PEIXE VOA, MEU IRMÃO?
Em Cuiabá, um amigo,
agrônomo e advogado,
deu-me um esclarecimento,
que me fez aliviado,
pois duas coisas que vi
- e sua razão não entendi -
deixaram-me angustiado.
Embora sem ativismo,
defendo a preservação
do lindo verde das matas,
das plantas, do nosso chão,
dos pássaros (inofensivos),
mesmo dos bichos nocivos
que povoam o sertão.
Quem não gosta de uma sombra?
Ou de trepar em mangueira
e colher o fruto gostoso,
pra comer à sua maneira,
ouvindo um bem-te-vi,
um sabiá, um juriti,
numa tarde domingueira?
E, em casa, não é bonito
o verde alegre das plantas
e o odor agradável
dessas criaturas santas:
samambaias, bulgarim,
a roseira, o jasmim,
e outras belezas tantas?
Pois bem, eu tinha, em casa,
uma roseira enxertada:
produzia rosa branca,
como também encarnada.
E eram tantas, que eu cortava,
pois até galho quebrava
da roseira carregada.
Como ia viajar,
durante o mes de janeiro,
pra roseira não secar,
improvisei um chuveiro
que ficasse gotejando,
as suas folhas molhando
durante o tempo inteiro.
Mas ao chegar da viagem,
que tristeza! que espanto!
Minha roseira querida
acho que sofreu quebranto:
as rosas estavam roxas,
e a roseira, tão frouxa...
Só podia ser ‘encanto’...
Chamei o amigo Eliezer,
mostrei-lhe a situação,
e ele, com sua calma,
veio com a explicação:
“Essa planta afogou-se.
Veja a cor, asfixiou-se,
já não tem mais solução.
As árvores, mano velho,
têm também que respirar.
E o fazem pelas folhas,
pois não há outro lugar,
e a água, sempre pingando,
foi entrando, foi entrando,
até ela se afogar.”
Depois de mais alguns chopes,
o Joazir falou: "Tio,
como é que nasce peixe,
sem influência de rio,
em lagoa, em açude,
em lago, tão a miude?"
Respondi: "Nem desconfio."
"São as aves pescadoras
- veio o Eliezer explicar -
que fazem esse trabalho,
verdadeiro semear:
sem saber, carregam ovas
nos pés - disso temos provas! -,
no seu constante migrar".
Não duvidei do que ouvi,
pois isso esclareceu
uma dúvida que eu tinha
como segredo só meu:
uma vez, num teco-teco,
viajando, vi um treco
que meu corpo estremeceu.
No meio de um nevoeiro
muito forte, carregado,
chegando a Barra do Garças,
eu e o Jonas, deputado,
vi passar, perto de mim,
um enorme surubim,
que aqui se chama pintado.
Arregalei bem os olhos,
prá poder não me enganar
faltou a minha kodak
ali, prá fotografar.
E disse ao Jonas Pinheiro:
"Olha o peixe, companheiro!"
Mas não deu pra ele enxergar.
Também na velocidade
que o avião ia voando,
e o escuro dentro da nuvem
que a gente ia passando,
só mesmo quem teve sorte
pôde contemplar o porte
do peixe, no ar, "nadando"...
Com esse papo pude, então,
o que vira, entender:
dos pés das aves, umas ovas,
no ar, hão de se perder,
e assim é que peixes crescem
nas nuvens e, na chuva, descem
para em algum lago viver.
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