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Contos-->Um minuto, uma eternidade -- 04/10/2002 - 17:30 (Marcelo Santos Barbosa) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Eu era jovem quando descobri os mistérios da noite; eu era belo e cheio de vida, mas desisti de tudo e entreguei minha alma e hoje reúno as trevas para o meu prazer.
Meu nome é André, gostaria de ganhar os parabéns de vocês, faz exatamente 30 anos que fui transformado, que fui tirado do meu mundo ensolarado por meu irmão de sangue Iam, um vampiro muito mais antigo que eu, Europeu.
Sou de São Paulo, nascido, criado e morto na capital, depois de tudo, já conheci outros lugares, mas há alguma coisa que me prende aqui, talvez o povo, talvez a violência ou até a poluição. Vou ser breve na minha história, vocês já devem ter ouvido isso milhares de vezes de outros bem mais importantes que eu, mas...
Vamos direto ao período onde tudo aconteceu, pois não vou ficar aqui falando de minha infância que foi linda, feliz, nem da minha confusa adolescência onde minha mente era possuída por pensamentos sexuais, e só.
1972, sim, esse é o ano; São Paulo era tranqüila então, se comparada aos dias de hoje; eu me divertia com o colorido das roupas, com os homens de cabelos compridos, calças boca-de-sino, esse sempre foi o problema do Brasil, as modas chegavam aqui com um atraso incrível, mas não quero discutir isso também. Eu trabalhava como barman numa casa noturna na Rua Augusta, prá mim era o emprego ideal, ganhava uma grana, bebia de graça e ainda no final da noite acabava na cama com uma mulher diferente, meu sonho de juventude. Era uma rotina agradabilíssima, fiz muitos contatos, amizades...Uma dessas amizades foi com um inglês chamado Iam, ele era alto demais para os padrões medianos brasileiros, devia ter uns dois metros no mínimo, muito simpático, falante, um contador de histórias nato. Na verdade ele só aparecia na boate para conversar, nunca saia com ninguém, nunca bebia, só contava histórias; ele prendia a atenção de todos, era expert no que fazia. Comecei então a prestar mais atenção em suas histórias e acabei viciando nesse ritual, tanto que com o tempo comecei a ficar conversando com ele por horas e horas e sentia que suas palavras tinham um efeito diferente sobre mim, despertavam umas vontades quase doentias de largar tudo e me perder pelo mundo.
Eu era meticuloso, tudo o que eu pensava em fazer pensava durante muito tempo, mas o incrível foi que tudo isso foi decidido em apenas duas noites de conversas com Iam. Uma noite ele veio a mim e me disse que precisava falar comigo e se fosse possível que eu saísse mais cedo, pois tinha que se retirar antes do amanhecer; e assim foi, saímos andando pelas ruas e quando entramos na Avenida Paulista paramos e ficamos observando sua beleza:
- André, o que você sente quando vê essa beleza toda?
- Sinto-me pequeno, mas feliz por ter a oportunidade de participar dela.
- Eu já viajei tanto, vi tantas coisas, senti outras tantas que acho egoísmo tentar guardar isso só para mim, por isso conto tudo o que já vi.
- Mas Iam, você descreve coisas que sinceramente são difíceis de se acreditar...Ele me interrompeu com um olhar triste.
- André...Meu amigo André, você gostaria de me acompanhar nessas minhas aventuras? Você gostaria de ver tudo o que eu vi? Sentir tudo o que senti? Peça-me, só não pense que é mentira!
- Não estou dizendo que é uma mentira total, mas...Com o indicador ele calou minha boca e me pediu que fechasse os olhos.
- Tente liberar sua mente André, pense num lugar agradável, agora veja com a alma o que digo a todos.
Flashes de lugares, de pessoas passaram pela minha cabeça numa velocidade inacreditável!
Lugares e culturas diferentes passaram e no meio de tudo uma coisa se conservava, imutável, Iam e seu sorriso generoso, nada, além disso, ficou tempo suficiente na minha mente que eu pudesse me lembrar. Com uma força enorme fui tirado do meu transe e abri meus olhos, assustado e, meio tonto, não me contive: - O que foi isso!
- André só lhe dei uma prova que não sou nenhum mentiroso. Disse sorrindo.
- Vc é um ilusionista, um mágico, deve fazer isso a toda hora! Mas comigo não! Deixe-me, não gosto desse tipo de coisa.
- Vou lhe dizer o que sou meu amigo, mas quero que mantenha a calma, pois nada de mau lhe farei. Nesse momento parece que ele se iluminou, não sei explicar.
- Eu sou um assassino profissional, mato por prazer e para conseguir sobreviver.
