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Contos-->As Torres Gêmeas -- 11/09/2002 - 20:28 (Sylvia R. Pellegrino) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Era quase meio-dia, quando Maria Luísa saiu do banheiro, depois de uma ducha. Vestiu um conjunto de calça e suéter da lã cor telha, prendeu os cabelos num coque solto e foi para a sala. Olhou com renovado desgosto a capa da revista Veja que jogara no sofá, depois de ler todas as reportagens. Tensa demais para ler o processo que levara para casa, e muito cansada para sair ficou parada no meio da sala, sem ânimo de ligar a tv.
Era lógico que o noticiário também estaria falando sobre Osama Bin Laden. O terrorista era o assunto do momento, assim também, o pobre país Afeganistão, devastado por outras tantas guerras.
Olhou em volta, observando os lindos móveis antigos, o tapete persa com desenhos em rosa e verde sobre fundo bege, as cortinas na janela, a preciosa escrivaninha francesa que comprara num leilão em Nova York, refletindo como tudo agora lhe parecia tão estranho.
Na sua casa tinha uma miscelânea de um pouco de cada pedaço deste planeta em que vivemos, compondo harmoniosamente o ambiente, no entanto agora estavam todos lá fora prestes a deflagrar uma terceira guerra mundial e destruir qualquer possibilidade de convivência pacífica.
Foi até a cozinha e lentamente pegou o coador de café, aqueceu a água e jogou sobre o pó. O odor desprendeu quase imediato. Sentou-se à mesa da cozinha e tomou a bebida revigorante, esperando que aquela sensação de estar vivendo fora da realidade se diluísse. Olhou a janela e viu a luz do sol entrar, aquecendo o ambiente, mas logo em seguida o céu foi se tornando cinzento e melancólico, exatamente como ela se sentia por dentro.
Não conseguiu resistir à tentação de recordar tudo novamente.
Era o início da manhã ensolarada de Nova York, ela havia levantado e tomado seu desjejum. Ainda estava à mesa quando o marido telefonou aflito, do Brasil. Os Estados Unidos estavam sendo atacados. Era a notícia ouvida pelo rádio que ele mantinha na empresa. Achou graça da notícia. Com certeza Roberto estava fazendo uma de suas freqüentes brincadeiras, apenas para fazê-la rir um pouco e ter motivo para telefonar e matar a saudade.
Percebeu pela urgência da voz dele que não havia brincadeira naquele momento. Colocou o fone no gancho sem se aperceber.
Ligou o televisor e viu uma das torres gêmeas de Nova York pegando fogo em seu topo. Momento seguinte uma aeronave entrava dentro da outra torre. Estava estarrecida diante da imagem. Pegou novamente o telefone, ligou e açodadamente tentava explicar o que via. Nesse momento, para seu espanto maior, a primeira torre veio escorregando, transformando-se num amontoado de escombros. Ele pedia encarecidamente que ela voltasse para casa. Que importava agora aquele caso complicado de comércio exterior?
Lembrou sua saída de Curitiba. Estava cheia de esperanças para fechar negócio com a firma americana. A empresa exportadora onde trabalhava no Brasil confiara a ela a maior missão de sua carreira.
Havia marcado uma audiência com o Diretor-Presidente da empresa importadora para as nove horas daquela manhã, mas a secretária havia telefonado e adiado o encontro para catorze horas, daquele dia, exatamente naquela torre do World Trade Center. Agora via vir abaixo um dos edifícios considerados mais seguros e inexpugnáveis do mundo.
Junto com aquela torre vinha abaixo seus sonhos de um grande contrato, uma gorda comissão e uma provável promoção. Sentiu-se mesquinha e torpe ao perceber seus pensamentos. Pensou em toda aquela gente que havia ficado sob os escombros e o corpo todo arrepiou. Poderia estar entre aquelas pessoas se sua audiência não houvesse sido adiada.
O café quente e forte fez mais efeito do que o banho e Maria Luísa começou a sentir a mente desanuviar-se. Então, permitiu-se pensar no que acontecera na manhã anterior, dentro da sala de seu chefe, e encheu-se de vergonha. Lamentou profundamente o seu descontrole. O modo como se comportara fora realmente deplorável.
Quando Hélio Ribeiro Guedes disse-lhe que ela voltasse a Nova York começou a gritar que não veria aquilo de novo, em hipótese alguma. A atitude e o olhar dele deixaram claro o desprezo pelo seu descontrole. Não por temer o que ele poderia estar pensando dela naquele momento, mas o que mais a aborrecia era reconhecer que perdera o controle. Afinal era uma profissional e das mais respeitadas dentro da empresa e sabia o quanto Hélio, seu chefe imediato, lutara para ir em seu lugar naquela missão.
Sua volta de Nova York aconteceu junto com a primeira leva de brasileiros que conseguiu sair da cidade, depois de tantos adiamentos.
A viagem estava tensa. Ninguém queria comentar o acontecido, mas todos temiam a presença de algum terrorista dentro da aeronave. Que a qualquer momento a rota seria desviada para algum outro alvo.
Ao chegar em solo brasileiro teve ímpetos de abraçar todas as pessoas que encontrava. Quando finalmente conseguiu sentir os braços do marido ao redor de seu corpo foi como se toda a sua pátria a abraçasse e a recebesse novamente.
O telefone tocou. Ela atendeu temerosa. Sabia que iriam lhe perguntar se havia decidido viajar. Concordou sem pensar.
E se acontecesse de novo e ela não conseguisse controlar-se? Não, não havia a mínima possibilidade. Pelo simples motivo de que agora ela sabia que a explosão de emoções a pegara de surpresa, ela se deixara envolver por aquele momento e não soubera o caminho de volta.
Entrou no avião naquela tarde de segunda-feira, indo em direção a Nova York. Tudo havia sido acertado novamente com a empresa americana. Estariam esperando-a no aeroporto para levá-la ao hotel e no dia seguinte teria o seu encontro com o Diretor-Presidente.
Olhou para os passageiros, todos pareciam calmos, lendo jornal alguns, revistas outros. Estendeu a mão para pegar o jornal, mas refutou. Agradeceu a aeromoça e decidiu pelo livro. Era um romance agradável com duzentos e cinqüenta e duas páginas. Estava terminando o livro quando foram avisados que estavam descendo em solo nova-iorquino. Respirou fundo e preparou-se para descer.
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