Usina de Letras
Usina de Letras
155 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62228 )

Cartas ( 21334)

Contos (13263)

Cordel (10450)

Cronicas (22536)

Discursos (3238)

Ensaios - (10364)

Erótico (13569)

Frases (50622)

Humor (20031)

Infantil (5433)

Infanto Juvenil (4767)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140803)

Redação (3305)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1960)

Textos Religiosos/Sermões (6190)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Ensaios-->A NEGA QUE GRITA! -- 01/06/2002 - 13:25 (José Roberto Pereira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Todos os tipos estranhos e sombrios de criaturas habitam as cidades onde moram os humanos. Mesmo com a chegada dos computadores, raios laser e toda sorte de tecnologia, a mente humana ainda não consegue penetrar nos mais distantes e sombrios recôndidos lugares que ficam escondidos dos olhos da ciência!

Numa tarde chuvosa, Claudio de Souza, escriturário de uma empresa de seguros, ficara até tarde em seu trabalho. Menino calado, apesar de ter 22 anos, era o que se chama de esquisitão. Não que tivesse alguma tendência homossexual, nada disso. Ele apenas ficava em seu canto, fazendo suas tarefas em uma mesa apinhada de papéis, boletos, contra-cheques, vales-refeições e vales-transportes de mais de 500 funcionários. Era um trabalho duro, pesado, aborrecido mas Claudio, branco e cheio de espinhas em um rosto que lembrava um rato prensado, não reclamava. Decerto porque nem sabia o que era ter qualquer tipo de vontade própria.
Mas havia um lugar em que Claudio tinha medo. Um lugar que lhe inspirava um certo tipo de medo que seu cérebro despreparado nem sonhava que poderia existir.
Naquela sexta feira chuvosa e fria como uma sepultura, Claudio ficara até tarde no trabalho, quando todos os demais fuincionários sairam para festas, bailes e barzinhos espertos. Mas Claudio era feio, espinhento, meio burro e não gostava de futebol, carro e samba. Ele não sabia o que era viver, apenas se empanturrava de trabalho e balinhas de café. A chefa de Claudio nem lhe desejou “boa-noite, bom fim de semana” pois o sujeito era de uma aparência patética, enfiado em sua blusa branca e gravatinha de crochê preta.
O zelador passou com o aspirador que mais parecia um 747 pedindo para ser aposentado mas Claudio continuava sua conferência das infindáveis folhas de formulário contínuo. Era um serviço que todo os seus “colegas” detestavam, mas o quieto Claudio fazia com precisão e cuidado, com o mesmo carinho que uma mãe macaca cata piolhos da cabeça de um filhote.
O zelador se fora e o prédio ficou silencioso. O elevador deu seu “ping” e subiu para o andar do zelador. A casa das máquinas pararam de funcionar, dizendo que se houvesse algum idiota que quisesse ir embora, deveria descer pelas escadas.
Claudio nem reparou que o horário avançava, nem reparou que a garoa fria se transformara numa chuva mais pesada, batucando nas janelas ao seu lado.
Quando terminou seu “trabalho”, Claudio fechou suas gavetas, trancou-as e se pos de pé, caminhando em direção ao relógio de ponto. Bateu o cartão, ganhara 6 horas extras que representariam quase nada em seu salário (como se ele soubesse o que era isso) e foi para as escadas. Estava no 18o. andar e teria que descer até a garagem do 5o. sub-solo se quisesse mesmo sair do prédio. O vigia da garagem eram um bebum que...
Não houve uma vez em que ele dormira naquele prédio porque esqueceram de lhe avisar que no dia seguinte era feriado?
Debaixo das luzes frias, ouvindo o zunido triste dos reatores, Claudio começou a descer pelas escadas em seu passo mole e arrastado.
Foi então que ele se lembrou! Foi então que ele se lembrou do medo! Do que ralmente o assustava!
Ele se lembrou da Nega Preta!