- Não atire, não me mate! Foram as únicas coisas que pude dizer. Com um sorriso largo e um pouco de humor britânico me disse com calma.
- André, só uso armas brancas, veja. Suas presas saltaram da boca, enormes! Viu? Na verdade sou um vampiro, me alimento do sangue, das energias e histórias de minhas vítimas, mas algo em você me atraiu, não quero nada de você exceto que seja meu acompanhante.
Muita informação fantástica para minha cabeça de homem de bairro de uma cidade de terceiro mundo; aqui no Brasil acreditamos em várias crenças, várias religiões existem para iludir-nos, mas um vampiro? Muita ficção prá mim.
Quando me virei prá fazer-lhe uma pergunta ele havia sumido e quando me virei para onde estava antes, lá estava ele sorrindo, isso me confundiu muito.
- Como fez isso?
- Uma de minhas habilidades é poder ler pensamentos e você queria que eu provasse o que eu realmente sou, não?
- E isso nada me prova, quero vê-lo se alimentando.
- Você vai ver, com certeza, mas quero lhe contar minha história, isso se estiver disposto a me acompanhar, what do you say kid?
- Hã? Não falava uma palavra de inglês naquela época. Tem um dinheirinho nisso tudo?
E o que ouvi foi um gargalhada contagiosa, e eu mesmo percebi qual estúpida foi minha pergunta; o homem estava me oferendo um mundo e eu pensando em dinheiro! Calei-me.
- Façamos o seguinte, invente alguma coisa no trabalho hoje e me encontre às oito horas naquela praça suja mais adiante, pense no que quiser e do jeito que quiser, mas quero uma resposta, ok?
Diante dos meus olhos ele sumiu, como se nunca estivesse ali antes; quem disse que preguei os olhos naquela manhã? E quando consegui cochilar ele me veio em sonho acompanhado de uma mulher extraordinária e com ela fazia uma dança extremamente erótica e no final cravava as presas em seus seios! Isso me deixou maluco, sendo eu um tarado sexual naquela época, vocês podem imaginar como eu acordei...
Mas o problema foi saber qual praça ele havia se referido; praça suja mais adiante? Voltei ao começo da Avenida Paulista e comecei a descê-la, e senti que alguma coisa me guiava, peguei a Rua da Consolação e segui, logo me dei conta de qual praça ele falara.
Para quem não conhece São Paulo, a Praça da República desde àquela época é um belo lugar, mas muito sujo e cheio de mendigos, travestis e comerciantes, acho que foi por isso que ele escolheu tal lugar. Quando cheguei lá estava ele sentado, conversando com algumas pessoas, rindo como sempre, mas ele se destacava dos outros, parecia uma figura colada num lugar totalmente diferente do de sua origem. Quando me viu sorriu e me abriu alegremente os braços, deu dinheiro a alguns mendigos, o que depois me disse que o fez para garantir nossa tranqüilidade e sem que eu pudesse falar começou:
- Nasci em Birmingham, Inglaterra no ano de 1798, mas como você bem pode ver pareço ter uns dez anos a menos, desculpe; Nasci de uma família de trabalhadores braçais, nunca tive mais do que o necessário para não morrer de frio ou fome; estudei, mas minha vida se transformou quando perdi meu pai e logo depois minha mãe. Sai de minha cidade e fui parar em Liverpool, onde logo arrumei trabalho na zona portuária; trabalhava de Sol a Sol e por vezes pelas noites escondido sob os fogs ingleses. Eu era belo e por força do trabalho meu corpo ficou bem feito, musculoso, de chamar a atenção, por isso era notado onde quer que eu fosse; nunca me prendi a ninguém, nunca dei meu coração a uma mulher, mas assim como você, me diverti muito naqueles tempos.
Não conseguia abrir minha boca nem sequer para respirar, era hipnótica a sua narração e quanto mais ele falava, mais eu me prendia a ele.
- Mas a vida nos trás as maiores surpresas nos momentos menos esperados; numa noite fria eu trabalhava como sempre quando ouvi um som que nunca havia ouvido, vinha de todas as partes, nunca vi quem me transformou, pois os fogs ingleses eram muito densos; no meu ultimo segundo de vida as únicas palavras que ouvi foram: - Come on little bloody shit, kill my hungry...
- Senti uma mordida muito forte no meu pescoço e imagens jogadas a esmo na minha mente e desmaiei; só acordei com um gosto maravilhoso de sangue entrando pela minha garganta e quando tentei me levantar recebi um golpe forte na cabeça que me fez desmaiar de novo, quando acordei era imortal, era forte e meus sentidos ficaram tão apurados que ainda hoje me espantam. Depois disso viajei por lugares que sempre quis conhecer, que só existiam nas minhas fantasias infantis.
