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Artigos-->A LÍRICA BRASILEIRA DO SÉCULO XIX - ANÁLISE FORMAL E TEMÁTIC -- 31/01/2007 - 04:43 (ALZENIR M. A. RABELO MENDES) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
A LÍRICA BRASILEIRA DO SÉCULO XIX - ANÁLISE FORMAL E TEMÁTICA

Maria Alzenir Alves Rabelo Mendes



INTRODUÇÃO



A teoria lírica ocupou lugar de destaque nas discussões acadêmicas dos clássicos gregos aos clássicos latinos, que defendiam a pureza dos gêneros em sua divisão clássica, como gênero épico, lírico e dramático, assim como preceitua a Poética de Aristóteles. O gênero lírico, associado originalmente à música, é caracterizado pelas formas estruturadas em versos rimados e melódicos, dispostos nos vários tipos de composição que o gênero permite. Seu conteúdo expositivo volta-se à efusão dos sentimentos e das subjetividades, e é por isso, particularmente, poético.

Até o século XVIII, a teoria dos gêneros primava pela harmonia das formas ao gosto do cânone greco-latino. Com advento do Romantismo, movimento que se impôs ao doutrinamento estético, a até então pureza dos gêneros, defendida pelos aristotélicos e horacianos, sofreu suas primeiras e intencionais modificações: fundiram-se os diferentes gêneros, revestiram-se dos traços herdados uns dos outros, libertaram-se em muito do rigor da medida perfeita, dando origem assim a novas formas de expressão literária (Soares, 2002). A rebeldia estética dos escritores do período romântico pôs em rediscussão os gêneros e inaugurou a prática da teoria moderna, liberando os autores dos preceitos oriundos da hélade grega, como a queriam os romanos.

Neste trabalho, faremos inicialmente uma breve abordagem sobre gênero lírico e passaremos à análise da estrutura externa de poesias, através das quais visamos identificar os aspectos diferenciadores de cada estilo de acordo com a teoria dos gêneros literários e a proposta das escolas a que pertenciam os poetas: Gonçalves Dias, Álvares de Azevedo, Casimiro de Abreu, Junqueira. Freire e Castro Alves, precursores do Romantismo brasileiro. Em seguida passaremos à análise da produção poética de Raimundo Correia, Alberto de Oliveira, Olavo Bilac e Vicente Carvalho, escritores da escola parnasiana. E de Cruz e Souza e Augusto dos Anjos, ambos representantes do sincretismo simbolista.



O LIRISMO DOS ROMÂNTICOS



Os poetas brasileiros do século XIX praticaram esse novo modo de fazer poesia nos Estilos de Época que assinalaram a fundação de uma literatura de cunho nacional. E, nos seus momentos iniciais, no período do Romantismo, aventuraram-se para um estilo moderno, porém ambiguamente classicizando suas obras pela preferência às formas fixas dos gêneros literários.

Seus pretensos opostos, os parnasianos evadiram-se para “reinos dos amores e dos sonhos proibidos”, saudosos das amadas ou da pátria, subjetivaram seus temas tanto quanto os antecessores. Com os simbolistas, as ambivalências se repetiram e coube a eles, o resgate da estética, da forma perfeita e dos temas caros.

Nos três casos, a concepção de gênero que perpassa os textos é a concepção moderna que, segundo Wellek e Warren (1985) “é a soma de processos técnicos existentes que o bom escritor faz uso, dilatando-os”. De acordo com a teoria moderna, os gêneros também se dilatam, seja pela fusão das espécies, seja pela ampliação dos conceitos.

O termo “canção”, na definição de Hênio Tavares (2000), é um termo genérico que admite várias formas e temáticas. Com o Romantismo, a canção se revestiu de mais liberdade formal e conceitual, o que nos permite classificar os poemas do Romantismo brasileiro Olhos Verdes (Gonçalves Dias), O Poeta (Álvares de Azevedo) e Amor e Medo (Casimiro de Abreu) como sendo uma Canção. A primeira poderia ser também considerada Glosa, por causa do Mote (de Camões) que é desenvolvido no decorrer de cada estrofe, ou uma Balada pela preferência por estrofes em oitavas. Mas preferimos enquadrá-la junto às canções, pela variedade do metro (heptassílabo e tetrassílabo) e pela temática lírico-amorosa.

