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Cronicas-->O TERCEIRO NOIVO -- 11/06/2000 - 19:35 (Mario Galvão) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Há pessoas, céticas, que não acreditam no fado, no destino. Bobagem - dizem - não há nada pré-fixado pelo além e tudo não passa de coincidências.
Todavia, certas estórias e determinadas histórias nos fazem pensar o contrário. Nelas, tudo nos leva a crer que a sina das pessoas envolvidas estavam antecipadamente escritas e os fatos eram inapelavelmente conduzidos para um determinado epílogo.
Vejam e julguem, por exemplo, o que aconteceu na vida de Rosana Antunes Siqueira, uma das mais lindas mulheres que conheci, em meu tempo de juventude, em Guaratinguetá, no interior do estado de São Paulo.
Uma das mais lindas e ricas, pois que era filha de um dos fazendeiros mais abastados da cidade, o velho Antunes Siqueira.
Se alguém não acreditar, que pergunte aos que viveram, na década de 50 e no início dos anos 60, naquela localidade valeparaibana. Eles irão confirmar o aqui relatado e assegurar-lhe que não é estória. É história, onde só modifiquei o nome da protagonista e de seu pai, está claro, para não deixar ninguém envolvido embaraçado.
Muito interessante e curiosa era a semelhança dela com uma oriental, melhor dizendo, com todas as Cleópatras que já vi retratadas por Hollywood. Maravilhosa, cabelo cortado rente, com franjinha. Morena clara, bem clara, "leitosa" mesmo, desses tipos "mignon", denotando descendência pura européia, sem a costumeira mistura de raças que se encontra no Brasil e, principalmente no Vale do Paraíba, onde a miscigenação do branco com o índio e mesmo com o negro foi tão comum na época em que o País era colónia de Portugal.
A semelhança era tanta que foi inevitável que, de uma feita, ela saísse, nos três dias de carnaval, no carro alegórico do festejado Bloco dos Estudantes, personificando exatamente a lendária rainha do Egito.
Nãó é preciso dizer que, linda e rica, tinha inúmeros fãs e pretendentes. Mas, se os estudantes, filhos de fazendeiros, comerciantes, radialistas, jornalistas e outros a adoravam, ela, por seu turno, se encantava mesmo era com um uniforme azul.
Assim, só namorava oficiais da Escolas de Especialistas da Aeronáutica, deixando o pessoal da cidade doido de ciúmes e despeito. Frustrava todos os sonhos de todos os que sonhavam com o casamento com a herdeira rica, a garantir um futuro de muita sombra e água, ou leite, frescos.
E foi aí que começou a acontecer.
O primeiro oficial da gloriosa Força Aérea Brasileira, mais entusiasmado, animou-se a enfrentar o pai, coronel de muitas léguas e gado e pediu-a em casamento. O pai, está claro, bem que prefiria vê-la esposando um de seus pares, para ver aumentar as terras e as vacas, mas, a contragosto, consentiu, até porque um certo radialista, com fama de pilantra, vinha assediando a moça de uma forma quase insuportável.
O noivado foi celebrado com as pompas de costume à época, com a família do noivo tendo vindo do sul, de avião da FAB e tudo o mais.
A alegria, entretanto, pouco ou quase nada durou.
Um negro urubu, isto mesmo, nada mais nada menos do que um malfadado corvo, acabou com a possível estória de fadas e impediu que os colegas do oficial cruzassem espadas sobre o casal nas portas da vetusta Igreja Matriz de Santo Antonio de Guaratinguetá.
A negra e fedida ave chocou-se em cheio contra a carlinga em que voava o oficial numa veterana B-25. Catrapruz! O jovem teve quase arrancada a cabeça pelo impacto do pássaro e morreu ali, na cabine do avião, sem que os colegas nada pudessem fazer por ele. Uma morte horrível.
O oficial ficou defunto e a beldade viúva, muito pouco antes de se casar.
O enterro foi lindo, no cemitério de Porto Alegre, com a família do oficial enlutada, os colegas do morto disparando salva de fuzis, a bandeira sobre o caixão e Rosana, como sempre maravilhosa e pálida, ao lado do Pai, soluçando desesperadamente pelo fim de um casamento tão desejado e tão próximo.
