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cronicas-->A TRESLOUCADA PAIXÃO DE GUSTAVO -- 02/06/2002 - 22:40 (José Renato Cação Cambraia) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
A TRESLOUCADA PAIXÃO DE GUSTAVO

Lá vinha ela de novo. Gustavo engoliu em seco, como sempre fazia diante de situações ameaçadoras, como o encontro inesperado com um cachorro bravo ou, o que às vezes é bem pior, com uma mulher. Ainda mais aquela, que ele não conseguia tirar da cabeça. Camila era o nome dela. Camila, brisa leve de verão, frescor da primavera, seus olhos brilham no sol, enquanto meu coração queima por ela, ensaiava e escrevia desses versinhos completamente ridículos para si mesmo, pois nunca haveria de ter coragem de mostrá-los a ninguém. Lógico, muito menos pra ela.
Gustavo sentia por Camila uma paixão louca, intensa, incontrolável. Seus olhos quase cegavam, sua cabeça tonteava, seu coração disparava, ele sentia náuseas e suas mãos suavam e tremiam quando ele a via. Uma vez tentou uma conversa, mas foi um desastre. Sem saber o que dizer, Gustavo ficou pateticamente parado na frente dela, gaguejando e tentando esconder o que sentia, com ridículos ares de indiferença. Conversaram pequenas amenidades sem importància e essa foi a única vez até agora. Ele sonhava em pegá-la pelos braços, discorrer sobre assuntos interessantes, fazê-la se admirar da sua inteligência, da sua desenvoltura e dos seus inúmeros outros talentos, como a sensível inclinação para as artes e aspirada faixa preta em Kung-Fu que poderia protegê-la dos perigos a que estava exposta neste mundo rude e cruel. Queria fazê-la rir, abraçá-la e girá-la sob o sol da primavera, dançar sob a lua cheia, no meio de uma praia totalmente vazia. Estava completamente, loucamente, inimaginavelmente apaixonado.
Naquela hora, como em todas as segundas, quartas e sextas, ela vinha subindo a rua, carregando seu violão. De banho tomado, de sandálias brancas e com o cabelo brilhando de tão limpo e sedoso, parecia uma entidade élfica desfilando no frescor da tarde. Gustavo se imaginava passando as mãos naqueles cabelos, naquele rosto pálido e macio, apertando forte aquelas mãozinhas finas. Ela tinha aulas de violão com uma professora que morava na mesma rua que ele, algumas casas acima. E ele aproveitava esses efêmeros momentos para espiar o alvo dos seus sonhos passar pela sua janela. Se a cena fosse de um filme americano, seria em càmera lenta e com um fundo musical tipo "My Girl" ou "Pretty Woman".
Gustavo teve um estremecimento só de pensar na possibilidade de conversar com ela, mas isso já habitava suas idéias há algum tempo. Por isso, ao vê-la surgindo na esquina de baixo, reuniu todas as suas forças e fê-las lutar contra seus músculos, que teimavam em fraquejar - aqueles covardes! - e contra seu estómago, que começou a se mover estranhamente, como se um filhote de gato vivo estivesse se mexendo ali dentro. Camila viu Gustavo sair de sua casa e olhou curiosamente para ele. Achou estranho, pois ele praticamente se arrastava para o outro lado da rua. Parecia que ele estava sofrendo, muito doente, ou algo assim.
Gustavo conseguiu, depois de um enorme esforço, atravessar a rua. Ao chegar à calçada, viu que ainda faltavam uns trinta metros para Camila chegar até ali. Não sabia o que fazer até o aguardado momento, e o nervosismo não lhe permitiu descobrir uma posição casual para suas mãos. Por isso, ficou alternado em encostar-se no muro, cruzar os braços, jogá-los pra trás, metê-los no bolso, roer uma unha ou mexer no cabelo. Tudo isso em trinta segundos, mas que pareceram horas para Gustavo.
Quando Camila se aproximou, Gustavo deu um passo à frente e disse o que estava mentalmente ensaiando há uns vinte minutos: "Oi, Camila!". Ela parou e olhou para Gustavo dos pés à cabeça. Respondeu um "Oi" frio e emendou que estava atrasada para o violão. Gustavo ficou ali parado, com as mãos no bolso por mais uns quarenta minutos, sentindo-se humilhado como um cão molhado. Depois nunca mais falou com ela.
Bom, foi assim o primeiro fora de Gustavo. Ele ficou arrasado, queria chorar até morrer, queria se esfregar no asfalto até perder toda a pele, queria ser enviado para um mosteiro budista na Indonésia e viver sozinho lá por toda a eternidade. Mas, no final da tarde já havia quase esquecido da Camila, pois estava preocupado mesmo era com o jogo de futebol contra seus colegas da 3ª série. Vinte anos depois, ao se lembrar daquele triste episódio, pensou em como as coisas realmente parecem ser bem maiores do que são quando se tem nove anos.


A SEMANA/BECO - 01/06/2002
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