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Ensaios-->COMENIUS, EDUCADOR, TEÓLOGO E REFORMADOR SOCIAL -- 27/10/2002 - 16:25 (Daniel Walker Almeida Marques) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Comenius: Educador, Teólogo e Reformador Social
Daniel Walker

1. Vida

O educador checo João Amós Comenius ou Jan Amos Komenský, seu nome original, nasceu em 28 de março de 1592, na cidade de Uherský Brod (ou Nivnitz), na Moravia, região da Europa Central pertencente ao Reino da Boêmia (antiga Tcheco-Eslováquia).
Seus pais Martinho e Ana, também eslavos, eram cristãos adeptos dos Irmãos Morávios, uma seita cuja história remonta aos tempos de Jan Huss, líder religioso muito popular no século XV, tendo sido padre, professor e reitor da Universidade de Praga.
A seita dos Irmãos Morávios, organizada em 1467, era uma das mais rígidas em doutrina e conduta, destacando-se pelo extremado apego às Sagradas Escrituras, pela humildade e pela profunda piedade, impondo a seus seguidores vida austera, com preces diárias e leitura cotidiana da Bíblia. E diferentemente do costume da época, adotavam como língua literária o checo em vez do latim.
Comenius foi acusado de não ser, na realidade, um erudito latino. Com efeito, ele próprio chegou a admitir isso. Reportando-se a este fato significativo na vida de Comenius, diz Eby (1962:166-167):

O fato é que Comenius não era em nenhum sentido um genuíno humanista, embora tivesse escrito textos para facilitar a aprendizagem da língua latina. Ele não se apaixonou pelo encanto da eloqüência ciceroniona e não reverenciou a literatura clássica. Teve apenas desprezo por uma memória bem equipada com as brilhantes frases dos oradores clássicos. Ainda mais, negou completamente a pretensão suprema do Humanismo, o valor moral da literatura pagã.

E Eby (1962:167) justifica a atitude de Comenius afirmando que “na verdade ele queria eliminar da sala de aula o fardo completo dos escritores clássicos, e desejava fazer isso no interesse do bem-estar moral e espiritual dos alunos”.
Outro ponto muito forte na personalidade de Comenius é o fato de ter sido ele muito místico. E certamente tornou-se místico como resultado do ambiente de extrema religiosidade em que fora criado, desenvolvendo logo cedo uma identificação bem clara com as crenças do povo morávio. Como observa Covello (1991:15):

Os salmos, os evangelhos e os cânticos religiosos de Huss embalaram a infância do pequeno Jan Amos e lhe incutiram a convicção de que a única coisa necessária é buscar o reino de Deus, pois a vida terrena é apenas passagem para a eternidade... Fora de Deus, fonte de luz e vida, não há senão trevas...

