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Ensaios-->23. CONFISSÃO ESPONTÂNEA -- 19/06/2002 - 06:04 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Nem bem eram passados alguns dias do meu trespasse e já me encontrava desperto, pronto para pespegar uns puxões de orelha naqueles malvados que me enviaram para cá. Não sei como dizer isso, mas me sentia bem leve e achava que era hora do acerto de contas. Contudo, não consegui acercar-me dos facínoras, pessoas desqualificadas socialmente, que não tinham pudor algum em “aliviar” o bolso dos transeuntes e em encaminhá-los de volta à pátria espiritual.

Pois bem, eu fazia parte do grupo, mas jamais matei ninguém, nem permitia que fosse maltratado. Só o que eu queria era o dinheiro, porque era com ele que comprava as coisas de que necessitava para ficar “numa boa”. Os seres que estão comigo estranham muito que seja capaz de acusar os outros e que me diga inocente dos crimes de sangue. Na verdade, contribuí para que alguns passassem para o lado de cá, tanto que, quando aqui cheguei, fui assediado por eles, que me chamavam de assassino e de louco.

A verdade, porém, é que não me sentia assim; é que tudo o que fazia era depois de alguns tragos e de algumas doses de coca. Aí ficava bem corajoso e não tinha medo de mais nada. No meio de uma sortida, demos de cara com uma força policial, mas pusemos todos para correr, pois não se atreveram sequer a responder ao nosso fogo. Uns covardões. Mais tarde, vim a saber que pegaram um dos nossos e executaram. Eram tão bandidos quanto nós.

Pedem-me para não ficar inventando histórias e querem saber por que demorei tanto para me apresentar ao grupo, já que faz muito tempo que perambulo sozinho, sem ter ninguém mais a me perseguir. Não sabia que era muito tempo. Na verdade, o pessoal da Terra andou escasseando ultimamente e eu já não achava mais graça nenhuma nas perturbações que promovia. Penso que, se perguntarem para os da turma, saberão responder melhor do que eu às questões.

O que estou estranhando muito é o sentido que têm as minhas frases. Isso é que é vida boa: ficar só ali, naquela de escrever os pensamentos dos outros. Quero é ver quando se tratar de vir aqui deste lado, o que vai ter para contar.

Não acho nada a respeito de ninguém. Quando era vivo, não sabia sequer distinguir as pessoas boas das más; para mim ninguém prestava. Aonde ia, via as pessoas fazendo de tudo para prevalecerem, para ganharem mais, para ficarem com a melhor parte. Não preciso citar ditado nenhum, pois existe um para cada tipo de raciocínio. Há aquele que “tudo perde”, mas há o que “não é tolo”.

O que queria dizer é que, do lado de cá, as coisas mudaram muito, pois ia a todos os lugares e via gente que roubava e matava, mas via outros que não faziam nada disso. Era fácil de influenciar no espírito dos primeiros. Quanto aos últimos, alguns me ofereciam meios de contacto e os punha de sobreaviso com relação às coisas ruins. Aí é que não queriam nada comigo. Quando rezavam, pedindo ajuda, eu era escorraçado bem depressa. Era assim que via porque não acreditava em que fosse ser auxiliado a entender o porquê de haver pessoas com tanta defesa e outras tão desprotegidas.

Mas chegou o tempo da compreensão e pude ver que nem todo mundo sabia exatamente o que fazia, embora agissem honestamente. Era curioso adverti-los das intenções de ganhar o céu. Eles se fechavam em orações e ficavam dias e dias recolhidos numa espécie de capelinha particular, fechando os ouvidos e os olhos para as algazarras que fazíamos, meus colegas e eu.

O mais interessante eram as brigas que desfechávamos uns contra os outros, pois cada um tinha uma idéia diferente do que fazer e não queria ficar por baixo. Eu mesmo achava divertidas essas desavenças, até que enjoei. Não sofri com a separação desses grupos de baderneiros. O que me fez pensar um pouquinho na existência foi que, sem eles, não tinha mais ninguém e viajava sozinho pelo espaço.

Esse sentimento de solidão é que me trouxe o despertar de que não era do grupo dos bonzinhos, pois tudo o que fazia me levava a ter sempre alguém em quem tinha de desforrar a minha inferioridade. Tinha inveja de tudo. Cada pessoa bem colocada na vida me fazia rilhar os dentes de ódio. Era assim que agia em vida e até pouco tempo atrás.

O que me fez deixar que se aproximassem de mim foi a idéia de que está na hora de deixar de ser tão atrasado, já que me disseram que todos somos irmãos por parte de Deus. Não é sem tremor que digo esse nome, pois tenho muito medo dele pelo que fiz. Agora vejo que os castigos foram muito tênues perto da extensão de minha maldade.

Acho que estão certos os amigos que me dizem que os sofrimentos ainda nem começaram e que não conheço sequer a extensão dos males que pratiquei. Fazem referência à interrupção de vários projetos importantes de grupos espirituais de valor que prejudiquei, com minha ignorância, insensatez e insensibilidade. Estas palavras não conhecia e puseram na minha boca. Ao tentarem explicá-las, supliquei que parassem, para não interromper esta manifestação, em que me sinto tão bem.

O médium me diz que está percebendo certa sensação de medo, certo susto e mal-estar em minha pessoa. Pois se trata de minha indecisão em acatar as recomendações dos amigos com quem deverei seguir. Que acha você: vale a pena o futuro em troca de promessas de muita dor e sofrimento? Não há alternativa: ou é agora ou será mais tarde? Deverei tomar logo a decisão. Se deixar para depois, haverá maior quantidade de resgates a serem feitos? Não há dúvida possível: terei de aceitar o quanto antes. Mas não são esses sofrimentos controláveis, ajeitáveis, menores, segundo algum projeto sem dor que se possa estabelecer com os que estão mais acima? Dependerá só de meu entendimento das leis da justiça e do amor?

Eu que me “esfregue”! Vou aceitar para ver no que dá. Se não for possível, acho que terei o direito de escapulir.

Dizem que não entendi direito o que vai ocorrer e que, quando estiver melhor preparado, poderei tomar a melhor deliberação. Pois seja; vou acompanhar os irmãos, prometendo, conforme me pedem, respeitar os ambientes senão perderei a oportunidade. Tudo bem. Em matéria de palavra dada, apesar de no sentido negativo, sempre cumpri a minha. Espero que não seja esse mais um defeito que tenha de eliminar.

Fiquem todos à vontade para continuar com suas tarefas. Adeus, irmãozinho — desculpe-me e aceite meu desejo de que sua prova de fogo não seja tão pesada quanto tem sido a minha. Fique em paz!


Comentário

Tinha um mérito o irmão que deixou seu relato: disse desabridamente o que fez de errado. Nem tudo registrou, porque a lista dos atos criminosos foi muito extensa, mas a verdade é que nada escondeu, a partir do momento em que percebeu não ser vantajoso para o auxílio que lhe prestávamos.

Que dizer a respeito do infeliz? Quase nada, a não ser que esteve longo período na erraticidade e que seus crimes eram, do seu ponto de vista, bem menos cruéis do que aqueles que via o povo perpetrar nestas derradeiras estrepolias. A nós nos disse que a maldade que observou no coração o punha até com medo de volver a peregrinar sobre a face da Terra. Disse que, se tiver de cometer crimes tão absurdos, prefere transformar-se em vítima. É o exemplo que nos restou de tudo o que pudemos observar no meio da negritude de seu caráter. Que nossos leitores tenham sobre que aplicar suas reflexões!

Fiquem na paz de Deus!

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