Os poemas do Romantismo Desejo (Junqueira. Freire) e Mocidade e Morte (Castro Alves) poderíamos considerá-los como ode ou como elegia, respectivamente, por manifestarem sentimentos ardentes, mas preferimos a classificação de cântico que, dentro da proposta romântica, se apresentam em estilo mais elevado e solene, embora as palavras ode e elegia, em grego, também signifiquem cantos, ou cânticos, compostos em estrofes simétricas e admitam a variedade do metro, mesmo que haja preferência pelo verso decassílabo. Em Desejo, os versos são decassílabos e hexassílabos, em Mocidade e Morte, os versos eneassílabos, decassílabos e hendecassílabos.

Das formas-fixas, encontramos somente Sonetos, de Fagundes Varela, com estrutura estrófica que se sustenta em esquema rímico regular nas duas quadras e nos dois tercetos, e a predominância dos versos decassílabos, que garantem, logo na leitura gráfica, sua inserção nos moldes parnasianos. No entanto, bem ao gosto romântico, a temática é lírico-amorosa e o conteúdo subjetivo é expresso em primeira pessoa do singular “Eu passava na vida errante e vago...” (v. 1- 1ª estrofe).



A FORMA E O GÊNERO NO TRINÔMIO ROMÂNTICO-PARNASIANO-SIMBOLISTA



No Parnasianismo e no Simbolismo, a forma preferida é também o soneto, mas cada escola o trabalhou a seu modo. Na poesia da primeira, embora a pretensa objetividade não tenha sobrepujado a subjetividade e a mística da segunda, ainda assim há uma certa “dureza” do verso burilado que contém a emoção lírica. A função emotiva cede espaço para a função poética, embora esta exista em todas as poesias.

O gênero lírico que para os românticos e simbolistas é vinculado à musicalidade e expressão do “eu”, para os parnasianos prende-se à escolha criteriosa do vocabulário que, buscando o efeito estético pelas figuras de harmonia: metro, rimas, aliterações e assonâncias, deve também produzir musicalidade.

No soneto Anoitecer (Raimundo Correia) a mudança do enfoque do “eu” para o “ele” (o mundo exterior), em nada prejudica o lirismo, pois este é assegurado pelas rimas suficientes. “Agonia/dia”; “raiados/destacados”; pela regularidade do metro: versos decassílabos com a tônica na 4ª, 6ª e 10ª sílaba métrica, e pelas aliterações “Fogem... fecha-se”. Como também pela linguagem poética que descreve o anoitecer, desviando os vocábulos de seu sentido denotativo para um figurado (conotativo): “Esbraseia o Ocidente na agonia” (1º- verso 2ª-estrofe). O primeiro vocábulo, longe de dizer que há brasas no pôr-do-sol, diz como fica o poente quando o sol se vai e a noite se aproxima, isto é, adquire tons avermelhados que lembram brasas.

Nos sonetos A Volta da Galera, de Alberto de Oliveira, e Inania Verba, de Olavo Bilac, e Velho Tema (Vicente Carvalho), o gênero lírico também não está na expressão do “Eu”, mas na linguagem, e nos fenômenos estilísticos, como por exemplo, no desvio da norma gramatical.

Em A Volta da Galera, a inversão da sintaxe, ou hiperbátos, chega gerar confusão de sentido (1º, 2º e 3º tercetos). Somente ao parafrasear, colocando, assim as frases na ordem direta é que chegamos ao entendimento do assunto ali tratado: a descrição do cenário e do ambiente enquanto uma velha galera se aproxima da praia de da cidade de Corinto, evocada pelo poeta.

Os sonetos Inania Verba e Velho Tema não diferem, nesse sentido: o lírico está no discurso poético, na forma-fixa de largo uso do gênero.

Os poetas simbolistas, também fazem uso do soneto, mas a “expressão do eu” converte-se em “mergulho no eu”, enquanto a discursividade parnasiana é substituída pela antidiscursividade, ou alogicidade, características da poesia romântica.

O gênero lírico acentua-se pela escolha das palavras e pelo efeito sonoro delas que, seqüenciadas, produzem musicalidade e impressão de luminosidade: “... fúlgidas brancuras/alvuras castas...” nos versos do soneto Braços, de Cruz e Souza. O mesmo efeito é alcançado em “Ogiva fúlgida.../ lustrais radiações intensas/cintilações de lâmpadas suspensas...” em Vandalismo, de Augusto dos Anjos. Nos dois fragmentos estão presentes também as rimas internas, como se não bastasse aos simbolistas o uso delas no fim de cada verso, geralmente decassílabo, em esquema rímico ABBA nas quadras e quase sempre simetricamente perfeitas.

A concepção de gênero que norteia a lírica dos românticos e simbolistas equivale à musicalidade, forma, mais a manifestação das aspirações da alma, a expressividade e afetividade das emanações sentimentais. No fazer poético, depois da função que lhe é peculiar, a poética, predomina a função expressiva ou emotiva.