A infância de Comenius foi trágica. Aos 12 anos, seus pais e suas duas irmãs (Ludmila e Suzana) morreram, tendo ele ficado só e ao abandono. Em razão disso, foi obrigado a viver em Nivnice com uns tutores rudes que lhe deram pouca atenção. E isto, possivelmente, contribuiu para que sua educação infantil fosse tão descurada, fato este por ele mesmo revelado.
Este episódio ficou indelevelmente marcado em sua personalidade, razão pela qual durante toda a sua existência dedicou peculiar atenção à infância, tendo organizado um sistema próprio de educação infantil visando à reforma da humanidade.
Numa escola dos Irmãos Morávios aprendeu rudimentos de leitura, escrita, cálculo e catecismo, mas o suficiente para despertar nele o desejo de saber e a preparação para torná-lo no grande erudito do futuro.
Na juventude, o modelo de escola da época com o qual Comenius podia contar era simplesmente desestimulador. Era um lugar de seriedade sombria, desprovido de atrativos e que exigia dos meninos postura de adultos, exercício exacerbado da memorização, verbalismo ao extremo e finalmente a prática da famigerada pedagogia da palmatória, segundo a qual “a letra com pancada entra”, coisa que, com certeza causou-lhe uma profunda decepção.
Quando Comenius concluiu os estudos secundários fez opção pela carreira eclesiástica, para a qual sempre demonstrara inclinação. Estudou teologia na Faculdade Calvinista de Herborn, na Alemanha. Aí adquire uma boa formação cultural, fica amigo dos professores, destaca-se como aluno e, ainda como estudante, apresenta duas teses de doutorado: “Problemata miscelania” e “Syloge quaestiorum controversum”, ambas alvo de elogios de seus professores.
Segundo assinala Gasparin (1994) durante esse período de estudos na Alemanha, Comenius ampliou e fundamentou suas convicções religiosas, além de haver adquirido uma vasta cultura enciclopédica e desenvolvido o espírito de reformador que o acompanharia durante toda sua vida.
E Comenius não pára. Começa a redigir um dicionário de expressões elegantes, chamado de “O tesouro da língua boêmia”, transfere-se para Heidelberg a fim de aperfeiçoar seus conhecimentos de astronomia e matemática, e só então retorna à sua pátria, entusiasmado para pôr em prática tudo o que aprendeu.
Após uma breve estada em Praga, Comenius chega a Prerov, maior centro da comunidade morávia, e aí se estabelece no magistério, contagiado pelas idéias pedagógicas aprendidas na Universidade.
Inconformado com o esquema educacional vigente, procede a uma verdadeira reforma em sua escola, aplicando métodos mais eficientes para o ensino das ciências e das artes, e assim, não demora a brilhar como professor eficiente.
Decorridos dois anos na profissão de professor é ordenado pastor dos Irmãos Morávios (1616), estabelecendo-se na cidade de Fulnek, onde se casa com Madalena Vizovska e com quem tem seus dois primeiros filhos.
Comenius está com 24 anos, mas desempenha com habilidade as funções de professor e pastor. É então nomeado diretor das escolas da Unidade.
Por ter se interessado bastante pelas idéias rosacrucianas muitos biógrafos de Comenius apontam-no como adepto da fraternidade Rosacruz, fato ainda hoje não devidamente esclarecido em sua biografia.
Uma nova tragédia surgiu em sua vida. Foi a Guerra dos Trinta Anos, conflito religioso desencadeado entre católicos e protestantes na Alemanha, estendendo-se depois por toda a Europa.
Essa guerra foi um grande martírio para a família de Comenius e também para a Tcheco-Eslováquia, cuja população foi dizimada em mais de oitenta por cento. No ano de 1621, os exércitos espanhóis invadem e incendeiam a cidade de Fulnek e nisso Comenius perde todos os seus livros e manuscritos. E como se não bastasse, perde também sua mulher e seus dois filhos vitimados pela epidemia (peste).
Comenius, mesmo diante de tantas agruras, não desanima. Ao contrário, recomeça tudo. Produz uma série de escritos de cunho religioso a fim de recuperar o ânimo da irmandade. Os Irmãos Morávios são vítimas de intensa perseguição e fogem para a Polônia, onde já existiam alguns simpatizantes.
Estabelecido em Leszno, Comenius casa em segundas núpcias com Dorotéia Cirilo, filha de um influente bispo da Unidade. Reanimado, retorna às funções de professor e pastor. Sua fama chega à Inglaterra, onde um grupo de intelectuais liderados por Samuel Hartlib estava ansioso por uma pessoa capaz de reinstalar o humanismo cristão tradicional no espírito dos homens e que também proporcionasse paz e progresso para a humanidade.
Convidado, pois era a pessoa sobre quem recaiam aquelas qualidades, Comenius vai a Londres, sendo recebido com todas as honras. A fama cresce e ultrapassa as fronteiras britânicas. Comenius é convidado inclusive para assumir a Reitoria da já famosa Universidade de Harvard. Por razões políticas, não aceita. Passa por outros países, como a Suécia, e depois volta à Polônia, fixando-se novamente em Leszno.
Na Suécia um fato bastante significativo em sua vida acontece: foi o proveitoso encontro com Descartes, no castelo de Endegeest, nas cercanias de Leide, quando o filósofo francês se ocupava em rebater as críticas feitas às suas Meditações sobre a filosofia primeira.
Apesar de não ter sido um encontro duradouro, pois não passou de quatro horas, Covello (1991:61) acredita que o pensador francês devia simpatizar com o mestre morávio, porquanto entre eles havia muitos pontos em comum:

A começar, tanto um como outro se haviam decepcionado com as humanidades ensinadas nas escolas de seu tempo (...) Tanto Comenius como Descartes foram intelectuais do método e ambos defendiam o método como condição para aquisição do saber. (...) Descartes, da mesma forma que Comenius, aspirava a uma ciência universal que pudesse ser alcançada por todos.