Passado um tempo, um bom tempo, Rosana desfilava novamente com um outro oficial da aeronáutica pelas alamedas da Conselheiro Rodrigues Alves, deixando os naturais da terra, frequentadores do "footing" dominical, roendo as unhas de inveja e o tal radialista, que havia recobrado esperanças, choramingando no ombro de amigos, na mesa repleta de cervejas, no tradicional Bar Pequeno, num canto da praça, sentindo fugir-lhe mais uma vez a oportunidade de fisgar a herdeira.
Era, desta segunda vez, um cearense.
Sabedor dos antecedentes do antecessor, prudente, alegou um problema na vista e, por via das dúvidas, parou de voar. Ficou firme, em terra, de forma que nenhum urubu lhe pregasse peça e impedisse o casamento com a rica e bela herdeira.
Não foi suficiente.
Um mês após o noivado, também assistido pela família, vindo adrede de Fortaleza para a festança na Fazenda, no Bairro do Ribeirão das Pedrinhas, catapuf! Esse, o segundo, também não escapou vivo da sina dos pretendentes da Rosana.
Desta vez foi um tombo de moto, destes bem bestas, numa estrada da roça, quando o noivo voltava, num domingo à tarde, felicíssimo e entontecido de paixão, da fazenda da morena fatal. O oficial da aeronáutica, apesar de ter feito todos os cursos de segurança de vóo, neste estava sem capacete e bateu com o alto do cocoruto numa pedra rolada de rio, dessas bem grandes, pontuda. Foi plá e pluft! Direto para a UTI da Santa Casa e de lá, que não houve tempo para translado, para uma cova no Cemitério Municipal de Guaratinguetá, onde está enterrado até hoje, o túmulo bem ali atrás da Capela, para quem quiser tirar qualquer dúvida da veracidade deste caso.
Foi assim que a Rosana entrou solteira pela década de sessenta.
As coisas ficaram mais difíceis. O radialista desistiu de esperar, casou-se com uma paulistana e foi-se embora de Guaratinguetá, e aliás, ele e os filhos acabaram gente famosa nas rádios e televisões da capital.
O pessoal de farda tão desejado, bem, estes nem passavam mais por perto, na Praça Conselheiro, da linda Rosana, que apesar de mais velha continuava maravilhosa, de fechar o comércio enquanto o pai, danado de pão duro, enricava cada vez mais cada vez.
Todo oficial da Aeronáutica, solteiro, que chegava, dos mais diversos rincões do Brasil, para servir em Guaratinguetá já recebia dos colegas a advertência:
"-- Pode namorar qualquer "muvuca" (era o nome que eles davam às moças da terra), mas tem uma que não deve: aquela do cabelo e aparência de Cleópatra. Já matou dois colegas nossos. Vai nessa não!"
O tempo foi se passando e a Rosana foi ficando coroa e entediada, chegando a ficar até mesmo um tanto quanto feiosa. Sempre solteira. Nem mesmo o pessoal da cidade se animava mais e Rosana se arriscava-se a ficar solteirona para o resto da vida, viúva de dois "coca-colas" ( o nome que o pessoal da terra dava aos militares da FAB), sem nunca ter ultrapassado os umbrais solenes da Matriz.
Já pelos meados da década de sessenta, entretanto, apareceu um terceiro militar da FAB, corajoso como nenhum outro, que resolveu enfrentar a lenda e o destino.
Namorou Rosana, noivou com ela, em mais uma festa estupenda na Fazenda do Bairro do Ribeirão das Pedrinhas. A família, desta feita do Paraná, também veio em peso para a festa, também a bordo de um Avro da FAB, que nessa época nenhum jornal tinha coragem de fofocar a respeito, pouco tempo passado do golpe militar de 64.
A festa do noivado foi de arromba e imaginem então o que foi a festa do casamento!
Pasmem. Para o paranaense sortudo, nada aconteceu. De ruim, está claro. De bom foi que herdou alqueires e mais alqueires e rebanhos e mais rebanhos de ubres holandeses, repletos de leite B. O sacana namorou, noivou, casou e nada de errado aconteceu com ele. A gente morrendo de inveja!
Por isso é que dizem alguns que tem gente que tem mais força do que o destino.
O ex-capitão aviador, hoje coronel de gado e de gente, com empreendimentos na capital paulistana e na paranaense, muito bem casado, com filhos e netos, foi um deses, podem crer.
Esse eu conheci. Você conhece algum outro?
Ou acha que também foi destino, sina, fortuna, com as parcas trabalhando, desta feita, a favor e não contra?

Mário Galvão é jornalista e profissional de RP
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