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Contos-->PEQUENAS COISAS QUE SEI SOBRE ELA -- 06/08/2002 - 11:03 (Walter da Silva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
PEQUENAS COISAS QUE SEI SOBRE ELA


Tudo aconteceu numa assembléia de condomínio. Eu, morador novo, ela, secretariando a reunião. De fato, era um encontro de poucas pessoas, de praxe. Sentei-me na extremidade de uma mesa improvisada. A alguns centímetros de distância, parecia de boa aparência, diria, bonita. Fiz uma pequena intervenção, como sugestão a alguma atividade comunitária, que não me lembro bem. Ela parara de escrever, voltando o olhar claro, esverdeado, para cima de mim. Notei-a em seu conjunto, embora não pudesse visualizar o restante do “hardware”.
Enquanto os demais participantes sugeriam algo, eu a fitava, meio curioso, meio surpreso de encontrar entre pessoas de simples trato, uma mulher sem aparência de quem trata o fogão e as coisas da cozinha, como seu repertório diário. Não... não se tratava de uma borralheira, uma dona-de-casa empedernida, a quem o marido - se o tivesse - proíbe de ir à rua, comprar o pão da manhã. No final da reunião nos apresentamos discretamente. Da janela do meu apartamento quase sauna, observava a guarita principal do portão de entrada do condomínio e, lá de baixo, podiam-se ouvir os acordes da quinta, da sexta e da sétima sinfonias de Beethoven, ressoando e chamando atenção, aos sábados de manhã.
Certo dia, estava à espera de uma condução, à porta de entrada do condomínio e ela passava, num velho Passat branco, que teimava em se locomover, sob o comando de uma dama ágil e aparentemente inteligente.
- Vai pra onde? quer uma carona? Me perguntara, abrindo o vidro da janela do carro. Aceitei. Conversamos um pouco, durante o curto trajeto. Ela, simpática mas comedida, súbito me induz a convida-la a ouvir música, em meu apartamento.
- Ah... claro! Será um prazer. Respondi-lhe lisonjeado e um pouco surpreso, acrescentando:
- Leve seu marido! Mas o disse como mera etiqueta, tive quase completa certeza de que já não mais era casada.
- Posso ir sozinha? Perguntara com um ar de decisão peremptória, definitiva.
Minha especialidade à época, era um gadídeo* ao forno, com espinafre, arroz branco e um “riesling” seco. Expliquei-lhe a origem da sonata, falei um pouco sobre as sinfonias, o maravilhoso concerto nº 5, para piano e orquestra... O moço de BONN, foi, além de convidado especial, a testemunha de que nos amaríamos durante tantos anos, tantos jantares à luz de vela, tanta música, tanto cotidiano. Entre um e outro acorde, durante a sobremesa, servi-lhe um beijo na boca carnuda, do tipo beijo roubado. Tudo começara assim, sucedido de uma paixão quase avassaladora.
Viajou um dia para a América, levando uma “aliança” no dedo esquerdo, uma esperança de voltar, uma filosofia, certa filosofia do “para sempre”...
Depois de quase 7 anos, sob invernos, verões e quanta aprendizagem, alguns projetos jamais concluídos e aquela teimosia de nos entregarmos monoliticamente... mandou-me um cartão, dos poucos que me viera às mãos, dizendo:
- Estou mudando os rumos da minha vida.
Os aviões explodiram as torres, meu coração implodira aos poucos, mas sobrevivi incólume e contrafeito, regendo minha orquestra de sentimentos pessoais, maestro de um desejo posto e disposto em fermata.

________________________________________________________
* da família do bacalhau e da merluza.



WALTER DA SILVA
Aldeia, Camaragibe, fevereiro de 2002
Extraído de “22 CONTOS DE RÉS” ®
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