Nega Preta, Nega Quizumbeira, Negona, Preta do Demo, seja lá o nome que os office-boys e faxineiros davam, ela era a única coisa que despertava medo no abobado Claudio. Ele ouvira as conversas dos outros, em especial do seu Toledinho, o eletrecista do bloco 3 e que fazia a (péssima) manutenção de seu andar.
Conta-se que havia uma faxineira de nome Rosacliana, uma negra linda como uma jaboticaba fresca... e com o mesmo sabor, pois todo mundo enfiava sua colher naquela sopinha de creme que ela tinha entre as pernas. Rosacliana liberava mesmo pois se havia uma coisa que ela gostava era de uma boa pica. E mesmo de uma pica ruím, ela dava um jeito.
Devassa, autoritária, preguiçosa, sambista, macumbeira, louca e linda, Rosacliana vivia pertubando as mulheres do prédio e alegrando a vida da rapaziada.
Mas Rosacliana encontrou seu Oswaldo, um dos executivos da empresa. Ela dava pro homem de todas as maneiras, até que Jordão, o segurança do bloco 1, fez uma loucura de ciúmes. Rosacliana foi encontrada esquartejada em um banheiro dos executivos. Seu estado estava tão medonho que os legistas vomitaram. Sem falar que os jornais noticiaram que ela foi morta não apenas com requintes de crueldade mas com um número sem fim de agulhas estavam enfiados em sua boca!
Essa idéia passou rapidamente pelos poucos neurônios de Claudio que, sem saber bem o motivo, apertou o passo em direção à saída.
A repetição constante dos lances de escada, os degraus que não acabavam mais lembraram a Claudio que ele descia, descia e descia sempre e sempre, cada vez mais para baixo, para o chão e para o inferno!
Sem fôlego, parou numa porta e respirou pesadamente. Foi seu maior erro!
Uma onda estranha de lascívia penetrou-lhe pela espinha. Alguma coisa mágica e maléfica cutucou-lhe o rabo, rodopiando como uma serpente de sensações, acariciando-lhe a virilha, até lhe cobrir por completo seu corpo. Ele ficou de pau duro, um mastro pequeno mas rijo como aço, seu coração a beira da exaustão completa! Sua testa cobriu-se de suor frio e suas mãos escorregaram nas paredes.
Uma voz saída de um tubo de carne pastoso pronunciou alguma coisa que lhe arrepiou a pele e lhe eriçou os cabelos da nuca. Um medo primevo gritou em suas entranhas, um pavor que vinha do tempo das cavernas e das árvores. Um medo que ele pensava não ter, mas que suas células se lembravam perfeitamente!
Foi quando aquela curiosidade louca lhe fez olhar para a direção daquele chamado maldito.
Uma forma descarnada, putrefata e purulenta lhe fitava com as órbitas vazias. Uma carne do rosto destroçada por faca de pão, tocos onde haviam braços e mãos destroçadas onde antes houvera carne e falanges. Ele viu o cérebro exposto, a mandíbula ausente e uma papa de sangue e pus cobrindo a aparição. Dentro daquilo que se um dia se chava de boca, um ramo de agulhas movia-se para dentro e fora do corpo da bicha, produzindo um som de rascar de metal.
A voz da criatura era um chamado do inferno, coberto de creme de sedução e luxúria. Claudio não podia deixar de olhar para aquela bestialidade, coberto de horror mas, ao mesmo tempo, atraído por uma sedução enlouquecida! Tudo, tudo naquele pobre sujeito desejava estar em um quarto distante e esquecido por Deus, em algum lugar além da razão. E foi para lá que sua mente fugiu, pouco antes de receber o toque do fantasma.
O zelador abriu uma garrafa de cachaça. Olhou para seu enorme crucifixo na porta de seu minúsculo apartamento e esperou. Um grito de mulher tremeu o prédio. O zelador sabia que a Nega que Grita havia feito mais uma vítima e ele haveria de tomar alguma providência.
Mas não naquela noite. Estava uma chuva fria e a ocasião pedia um gole!
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui