Escrevo porque vi agora uma foto de capa da Folha de São Paulo de hoje. A senhora Monica Cardoso, num flagrante pungente, chora de forma dolorida e desesperançada e no seu chorar expressa a dor de todas as perdas e o desamparo dos desvalidos que, como ela, perderam tudo. Teve que sair de sua casa para sobreviver. A sua dor foi o preço que pagou para sobrevivência. Centenas de outras pessoas não tiveram a escolha e pereceram.
O fotógrafo que fez o flagrante é um artista e transformou em realidade o dizer de que uma imagem fala mais do que mil palavras. No mesmo jornal tem a notícia de que o governo do Estado do Rio de Janeiro tinha estudos que alertavam para os perigos da região serrana, em situações de cheia. Portanto, a incúria dos governantes está mais do que demonstrada. O estudo referido tem dois anos. Nada foi feito pelos que tinham a responsabilidade de fazer alguma coisa, de velar pela vida dos que estavam expostos e ignoravam os perigos. Vidas interrompidas e projetos de existência foram frustrados, como o da sofrida Monica Cardoso. São crimes infames pelos quais as autoridades constituídas deveriam responder em juízo. Bem sei que nada será feito e tudo será oficialmente creditado a catástrofes naturais.
Sei muito bem da dor da perda da casa de Monica Cardoso. Quando menino nossa casa sofreu um desastre – uma viga do quarto do meu pai rompeu-se e por muito pouco não nos matou a todos, meu pai, minha mãe, meus três irmãos e eu. Ali eu descobri, menino de tudo ainda, o sentido da casa – do lar – na existência das pessoas. Levamos meses para recuperar o que perdemos, na verdade anos, ajudados por parentes dadivosos e por amigos. No dia do evento eu soube o que é o desamparo supremo: o mesmo que vi no rosto de Monica Cardoso vi no rosto sofrido da minha mãe. A casa era tudo que tínhamos e nela estava tudo que tínhamos. Ao menos me consola o fato de que nosso infortúnio não tinha como ser evitado. Mas Monica Cardoso, não: todos sabemos que os ineptos governantes tiveram todo tempo para agir e nada fizeram de forma preventiva. São homicidas. Mais que homicidas, ceifadores do futuro dos sobreviventes. Uma dor como essa é irreparável e ficará marcada de forma indelével, para sempre, no coração dos que a sofreram.
Minha tarefa é dizer isso, que sua dor, Monica Cardoso, era evitável. Que esses criminosos que nos governam nada fizeram para prevenir o desastre. Que eles são culpados, mesmo que a Justiça sequer venha a se pronunciar. São culpados diante do tribunal de nossas consciências e culpados diante de Deus e sua culpa é imperdoável e imprescritível. Se eu pudesse eu gostaria de ajudá-la, mas nem a conheço. Gostaria de ajudá-la como ajudaram a mim e a minha família em nosso infortúnio. Mas nem sei onde você fica e onde vai morar. Então lhe dedico a minha oração. Acredite, não é pouco nesses tempos sombrios de ateísmo. E lhe dedico este artigo, o meu desabafo acusador, de dedo em riste, diante dos grandes criminosos que são os nossos governantes.