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Contos-->I C T U S -- 17/07/2002 - 11:43 (Walter da Silva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

I C T U S

Chovera muito. E por isso, suspensa a filmagem, as cenas do assalto, seriam rodadas em estúdio. Merda! Teria esbravejado o roteirista, acompanhante incansável, desde o primeiro dia. Equipe segue para o hotel e diretor e roteirista, amigos figadais, retornam ao apartamento a repassar as cenas anteriores.
Abruptamente e com raiva, abriu a porta com muita força, batendo-a e brandindo violentamente:
PORRA! Um pescadorzinho medíocre, subserviente, negou três vezes o parecero e ainda vem me mandar um temporal desses na hora
errada!!! Catzzo
O diretor, acendendo o charuto, olhava-o sem emoção sequer. O fato é que se atrasavam em uma semana, porque a chuva resolvera chover, chover e chover. A equipe, sem mesmo nada o que fazer, joga cartas até altas horas e aguarda o amanhecer, a boa vontade do tal pescador, cujo caráter, a juízo do roteirista, é duvidoso e pouco confiável. Enquanto conversam sobre as dificuldades da produção, o dinheiro escasso e os telefonemas da Produtora, os dois homens repassam outra vez, como deveriam ser as cenas do assalto.
Afora os problemas que já tiveram desde o início das filmagens, os boatos da violência da cidade, o mau-caratismo do prefeito, do juiz, do padre e do comerciante rico e quase dono soberano da região, repassam.
A atriz principal ficou gripada. O ator principal, de pirraça, advertiu que suas reservas de vitamina “C” não seriam suficientes para imunizá-lo dos beijos lancinantes da atriz, que está doida para trepar com ele. Mas o velho empresário mecenas, no real papel de marido da atriz principal, está fotografando tudo, tudo.
Conselhos foram dados antes do início dos trabalhos. Para não irem à cidade, por conta da má fama do local, a tradição diabólica, esconderijo de meliantes e outras quizumbas não menos desejáveis. Mas a arte em primeiro lugar! O projeto deve durar em torno de seis meses. Duraria. Já lá vão dez meses e, azar seu, é o primeiro ano que chove além da conta, justo no mês de setembro. À noitinha, resolveram fazer mais uma reunião de toda a equipe, dentro da pequena sala do hotel, decidir de uma vez os impasses, bater o martelo.
O fac-totum providenciou a pauta e a continuista anotaria os principais pontos.
Chovia muito. Parecia noite, às 9 da manhã. Ausinésio Miranda, o contumaz delegado, continuava ébrio, gambá. Sumira desde a última queixa prestada pelo Idel, alcunha do administrador das filmagens, Idelfonso Crispim, famoso pelos seus inúmeros projetos neo-pós-realistas.
Sumiram algumas lentes, peças de reposição, algumas indumentárias, um móvel de época do início do século XVIII...
Até quiseram mudar o nome do filme. Foram sugestões demais para um único filme de ação, filmado no nordeste e com recursos deste, incluindo todo o elenco nordestino. Não se chegou a nenhuma conclusão. Tampouco, com os prejuízos impostos à produção, o que foi reposto mal daria para suportar mais algumas poucas semanas, se muito. A reunião durara exatamente o tempo em que os larápios, aproveitando a chuva, a falta de segurança e um certo amadorismo, rasparam todos os apartamentos. Levaram justo o que haviam prometido levar, no bilhete deixado na delegacia pelo furioso Idel, ao delegado ébrio, Ausinésio Miranda. Cagaram sobre as camas, mijaram nos guarda-roupas, sujaram as paredes com tinta vermelha da produção. No chão, em giz e cor vermelha de sangue, a claquete com a qual se grita AÇÃO: Massacre em Rincão de Deus, título original do filme, inconcluso.


Olinda, Pernambuco, 1998.



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