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Contos-->V I L A V E L H A * -- 25/07/2002 - 15:38 (Walter da Silva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
V I L A V E L H A *


Vila Velha amanhece sob o concerto grosso dos passarinhos, galos garnisé e caipira, mais o contraponto do vento, soprando forte. Na Vila Velha, o tempo se envergonha de passar depressa. A chuva tímida de setembro, bate fria na pele, durante a caminhada matinal, tendo ao fundo uma melodia entrando no verde claro-escuro dos quintais, cercas de cabatãs e papoulas, unificando a paisagem.
A comunidade de 80 casas. Ao lado esquerdo do campo de pelada, quase inativo, as crianças, em idade escolar, cantam convictas o Hino Nacional, sob a supervisão das três professorinhas enfileiradas. Ao fundo, a velha igreja da Conceição, primeiro marco da passagem enxerida do catolicismo...
Em frente à igreja, o artesanato do Biu, em cujo quintal, o fabrico de peças em quengas de coco, se mistura à desarrumação e à belíssima vista do estuário a uns 100 metros morro abaixo da Vila.
Às oito, quase em ponto, passa em frente à casa, o ônibus da “Itamaracá”, levando o nativo até Paulista. Ele vem três vezes ao dia e constitui uma inusitada comemoração, ainda que milhares de vezes já tenha vindo. A mocinha que trabalha no único telefone público do lugarejo, chega às oito, também, sai às doze e, com aquele ar de funcionária modelo, volta depois do almoço às duas da tarde, permanecendo ali até oito da noite.
Não há fichas telefônicas e as ligações custam quarenta centavos, cada, teoricamente, pelos supostos três minutos, calculados de modo empírico. A mansidão e simplicidade do local, convivem com a aparente sofisticação do bar e restaurante do Luís Jasmim, famoso artista plástico, retratista, a quem não se avista com facilidade. Se a energia elétrica há em condições normais, a água preciosa só chega uma vez por dia, às seis da tarde, sob a administração do Jair que o faz sem remuneração, como se fora um síndico, apenas hídrico.
Fala acelerada, Jair levou esporro da mãe autoritária, porque abriu o bar Mangueirão, de sua propriedade, com um certo atraso. Motivo? dormiu em Itapissuma com a namorada. Resmungava umas mumunhas ininteligíveis, olhando assim meio esquivo e puto da vida.
Pergunto-lhe se vai cozinhar galinha caipira, ao molho pardo, para o almoço; ele responde que não sabe ainda.... talvez faça peixe. Ótimo!!! exulto exagerado. Só que horas mais tarde estou eu saboreando a galinha, enfim.
- Essa galinha de capoeira é melhor do que a de granja. Argumenta o Jair.
- Não sei não. Capoeira é gostosa, mas é muito dura. Por isso é que se utiliza muito a panela de pressão!
O Jair desconversa, faz que não entende, só para não se contrariar com esses hábitos de gente da capital. O turismo da ilha de Itamaracá, leva em conta um passeiozinho à Vila Velha. Os alemães são trazidos por um guia nativo de olho verde que mora em Boa Viagem, no litoral e o vejo mais uma vez repetir as mesmas palavras com seus guiados de Berlim, Frankfurt e adjacências.
Ali, na mesa de entrada do bar, sento-me eu com o jornal do domingo, trazido de longe e mergulho numa viagem mundo afora, relendo o suplemento literário: Sartre, White, Stendhal e que tais.
Enquanto isso, o guia serve e sugere aos alemães, o que deveriam pedir para comer, porque para beber, eles falam sem nenhum sotaque: coca-cola. Termino minha leitura dominical, encerro meus efeitos organoléticos, fecho o jornal e cumprimento a irmã do Jair, a doce maestrina que regia as criancinhas, durante o hino Nacional.
Uma vizinha, coincidentemente alemã, é amiga do Khalid Mahmud, um indiano culto que me aceitou como hóspede, enquanto escreveria meu livro de contos. Ela passou com sua criança, lenço na mão esquerda, em direção ao barco que a levaria à Coroa do Avião, uma ilhota próxima às praias do Recife.
Certamente fora dormir tarde, com aquela cara de sono, vendo a televisão, para poder aprender melhor o português falado.
De resto, cabe-me esperar que a chuva fina pare e eu possa, de minha frugal janela, apreciar o Atlântico, a “coroa do avião”e a praia da Gavoa, para tornar este dia mais Vilense ainda.



WALTER DA SILVA
Vila Velha, setembro, 1995.
Extraído de “22 CONTOS DE RÉS”®

* lugarejo que antecedeu a Ilha de Itamaracá-PE


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