PETIÇÃO EM VERSOS PARA LIBERAR VIOLÃO
O desembargador Arthur Moura, do Tribunal de Justiça da Paraíba, quando Juiz da Comarca de Campina Grande, foi procurado pelo advogado e repentista Ronaldo Cunha Lima para liberar o violão de um boêmio, detido pela polícia. A pedido do magistrado, a petição foi formulada em versos, e o despacho, condensado numa quadra.
O PEDIDO
O instrumento do crime que se arrola
Neste processo de contravenção
Não é faca, revólver, nem pistola,
É simplesmente, doutor, um violão.
Um violão que, em verdade,
Não matou, nem feriu um cidadão
Feriu, sim, a sensibilidade
De que o ouviu vibrar na solidão.
Violão é sempre uma ternura
Um instrumento de amor e de saudade
O crime a ele nunca se mistura
Inexiste entre ambos afinidade.
O violão é próprio dos cantores,
Dos menestréis de alma enternecida,
Que cantam as mágoas que povoam a vida
E sufocam as suas próprias dores.
O violão é música e é canção
É sentimento, é vida, é alegria,
É pureza e néctar que extasia
É a dor espiritual do coração.
Seu viver, como o nosso, é transitório,
Mas seu destino não, se perpetua,
Ele nasceu para cantar na rua
E não para ser arquivo de cartório.
Mande soltá-lo pelo amor da noite,
Que se sente vazio em suas horas,
Pra que volte a sentir o terno açoite
De suas cordas leves e sonoras.
Libere o violão, doutor Juiz,
Em nome da justiça e do direito,
É crime, por ventura, um infeliz,
Cantar as mágoas que lhe enchem o peito?
Será crime, afinal, será pecado,
Será delito de tão vis horrores
Perambular na rua o desgraçado
Derramando na praça suas dores?
É o apelo que aqui lhe dirigimos,
Na certeza de seu acolhimento,
Juntada desta aos autos, nós pedimos,
E pedimos, também, deferimento.
O DESPACHO
Para que eu não carregue
Remorsos no coração
Determino que se entregue
A seu dono, o violão.
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