Mais adiante Covello (1991:62) acentua:

Mas as divergências entre os dois pensadores eram igualmente grandes. Enquanto Comenius encarava a ciência como meio de aproximação com Deus, Descartes preconizava a ciência para fins exclusivamente humanos, sem colorido religioso. (...) Descartes queria uma ciência com base na razão e repudiava a Bíblia como fonte de conhecimento científico. Para ele, a Bíblia era apenas fonte de salvação. Já Comenius encontrava nas Sagradas Escrituras os fundamentos de seu sistema filosófico e em todas as suas obras a Bíblia é mencionada como fonte de sabedoria. Ciência e religião unem-se em Comenius, ao passo que, no entender de Descartes, esses dois campos devem permanecer separados, cada qual a desempenhar sua própria função: verdades reveladas nada têm que ver com verdades científicas. A postura cultural de Descartes é a de um racionalista puro. A de Comenius é a de um intuitivo. O filósofo francês jamais aceitava alguma coisa como verdadeira, se não se evidenciasse como tal. Comenius, ao contrário, era tão crédulo que aceitava até profecias, como as de Kotter a respeito dos destinos do seu povo. Descartes reconhecia em Comenius um homem de bom espírito e grande doutrina. Mas não acreditava no seu projeto de ciência universal que os estudantes fossem capazes de aprender antes dos vinte e quatro anos. Tampouco achava viável a consecução de uma enciclopédia do saber , nos moldes comenianos.

O destino realmente conspirava contra Comenius. E veio outra tragédia. Sua cidade é reduzida a cinzas. Um incêndio, tal como acontecera em Fulnek, destruiu sua casa e, coincidência, mais uma vez perde sua valiosa biblioteca.
Mais aflição na vida de Comenius: em 1648, em Leszno, sua mulher Dorotéia morre, deixando cinco filhos, dois crescidos e três pequenos.
Completamente pobre e doente, e mais do que isso, vítima da incompreensão da comunidade, busca asilo em diversas cidades alemãs, mas terminou optando pela Holanda, onde passará os derradeiros anos de sua vida.
Comenius ainda casou em terceira núpcias, em 1649, com Johana Gajusová.
Na Holanda, instalado em Amsterdam, Comenius mesmo combalido reúne forças para prosseguir seu trabalho de educador e reformador social. E ele cresce de novo. Segundo Covello (1991) conscientes do valor de Comenius as autoridades holandesas propõem ao hóspede a publicação de todas as suas obras pedagógicas, muitas das quais já bastante conhecidas no país.
O grande sábio morávio vive feliz na Holanda, experimentando uma nova e reconfortante vida. Não enfrenta dificuldades financeiras, tem o reconhecimento do público e das autoridades, e na última fase de sua vida dedica-se a ser um apologista da paz, propugnando pela fraternidade entre os povos e as igrejas.
Sua vida chega, então, ao fim. Em 1670, quase octogenário, adoece gravemente, mas antes de morrer no dia 15 de novembro, ainda encontra fôlego para escrever um resumo de seus princípios pedagógicos, transcritos noutro capítulo deste trabalho, e alvo de comentários.
Comenius morre cercado por familiares e amigos, com aura de santidade, e é sepultado numa pequena igreja em Naarden, onde foi construído seu mausoléu.
Conforme Covello (1991), em 1956 a Conferência Internacional da UNESCO realizada em Nova Delhi delibera a publicação das obras de Comenius e o aponta como um dos primeiros propagadores das idéias que inspiraram a UNESCO por ocasião de sua fundação.

