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Cronicas-->Meu Álbum de Fotografias -- 18/06/2002 - 20:35 (Daniel Amaral Tavares) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Lembranças.

Há muito tempo, uma pessoa perguntou-me se eu tenho uma lembrança que poderia ser importante em minha vida. Isso com referência ao meu tempo de criança.

- Sim, eu tenho. - Respondi. Tenho muitas, e posso relatar uma delas que marcou, e jamais me esquecerei.

Por coincidência, falar em lembranças é justamente de um álbum de fotografias que vou falar.

Primeiro quero esclarecer: Eu não fui criado com minha mãe. Sou filho de mãe solteira e meu pai não assumiu a sucatinha que deixou no mundo. Deixando mamãe com o peso do compromisso de pai e mãe ao mesmo tempo.

Aos meus seis anos de idade, passei a morar na casa de minha vovó materna. Eu tenho até hoje, um álbum de fotografias, de quando completei sete anos de idade. Vovó teve o capricho de encomendar um álbum, dizendo ser a mais importante das lembranças de quando eu era criança. Hoje sou um homem de bastante idade e vovó só existe nas lembranças e saudades. E, de vez em quando, paro para olhar as fotos, meu coração reclama. "Nem tristeza, nem saudade matam!". "Meu preito de saudade à minha querida vovó e à saudosa mamãe, que já passaram pra outra vida". Nem meu pai teve o cuidado de fazer isso pra mim. E vovó o fez, com muito carinho.

Meu cabelo era esfarripado, despontado, seco e muito escorrido. Mais parecia o cabelo de um indiozinho Curumim. Ela teve o cuidado de levar-me ao barbeiro (naquele tempo não se dizia cabeleireiro), mandou cortar bem baixinho.

Pediu que deixasse uma franjinha na testa (fronte). Antes de levar-me ao barbeiro, ela me arrumou, vestindo as roupinhas novas que ela mesma deu-me de presente de fim de ano. Eu fiquei muito bonitinho mesmo. A foto é quem diz.

Mandou o fotógrafo caprichar nas fotos, que são em cores preto e branco. Naquele tempo não havia foto colorida. E levou-me para mamãe ver de cabelo cortado e de roupas novas bem bonitas. Ao me ver, mamãe chorou. Talvez porque ela nunca póde comprar roupas novas pra mim. Mamãe era muito pobre e, quando eu morava com ela, eu usava roupas e calçados usados, que outras pessoas nos doavam.

São lembranças que jamais na minha vida hei de esquecer. Saudade, muita saudade, daquele tempo que jamais voltará. Lembrar tudo isso, faz doer o coração da gente. São nítidas as lembranças de quando eu tomava banho, vovó tinha o cuidado de pentear o meu cabelo esfarripado, sem parar de conversar comigo. Dizendo coisas assim:

- "Pentear o cabelinho pra ficar bonito. Aliás, já é bonito, pra ficar mais bonito ainda. Papai do céu não gosta de menino que não toma banho e fica sem pentear o cabelo."

Outras vezes dizia:

- "Nossa! Como ficou lindo de roupa nova, cabelo penteado, puxa! Até é capaz de arrumar namorada".

E, eu ficava todo empolgado com tais elogios. E, era justamente o que ela queria: me ver alegre. Por aí dá pra se observar o amor que tinha ela por mim.

Como ia dizendo: mamãe era muito pobre e eu ainda bem criança mas tenho guardado as recordações. Lá na casa de mamãe, a gente levava uma vida miserável, as coisas muito difíceis. Miséria é o que nunca nos faltou. Lembro-me que às vezes mamãe comprava um pão, daqueles compridos, que uns tratam de filão outros dizem bengala. E repartia aos poucos. Pra mim durava cinco (5) até seis (6) dias aquele pão. Mamãe cortava duas ou três fatias e guardava o resto pra no dia seguinte repartir mais duas ou três fatias, até que um dia acabava. Ela, muitas vezes nem provava do pão.

Eu dizia: come também, mamãe.

A resposta que me dava era:

- Não. Você comendo é mesmo que mamãe comer também; fico satisfeita em ver você comendo.

Isso era um pouquinho que a dura realidade da vida nos oferecia.

Embora ela sendo mãe solteira, impunha respeito e não teve mais filhos. Foi sempre muito firme no trabalho de casa e da fábrica também. Mesmo assim, passávamos por difíceis momentos em nossa vida. Contudo, ela sempre teve emprego, mas o salário como sempre, uma ninharia. Ela nunca me maltratou, nem se lamentava da sorte que Deus nos dera. Sempre tranquila mantinha a calma. Mas sempre com um olhar tristonho. Ninguém consegue esconder um sofrimento. Sempre está estampado no rosto de quem quer que seja.

E a cada dia que se passava, mais a nossa situação ia se agravando. Foi quando ela chorando falou pra vovó:

- Eu não sei como vou poder dar estudo para o meu filho!

Foi naquele dia que vovó pediu pra mamãe deixar eu ir morar com ela. Mamãe chorou muito, mas decidiu, e eu fui pra sempre ficar com a vovó.

Quando eu já estava mocinho, vovó veio a falecer. Duro foi a hora do adeus. Momento crucial na vida da gente. Por um momento ela me falou que estava sentindo mal. E,

- Acode! Meu filho, estou morrendo!
- Estava mesmo.

Tudo foi tão de repente; ela foi empalidecendo, esfriando rapidamente, respirando com deficiência e bem compassado. E parecia querer falar alguma coisa mais, durante aquele momento, mas não conseguiu. Ali bem pertinho, a meu lado, deu o último suspiro. Tudo, não durou mais que uns dez minutos.

Só me restam lembranças da saudosa vovó e da mamãe que também partiu pouco tempo depois.

Deixaram-me órfão duas vezes.

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