Certo dia, num desses dias em que uma tristeza quase "sem explicação" toma conta da gente, li em um livrinho de pensamentos: "Não se deixe abater pela tristeza. Todas as dores terminam..."
Engraçado! Sempre tive restrições a esses livros: tão miúdos, tão óbvios, tão pragmáticos (metafísicos e subjetivos também). Mas tinha esse em casa, junto com tantos outros que me fascinavam e me deixavam orgulhosa de tê-los em minha estante.
Imaginem! Parte da construção histórica do conhecimento humano compunha minha pequena biblioteca particular. Saramago, Vinícius de Moraes, Gaudêncio Frigotto, Simone de Beauvoir, Ruy Castro, Patativa, Chico Buarque, vários filósofos, poetas, cientistas, enfim, pensadores.
Mas no meu maior - naquela hora era o maior - momento de tristeza, estava com o livrinho de pensamentos em minhas mãos. E que ironia! Sem que fosse produzido por nenhum dos sábios que eu tanto admirava, era pretensiosamente intitulado de "Minutos de Sabedoria".
E apesar de eu sentir a agudez interminável da minha dor; de eternizar os minutos em que ela se intensificara em lágrimas; aquela simples frase, de um livrinho cheirando a novo - e a mofo - de quase não-uso; aquela frase tão previsível; tão óbvia, que chegava a me irritar, pois soava como uma afronta à minha capacidade dedutiva; aquela simples, previsível, óbvia e sábia frase martelava meus olhos e enchia meus pensamentos.
Sim, porque não conseguia parar de lê-la e, a cada nova e redundante leitura, era inevitável dar-lhe razão. É fato! Todas as dores terminam. Ainda que culminem com a finitude humana. Um dia elas encerram seu cárcere.
Isso mesmo, cárcere! A dor não se afasta da gente não porque seja prolongada por um sofrimento exterior, mas porque a fechamos dentro do peito, fazemo-la percorrer nossa corrente sanguínea e acabamos por sufocá-la em nossas entranhas.
Por vezes ela se manifesta revoltosa e parece querer deixar-nos, arrebatando-nos com as lágrimas, os gritos, os vómitos...
Mas nós somos mais "fortes"!
- Fique aí, Senhora Dor! Só sairá quando eu quiser.
E então, resignada e perseverante, ela permanece viva dentro da gente. Se alimentando das nossas tristezas e dos pensamentos dos grandes intelectuais da nossa história.
São Luís, madrugada do dia 04.08.2002
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