Poeta Frágil Hoje 23:20
O poeta vagueia lívido na noite.
Escreveu um poema e fugiu, frágil,
Ao doce incenso das palavras inventadas
E exorciza agora, em frio intenso,
O segredo grácil das coisas odiadas.
Em fuga para o infinito cósmico,
O poeta passeia uma garrafa,
um licor de absinto agreste.
Contra o peito vai esmagada,
Mórbida companhia, força falsa
que nunca lhe é negada e que veste
nas friorentas alvas madrugadas..
E busca, sonha com um sentido,
Para o desfiar dos dias,
Pardacentos, boreais, ímpios,
Desmesurados, desventrados,
De emoção em fogo lento.
A poesia falsa, insípida e indolente,
As palavras já despidas
De promíscuo sentido evidente.
Na curva rectilínea do destino,
Quebra a força da razão,
Procura o sonho nu, a válida
Verosimilhança existente
Nas coisas que vê ou que pressente
E nada, nada há que lhe refracte,
A dor de já não saber o que sente.
Sem momentos de evasão,
Sem vector de rumo válido,
Sem um vislumbre de gente,
O sonho escapou-lhe, ridente,
Como areia fina entre as mãos,
Ao vento de uma praia qualquer,
Nas ondas de vigorosas águas,
Contemplando, absorto, talvez,
Sombra vaga em perfil de mulher...
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