2. Principais Obras
Como autor de livros e panfletos, Comenius foi infatigável e muito versátil em matéria de assuntos. Os pesquisadores costumam classificar as obras comenianas em três categorias: a) as que tratam exclusivamente de princípios educacionais; b) outras que tratam de recursos auxiliares para a instrução na sala de aula; e c) as obras mistas, nas quais se incluem as religiosas, como sermões, histórias eclesiásticas, hinários, catecismos, traduções e trabalhos proféticos.
Na opinião de Eby (1962) os textos de Comenius abrangendo princípios de métodos, atingiram extraordinária popularidade. Já as suas recomendações curriculares, embora de alguma forma extravagantes e grandiosas, estavam, porém, em harmonia com a nova corrente de reforma no currículo. E conclui: “Seu esquema geral de reforma só encontrou a mais fria recepção e foi rapidamente entregue ao esquecimento”
Todos os pesquisadores são unânimes em apontar a Didacta Magna ou A Grande Didactica, como sendo sua obra-prima e sua maior contribuição para o pensamento educacional.
Entre tantas obras Comenius escreveu:
- O labirinto do mundo, 1623
- Didactica checa, 1627
- Guia da escola materna, 1630
- Porta aberta das línguas, 1631
- Didactica Magna (versão latina da Didactica checa), 1631
- Novíssimo método das línguas (1647)
- O mundo ilustrado (1651)
- Opera didactica omnia ab anno 1627 ad 1657
- Consulta universal sobre o melhoramento dos negócios humanos (1657)
- O anjo da paz, 1667
- A única coisa necessária(1668)

3. Ensinamentos
Nesta coletânea de ensinamentos comenianos é fácil perceber a grande preocupação do grande mestre morávio com a educação integral do homem, a partir de criança. Talvez por ter sido durante toda a sua vida uma pessoa mística, temente a Deus e profundamente admiradora da natureza, de onde procurava tirar os exemplos a serem aplicados, Comenius mostra-se como um educador do tipo que hoje se enquadraria como um moralista.
Com efeito, ele sempre procurou ser um reformador social e não apenas um pedagogo, ou teólogo, sempre colocando a figura de Deus no centro de tudo, atitude não tão encontradiça entre os educadores contemporâneos, mais ligados aos modismos, que muitas vezes não passam de coisas do passado maquiadas, e apresentadas como novidade.
Os ensinamentos de Comenius, mesmo com mais de 400 anos de existência, ainda não perderam totalmente a sua atualidade, daí por que vale a pena conhecê-los e, em muitos casos, segui-los à risca ou reciclando-os e adaptando-os à vida atual.

Quando se vê Montessori (1965:13) dizer:

Devemos despertar na consciência do educador o interesse pelas manifestações dos fenômenos naturais em geral, levando-o a amar a natureza e a sentir a ansiosa expectativa de todo aquele que aguarda o resultado de uma experiência que preparou com cuidado e carinho

fica difícil não acreditar que a obra de Comenius continua viva.
Vamos, então beber um pouco da sua sabedoria nos ensinamentos abaixo, todos transcritos de sua Didactica Magna:

“As Sagradas Escrituras nos ensinam primordialmente que não há caminho mais eficaz para corrigir a corrupção humana que a correta educação da juventude”. (Comenius, 1997:27)

“Se for preciso curar a corrupção do gênero humano, é preciso fazê-lo sobretudo por meio de uma atenta e prudente educação da juventude”. (Op. cit., 29)

“Educar os jovens com sabedoria significa, ademais, prover a que sua alma seja preservada da corrupção do mundo; favorecer para que germinem com grande eficácia – as sementes de honestidade que neles se encontram, por meio de ensinamentos e exemplos castos e assíduos”. (Op. cit., 30)

“Grande parte da juventude cresce sem a devida educação, como uma selva que ninguém cuida de plantar, irrigar, podar e fazer crescer bem. Por esse motivo, hábitos e costumes selvagens e indômitos acabaram prevalecendo em todo o mundo”. (Op. cit., 32)

“O que somos, fazemos, pensamos, dizemos, inventamos, conhecemos, possuímos é como uma escada com a qual, subindo sempre mais, alcançamos degraus mais altos, mas nunca chegamos ao topo”. (Op. cit., 44)

“Quem ama o poder e a riqueza não encontrará onde saciar sua fome, mesmo que possua todo o universo. Quem almeja demasiadas honras não ficará satisfeito nem que seja adorado por todo o universo. Quem se entrega aos prazeres, por mais que os sentidos se engolfem em rios de delícias, tudo acaba se consumindo, e o desejo se volta de um objeto para outro. Quem aplica o espírito no estudo da sabedoria nunca encontrará o fim: quanto mais souber, tanto mais compreenderá que falta muito por saber”. (Op. cit., 45)

“Três são as espécies de vida para cada um de nós e três as moradas: o útero materno, a Terra e o Céu. Da primeira se entra na segunda pelo nascimento; da segunda, na terceira pela morte e pela ressurreição; da terceira nunca se sai, por toda a eternidade. Na primeira recebemos apenas a vida, com movimentos e sentidos incipientes; na segunda, a vida, o movimento, os sentidos, com os primórdios do intelecto; na terceira, a plenitude absoluta de tudo”. (Op. cit., 46-47)

“Entendo por INSTRUÇÃO todo conhecimento das coisas, das artes e das línguas; por COSTUMES, não só a correção do comportamento externo, mas o equilíbrio interno e externo dos movimentos da alma; por RELIGIÃO, a interna veneração com que o espírito humano se liga e se vincula à divindade suprema”. (Op. cit., 55)

“Quem prefere as coisas agradáveis às saudáveis é tolo. E ainda mais tolo é quem, desejando ser homem, cuide mais dos ornamentos do homem que de sua essência”. (Op. cit., 56)

“Todo homem nasceu com capacidade de adquirir a ciência das coisas, antes de mais nada porque é imagem de Deus”. (Op. cit., 58)

“O homem nada recebe do exterior, mas só precisa expandir e desenvolver as coisas que já traz implícitas em si, mostrando a natureza de cada uma”. (Op. cit., 59)

“No homem é inerente o desejo de saber e também de enfrentar (e não apenas de suportar) os esforços que isso implica. Tal já acontece na primeira infância e nos acompanha por toda a vida”. (Op. cit., 60)

“Os exemplos dos autodidatas mostram com muita clareza que o homem, com a orientação da natureza tudo pode alcançar”. (Op. cit., 61)

“Nosso cérebro, forja de pensamentos, é com justiça comparado à cera, sobre a qual são impressos os selos ou com a qual se moldam estatuetas. De fato, assim como a cera que, adaptando-se a todas as formas, pode ser plasmada e replasmada de todas as maneiras, também o cérebro, abrangendo as imagens de todas as coisas, recebe em si o que o universo contém”. (Op. cit., 62)

“Ah, como somos cegos se não reconhecemos que estão em nós as raízes de toda a harmonia!”. (Op. cit., 65)

“Nos movimentos da alma, a roda principal é a vontade; os pesos que a fazem mover-se são os desejos e os afetos que a fazem pender para um lado ou para o outro. O escapo, que aumenta ou diminui o movimento, é a razão que mede e determina o que deve acolher ou do que deve fugir, onde e em que medida. Os outros movimentos da alma são como rodas menores que seguem a principal. Se aos desejos e aos afetos não for atribuído um peso excessivamente grande, e se o escapo, que é a razão, aumentar ou diminuir os movimentos com discernimento, só poderá seguir-se harmonia e o acordo perfeito das virtudes, ou seja, um equilíbrio conveniente entre ações e paixões”. (Op. cit., 66)

“É coisa torpe e nefanda, sinal evidente de ingratidão, insistir na degeneração e esquecer a regeneração!”. (Op. cit., 68)

“A natureza dá as sementes da ciência, da honestidade, da religião, mas não dá a ciência, a virtude, a religião; estas são adquiridas apenas com a prece, com o estudo, com o esforço pessoal”. (Op. cit., 71)

“A educação é necessária para todos”. (Op. cit., 75)

“O que são os ricos sem sabedoria, senão porcos engordados com farelo? Os pobres sem o conhecimento das coisas o que são, senão burros de carga? Um homem de bom aspecto mas ignorante o que é, senão um papagaio de bela plumagem? Ou então, como disse alguém (Diógenes Laércio), uma bainha de ouro com um punhal de chumbo? A quem um dia caberá comandar outros, como reis, príncipes, magistrados, pastores e doutores da igreja, a estes, mais que a ninguém, é necessária a educação profunda da sabedoria, assim como os guias precisam ter os olhos treinados, e os intérpretes a língua, a trompa precisa ser capaz de tocar, e a espada de cortar. Do mesmo modo, os súditos precisam ser iluminados, para que saibam obedecer com prudência os que comandam com sabedoria: não por obrigação e com servil obséquio, mas de bom grado e por amor à ordem. Isso porque uma criatura racional deve ser guiada pela razão, e não por meio de gritos, cárcere, pancadas e aqueles que agem de modo diferente ofendem a Deus, que neles também opôs sua imagem e os assuntos humanos estarão cheios – como estão – de violência e descontentamento. Fique estabelecido, pois, que a todos os que nasceram homens a educação é necessária, para que sejam homens e não animais ferozes, não animais brutos, não paus inúteis. Segue-se que alguém só estará acima dos outros se for mais preparado que os outros”. (Op. cit., 75-76)

“No homem é sólido e duradouro apenas o que foi absorvido na primeira idade”. (Op. cit., 80)

“Para orientar e guiar as crianças, são mais úteis os exemplos do que as regras: se algo é ensinado a uma criança, pouco fica gravado, mas se for mostrado o que os outros fazem, ela logo os imitará, sem precisar de ordens”. (Op. cit., 86)

“Se quisermos servir a Deus, ao próximo e nós mesmos, devemos ter piedade em relação a Deus, honestidade em relação ao próximo e ciência em relação a nós mesmos”. (Op. cit., 98)

“A arte de ensinar não exige mais que uma disposição tecnicamente bem feita do tempo, das coisas e do método”. (Op. cit., 127)

“Que tesouro de instrução conseguirás se a cada hora aprenderes nem que seja um único teorema de uma ciência, uma única regra de aplicação técnica, uma narrativa ou uma máxima elegante (coisas que, claramente, não requerem esforço?)”. (Op. cit., 143)

“As coisas todas só atraem a juventude quando adequadas à sua idade e quando as explicações são muito claras e intercaladas com algumas amenidades ou com assuntos menos sérios, mas sempre aprazíveis. É isso que significa unir o útil ao agradável”. (Op. cit., 170)

“Facilitará o estudo do aluno quem lhe mostrar como usar na vida cotidiana aquilo que está sendo ensinado”. (Op. cit., 180)

“A escola tem a missão de ocupar os jovens só com coisas sérias”. (Op. cit., 185)

“Por que vagar entre opiniões diferentes sobre as coisas quando se busca conhecer o que são as coisas realmente?”. (Op. cit., 190)

“O homem instruído com fundamento é como uma árvore que se sustenta com as próprias raízes e a própria linfa; por isso, estará sempre vigoroso (aliás, fica mais robusto a cada dia que passa) verdejante, e produz flores e frutos”. (Op. cit., 192)

“Tudo o que se ensina deve ser consolidado por razões que não permitam dúvidas nem esquecimentos”. (Op. cit., 196)

“De tudo o que se aprende, é preciso buscar logo a utilidade, para não aprender nada de inútil”. (Op. cit., 198)

“Instrução nunca chegará a ser realmente sólida se não se instituírem repetições e exercícios, freqüentes e bem feitos”. (Op. cit., 199)

“É melhor ter no bolso uma moeda de ouro que cem de chumbo”. (Op. cit., 221)

“Devem ser banidos das escolas todos os autores que ensinam só palavras, sem dar a conhecer nada de útil”. (Op. cit., 223)

“O juízo correto acerca das coisas é o verdadeiro fundamento de todas as virtudes”. (Op. cit., 264)

“O triste vício do egoísmo é estritamente relacionado com a natureza corrupta que faz desejar apenas o proveito próprio, sem atentar os outros”. (Op. cit., 267)

“É preciso manter os filhos longe das más companhias para que não sejam por elas corrompidos”. (Op. cit., 269)

“Antes de mais nada, acredito que todos concordam que a disciplina deve ser exercida contra quem erra, mas não porque errou (o que foi feito, feito está), mas para que não erre mais. Portanto, deve ser exercida sem paixões, sem ira, sem ódio, mas com simplicidade e sinceridade, de tal modo que mesmo aquele a quem for aplicada perceba que é para seu bem e que é ditada pelo afeto paterno de quem tem a responsabilidade de guiá-lo; assim, poderá recebê-la com o mesmo espírito com que se toma um remédio amargo receitado pelo médico”. (Op. cit., 311-312)

“Quem ignora o seu próprio mal dele não cuida; quem não sente a dor não geme; quem não percebe o perigo não estremece nem quando está sobre o abismo ou o precipício; assim, não espanta que não se preocupe aquele que não nota as desordens que afligem o gênero humano”. (Op. cit., 25)

“Nada é mais difícil do que perder os hábitos adquiridos (o hábito de fato é uma segunda natureza, e tu podes expulsar a natureza à força, mas ela sempre retorna), é lógico que nada é mais difícil que reeducar um homem que recebeu educação ruim; depois que a árvore cresceu, seja ela alta ou baixa, com os ramos esticados ou curvos, uma vez adulta assim permanece e não se deixa modificar”. (Op. cit., 29)

“Se quisermos igrejas, estados e famílias bem organizados e florescentes, antes de mais nada ponhamos em ordem as escolas, fazendo-as florescer, para que se tornem realmente forjas de homens e viveiros de homens de igreja, estado e família; só assim alcançaremos nossos fins, e não de outro modo”. (Op. cit., 34)

“Quem nos deu a vontade nos fará atingir o objetivo: é o que devemos pedir à misericórdia divina e esperar com confiança”. (Op. cit., 39)

“Todos os que tem a tarefa de formar homens devem educá-los de tal forma que vivam lembrados de sua dignidade e de sua excelência: que procurem, pois, orientar seus esforços para esse supremo fim”. (Op. cit., 42)

“Tudo existe em função do homem, inclusive o tempo. Por isso, não será concedido ao mundo uma duração maior que a necessária para completar o número dos eleitos”. (Op. cit., 51)

“Assim como é certo que o tempo transcorrido no útero materno é uma preparação para a vida no corpo, também o tempo transcorrido no corpo é preparação para a vida que dará continuidade à vida presente e durará por toda a eternidade. Bem-aventurado aquele que sai do útero materno com os membros bem formados; mil vezes bem-aventurados aquele que deixar esta vida com a alma limpa”. (Op. cit., 52)

“Se fosse concedido ao homem mil anos, durante os quais, adquirindo sempre novos conhecimentos, ele passasse de um conhecimento a outro, ainda assim teria novos objetos para conhecer, tal é a inexaurível capacidade da mente humana, que no conhecimento é como um abismo”. (Op. cit., 59)

“Devemos admirar o espelho da sabedoria de Deus, que obrou de tal modo que a massa não muito grande do cérebro fosse suficiente para receber milhares e milhares de imagens”. (Op. cit., 63)

“Abstenhamo-nos de limitar a graça de Deus, pois Ele está pronto a derrama-la sobre nós com prodigalidade”. (Op. cit., 69)

“Ninguém cuide realmente de ser homem se não tiver aprendido a comportar-se como homem, ou seja, se não tiver sido formado nas coisas que fazem o homem”. (Op. cit., 71-72)

“A educação deverá ser iniciada muito cedo, porque na vida não só se deve aprender, como também agir. Convém, pois, instruirmos-nos o mais depressa possível sobre o que se deve fazer na vida para que não nos aconteça ter de abandoná-la antes de termos aprendido a comportar-nos”. (Op. cit., 78)

