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Ensaios-->Hermenêutica da lei: Falta ética ao processo jurídico? -- 22/04/2000 - 19:13 (Leonardo Daldegan Lima) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
As leis, como estão dispostas nos códigos e nas consolidações, grosso

modo, dispõem de diversas interpretações, cujas pretensas conclusões são dominadas pela

classe dominante. Pretende-se, nesta resenha, mostrar os péssimos rumos da hermenêutica

da lei, na qual falta ética e sobram interesses excusos. Além disso, o texto visa criticar a

maneira como é aplicada a lei no Brasil e no mundo, mostrando a quem somente ela atinge

e a quem ela deixa de atingir. Também é objetivo desse ensaio tentar questionar a função da

lei, hoje integralmente manipulada pelos detentores do poder.

A lei tem como função regular as relações sociais, econômicas e de

várias outras naturezas entre os homens. Desde o início da Idade Moderna, estas relações

vêm sendo asseguradas pelo ordenamento jurídico instituído, positivado, que dá

credibilidade à convivência entre os indivíduos, ao entendimento deles uns com os outros

em todas as esferas da vida. Mas, quem sai ganhando com isso tudo?

Ao longo dos tempos, desde o início da Idade Moderna, viu-se o

surgimento de uma classe burguesa e, por outro lado, de uma imensa massa proletária.

Junto a estas duas classes, acoplava-se a lei positivada, que visava 'garantir a convivência

entre os homens' que antes viviam 'o medo de perder sua vida e sua propriedade'. Ora,

quão lindas seriam estas intenções se não escondessem o verdadeiro 'porquê' do

nascimento da lei positivada. Como foi colocada sob ideais liberal-burgueses, a lei visou,

grosso modo, apenas beneficiar os detentores do poder econômico através do uso do poder

de coerção. Este, sem dúvida, é a maior característica da lei. E quando se fala em poder de

coerção, pensa-se em um poder de polícia que possa abafar as animosidades da massa

proletária.

Nota-se através dos tempos que, verdadeiramente, a função da lei tem

sido garantir à burguesia uma hegemonia inquebrável; algo que pode ser visto nos dias

atuais tamanha é a pobreza e a desigualdade social e econômica no mundo. Ao lermos

livros, doutrinas de renomados juristas, é explícita a intenção de dizer que a lei vem para

regular as relações sociais, econômicas, como num maravilhoso mundo onde todas as

pessoas são tratadas igualmente, onde o direito de todos, independente de raça, cor ou

situação econômica, é respeitado. Esse mundo não existe, e a humanidade está longe dessa

utopia.

Logicamente que a lei tem uma importância fundamental e vital para a

convivência dos indivíduos, e sempre terá (e não serei eu discordante deste fato). Quando

critica-se a lei, diz-se sobre sua nobre função, social, que infelizmente está difícil de ser

alcançada. Discorre-se também sobre sua interpretação às vezes anti-ética e principalmente

sobre sua aplicação, enfim, em quem está sendo aplicada, como está sendo aplicada e a

diferença de aplicação entre os 'tipos' de indivíduos.

Enxergando a real função da lei, podemos fazer questionamentos sobre

algumas conclusões. Não seria necessária uma remodelação, baseada em princípios éticos

(não econômicos, como sempre foi feito), da função da lei? Colocando ética e lei frente a

frente, não haveríamos de criar uma urgente função social mais competente, menos

falaciosa? Se estamos numa sociedade desigual, e se quase nada é feito para que se resolva

isso, a função da lei deveria ser 'manter desiguais as relações sociais e econômicas', como

são hoje, e não 'regular as relações sociais e econômicas' pura e simplesmente. Há muita

hipocrisia dentro desta definição, presente em vários livros de renomados juristas.

A lei, como foi dito acima, foi positivada sob interesses liberal-

burgueses, que enalteciam a igualdade e a liberdade. Por conseguinte, a interpretação do

direito quase sempre foi feita sob o viés burguês, ressalvados seus interesses. Quem tem o

poder político em mãos cria seu próprio eixo jurídico, em torno do qual a interpretação da

lei deve se conter. Nesta maneira, muitas vezes, justiça distancia-se da lei porque

prevalecerá o interesse da classe mais abastada, mesmo que falte a ética neste ato

interpretativo(há diversos exemplos, nas sentenças do nosso Supremo Tribunal Federal, que

foram efetivamente influenciadas politicamente).

