se de dinheiro a situação estava feia. Muito feia! Tanto que se comentava à boca pequena: ela estava mais pra bicho papão do que pra anjo bom! Assim estava para todos, assim estava, como sempre esteve, para Jacinto Ilusão, homem de vida simples, porém com sonhos que iam além, muito além de sua fértil imaginação!
Jacinto trabalhava como porteiro de uma conces-sionária italiana de automóveis importados. Apesar de sua minguada e real remuneração mensal, e com ela, sei lá como, sustentar sua mulher e quatro filhos, pos-suía sonhos. Muitos sonhos! Dentre eles, um sonho maior: possuir o seu próprio carro. Não se importava qual o modelo, marca ou ano de fabricação, contudo, o seu sonho era colorido: fosse como fosse, o “seu” au-tomóvel teria que ser vermelho. Exatamente igual à cor dos tantos que embevecido, costumeira e diariamente admirava em vê-los passar a sua frente pela portaria em qual trabalhava.
Trabalho e sonho, sonho e trabalho, assim se re-sumiam os dias da rotineira e monótona vida de Jacinto Ilusão. Nenhum novo acontecimento sobrevinha ao seu modesto cotidiano que lhe pudesse trazer uma mera expectativa de poder concretizar o seu tão almejado sonho. Porém, ele sonhava, nunca deixara de sonhar. Algo em sua fantasiosa e colorida imaginação lhe dava a certeza que iria conseguir alcançar esta sua obstinada aspiração!
Até que, num final de tarde, após ter completado a sua cansativa e rotineira jornada de trabalho, Jacinto, enquanto aguardava sua condução que o levaria de volta a sua casa, absorto em sua habitual fantasia, admi-rava os automóveis que passavam a sua frente pela pis-ta de rolamento. A cada carro vermelho Jacinto suspi-rava, sonhava, deliciava-se com sua fértil imaginação. Quando num repente, vinda do nada, uma senhora dele se aproximou:
— Boa tarde moço! Compra uma rifa?
Surpreso, Ilusão respondeu:
— Riiifa?! Ora! Rifa... Do quê?
— Rifa, moço! Rifa de um carro... Zerinho! Corre amanhã pela loteria Federal. Este é o último número! Quem sabe hoje é o seu dia de sorte! Compra!... Vai...
— Ah!... Minha senhora se soubesse... Mal tenho dinheiro para poder pagar a minha condução.
A desconhecida senhora insistiu:
— Compra, vai! Sabe... A sorte costuma só uma vez bater a nossa porta! Compra?... O carro é lindo... É vermelho!
— O QUÊ!... VERMELHO! — Jacinto não acreditou no que estava ouvindo! As palavras ditas por aquela es-tranha senhora mexeram com sua estrutura emocional:
— Como? CARRO! VERMELHO! Ann... Quanto cus-ta?
— Somente cinco reais! Compra... Vai!
Jacinto se empolgou. Um frio arrepio percorreu todo o seu corpo franzino. Percebeu estar nas mãos da-quela desconhecida a realização do sonho de sua vida. Sua mente passou a latejar! Seu coração a disparar, desconcertou-se por completo! Seus pensamentos pas-saram a rodopiar em sua mente sonhadora. Contudo não deveria ceder aos impulsos que sentia. Tentou rea-gir. Balançou, coçou a cabeça, fez um muxoxo, franziu a testa. Pensou no dinheiro de sua condução... No leite das crianças... Na conta do armazém, no seu aluguel... No entanto, deu de ombros: não conseguiu resistir: seu sonho havia falado mais alto!
— Ah!... Seja o que Deus quiser... Dá logo esse “MEU” carro vermelho!
Feliz pela venda efetuada, a senhora retirou-se. Enquanto isso, Jacinto não se continha de tanta felici-dade e ansiedade. Avidamente passou a ler o bilhete comprado:
“Carro zero”; turbinado, bancos de couro, som completo, rodas de liga leve... VERMELHO!
Ao ler a palavra “vermelho”, um calor imenso to-mou conta de todo o seu ser. Entrou em devaneio! Sen-tiu-se leve, maravilhado... Feliz! Incontinenti, mergu-lhou de vez em sua doce fantasia. Passou a imaginar-se dentro de seu tão sonhado carro vermelho. Mentalmen-te passou a “dirigi-lo” pelas movimentadas ruas de seu bairro; a sonhar como nunca houvera sonhado! Com um sorriso repleto de satisfação, mal se deu conta do cole-tivo que aguardava estar estacionando a sua frente. Fi-cou fora de si. Em devaneio, ainda sem aperceber-se do que acontecia a sua volta, subiu ao ônibus superlotado.
