Usina de Letras
Usina de Letras
74 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62236 )

Cartas ( 21334)

Contos (13264)

Cordel (10450)

Cronicas (22537)

Discursos (3239)

Ensaios - (10367)

Erótico (13570)

Frases (50634)

Humor (20031)

Infantil (5434)

Infanto Juvenil (4769)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140808)

Redação (3307)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1960)

Textos Religiosos/Sermões (6191)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Contos-->FOI O VENTO QUI PASSÔ! -- 06/07/2000 - 00:38 (Vera Maria dos Santos) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
FOI O VENTO QUI PASSÔ!

— Ah! meu Deus, mãe me faz tanta falta. Eu não sei até que dia vou agüentar aquela natureza de pai, que não é mole! Tenho que carregar aquela cruz até o dia que Deus quiser. Ele não quer vir morar na cidade. Diz que nasceu na roça e morre lá mesmo. Que se não tiver ninguém para cuidar dele, que se acaba lá sozinho mas, pra cá, “só vem com os pés pra frente”.
Ele está com noventa e quatro anos e tem uma cabeça dura que eu nunca vi igual na face da terra. Mas toda vida foi assim. Mãe, quando viva, se queixava muito. Eu, como filha única do casal, não posso deixá-lo sozinho, tenho que ir para a roça todo final de semana cuidar da roupa da comida e da casa dele. E olhe que daqui pra lá é uma “boa puxada”, uma légua e meia!... E eu vou a pé. É uma luta essa minha vida!
Nesse dia eu me levantei cedo, o sol ainda não tinha saído, quando me mandei pra lá sozinha e Deus. Quando cheguei na roça, a casa estava toda revirada e ele reclamando:
—Tô aqui me acabando à míngua. Tombém é isso mermo, quem espera pelos zouto, sempre passa por esses vexame... Ai! Que dor nessa perna.
— E o que foi pai?
— Ocê num tá vendo não Maria?!!
— Ah! Pai, não me diga que ainda é aquela estória do cansanção!
— Não, Maria, aqui foi o vento qui passô e fez essa disgraceira na minha perna. Agora eu só caminho manquejando.
— O senhor tomou o remédio que eu mandei por Dazinha?
— Eu não, sei lá o que era aquilo! Eu sacudi no mato.
— Tá certo, depois o senhor quer ficar bom sem tomar nada. Levante aí a perna da calça pra eu ver como é que está o ferimento.
— Mas pai, como tá inchada a sua perna! Essa semana eu vou levar o senhor ao médico.
— E quem vai? Eu? Há! Há! Há! Eu num vou não. Esses médico num sabe de nada! Aqui eu já li disse: foi o vento qui passô, por isso minha perna tá assim. Num tem jeito não! Me diga Maria, quá é o dotô que vai sabê dum reméido que cure doença do vento? Hum!
— Mas pai, como é que o vento passa e deixa a perna de uma pessoa tão inchada? Isso é conversa!
— Ah! Ocê num sabe não, foi morar na rua e sisqueceu das coisa daqui. Eu vou li contá: Maria, tem gente boa e ruim na face da terra; quando a pessoa é boa e morre, passado um tempo adepois do interro a cova do sujeito fica lachada e o corpo vira um santo.
Mas quando é gente ruim, a cova lacha tombém, só que o corpo do sujeito vira uma seprente. O padre sabendo desse acontecimento, na época da Santa Missão, vai no cemitéro à meia noite, com uma gaiola toda de ferro que só tem um buraco bem pequeno em riba. Abre a cova desse sujeito ruim, tira a seprente e prende dento dessa gaiola que é fechada cum cadiado pra ela num fugir. Adepois disso, o padre vai dereto pra o meio do aceano e joga a gaiola com seprente e tudo. De tempos em tempos, quando o mar dá aquele ridimuinho traz a gaiola de lá das prefundeza do aceano, pá riba. Aí essa seprente mermo presa nessa gaiola, ainda consegue fazê má aos zouto. A infeliz sobe até o buraquinho de riba da gaiola e dá um assopro que é mortá pra quem mora mais perto do mar e, por onde esse vento disgraçado passa é matando, alejando, indoidando e intronchando. Por isso que tem munta gente que morre de repente e ninguém sabe o que foi. Mas eu sei!... Eu num morri porque tenho munta fé em Deus e o assopro que essa seprente mardita deu já chegou fraco aqui nessas banda.




GLOSSÁRIO
Aceano - oceano
Bandas - no sentido de lugar, área.
Cansanção - planta de pelos urticantes e vesicantes que agridem a pele humana ao primeiro contato
Intronchando - deformando
Lachada - rachada.
Manquejando – mancando
Sacudi - jogar fora
Seprente - serpente.
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui