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Artigos-->ANÁLISE HISTORIOGRÁFICA DAS OBRAS: Casa Grande e Senzala -- 24/08/2009 - 14:20 (Maria de Lurdes Mattos Dantas Barbosa) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
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O livro de Emilia Viotti da Costa, professora e historiadora, intitulado, Da senzala à Colônia,



originou-se de uma tese de livre – docência apresentada à cadeira de História da Civilização Brasileira da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, sob o título: Escravidão nas áreas cafeeiras; aspectos econômicos, sociais, políticos e ideológicos da transição do trabalho servil para o trabalho livre (1964). Embora tivesse sido escrito de acordo com os requisitos acadêmicos do momento – o que explica alguns de seus defeitos e qualidades –, o livro pretendia ser mais do que um exercício universitário (VIOTTI, 1998, p.26).



A obra faz uma análise das particularidades do sistema colonial a partir de suas conexões com a expansão cafeeira, assim como centra sua atenção no período em que se dá o trânsito do trabalho escravo para o trabalho livre.

É um livro de referência fundamental das origens sociais e históricas, ao mesmo tempo, em que explica toda a problemática que constitui o processo abolicionista. Faz uma séria abordagem dos valores racistas na sociedade brasileira e da desagregação do sistema econômico, abordando as relações entre trabalhadores livres e escravos. Critica veementemente o processo de escravidão na região paulista, destacando principalmente a cafeicultura como representante da empresa capitalista moderna. No entanto, o processo de modernização não ocasionou mudanças significativas na estrutura de produção, isso porque basicamente o latifúndio exportador continuava, assim como, a tradição da monocultura ancorados no colonato, meiação e, sobretudo, no sistema de parceria.

Gilberto Freyre, escritor nordestino, escreveu Casa Grande e Senzala em 1933, uma obra volumosa que retrata o Brasil numa perspectiva de valorização do negro, reinterpretando a raça pela cultura, defendendo a miscigenação como fator benéfico para o Brasil, desde quando o negro contribuiu em diversos aspectos para o desenvolvimento econômico e social, afirmando que,



O negro no Brasil, nas suas relações com a cultura e com o tipo de sociedade que aqui se vem desenvolvendo, deve ser considerado principalmente sob o critério da história social e econômica. Da antropologia cultural. Daí ser impossível – insistimos nesse ponto – separá-lo da condição degradante de escravos, dentro da qual abafaram-se nele muitas de suas melhores tendências criadoras e normais para acentuarem-se outras, artificiais e até mórbidas (FREIRE, 2004, p. 404).



Sua obra solidamente estruturada contém, características da formação de uma sociedade híbrida escravocrata e agrária. No entanto, seu olhar senhorial e o reelogio ao projeto dos colonizadores portugueses para o Brasil, foram motivos de severas críticas por parte de autores brasileiros que não concordam com Freyre quando ele diz que a miscigenação foi importante para de fato corrigir a distância social entre a casa grande e senzala. “A agricultura escravista, aristocratizava senhores e escravos; a miscigenação contrariou esse efeito separador ao reunir em famílias as índias e as negras aos brancos” (2001). Para Viotti, no entanto,



De um lado, havia a família branca, aparentemente monógama; de outro, a promiscuidade das senzalas a incitar e favorecer a poligamia do senhor. Por sua vez, a situação do escravo também não contribuía para estreitar laços familiares: a desorganização das tradições africanas, o interesse dos senhores que preferiam, para os escravos, as ligações passageiras a relações consolidadas pelo casamento - que poderiam criar obstáculos à venda -, o número relativamente pequeno de mulheres em relação aos homens, tudo contribuiu para conferir precariedade e instabilidade àqueles laços (VIOTTI, 1998, p. 16).



Quanto aos índios, certamente a dificuldade foi ainda maior de consolidação familiar com as outras raças.

Emilia Viotti, consegue traçar, uma clara narrativa sobre o cotidiano dos escravos que foram trazidos para o Brasil. Aprofunda-se de forma mais contundente nos conflitos étnicos, culturais e sociais das circunstâncias históricas. Já Freyre traça o cotidiano de forma minuciosa dos afazeres domésticos, das receitas culinárias, danças, cantigas, brincadeiras infantis... Bebe na fonte da Escola dos Annales, a história das mentalidades coletivas, a micro história, sem, contudo, desprezar ou dispensar as fontes institucionais, oficiais, estatais.

