Eu ganhei, sem pedir, mais 15 dias de férias. Eu, centenas de professores e milhares de alunos dos ensinos Fundamental e Médio. Tudo por culpa de uma gripe que já teve meia dúzia de nomes: Gripe Suína, H1N1, Nova Gripe, Gripe A ou apenas Influenza. Por causa dela, só retomo as minhas aulas regulares em meados de agosto se o cenário não mudar. O que significa isso? Se mais casos forem confirmados no Estado de São Paulo, se mais pessoas morrerem, as aulas serão suspensas outra vez? E outra? Ocorrendo isso, teremos um ano letivo totalmente comprometido. Com a atual suspensão, considerando que o ENEM é em outubro, os meninos terceiroanistas do Ensino Médio já são os maiores prejudicados. Aqui vem a pergunta que poucos querem fazer e muito poucos querem responder: esse adiamento era mesmo necessário?
Desde que o fantasma da gripe dos porcos mexicanos surgiu, muita bobagem já foi dita e feita. A imprensa, para começar, desempenhou o papel no qual mais se sente à vontade, o de arauto hiperbólico das mazelas humanas. A Gripe Suína foi pintada quase como uma peste negra do século XXI. Imagens de cidades desertas, pessoas mascaradas, escolas fechadas e jogos de futebol cancelados. Pandemia!? Na verdade, pandemônio. Enquanto o São Paulo Futebol Clube conseguia passar de fase na Taça Libertadores por W.O. graças aos supostos riscos que um jogo no México poderia representar, alguns médicos tentavam dizer que o pânico era um exagero. A tal gripe não seria assim tão devastadora. Para desespero da turma do apocalipse, o fim do mundo não viria ainda.
O alarde diminuiu. Michael Jackson morreu, e não foi de gripe. A Gripe virou assunto de segunda. Ainda mais quando as estatísticas mostraram que a Nova Gripe era menos fatal que a gripe comum, velha conhecida nossa, responsável por milhares de mortes por ano no Brasil. A vida seguiu sem maiores tosses e sem febres. Vieram, então, los hermanos de la Plata e o auê recomeçou. Se na Argentina as mortes cresciam, o Brasil estava em risco. Aquela história: a gripe argentina é a pneumonia brasileira, ou algo assim. O pânico voltou. A Gripe Suína já assustava. Gripe Suína com transmissor argentino? Ni-mim-não! Máscaras e antivirais sumiram das prateleiras. Os apocalípticos começavam a virar o jogo.
No início da semana que passou, “eles” (quem são eles?) anunciaram que as aulas das escolas da rede pública estadual estavam suspensas até 16 de agosto. O município aderiu e o Sindicato aconselhou que as particulares também tomassem a mesma decisão. E cá estou eu, em férias forçadas. Você já sabia de tudo isso e a ideia aqui não é fazer relatório. É responder a pergunta já feita: precisava?
Não sou especialista e você pode simplesmente desprezar meu comentário. Não tenho como baseá-lo em provas de laboratório. Se quiser ter um pouco mais de paciência, leia-me: a suspensão oficial das aulas é um exagero, uma vitória dos apocalípticos. A justificativa d“eles”: as aulas foram suspensas porque o número de crianças contaminadas é muito baixo se comparado aos casos detectados entre adultos; prorrogando as férias, esse número permaneceria insignificante, já que uma possível criança doente não poderia, sem o contato com as outras, iniciar um ciclo de contaminação. Tudo bem que isso não explica a paralisação das aulas no Ensino Médio e nas Universidades, uma vez que, embora muitos se comportem como tal, não há crianças por ali. Aliás, os alunos da “facul” e do colégio, que não estão em sala de aula, tenha certeza, estão socializando bem “sussa” em shoppings, bares e baladas. Trocando um viruzinhos, véi!
Minha principal objeção a essa decisão é que ela é baseada, no máximo, em hipóteses. Pode ser que o número de crianças contaminadas seja pequeno porque elas estão em férias. É o que “eles acham”. Decisões tomadas com base em hipóteses e no calor da muvuca têm grandes chances de resultar em erro. Até o Paulo Renato, ao dar a notícia da suspensão, transferiu a responsabilidade para as “autoridades de saúde”: “ Eu não sou especialista, mas essa decisão foi tomada com base na orientação do pessoal da saúde”. A prefeita e as secretárias de Ribeirão também não me pareceram muito certas sobre a pertinência do ato no momento da coletiva. Os diretores das escolas particulares, antes de decidir sobre a adesão, tentaram saber se seus concorrentes iriam suspender as aulas ou não. No fim, como um acabou suspendendo, outro também, todos aderiram. Duas semanas de aula perdidas representam cerca de 60 horas-aula a menos. Para o Ensino Médio, ainda voltado para o vestibular e o cumprimento de metas de conteúdo, é uma perda muito grande.
Você deve ter ouvido que os alunos não serão prejudicados, pois as aulas serão repostas. Acredite, não haverá reposição de verdade. Quem conhece a rotina de uma escola sabe que, na prática, a reposição esbarra na impossibilidade dos professores, que dão aula em várias escolas, e na dificuldade que as famílias e as escolas encontram de colocar os alunos na sala de aula em horários alternativos, principalmente se “alternativo” significar “sábado”. Ao fim, haverá apenas o registro de reposição e nenhuma reposição efetiva na maioria das escolas.
Como os ânimos relativos a essa Gripe sofrem mutações constantes, algo me diz que teremos uma “suspensão da suspensão” antes do dia 16. Isso não é só uma previsão. É um desejo.