Muito se fala do logicismo formal de Kelsen, o qual baseia a

interpretação dos fatos sociais em si naquilo que está colocado no ordenamento jurídico

instituído. O silogismo mostra a maneira pela qual o direito deve ser visto, partindo-se da

lei, passando posteriormente pelo fato até chegar-se a uma conclusão. Dogmatiza-se certos

preceitos para que se 'enclausure' a interpretação do direito. As chamadas lacunas do

direito são absorvidas pelo ordenamento jurídico que, então, pode ser considerado

completo, perfeito. E tudo (qualquer interpretação) cabe dentro daquele ordenamento. Algo

só pode ser legítimo se for, antes de mais nada, legal. Muitas sentenças, enxergadas por este

viés, são proclamadas cegamente. Vê-se apenas a forma da lei e a maneira como o fato

pode ser encaixado nesta lei; deixa-se de lado, muitas vezes, a justiça. É um grande

problema, a interpretação tendenciosa da norma.

Já a aplicação da lei sempre está ligada a um fato que é citado por esta

lei. Mas, como a lei pode ser aplicada da mesma maneira para cidadãos que,

economicamente ou socialmente, são diferentes? Resultado: A aplicação real das leis, da

maneira como elas se põem no ordenamento jurídico, só se dá aos indivíduos pouco

abastados. Vista dessa maneira, às vezes a lei não converge com ideais de justiça, sendo

apenas a expressão da vontade de quem tem o controle do aparelho coercitivo do Estado. E

como o Estado é, de certa maneira, a representação da hegemonia burguesa sobre o

proletariado, a aplicação da lei sempre esteve fadada a interesses excusos.

O que se vê hoje é o reflexo da vontade de quem tem o poder nas mãos.

A sabedoria popular diz que a lei só é aplicada no '3P', ou seja, no pobre, nos cidadãos da

raça negra (pretos) e nas prostitutas. Banqueiros falidos, que usurparam os cofres públicos

brasileiros, estão longe de verem a lei ser aplicada neles. A inércia ao punir políticos

corruptos mostra o rumo da aplicação da lei no Brasil. Penitenciárias abarrotadas de

pessoas pertencentes à classe pobre são vistas em todo o território, enquanto na política

nacional vemos exemplos e mais exemplos de indivíduos impunes. Falta ética à aplicação

da lei, não só no Brasil, mas no mundo inteiro.
Não seria conveniente reestudar, sem hipocrisia e com mais

transparência, para quê a lei vige? Diante de uma situação delicada na qual se encontra a

maioria da população mundial, a busca da verdadeira função da lei não se faz obrigatória?

Miguel Reale expôs um pensamento interessante, que leva em consideração esta situação

delicada do mundo de hoje e que induz a uma crítica na maneira de pensar a lei. Diz ele que

'os que se inquietam com o futuro do homem, numa época de marcada transição

curiosamente coincidente com a passagem para o novo milênio, não escondem a mais

profunda preocupação perante certos desgarramentos da sociedade de massa, sempre mais

dominada pela obsessiva posse e gozo das últimas benesses propiciadas pelo progresso

tecnológico, que tende a transformar as novas gerações em atormentados joguetes da

civilização do orgasmo , que se caracteriza pela incontida ansiedade de imediata fruição de

tudo aquilo cujas virtudes e vantagens os poderosos meios de comunicação enaltecem, em

perene e aliciosa propaganda, que obedece, tão-somente, à nunca satisfeita ambição

empresarial'. Diante desta sincera reflexão, temos a obrigação de levar este ideal para o

direito, a fim de redefinir a função da lei, aplicá-la eticamente e interpretá-la de uma

maneira justa e igual para todos.

Referência Bibliográfica:

REALE, Miguel. 'Paradigmas da Cultura Contemporânea'. Editora Saraiva, 1999, São
Paulo, 1ª edição.

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