De vez em quando parecia que uma tristeza forte baixava na sua face e ele não conseguia disfarça-la, me olhou de uma forma terna dentro dos meus olhos me disse:
- Depois de tudo que você ouviu, concordaria em me acompanhar? Em dividir comigo novas experiências? Em troca viajaria, ganharia um bom dinheiro se essa for sua preocupação e em troca só o que te peço e sua companhia. O que me diz?
- Bom, a proposta é tentadora, você me parece de confiança, senão já teria me atacado, é um trabalho estranho, mas preciso saber de mais um só detalhe.
- Pergunte o que quiser. Sempre solicito.
- Os da sua espécie ainda tem experiências sexuais? Pois sem querer ofender, você tem um jeito meio feminino e não quero ser nenhum escravo sexual de ninguém.
- Meu jovem, você não sabe de nada. Temos um prazer muito mais explendido do que apenas nos meter no meio das pernas de lindas mulheres e francamente, me chamar de afeminado não foi nada educado de sua parte!
- Desculpe-me, mas não costumo mentir, sou sincero e leal, mas não gosto de intimidades com homens. O que ouvi foi novamente aquele sorriso inigualável.
Fui direto para a boate e pedi minha demissão e me despedi das mulheres, estava no final da noite literalmente acabado, mas voltei prá casa caminhando e procurando compreender tudo o que Iam tinha me dito; como sempre gostei de mistérios, resolvi mergulhar de cabeça nessa aventura sobrenatural.
Embarquei junto com Iam num vôo noturno para a Europa; mesmo à noite o lugar inspirava muita diversão e conhecimento. Desde o início mantivemos uma rotina diária: dormir de dia e nos divertir a noite, demorei um pouco a me acostumar, mas depois não via mais diferença.
Com o devido respeito que eu tinha para com ele na época, tínhamos nos tornado companheiros, amigos até; sua rotina era minha rotina, acho que a única coisa que nos diferenciava era o modo como nos alimentávamos.
Uma noite Iam me olhou profundamente e me fez uma pergunta que eu juraria que nunca faria:
- André venho lhe estudando há muito tempo, seus sonhos, seus desejos e suas fraquezas e você se tornou, ao meu ver, digno de minha amizade...Vc já pensou em ter tudo o que tenho? Meus poderes, minha...Eternidade?
- Sim! Tive a impressão de ter respondido mesmo antes de Iam ter terminado.
- Mas tenho medo do ritual, da expectativa, mas o que está me oferecendo é muito mais do que mereço.
- Não quero que você tema, esqueça isso por enquanto, é melhor.
Mas não houve tempo, quando me virei Iam se atracou em meu pescoço e nesse momento vi o maior espetáculo de luzes e sensações que já havia sentido; depois uma dor mortal no peito e na cabeça...Doce gosto de sangue, borbulhando uma outra espécie de vida em mim.
Quando acordei me senti tonto e não me reconheci; me senti outro e vibrei: - Sou imortal!
Iam apareceu logo em seguida e me olhou de longe, certo de que tinha feito um belo trabalho.
- André, não conheci quem me transformou, sobrevivi graças aos mitos da literatura, aprendi tudo o que sei lendo, mas não quero que isso aconteça a você, venha, vamos conversar.
- E foi ai que aprendi tudo o que sei, tudo o que preciso; me tornei irresistível para as mulheres, quando escolhia minhas vítimas, fazia com que parecesse uma conquista comum e tudo começava com os populares “torpedos”, num bar de solteiros...Um poema para as morenas:
“Negros teus olhos,
Misteriosos e densos
Como a noite.
Na tua beleza silenciosa eu vivo.
Oh mulher!
Em ti, bebo a eternidade “.
Ou,se fosse o caso, outro para as loiras:
“No dourado dos teus cabelos
Aquecem-me os raios de Sol
Que eu perdi,
E no mar verde dos teus olhos
Eu mergulho.
Em ti, bebo a eternidade ““.
E estava feito, nada comparado à sensação sexual, mas já me satisfazia; de vez em quando eu alimentava meu lado voyeur observando casais, mulheres no banho.
Hoje sou um cidadão do mundo, sempre de bem com as forças da natureza, mas triste com duas coisas que perdi: a amizade de Iam, que depois de pouco tempo seguiu suas aventuras e minha saudade mais profunda, essa que nunca mais vou poder saciar, uma coisa que nem o sangue consegue suprir...O doce e reconfortante sabor do chocolate.
See ya!
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