"QUE SE CUIDEM OS MOINHOS!"
Edmilson Sanches
"Então, você é o famoso Sanches?"
Esse foi o comentário-pergunta de Roberto Crema, quando dei-lhe meu nome na sessão de autógrafos de seus livros, após sua palestra na Associação Médica (ele já havia pronunciado uma palestra, no dia anterior, na solenidade de abertura).
Sorri um pouco, mas não procurei entender o comentário daquele grande cidadão cosmo-holístico. O terapeuta Roberto Crema — que eu já conhecia de leituras, ele e Pierre Weil — é um desses brasileiros universais, transcendentais, quintessenciais, que estão em sintonia — e química — fina com os novos "comprimentos de ondas" do Terceiro Milênio.
Conversamos um pouco, ele e eu. Conversamos uma conversa "meio estranha, de iniciados", como avaliou um amigo médico ali perto.
Perguntei ao Crema o que seria dos simples, das pessoas que, por diversas razões, não alcançaram outras dimensões de conhecimento, de consciência cósmica. Respondeu-me biblicamente: os simples herdarão o Reino dos Céus. E qual o sentido, então, da Busca, de ser um buscador de conhecimento, da Essência? — perguntei-lhe, outra vez. Roberto Crema disse haver tipos diversos de simplicidade, entre eles a "simplicidade profunda", a do buscador de iluminação pelas vias do conhecimento, da bondade. É essa a sua simplicidade, Crema? "Sim, eu sou do tipo que busca a simplicidade profunda".
Disse-lhe, adiante, que a afirmativa de que ninguém banha-se duas vezes no mesmo rio não é verdade apenas porque o rio flui e, nessa constância, suas águas tornam-se outras: nós não nos banhamos duas vezes em um mesmo rio porque TAMBÉM NÓS MUDAMOS, como o rio, a cada instante, pela renovação das células, pelo reposicionamento dos neurônios, o que faz com que, momento a momento, sejamos, até cientificamente, um ser diferente, em corpo e em mente. Roberto Crema concordou, exemplificando que um homem não se casa com a mesma mulher duas vezes — no que ele tem inteira razão (a mulher pode dizer isso também do seu homem).
Voltei ao raciocínio, volteando uma pergunta-afirmação de Crema. Durante sua segunda palestra, disse ele: "Para onde vão os átomos de uma pessoa depois que ela morre? Eles permanecem aqui". Sendo assim, o rio em que me banho e o corpo que ele lava são herdeiros atômicos dos antecedentes que eu e o rio fomos, e somos, desde sempre, a base em que se assentarão e a massa com que se moldarão nossos pósteros (meus e do rio). Eu e o rio somos um. Um pequeno todo da parte do Todo maior, único, total.
Falamos de pessoas e personagens — Gonçalves Dias, Fernando Pessoa, Dom Quixote, Sancho Pança... Falamos de lugares — Brasília, Minas, Caxias... Falamos de "coisas", "linguagens", "visões", consciência... Perguntou-me o que eu fazia nesta cidade. Em sintonia, disse-lhe: "Luto contra moinhos".
Ao lado, um engenheiro-vereador recita gonçalvinamente: "A vida é combate / que aos fracos abate / que aos fortes, aos bravos, só pode exaltar".
Por sua vez, olhar mediado pelos óculos, Roberto Crema olha-me e diz, com aquela segurança quintessencial: "Que se cuidem os moinhos!...".
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Em casa, abro o livro de Roberto Crema. A dedicatória: "Sanches, pelo Guerreiro da Utopia Dom Quixote, desejando-lhe um Bom Combate e que todos os moinhos possam florescer."
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