Um leitor muito gentil, o Ricardinho, pelo fato de eu me referir muitas vezes ao Rei Pelé nos meus textos, me enviou um exemplar da antiga revista ‘A Gazeta Esportiva Ilustrada’, primeira quinzena de Junho de 1960, com uma reportagem deliciosa sobre o início de sua carreira. É um verdadeiro ‘manjar dos deuses’ para quem o viu jogar, e uma oportunidade rara para os jovens que não o conheceram. É interessante de se notar, também, o jeito peculiar como se escrevia sobre futebol naqueles tempos. Com todos esses ingredientes, eu não poderia privá-los de uma jóia preciosa como essa. Vou transcrevê-la na íntegra, em duas partes, para deleite de todos nós.
Carlos Claudinei Talli
‘Assim começou Pelé!’ – Parte II
A seguir estamos apresentando o complemento da reportagem publicada na “A Gazeta Esportiva Ilustrada” da primeira quinzena de junho de 1960.
“A estréia no quadro principal foi contra o Jabaquara, em 16 de novembro de 1956. Nesse dia, o ‘ex-Leão do Macuco’ mudou o nome para Espanha, denominação primitiva, a qual acabou, posteriormente, por abandonar. E foi o seu goleiro Nelson o primeiro a sofrer um gol de Pelé, na sua carreira de profissional.
Vejamos o que nos diz a edição de A GAZETA ESPORTIVA, do dia 17 de novembro daquele ano, sobre a partida, nos ‘flashs’ escolhidos da reportagem cujo título era ‘Vitória tranqüila do Santos sobre o Espanha’:
‘Santos, 15 (Dep. A GAZETA ESPORTIVA) – O novo (e velho) Espanha F. C. comemorou hoje seu 42º aniversário, constando como fato principal do programa a partida amistosa disputada com o Santos, na Vila Belmiro. O líder venceu com tranqüilidade, sem maiores esforços, mesmo tendo mandado a campo uma equipe na qual havia apenas dois ou três titulares..
A contagem final de 4 a 2 ficou bem ao andamento geral da pugna, pois o Santos fez o bastante para triunfar e o Espanha se esforçou para fazer jus a uma sorte melhor...
Foram as seguintes as equipes, com as alterações que sofreram, todas na fase final:
Santos – Barbozinha (Osvaldo), Wilson e Feijó; Cássio (Zezinho), Formiga e Fioti (Ari Silva); Alfredinho (Carlinhos), Pelé, Álvaro (Valdir), Del Vecchio e Pepe.
Espanha – Nelson, Sarno e Nei; Biguá, Nelson e Miguel (Delegildo); Hélio, Bugre, Wilson, Araraquara (Miguel) e Albertinho.
Na equipe do Santos destacaram-se Barbozinha, Wilson, Fioti, Del Vecchio, Pepe e Pelé. O garoto Pelé agradou bastante, pelo domínio da bola, acerto dos lançamentos e certeza no arremate...
[...] Voltou o Santos a marcar um minuto depois, (14’ do segundo tempo), quando Del Vecchio escalou pela direita e cruzou para a área. Pepe deixou a bola passar para Pelé, que atirou firme para estabelecer o marcador de 3 a 0...
A renda atingiu a 42.470 cruzeiros, prejudicada pelo mau tempo. Ademais, os associados do Santos e do Espanha não pagaram ingresso. Várias solenidades foram realizadas antes da partida principal. O quadro rubro-amarelo entrou no gramado com as camisas do Jabaquara, que foram tiradas no gramado, pois traziam por baixo as do Espanha, de listas verticais vermelhas e amarelas. Foi também arriada a bandeira do Jabaquara A. C. subindo ao mastro o pavilhão do Espanha F. C....
O ponta-pé inicial foi dado pelo cônsul da Espanha em Santos, sr. Rodolfo Arévalo. Pela vitória alcançada na tarde de hoje o Santos conquistou a bela taça ‘Fraternidad’.’
A terceira estréia ocorreu em 7 de julho de 1957, quando pela primeira vez Pelé vestiu a camisa da seleção brasileira. Foi, aliás, nessa oportunidade que sofreu a sua única derrota dentro do time do Brasil. Fez um gol, primeiro de uma longa série que o está levando para o posto de maior artilheiro nacional de todos os tempos dentro do selecionado auri-verde.
Thomaz Mazzoni, em sua reportagem na A GAZETA ESPORTIVA, de 8 de julho de 57 escreveu, sobre o jogo Argentina 2 x 1 Brasil, pela Taça Roca, no Maracanã, entre outras coisas, o seguinte:
‘[...] Não é necessário dizer que o Brasil sempre atacou mais, porém, com mais nervosismo, com aquela falta de confiança que não devia existir e que somente são desculpáveis desta vez para atacantes novatos como Del Vecchio, Pelé, Mazzola e Moacir, mas indesculpáveis, para os demais...
Vai a gente compreender porque o técnico Pirilo não fez entrar o quadro no gramado com Pelé no lugar de Del Vecchio ou Mazzola. O garoto do Santos F. C. é no momento o jogador paulista mais popular no Rio de Janeiro. Pois bem. O técnico não soube compreender que valor psicológico teria Pelé começar a partida. Basta se dizer que entrando no segundo tempo ao lado de Moacir, já com o jogo perdido por 1 a 0, o ataque brasileiro transformou-se completamente, jogando muito melhor o trio central e o quadro todo...
Quanto a Pelé e Moacir intranqüilizaram muito a defesa contrária com o jogo de esquivas de corpo precioso, mas que na hora decisiva não foi desfrutado...’
Na descrição do jogo, o consagrado jornalista nos conta:
‘... Os dois quadros voltam ao gramado. O time brasileiro apresenta duas modificações: Pelé substitui Del Vecchio no comando da ofensiva e... os brasileiros avançam perigosamente, mandando Pelé a Luizinho... os brasileiros dominam agora...
Na recarga os brasileiros descem perigosamente e Luizinho manda a Pelé que atira, rondando a bola perigosamente a meta de Carrizo...
Decorriam 32 minutos de jogo, quando Luizinho reteve a pelota nas imediações da área Argentina, esperando a colocação dos companheiros. Quando Tite penetrou, recebeu bom passe. O ponta virou e mandou para o miolo, aparecendo Pelé na corrida para atirar no canto, empatando a partida.
Os dois quadros contaram com: BRASIL:- Castilho, Paulinho e Bellini; Zito, Jadir e Oreco; Maurinho, Mazzola (Moacir), Del Vecchio (Pelé), Luizinho e Tite. ARGENTINA – Carrizo, Pizarro e Vaino; Gianserra, Rossi e Urriolabeitia; Corbata, Herrera (Antonio), Juares (Blanco), Labruna e Moyano.”
E assim começou Pelé! Brilhando desde o primeiro dia, nos amadores do Santos, entre os ‘cobras’ e na Seleção.’”
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