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Artigos-->De bobeira -- 09/02/2002 - 13:16 (Maria Abília de Andrade Pacheco) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Morta de dor na consciência, eu teimava em extrair um cochilo daquele vago de fim de tarde, mesmo sentindo a animação vinda das ruas, um convite para a busca vagabunda que vem e avassala. Tudo ilusão, eu repetia: é ganhar a rua atrás do eco de minhas impressões e não encontrar nem vulto. Sempre assim: vem o vislumbrado e engole o experienciado em tempo real. Bom, vira e mexe, me pego nessas vãs filosofias, que nunca deram dão darão em nada. Mas só me dou conta disso quando já matutei boa meia hora.

Mas hoje, especialmente, eu tentava dormir um pouco, morta de dor na consciência sim, mas poderosa para gritar ao mundo: vivam todos vocês aí embaixo, que quero morrer uma tarde inteira aqui em cima! – isto é, enquanto isso também não for proibido nesse mundo de emoções contabilizadas e dentro da lei.

Dormi sim, bons quinze minutos se tanto. Acordei com sussurros arrastados, de apurar os ouvidos e escutar. Não sei se o que conto aqui corresponde ao que de fato se passou, confesso que muita coisa não faz sentido ou não sei se eu escutei do jeito que bem quis e entendi, mas, vá lá, aqui está o monólogo que ouvi da janela do meu quarto – penso que o “orador” estava falando do apartamento dele, ao pé da janela, ou... enfim, não tem importância esse detalhe. Assim:

“Escurece. E no entanto – não obstante - o maior sol lá fora. Aqui estou eu, pirata canhestro, tecendo palimpsestos. Mil estratégias, planos traçados no chão, que isso aqui é uma guerra. Pingos nos is, preto no branco, falando sério, essas coisas. Lá fora tudo, tanto, futuros. Aqui dentro só eu, comigo e mil monstros. A Coke não passa de cafeína choca, tudo conspira. Tudo quer que eu vaze porta afora, gritando e esperneando: Ei, olha o gado arrebentando a porteira! Bush, ó o Bin Laden aqui, ó! – qualquer coisa, mas que seja de doido, de crioulo petista assumido, eu o mais bolha de sabão que já pisou esses palcos. Nada não, acho que tem a ver com personalidade. Mesmo, eu diria, com virilidade. Esse troço de enfiar a mão dentro da calça que todo homem faz para marcar território. Essas coisas que são nossas sem nunca nos pertencer. No entanto...

E eu não pedi para nascer, nem venha. Não implorei, tampouco, migalhinha que fosse, desse amor de Jezebel, sempre pronto e enlatado para o primeiro que apareça. O meu é um amor – sei lá se é amor. Apenas um possuir a coisa, sem ser por ela possuído. Um troço doido, porque, cá para nós, render-se aos encantos é pertencer-se. E o que mais quero é me mostrar, me doar de bandeja a quem faça por me merecer. Sou muito melhor do que muito mano véio por aí. Isso sei que sou. Tenho certeza, e nem venha. Sei fingir bem, brinco até do que não sou e no fim saio sempre ganhando. Sei, não se me acostumo a perder nada que seja. Digo mais: sei lá se um dia aceitarei - uma – derrota. Não, e pronto. Se sou melhor do que todos eles, se tenho domínio de meus impulsos até quando pareço perder o controle. Sou premeditado, um cara meio maquiavélico, cheio das estratégias. Isso mesmo: ajo de caso pensado, maior cara-de-pau. E em sendo assim não tem que procurar minha identidade no pano de fundo que brinco de esconder meu sorriso. Não estou aqui nem lá, ninguém me acha. Me abandonei com cara de besta na esquina da mediocridade, que não nasci para Cristo. Cansei. Hoje não tenho endereço, não sou cadastrado em nada, meu cigarro não tem marca, qualquer pito que me cai lá vou eu sorvendo e tragando sem pensar nem uma só vez. Sou mais eu, e tendo me descoberto tenho a dizer que finalmente estou preparado para o espetáculo inaugural de tanta espera: uma deixa. Quero o sinal aberto para avançar os limites e, empossado no meu quinhão de terra sem dono, dançar meu carnaval sem pátria verde e amarela. Largar de vez as rédeas que me prendem ao topo do que sou para despencar sem algemas nesse mergulho alucinante que é a vida. Tenho a dizer que: venha e seja. Agora a coisa é entre nós dois: eu e você. Eu, partícula vadiando céu afora, em busca de ímãs”.

Bem, isso acho que ouvi, e se acho é porque tenho certeza de que ouvi, porque afinal o que conta é o que fica, não o que é ou possa ser. A música de fundo descobri depois que era um jogo de futebol transmitido pelo rádio, misturado com o som de um CD qualquer, vindo de outro apartamento. Engraçado que eu tinha achado a música o máximo, com aqueles palavreados gritados e engrolados, culminando com um longo gemido, depois novos novelos sonoros, repetidos e ritmados, crescendo, crescendo, até o grito final. Uma partida de futebol, e eu com isso? Ruídos, nada mais. Para mim, que importava? Tudo era um só espetáculo. De real, só eu com meus inventos.







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