“O homem que por toda a vida tem infinitas coisas para conhecer, experimentar e fazer, deve abrir a tempo os seus sentidos à contemplação das coisas”. (Op. cit., 78)

“Para que o homem possa ser formado para a humanidade, Deus lhe concedeu os anos da juventude, durante os quais é incapaz de fazer outras coisas, tendo condições apenas de se formar”. (Op. cit., 80)

“É muito perigoso deixar de infundir no homem, desde o berço, regras salutares de vida”. (Op. cit., 81)

“Em primeiro lugar, todo o homem nasceu para o mesmo fim principal, o de ser homem, ou seja, criatura racional senhora das outras criaturas, imagem manifesta de seu criador. Portanto, todos quantos forem devidamente instruídos nas letras, nas virtudes e na religião devem tornar-se capazes de levar a vida presente de modo útil e de preparar-se dignamente para a vida futura”. (Op. cit., 89)

“A essência da alma é composta por três faculdades (que correspondem à Trindade incriada): intelecto, vontade e memória. O intelecto aplica-se à observação da diversidade dos objetos (até as pequeníssimas minúcias). A vontade provê à opção, ou seja, à escolha das coisas profícuas e à rejeição das nocivas. A memória retém para uso futuro as coisas que antes ocuparam o intelecto e a vontade, recordando à alma a sua dependência de Deus e suas missões: sob esse aspecto, chama-se também consciência. Para que essas faculdades possam cumprir bem a sua tarefa, é necessário instruí-las nas coisas que iluminam o intelecto, dirigem a vontade, estimulam a consciência: para que o intelecto conheça com agudeza, a vontade escolha sem erros e a consciência anseie por consagrar tudo a Deus. Portanto, assim como essas faculdades (intelecto, vontade e consciência), por constituírem uma só alma, não podem ser separadas, também os três ornamentos da alma (instrução, virtude e piedade) não devem ser separados”. (Op. cit., 97)

“Vãos desejos: os dias passados não voltarão. Nenhum de nós, já entrando em anos, voltará a ser jovem, para poder aprender a levar a vida de modo mais idôneo: só nos resta uma coisa, de uma só coisa somos capazes, que é ajudar nossos pósteros na medida do possível; assim, demonstrando os erros em que nossos preceptores nos lançaram, mostraremos o caminho para evitá-los”. (Op. cit., 108)

“Não se faz um mercúrio com qualquer madeira, dizem alguns; eu respondo que de qualquer homem se faz um homem, desde que não haja corrupção”. (Op. cit., 113)

“Deus quis conceder-nos apenas o tempo que considerou suficiente à preparação de uma vida melhor. Para esse fim, a vida é suficientemente longa, se soubermos fazer bom uso”. (Op. cit., 133)

“Deus quis que as coisas para o nosso uso fossem muitas e diferentes, para que muitas sejam as coisas em que nos empenhamos, exercitamos e instruímos”. (Op. cit., 133)

“Quem trabalha com destreza e paixão, sabendo o que, onde, quando e como é necessário fazer e deixar de fazer, não terá desenganos. No entanto, é verdade que às vezes até os mais experientes não obtêm resultados (pois para o homem é quase impossível realizar tudo com tal precisão que não lhe escape algum erro de um modo ou de outro), mas aqui não nos ocupamos da perícia ou do acaso, porém da arte, ou seja, do modo como é possível prevenir os acidentes”. (Op. cit., 146)

“A criança não pode ser instruída enquanto é pequena demais, porque a raiz da inteligência ainda está escondida. Instruir o homem na velhice é tardio demais, pois a inteligência e a memória começam a arrefecer; na idade madura isso é difícil porque é trabalhoso reunir as forças da mente, que estão dispersas nas várias ocupações. Portanto, isso deve ser feito na juventude, quando o vigor da vida e da mente está em ascensão: nesse momento, todas as faculdades estão crescendo e lançando raízes profundas”. (Op. cit., 148)
(Extraído do livro Comenius, o criador da Didática Moderna, de Daniel Walker)

BIBLIOGRAFIA
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