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Artigos-->Breves Considerações sobre a literatura erótica -- 30/12/2010 - 16:53 (Carlos Higgie) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Breves considerações sobre a literatura erótica

Por Carlos Higgie (do livro Caleidoscópio)

“Tudo o que se mexe é pornográfico.”

Jean-Luc Godard

Produzir textos eróticos, escrever sobre algo tão intenso e tão humano, parece que condena àqueles autores, que a tal tarefa se lançam, a uma espécie de segundo plano, a mergulhar num

mundo obscuro, a serem tachados de produtores de subliteratura ou simplesmente pornografia. Muitos críticos acreditam que produções com alto conteúdo erótico não acrescentam nada à Literatura e até distorcem um pouco a percepção. Para eles, são livros sem grande conteúdo literário que, apoiados na sua carga erótica, caem no gosto do público e chamam à atenção das forças conservadoras, alimentando, ainda mais, sua fama ao serem censurados e proibidos.

Vários autores concordam que existe uma linha indelével, quase imperceptível ou talvez inexistente, entre o erótico e o pornográfico. Quem é capaz de determinar os limites? De afirmar, com autoridade e livre de preconceitos, o que é pornografia e o que é erotismo? Tudo está na mente de quem lê e interpreta.

Afirma categoricamente Octavio Paz, na sua obra Um Mais Além Erótico: Sade (1999)

Todos os atos eróticos são desvarios, desarrumações; nenhuma lei, material ou moral, os determina. São acidentes, produtos fortuitos de combinações naturais. Sua diversidade mesma delata que carecem de significação moral. Não podemos condenar uns e aprovar outros enquanto não saibamos qual é sua origem e a que finalidade servem. A moral, as morais, nada nos dizem sobre a origem real de nossas paixões (o que nos impede de legislar sobre elas, atrevimento que deveria ser suficiente para desacreditá-las).

Na corda bamba, equilibrando-se para não cair no ridículo, no ostracismo ou no abismo da condenação pública, o autor que se atreve a produzir relatos, carregados de erotismo, mergulhando nesse mundo incrível, borbulhante, que é a sensualidade humana, deve entender que nem sempre será reconhecido, apesar de ser lido com fruição na intimidade.

Alexandrian, na sua Historia de la literatura erótica (1991), destaca que:

a pornografia é a descrição pura e simples dos prazeres carnais; o erotismo é a mesma descrição re-valorizada, em função de uma idéia do amor ou da vida social. Tudo aquilo que é erótico é necessariamente pornográfico por extensão. É muito mais importante distinguir entre o erótico e o obsceno. Neste caso considera-se que erotismo é tudo aquilo que torna a carne desejável, mostrando-a em seu esplendor ou florescimento, inspirando uma impressão de saúde, de beleza, de brincadeira prazerosa; enquanto a obscenidade desvaloriza e associa-se com a sujeira, com as imperfeições, com as piadas escatológicas e os palavrões.

Escritores e poetas, vencendo a censura e a autocensura, se aventuraram pelos caminhos do erotismo, criando obras que no seu momento foram consideradas malditas, mas que venceram o tempo e permanecem até hoje. Alguns deles viram sua obra condena ao ostracismo, enfrentaram o desprezo público e foram presos por escrever e publicar sobre algo que todos, desde a remota pré-história, praticam e gozam.

Boccaccio, Apollinaire, Henry Miller, George Bataille, Vladimir Nabokov e Anaïs Nin, só para nomear alguns, incursionaram, com diferente sorte, no gênero erótico. Até o nosso Carlos Drummond de Andrade avançou nesse campo, deixando o seu livro Amor Natural, totalmente dedicado à poesia erótica. Ali podemos encontrar versos que fariam qualquer leitor mais

recatado ou conservador perturbar-se e corar: (Era manhã de setembro/ e/ ela me beijava o membro) escreveu Drummond; (Ó tu, sublime puta encanecida, /que me negas favores dispensados/ em rubros tempos, quando nossa vida/ eram vagina e fálus entrançados) lavrou noutros versos o poeta, avançando no perigoso território que separa, sem separar, o erótico do pornográfico ou simplesmente chulo. Não teve medo, na obra que foi publicada após sua morte, de utilizar imagens e termos que a maioria dos leitores considera agressivos ou reles, mesmo praticando diariamente, com prazer ou por obrigação, os atos amorosos, ou não, que tantos versos e prosas inspiraram e continuam a inspirar.

Affonso Romano Sant’Anna, que assinou o prefácio do livro Amor Natural, diz que “está na hora de o erótico (ou pornográfico?) fazer parte natural da obra dos poetas. Não há de que se envergonhar. Afinal, há milhares de anos que amamos desvairadamente de todas as formas registradas ou não no Kama Sutra e nos murais de Pompéia”.

Nesse sentido, no de abordar com naturalidade um tema tão humano como qualquer outro, os romancistas e contistas ousaram muito mais, apesar de alguns poetas, lembremos de Bocage, não temerem a condenação pública, lavrando versos que sem dúvida escandalizam até nos dias de hoje.

Sem dúvidas: esta na hora de considerar a literatura erótica como parte integrante da Literatura e não um subgênero condenado a ser lido na intimidade morna e carregada de penumbras. A beleza e o valor de uma obra não estão naquilo que é descrito ou apresentado, mas em como é descrito e como é apresentado. Cabe ao contista contar, ao romancista romancear, ao poeta versificar, sem se autocensurar, pegando a vida de jeito e plasmando no papel ou no mundo virtual aquilo que mexe com nosso corpo, com nossas almas, com nossa cabeça. Somente a hipocrisia que abunda na sociedade, em qualquer parte do mundo, não permite ver que existem coisas mais obscenas que uma narrativa erótica: a morte, as doenças que nos afligem, a guerra, a violência que vemos diariamente na televisão ou lemos nos jornais, são muito mais obscenas e prejudiciais ao ser humano que um conto, uma história que revela segredos de alcova que, há muitos séculos, já não são secretos para ninguém.

Escrever sobre o amor e o encontro dos corpos é, também, uma maneira lícita de descrever a intensidade da vida humana. Cabe ao leitor julgar se é boa ou má literatura, não se é moral ou

imoral.

Citações:

1 PAZ, Octavio. Um Mais Além Erótico: Sade.Tradução: Wladir Dupont. São Paulo: Mandarim, 1999.

2 Alexandrian. Historia de la literatura erótica. Trad. para o espanhol de Daniel Alcoba. Bogotá: Planeta, 1991.

Contato com o autor: chiggie@terra.com.br



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