No mundo existem mistérios
Que ninguém sabe explicar
Ocorrem por toda parte
Capazes de arrepiar
Como este que conto agora
Que a muita gente apavora
E dá medo até falar
Desafiando os perigos
Peço aos anjos proteção
Que me livrem das maldades
Dando muita inspiração
Para cumprir o meu trato
Que nestes versos retrato
Sem temer assombração
O fato que me contaram
É bastante curioso
De um tal Bode Berrador
Encantado e perigoso
E conforme me foi dito
Neste momento repito
Mais um relato do povo
Num lugar em Brumado
Chamado Pau-de-Colher
A história aconteceu
Acredite quem quiser
Ali ninguém faz segredo
Todos do Bode têm medo
Homem, menino e mulher
O episódio principia
Com um homem enforcado
Numa velha baraúna
E pelos pés amarrado
Há quem diga que surgiu
Desse homem que no rio
Também tenha suicidado
Isso porém não importa
Pois não nega o sucedido
Pelo contrário reforça
O que sempre é repetido
Por toda a população
Numa mesma conclusão
Sobre o Bode aparecido
Todos falam com receio
Do bicho mal-assombrado
Ao perguntar me disseram
Moço – é bom ter cuidado –
Não se meta a corajoso
O bode é malicioso
E pode sair chifrado
Mesmo sabendo do risco
Não reneguei meu intento
Pois queria se pudesse
Ver de perto o peçonhento
Isso disse a um morador
Credo cruz! Ele bradou
E se benzeu no momento
Um certo dia na Feira
Conheci uma Senhora
Que bastante prestativa
Se mostrou naquela hora
Dizendo vou responder
O que o Senhor quer saber
Sobre o Bode sem demora
Sêo Moço vou lhe dizer
Com toda sinceridade
Sou catingueira nativa
Mulher que fala a verdade
Não sei se é santo ou diabo
Pois esse Bode Encantado
De ninguém tem piedade
Latindo feito cachorro
Ou miando feito gato
Assobia feito gente
Ora canta como sapo
Berra, bufa e sapateia
Em noite de lua cheia
Na baixa e dentro do mato
Quando é safra dos imbus
O bicho fica assanhado
Na Caatinga ninguém entra
A não ser acompanhado
É um trovejo Sêo Moço
Que causa grande alvoroço
Lá naquele povoado
Tem gente até que se mija
E toda mulher arrepia
Quando se fala do Bode
Ninguém faz uma arrelia
Não há reza ou benzeção
Que dê fim na assombração
Que atormenta a Freguesia
Este Bode Berrador
Já fez vaqueiro correr
Moça donzela chorar
Muito valente tremer
Mais parece alma penada
Pela mãe excomungada
Só mesmo vendo pra crer
Os antigos contam fatos
E vivem a repetir
Os meninos se ajuntam
Atentos querendo ouvir
Dessa forma preservando
A lenda que vão narrando
Desde o passado ao porvir
Desse bicho ninguém sabe
Qual a fisionomia
Mas que seja mesmo um Bode
É a forte teoria
Mas outros acham que é
A imagem de “Lucifé”
A fazer estripulia
A cultura brasileira
Dessa maneira viceja
Mora na boca do povo
E na índole sertaneja
Gente cheia de esperança
Que da labuta não cansa
No sertão onde peleja
No fato que foi contado
Se não pude ser fiel
Fica por conta das regras
Quando se faz um cordel
Para agradar o leitor
Se os versos não têm humor
Amargam mais do que fel
Que lá em Pau-de-Colher
Este cordel seja lido
Pelo povo e nas Escolas
Deve ser distribuído
Entre amigos e parentes
Que de lá vivem ausentes
Sem ter do Bode esquecido
Para Sara e Luciano
Que merecem o meu apreço
Ofereço este folheto
De coração agradeço
O interesse revelado
Pelo fato ora narrado
Cuja amizade é o preço
Dou adeus aos meus leitores
Com a minha gratidão
Só quem gosta da Caatinga
Demonstra com emoção
A beleza que há nela
E a Natureza revela
Neste sofrido sertão