Para os parnasianos o gênero lírico é transmitido no rigor da forma, numa linguagem poética discursiva, seja para descrever algo, ou para fazer questionamento sobre o poetar, no “conter da alma” pela forma preconizada, ainda que tal atitude possa resultar na redução da idéia como assim preceitua Olavo Bilac em Inania Verba: “A forma fria... é um sepulcro de neve.../A palavra pesada abafa a idéia leve” (2ª quadra).



A TEMÁTICA



Quanto à temática, a predominância entre os românticos é a amorosa com base sensual, associada ao senso de mistério, evocado pelos substantivos “noite, sonho, sono e leito”. O desnudamento dessa sensualidade contida se dá quando desvendamos o sentido das metáforas, que geralmente são representadas por elementos da natureza, como: fogo, raio, chamas e fumo. A recorrência a essas palavras em quase todos os poemas permite a percepção de símbolos de desejo erótico, camuflados por outras metáforas como: flor, perfume e luz. E pela idealização do amor e da mulher, concebida como um ser puro e inalcançável, ou quase como uma entidade imaterial no poema.

Na primeira condição, a da mulher pura, a musa de Amor e Medo, de Casimiro de Abreu, de quem poeta foge, ou “Da luz de fogo que [a] cerca”. Paradoxalmente, a luz “divina” opõe-se à idéia de fogo como um símbolo das paixões que, pelo doutrinamento religioso que rege a sociedade da época, devem ser contidas, do contrário, seu elemento desencadeador, a mulher, corresponde à perdição demoníaca.

Na condição de ser inalcançável, em Sonetos (Fagundes Varela), a mulher não pode ser representada como um ser humano com virtudes e defeitos, mas comparada a um cisne branco, simbolizada pela cor que corresponde a uma promessa de suprema felicidade. Em Olhos Verdes, de Gonçalves Dias, essa condição é subtendida pelos olhos que são comparados e definidos pelos elementos da natureza como: mar, prado e esmeraldas, símbolo de esperança que também pode ser compreendida como promessa de felicidade.

A terceira condição, a mulher ausente, é mais perceptível em Desejo (J. Freire), em que o poeta, nem mesmo por meio de metáforas, refere-se ao elemento feminino. Nele, a metáfora é proveniente do mundo invisível crido pelos cristãos: o “inferno” serve para representar os conflitos entre a carne e o espírito. Vencer o inferno da renuncia ao prazer erótico e se entregar ao inferno onde “se goza um gênero inaldito”, ou “[encontrar alguns suplícios] que o coração [lhe] domem (10º estrofe).

Em Mocidade e Morte a temática é a mesma dos outros românticos (amor), a escolha do vocabulário também está dentro do universo preferido, por eles (flor, sonho, seio, leito, peito, beijo, pranto), mas o desenvolvimento do tema é diferente, pelo tratamento que o poeta dá à musa inspiradora que passa a ser uma mulher de carne e osso, Castro Alves faz dela o principal motivo pelo qual não quer morrer: “.../eu quero viver.../no seio da mulher há tanto aroma.../no seus beijos de fogo há tanta vida” (1º estrofe).

Nas poesias parnasianas, a temática está voltada para o mundo exterior como: Anoitecer, onde o fim do dia vai sendo descrito como quem descreve um quadro; para os motivos clássicos gregos, como: A Volta da Galera, ou questionamentos sobre a força de expressão pela palavra: Inania Verba.

Em Velho Tema (V. Carvalho), como nos demais, a temática é universal em oposição à temática romântica que é individualista. E por ser descritiva e discursiva a poesia parnasiana é pobre de metáforas, mas podemos encontrar figuras de pensamento com perífrase: “fecha-se o pálpebra do dia...” (Anoitecer); personificação: “ouvia a noite” (A Volta da Galera); oximoro: o pensamento ferve... e a forma fria e espersa... (Inania Verba). Antítese: “o eterno sonho da alma desterrada/ é uma hora feliz, sempre adiada (Velho Tema).

Quanto aos simbolistas, a temática é voltada, como nos românticos, para o particular, com conteúdo espiritualista e místico com um toque de sensualidade como em Braços (C. e Souza) “... Tentadoras Serpes.../pompa de carne tépidas e flóreas.../ abertos para o Amor e para a Morte. Os temas são desenvolvidos através de palavras que fogem de seu sentido de dicionário e funcionam como símbolos, apenas com poder de sugerir, sem preocupação de narrar ou definir.

Tendo explorado as temáticas desenvolvidos no gênero lírico, suas diferentes formas e espécies, faremos uma breve explanação de como os poemas e sonetos estão segmentados.