Viotti discorre ainda sobre as tentativas de imigração como forma de substituir o trabalho escravo e reflete profundamente sobre as formas diversas de protestos empreendidas pelos escravizados na busca da tão sonhada liberdade, os conflitos decorrentes desse processo de resistência negra. Diz que,



A escravidão desorganizou a vida familiar. O intercâmbio sexual entre senhor e escrava deu margem a que se fixassem preferências por certos vícios e anomalias sexuais (masoquismo – sadismo), estimuladas pela situação que a escravidão criara (VIOTTI, 1998, p.16).



Freyre ao se referir a esse assunto afirma que,



A verdade, porém, é que nós é que fomos os sadistas, o elemento ativo na corrupção da vida em família; moleques e mulatas o elemento passivo. Na realidade, nem o branco nem o negro agiram por si, muito menos como raça, ou sob a ação preponderante do clima, nas relações do sexo e de classe que se desenvolveram entre senhores e escravos no Brasil. Exprimiu-se nessas relações o espírito do sistema econômico que nos dividiu como um deus poderoso, em senhores e escravos (FREIRE, 2004, p. 462).



Freyre relaciona em seu livro as três raças básicas para a formação do povo brasileiro. Diz que o encontro dessa três raças, (branca, negra e índia), resultou num encontro fraterno, solidário e democrático. Entretanto, Viotti faz relação de duas raças a branca e a negra: “Dos séculos da convivência, das influências trocadas, do caldeamento das duas raças resultou a população de mestiços e mulatos que hoje ainda povoa o país” (1998). E esta convivência terminou por deixar cicatrizes nos negros e nos brancos. Se aprofunda nessa questão afirmando que os escravos possuíam experiência do mundo tropical, por esse motivo facilitavam a adaptação do português à vida colonial.



Hábitos alimentares, modismos lingüísticos suavizando a pronúncia, modificando a língua portuguesa, introduzindo vocábulos novos; crenças religiosas adulterando o cristianismo, superstições contagiando a credulidade do branco, suas lendas e seu sentido musical, transformando-se, por sua vez, no contato com a tradição indígena e portuguesa, foram incorporados à nova sociedade forjada nesse íntimo convívio (VIOTTI, 1998, p. 15).



Segundo José Carlos Reis, Casa Grande e Senzala é um texto de ciência social qualitativo, inovador. Concordo plenamente com ele nesse aspecto, mas faço ressalvas, quanto à questão da colonização portuguesa no Brasil da forma como é abordada por Freyre, mas saliento que essa obra embora inicialmente discriminada no Brasil, “é reconhecida como uma referência superior da ciência social pelos mais importantes cientistas sociais do mundo. Tanto Da senzala à Colônia, quanto, Casa Grande e senzala, são obras de inestimável valor para a historiografia brasileira, a primeira mostra a casa grande de forma realística sem subjetividade, sofreu fortes influências da historiografia recente como Caio Prado Júnior, Florestan Fernandes, Nelson Werneck Sodré e outros. A autora foi beber nessas fontes, por não encontrar respostas na historiografia tradicional. Essa obra, como afirma a própria autora, “não nasceu de um esforço individual isolado (como, aliás, nenhum livro nasce), mas de um processo coletivo de reflexão” (1998). O tempo é o dos primórdios da escravidão até o prenuncio da transição da sociedade senhorial para a empresarial na segunda metade do século XIX. É um livro denso, ás vezes repetitivo, mas de suma importância na formação de historiadores e para a sociedade brasileira como um todo, pois, reúne informações básicas do sistema colonial, com enfoque na escravidão e abolicionismo.

Darcy Ribeiro ao analisar o livro de Freyre, informa que Casa - Grande e Senzala eleva à condição de mito, um paradigma que mostra o movimento da sociedade escravocrata e ilumina o patriacarlismo vigente no Brasil pré-urbano-industrial. As estruturas sociais e econômicas são apresentadas como processos vivenciados. Apresentam-se não só situações de fato, mas pessoas e emoções que não se compreendem fora de contextos. Afirma que,



Gilberto Freyre inova nas análises sociais da época: sua sociologia incorpora a vida cotidiana. Não apenas vida pública ou o exercício de funções sociais definidas (do senhor de engenho, do latifúndio, do escravo, do bacharel), mas a vida privada (FREYRE, 2004, p. 21).



Portanto, as duas obras do ponto de vista histórico, sócio-econômico e cultural, se constituem em compêndios indispensáveis para o estudo de História. Não contém verdades absolutas, mas estão abertas para novas releituras e resignificação, enfim novos paradigmas. Desde quando, as verdades só prevalecem até aparecerem novas evidências e novas certezas... Assim é a história!









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