Na década dos 70 aportou por estas bandas um sujeito grande, obeso, testa estreita, lábios finos, extremamente brincalhão, e que devido a passividade dos nativos achou que poderia tornar-se prefeito.
Sua vida acadêmica dava alguns indícios de quem era o forasteiro: durante as farras desbragadas a que se entregavam, ele e seus colegas, era comum saírem completamente nus pelas ruas, em carreiras loucas com que provavam a coragem e nas quais sinalizavam ser diferentes e superiores.
A noção de que a lei nunca o atingia, autorizava-o inclusive, assear a bunda com a bandeira nacional. Tal fato, comum e corriqueiro na rupública, era um tipo de ritual a que se submetia, sempre que via sua intrepidez posta em dúvida por algum outro maluco excêntrico.
Seu pai, usineiro falido, vigiava de perto, por meio de olheiros, o comportamento do filho. Quando em estado de alerta por qualquer enrascada, do filhote fanfarrão e mimado, para se acalmar, punha a vista o talonário de cheques com o qual conseguia a complacência das autoridades.
Para testar sua popularidade e liderança participou de inúmeros pleitos em que concorria ao cargo de presidente do centro acadêmico. Em certa ocasião, quando percebeu a provável vitória de um concorrente melhor preparado, tratou de, por meios escusos, desancar o adversário humilhando-o na frente da turma.
Sabedor de que papai estava invariavelmente a postos com seu talão, não se acanhava em cometer os mais descabidos desmandos induzidos pela prepotência bufona.
E foi assim que, formado em faculdade de ensino público e gratuíto, pode manter a mesada de papai, dando a ele esperança de que poderia ser eleito prefeito da cidade prosaica.
Seu primeiro passo foi enfronhar-se no partido politico dominante e por meios que somente a gorda conta bancária poderia explicar,tornou-se logo depois, secretário municipal das merendas escolares.
Em decorrência desse seu cargo público, tinha contatos diretos com industriais influentes na região. Em seu gabinete era comum a presença de usineiros queixosos da política federal para créditos agrícolas.
Um dos assuntos dominantes desses senhores era a mingua do lucro que a lavoura da cana produzia. Uma das causas atribuídas ao depauperamento era, sem dúvida, a escassez da mão de obra utilizada na colheita.
A raridade dos cortadores das plantas herbáceas encarecia, de fato, seus trabalhos. E isso retirava os lucros dos latifundiários que se descabelavam diante das contas vencidas.
A solução que o futuro prefeito encontrou, para resolver os problemas da sua clientela, estava nas regiões pobres do interior do Estado de Minas. De lá, em ônibus quase confortáveis, denominados expressos 383, uma referência mística aos números do seu título eleitoral, iniciou o transporte das levas e levas de trabalhadores que aportavam nas usinas da região.
Depois de alguns anos dessa prática, a cidade inchada, apresentava certos sintomas de escangalhamento nos setores da saúde pública e segurança. Assim, a demanda pelos serviços médicos antes dirigidos somente aos nativos, viu-se maximizada. Em decorrência a qualidade também caiu provocando sérios abalos sísmicos na estrutura municipal.
No setor da segurança, o arruinamento era concreto e visível quando inexistiam mais vagas nas cadeias e as fugas bem como as rebeliões eram banalizadas e corriqueiras.
Na esfera da educação as vagas para o ensino primário tornaram-se insuficientes para atender aos filhos dos cidadãos recentes. No transporte outras linhas de ônibus deveriam ser criadas para servir aos bairros que se formavam. Porém os impostos pagos pelos latifundiários impossibilitavam o pleno desenvolvimento e adequação das instituições à nova realidade.
Por isso a qualidade de vida, naquela que fora uma cidadezinha pacata e tranqüila, do interior provinciano, tornou-se péssima. E os incomodados como sempre, que se retirassem.
Mas o garotão mimado e prepotente, que tinha sua segurança no talonário infalível do papai, formou o seu ambicionado curral eleitoral. Este o elevou não só ao cargo de prefeito, mas a dezenas de outros mais, durante toda sua longa vida de tradicional e inefável senhor de engenho.
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