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Contos-->la femme -- 15/09/2002 - 11:12 (Paulo Belushi) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Amélia era o nome com qual a registraram na certidão de nascimento. Mas ninguém precisava saber disso. Bastava saber o seu codnome, dado por suas companheiras na luta feminista pelos direitos da mulher: La Femme.
Ela era a fêmea. Dita e feita. O sonho de liberdade que toda mulher submetida pelo patriarcado ocidental quer para si. A realização da utopia matriarcal em si mesma. Era a realização em seu próprio cotidiano da mulher poderosa almejada pelo movimento feminista internacional.
Este, pelo menos, era o mito. Alimentado sistematicamente pela liderança/personagem, que se utilizava da fama para fazer avançar seu objetivo de emancipação da mulher.
— La Femme, qual a sua posição à respeito do aborto?
— É claro que sou a favor da sua legalização.
— Mas você defende a prática do aborto?
— Não só defendo a prática como acho ser obrigação do estado que incentive as adolescentes grávidas a abortarem. O sistema público de saúde deve ter condições de realizar uma cirurgia abortiva em qualquer posto médico.
Esta era a fêmea, adorada pelas mulheres, temida pelos homens. Símbolo sexual das lésbicas, modelo de autoridade para as donas de casa. Durante uns anos, assinou uma seção de cartas em m jornal feminista onde passava as orientações mais radicais às mulheres vítimas da opressão.
“La Femme, não sou ciumenta nem gosto de desconfiar das pessoas sem motivo, mas acho que meu marido anda saindo com outras mulheres. Sou jovem, bonita, e fiel, mas ando tão insegura. O que eu faço?”
“O que você já devia ter feito. Se você é jovem bonita e fiel, deveria arrumar logo alguns garotões para te garantirem o prazer que teu marido te nega. Coloque uns dois ou três atletas em sua cama, experimente dupla penetração anal, enfim, liberte-se. E, se continuar achando que seu marido te trai, abandone-o a própria sorte. Os homens, sem nós, são uns inúteis, eles afundam em um mar de depressão. Agora nós, sem eles, somos a excelência em pessoa. O que você está esperando, mulher?”
“La Femme, eu trabalho na mesma função de um homem incompetente e ele ganha duas vezes mais do que eu. O que devo fazer? Com quem devo reclamar?”
“Com ninguém. Se este homem é incompetente, deve ser tarado e punheteiro. Seduza-o, mas não vá para a cama com ele. Homens incompetentes geralmente brocham. Só seduza-o, e o faça pagar as suas contas. Ele ganha mais para isso.”
Tornou-se uma celebridade nacional. Discurso garantido nos oitos de março. Personalidade cuja opinião aparecia sempre nos telejornais noturnos e nos jornais diários. Paquerada pelos partidos políticos e organizações de defesa da mulher, embora sempre se manteve independente.
Enfrentava o ódio das classes conservadoras. O bispo da capital não poupava críticas à sua “ideologia de morte e de pecado, que incentiva a promiscuidade e a libertinagem”. Crítica que ela respondia sem pudores:
— O que ele gostaria é que ficasse quieta e aceitasse o que ele faz com as mulheres que todos os dias são seduzidas pelos padres de sua diocese.
Sua fama atravessou as fronteiras de seu país. Chegou à Europa, onde apresentou conferências e palestras em universidades e congressos. Visitou os países africanos onde se amputam os clitóris das mulheres. Enviou dinheiro para organizações feministas de países muçulmanos, e queimou burcas em praças do Afeganistão. Foi capa da Times e da Newsweek.
Um dia a grande líder feminista norte americana Clarice Sinclair decidiu rodar o mundo para apoiar a luta das mulheres no terceiro mundo. Foi ao seu país e fez questão de aparecer à imprensa tomando café na casa da famosa La Femme. Quando sua assessora apresentou a idéia, ela foi rápida:
— Alugue um flat. Diga-lhe que La Femme não tem casa, não fica parada em lugar algum.
— Mas... é Clarice Sinclair.
— Por isso mesmo. Ela não precisa saber “aquilo”.
A assessora entendeu. Alugou um flat caríssimo e soltou nota à imprensa dizendo que o sedentarismo é a fonte do poder do macho. E ela era a fêmea, nômade e independente. E todo mundo caiu na conversa, dando as fotos das duas feministas no coffe shop do flat.
Tomo mundo menos um jornal conservador, que me telefonou no dia seguinte. Pediram-me para comparecer imediatamente ao escritório do diretor da redação.
— O que há? perguntei ao senhor diretor.
— Queremos descobrir a casa de La Femme.
— Por quê?
— Achamos que essa vagabunda esconde alguma coisa. E queremos descobrir o que é.
— E querem que eu a siga para um paparazzi básico?
— Exatamente.
— Por que eu?
— Porque você está acima de qualquer suspeita, também vive metido nestes movimentos de comunistas tarados e veados, e é o melhor que temos agora.
— Obrigado pela parte que me toca...
— Topa?
— Quanto rola?
— Mil dólares se conseguir.
Fechei. E na mesma tarde comecei o meu plantão em frente ao escritório de La Femme. Esperei em um coffe shop até altas horas da noite, tempo em que fumei dois maços de cigarro barato e tomei oito xícaras de café. Quando ela saiu, entrei no carro e, mantendo distância, a segui.
Ela dirigiu, sem me perceber, até uma cidade na periferia da capital. Em um bairro de classe média. Saiu do carro com uma peruca ruiva, que a fazia passar por outra pessoa. Um senhor andava pela rua e a cumprimentou:
— Boa noite, dona Amélia.
Ela respondeu ao cumprimento com um sorriso. Entrou na casa. Preparei a minha teleobjetiva, não queria perder nenhuma cena importante. A mulher encontrou um homem barrigudo, barba por fazer, latas de cerveja espalhadas pela sala, assistindo ao jogo na TV.
— Onde você estava, sua piranha?
— Trabalhando, amor.
— Sei, você fica por aí, passa às vezes meses fora de casa, dando o rabo para todo quanto é homem. Pensa que eu não sei.
— Eu faço tudo para te sustentar, meu amor.
O sujeito se levantou e virou-lhe um murro na cara.
— Vagabunda!
Ela passou a mão sobre o hematoma como uma mulher apaixonada. Olhou com tesão para aquele homem e disse:
— Bate de novo.
Ele dirigiu-lhe um olhar violento, cheio de ódio e rancor:
— Mas é mesmo uma piranha! Não aprende mesmo, não é?
E começou a lançar os objetos que via no caminho. Com uma cadeira de cozinha, deu-lhe golpes tão violentos que eu parecia ouvir ossos estralando. Fazia um esforço enorme para vencer meu asco e continuar apontando a teleobjetiva, mas ela parecia adorar, e seu rosto exalava prazer e orgasmo. Quando ele terminou, ela ficou ao chão, caída, quase inconsciente, mas não como uma vítima da violência. Estava como quem termina um ato de sexo.
— E aí? ligaram-me da redação. Conseguiu alguma novidade?
Pensei em dizer o que acabara de assistir. O material estava todo comigo. No entanto, por algum motivo esqueci o jornalista e o paparazzi, e fiquei pensando no que as mulheres do mundo perderiam se aquilo fosse publicado. Desconversei:
— Nada. Ela está em um flat em uma cidade vizinha. Segundo a recepção, amanhã ela sai.
— Então era verdade.
— Sim ao que parece. Se quiser, eu continuo o plantão outros dias.
— Não, não precisa. Passa aqui amanhã e pega o dinheiro.
Fui até um laboratório em comprei um novo filme. Sem nada.
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