MOMENTOS E SEGMENTOS



As poesias românticas estão estruturadas, geralmente em quatro, ou três grandes movimentos que se assemelham às cinco partes em que se dividem os poemas épicos: proposição invocação, oferecimento, narrativa e epílogo. Os românticos não obedecem a ordem tradicional, podendo as partes ser invertidas ou faltar alguma delas, o epílogo ou a síntese.

Ao dividir as poesias em movimentos, chegamos, na maioria delas, à apresentação que geralmente está na primeira estrofe como um resumo do assunto a ser desenvolvido; à narração, ou descrição, dependendo do tema; à invocação ou interpelação: momento em que o poeta se dirige a sua musa ou a alguma divindade; ao oferecimento, parte não obrigatória na poesia épica, e suprimida na poesia lírica; e a síntese que nem sempre acontece, podendo o poema ficar em aberto por meio de indagações... “de noite a mêdo/choraríeis em segrêdos/uma lágrima por mim? “ (O Poeta - A.A)

Em Ossa Mea e Vandalismo, o tema é espiritualista. Mas abordado de modo diferente. No primeiro soneto o eu-lírico revela alguém que se inspira em rituais católicos, na referência a sacrifícios diante de altares e na imposição de “Mãos que consagram.../mãos de esperança para as almas loucas.” Aludindo a um ser que deposita fé em algo, na vida após a morte e na redenção das almas pela interferência dos sacerdotes.

No segundo soneto, o poeta entra em conflito com os princípios de fé simbolizados pelas “catedrais imensas” que existem no seu coração, também simbólico, figurativo das crenças movidas pela emoção pura, talvez ingênua, tal como a que professaram os românticos. Princípios que o eu-lírico destrói ao penetrar nos mistérios das catedrais, desvendados pelos saberes do cientificismo que quebra a “imagem de seus sonhos” na tentativa de dissolver o conflito gerado no espírito do homem que se quer livre de dogmas.

O soneto, de modo geral, deve apresentar na primeira quadra o resumo do assunto a ser tratado no desenvolvimento. Mas nos sonetos analisados, somente Velho Tema obedece modelo tradicional, que deve conter um só assunto dividido em três partes: tese, antítese e síntese. Vicente de Carvalho inicia seu soneto fazendo uma assertiva: “Só a esperança... disfarça a pena de viver...” e reitera a afirmação ainda dentro da primeira quadra quando diz que a existência é uma grande esperança malograda, contrói desse modo o primeiro movimento do texto e nele a tese.

Na segunda quadra, onde também realiza o segundo movimento do poema, elabora a antítese: “O eterno sonho da alma desterrada.../é uma hora feliz, sempre adiada...”, para expandir a síntese nos dois últimos tercetos, momento em que o poeta explica o porquê de não alcançarmos a felicidade, tornando a existência uma esperança malograda: “Essa felicidade.../está sempre apenas onde a pomos/e nunca a pomos onde nós estamos.” Em Inania Verba essa estrutura perfeita não se repete nos movimentos, mesmo havendo antítese na segunda quadra, não há a tese, pois o poeta nada afirma, só questiona, dialogando consigo mesmo, isto é, com a própria alma: “— Ardes, sangras pregada à tua cruz...”

O soneto romântico de Fagundes Varela, Sonetos, contém o resumo do assunto na primeira quadra, trazendo duas informações no primeiro movimento: a primeira informação centra-se no modo de vida do poeta num tempo já passado “Eu passava na vida errante e vago”. A segunda informação refere-se ao surgimento de alguém na vida do poeta: “Mas tu, te ergueste peregrina e pura.” Depois desta quadra em estrutura bimembre segue-se a descrição metafórica deste ser quase mitológico, que vive entre o céu e a terra “beijava a onda num soluço mago/E a voz ungida.../Roçava as nuvens em divino afago”.

O sujeito que se enuncia no passado vem para o presente “ Hoje te imploro esse amor tão fundo” (2° terceto). E isto é comum em todas as poesias, o tempo é sempre presente, mesmo quando os fatos que motivaram o poema estão no passado, devidamente marcados pela colocação dos verbos no pretérito. No entanto é necessário distinguir a postura dos românticos da postura dos parnasianos e dos simbolistas diante da elaboração lírica.

Os românticos, cumprindo a proposta de quebrar a rigidez das normas clássicas, fazem da poesia o afloramento de idéias, sentimentos e emoções. Deixam de fazer poesia imitação da realidade objetiva para exprimir a sua realidade, subjetiva e individual, colocando-se na posição de “demiurgo”, de “gênio criador”, porém ausentando-se dos fatos palpáveis, evadindo-se no imaginário. Na condição de criador, o poeta idealiza a mulher e a natureza, esta última como um lugar perfeito de refúgio, do “bom orvalho” quase paternal (Amor e Mêdo); onde o “árabe errante” pode dormir à sombra fresca das palmeiras (Mocidade e Morte).