Acotovelado entre os inúmeros passageiros, Ja-cinto Ilusão prosseguiu a dar asas a sua fértil e colorida imaginação embevecida com a doce sensação de imagi-nar-se dirigindo o “seu” automóvel. Sonhava... A cada gesto, praticado pelo motorista do coletivo, era levia-namente macaqueado por Ilusão. Não se dava conta de seus atos: “viajava!” E, viajando, entre curvas, freadas e buzinadas estridentes, engendradas pela sua própria mente, completamente envolvido por sua terna fantasia chegou ao seu destino.
Usando sua velha marmita como fosse a direção de seu carro vermelho, desce do ônibus... E “BRRRr-rumm...” Roncando como fosse um motor de um auto-móvel em movimento, entra esbaforido em sua casa:
— ESPERANÇA! ESPERANÇA! Corra! Venha ver... Comprei um bilhete de rifa “daquele meu” carro VERMELHO! — Todos os da casa, filhos e sua esposa Es-perança, surpresos, correm à sala para ouvirem deta-lhes da novidade anunciada. Mercedinha, a filha mais velha do casal, não se contém:
— BACANA PAI! Que bom!... É VERMELHO! Olha pai, a janelinha do banco da frente é minha! — e com ar triunfante, encarou os seus irmãos: — FALEI PRIMEIRO!... TÁ!
— O QUÊ?... Seu lugar uma OVA! Quem vai se sen-tar no banco da frente sou eu! Tenho que ajudar o pai a dirigi-lo. Você não entende nada de automóveis! — dis-se empolgado Ilusão Júnior.
— OPA!... “Pera aí gente!... vocês podem até sen-tar no banco da frente... eu não faço nenhuma questão, mas a janela detrás é minha! Quero ver as paisagens! — retrucou Fordela, a filha mais comedida da família”.
Esperança, transbordando-se de alegria, após ter lido o bilhete comprado por Jacinto, entra nervosa na conversa:
— Calma!Crianças! Há lugar pra todos: o carro é grande... Meu único desejo é poder ouvir as músicas do “Roberto”. Posso sentar-me onde sobrar um lugar, mas no rádio do carro... Ninguém mexe! COMBINADO?
— MÃE... E eu? Também quero ouvir os meus “ro-ques-pauleras”. Esse tal de Roberto já era! — falou con-trariada, Fusqueta, a filha caçula de Jacinto Ilusão?
— O QUÊ!... ROQUE!... PAULERA.”... eu disse Ro-berto! E PRONTO! E tem mais: quero dizer outra coisa: não quero ver ninguém comendo doce dentro do carro! Se o estofamento ficar sujo, será difícil limpá-lo. Temos que tomar muito cuidado: o carro é novo, além disso, tenho certeza, como sempre acontece, a limpeza vai sobrar” só “pra mim!”.
Jacinto, cheio de si, ainda com a sua velha marmi-ta nas mãos, entra na conversa:
— CALMA querida! Calma! Não se preocupe com essas bobagens de limpeza... Em “meu” automóvel as nossas crianças podem comer doce à vontade! O esto-famento é de couro! É lavável. Não estraga!
A ansiedade de imaginarem-se passeando no car-ro de Jacinto tornou-se geral! Cada um pleiteava para si as melhores vantagens do automóvel. Em pouco tempo o falatório degenerou-se. Todos passaram a “falar” ao mesmo tempo:
— O lugar da frente é MEU! — Falei PRIMEIRO...TÁ! —Senta VOCÊ no meio! — A MÃE senta atrás...
Dessa maneira, formou-se um verdadeiro rebu: _ “MEU!... SEU!... PAI!... FILHO!... MÃE!... CARRO!... LUGAR...” Até que, perdendo totalmente a sua aparente passividade, Jacinto, grita com toda a força de seus pulmões:
— CHEGAAA! O CARRO É “MEU!” DESCE TODO MUNDO DO CARRO... VOU “SAIR” SOZINHO! — e, com-pletamente alucinado, ainda segurando a marmita co-mo fosse a direção de “seu” carro vermelho, imitando mais uma vez o som do motor de um automóvel em movimento, sai à rua em disparada: “Brrrrrrruummm!” — Claro! Terminou a discussão!
A bem da verdade, hoje, há algum tempo do acon-tecido, ninguém conseguiu saber se afinal Jacinto Ilu-são ganhou ou não o “seu” tão sonhado carro verme-lho. Apenas o que muito se fala e os vizinhos de Jacinto não se cansam de comentar, é que, após o momento do carão dado por Jacinto em toda a sua família, um estri-dente barulho de cantar de pneus “explodiu” pelos a-res... E, como por encanto, uma densa nuvem de fuma-ça, com um forte cheiro de gasolina e borracha queima-da, espalhou-se por todo quarteirão!

O que sobrou da história:

“QUEM DISSE...
QUE NÃO SE VIVE DE ILUSÃO?“.


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