Os mitos bíblicos ou decorrentes de outras culturas são aludidos com freqüência. A “Madalena pura” de Casimiro de Abreu é uma alusão à prostituta, santificada por enxugar os pés de Cristo com os cabelos; o Ahasverus, em Castro Alves, mito épico da cultura hebraica, é símbolo da luta eterna do homem em busca da redenção.

O fazer poético dos parnasianos opõe-se às paixões e “fugas” dos românticos. Volta-se para a arte mimética da realidade observável, reelaborando-a pela escolha laboriosa de vocábulos que valorizam os encontros consonantais: “exprime, escrava, escreve, cruz, pregada, breve, deslumbrava, palavras...” (Inania Verba); a nasalização dos fonemas, que se estende até o simbolismo do “ocidente, delineam-se, tons, melancolia, informe, sombra ...” (Anoitecer); “brancas, opulências, florescências, latescências, dormências...” (Braços), como um recurso estético para garantir o efeito sonoro e sugestivo pela seqüência das palavras.





CONSIDERAÇÕES FINAIS



Dos pontos levantados nesta análise, gênero, tema e relação do poeta com a realidade, concluímos que o conceito de gênero que perpassa a lírica dos poetas das diferentes escolas mencionadas, é o conceito moderno que permite a fusão dos gêneros e das espécies, gerando daí uma nova espécie. Assim, as oitavas e os dísticos, usados alternadamente por Castro Alves em Mocidade e Morte, resultarem em outra espécie que podemos classificar pelo conteúdo e tom solene como Ode e/ou Elegia; e pela liberdade de forma: como ântico que é um dos tipos da canção.

Quanto aos temas, podemos concluir que a temática romântica parte do homem, do amor ou de elementos da natureza com representantes do ser ou de seus sentimentos. Desse modo, “fogo, raio, chama, amor e desejo” situam-se no mesmo campo semântico (paixão), vinculando nele o ser humano. Esta forma de vinculação se dá sempre pelo uso de metáforas que caracterizam o desvio da norma.

Quanto à relação do poeta com a realidade, se focarmos a escolha do vocabulário e o valor dado aos substantivos (sonho, ilusão, sono, alma...), bem com a preferência pelos verbos sensitivos e de estado (sentir, estremecer, suspirar, morrer, dormir, sonhar ...) geralmente em primeira pessoa, percebemos que a realidade exterior é relegada em função do egocentrismo romântico.

Nos parnasianos, o lirismo é contido pelo pensamento lógico, pela descrição detalhada do mundo exterior de onde o poeta extrai seus temas. Desse modo, justifica-se a preferência pelos substantivos concretos (Corinto, velas, água, praia, torre, luz, remos, curva, ombro, clâmide — A Volta da Galera). E na busca do equilíbrio entre o concreto e o abstrato em Raimundo Correia e Olavo Bilac. O primeiro por ficar num meio termo romântico/parnasiano/simbolista; o segundo, por ultrapassar o parnasianismo, questionando-o, prenunciando a nova proposta poética: a modernista.

Nas poesias simbolistas, os verbos e substantivos adquirem funções específicas para a proposta da escola que é a sugestão dos significados. Um verbo de ação como “ordenar”, pode se apresentar em locução como: “parece ordenar” (Ossa Mea), perdendo assim seu poder de concretização de um ato. O verbo “prender” (Braços), também não está aplicado como verbo de ação, pois é seguido de comparação “tentanizam como os herpes”. Porém os herpes não prendem, alastram-se pelo corpo em movimentos lentos quase imperceptíveis deixando suas marcas, talvez, indeléveis.

Em síntese, nas duas últimas escolas literárias do século XIX, o fazer-poético vai se tornando consciente: os diálogos dos românticos com musas inalcançáveis deslocam-se para o diálogo do eu consigo mesmo (Inania Verba), representado, agora, pelo coração como uma parte de inseparável de si (Vandalismo), ou como um das partes que estruturam as recém-descobertas, na época, estruturas mentais.





REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS



SOARES, Angélica. Gêneros Literários. São Paulo, Ática, 2002.

TAVARES, Hênio. Teoria Literária. Villa Rica/Itatiaia, Belo Horizonte, 2002

WELLEK, Rene & WARREN, Austin. Teoria da Literatura. Lisboa, Europa-América, 1971.













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