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Contos-->DESTINO -- 09/11/2002 - 18:39 (Ailton Sanches) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


CONTO Nº 01

D E S T I N O

Naquele ambiente sombrio do Tribunal do Juri, o juiz levanta seu martelo e bate duas vezes, anunciando a sua sentença – dezoito anos de prisão, sem direito a recorrer da pena.
As lágrimas rolam pela face de dona joventina. A perplexidade é geral. Como pode
aquela senhora de mais de sessenta anos de vida e mais de quarenta anos de matrimonio matar o Antonio Juvêncio?
Pouco se falou do assunto os jornais locais, mas ao determinar a sentença, a estória se espalhou. Dona Joventina recostada às grades de uma cela, sozinha, isolada, em razão de sua idade, fica só a pensar na vida que lhe resta, longe dos filhos, dos netos, dos irmãos da igreja, de tudo mais. Também, dava de ombros, meus filhos quase nem ligava para nos. Passava meses sem que fossem nos ver. Telefonema, duas, no mais quatro vezes por mês. Se já vivia sozinha, agora não faz diferença. Só que não matei meu marido. Ninguém quer acreditar. Acho que até Deus está duvidando de mim, mas, quando com ele estiver vou convencê-lo da minha inocência
No século passado, Antonio e Joventina se conheceram em uma das muitas reuniões de uma igreja evangélica, o namoro foi imediato e a paixão que tinham um pelo outro tornou-se notória para a comunidade e para a família. Casaram-se, foram enfrentar as agruras da vida. De fato a vida sempre foi muito dura para os dois, pior ainda para Joventina que alem de cuidar dos filhos dava conta de todos os afazeres da casa. Antonio também trabalhava duro. Esforçou-se para estudar e conseguiu um bom sustento financeiro na aposentadoria.
No inicio do casamento, foram pagar aluguel. Antonio não se conformava; dizia: é jogar dinheiro fora, temos que ter nem siquer um barraco que seja nosso. Era um lutador e logo, aos três anos de casado, já tinha o seu barraco, ou melhor, sua meia-água.
Com o passar dos anos, o governo, de quem era o eterno empregado, mandou-o para Brasília. Ali chegou com a amada esposa e dois filhos. A nova terra era tão promissora que o casal resolvera ter mais dois e assim a prole subia para quatro. Apesar das lutas, eram felizes. Sempre juntos em todos os lugares, na igreja, nos shopings: viajavam muito, conheciam vários lugares do Brasil.
Os filhos se formaram, todos estudaram em faculdades. Um já era até doutor. Agora todos casados e de seus casamentos, já lhe nasceram outra geração, a dos netos e, mais alguns anos por certo, viriam os bisnetos. Era uma vida consolidada. Era difícil entender o acontecido.
O corpo de seu Antonio Juvêncio foi levado para o Instituto de Medicina Legal, a fim de que fosse submetido a autopsia. Os exames de necropsia declarou morte por envenenamento: foi encontrado em seu organismo grande quantidade de quinino, veneno letal, capaz de provocar morte instantânea por sufocação, e, não por parada cardíaca como se presumia.
Com o resultado do laudo a policia tinha que prender alguém, a fim de apurar a estória. Mas prender quem? O mais lógico seria a pessoa que, na ocasião da consumação da morte estivesse a seu lado.
Duas horas da madrugada. Quem poderia estar ao lado de Antonio Juvêncio, deitado na cama, em seu quarto, dentro de sua casa? Dona Joventina. Era óbvio que seria ela a acusada número um, numero dois e assim por diante. Quem mais poderia causar suspeição de ter matado o seu Antonio Juvêncio?
O júri não teve dúvidas, todas as provas e circunstancias apontavam para dona Joventina. E o pior que a própria Joventina não sabia explicar ou siquer imaginar o que de fato aconteceu.
O MM Juiz não teve outra alternativa. Tratava-se de crime passional e os rigores da lei deveriam ser aplicados, e assim foi feito. Diante das evidencias, crime doloso com aplicação de uma pena irrecorrível para que a ré Joventina, terminasse seus anos na prisão. Nos últimos meses, Joventina acabara de completar sessenta e quatro anos. Com muita sorte, se lhe fosse dada a liberdade condicional, sairia com pouco mas de setenta e três anos. Valeria a pena? Será que sria recebida pelos filhos, pelos netos, pelos bisnetos e teria o restante de uma existência normal. E seus familiares conseguiriam perdoar uma mãe que de forma tão violenta tirara a vida de seu pai querido?
De fato ao tomarem conhecimento do caso, sem que contudo houvesse uma explicação plausível, seus filhos lhe deram total abandono. Havia uma dor muito grande e o espírito de misericórdia se apossou de todos eles. Até o mais cético condoeu-se da mãe. Mas como entender uma tragédia como esta?
A principio, a revolta era geral, mãe monstruosa. Viveu cerca de quarenta e seis anos juntos entre namoro e casamento. Passaram por momentos terríveis na vida. Perderam noites de vigília cuidando dos filhos. Quantas e quantas vezes dobraram os joelhos buscando a misericórdia de Deus? Eram perguntas e perguntas que sempre voltavam vazias.
No dia anterior a tragédia, tinha sido um domingo. E, como sempre acontecia, era a sua rotina semanal, levantaram-se cedo, arrumaram--se e foram para a Escola Bíblica Dominical. Cantaram vários corinhos de louvor, ouviram o estudo da palavra, cantaram novamente, oraram e comungaram com os irmãos. À saída cumprimentaram a todos,.com aquela alegria da irmandade. Após tão abençoada reunião resolveram almoçar juntos, como faziam de vez em quando. Estavam felizes, falavam sobre os filhos, e toda a família, fizeram até planos para uma viagem. Passaram à tarde descansando e vendo televisão. Mais tarde, fizeram um lanche, se aprontaram e novamente foram à igreja louvar a Deus. Ao regressar da Igreja ainda tiveram tempo de ver um pouco do fantástico. Cansados, trataram logo de ir dormir. Teria sido uma noite tranqüila se o destino não intervisse em suas pacatas histórias.
A noite passou e a segunda-feira já ia para as nove horas da manhã, quando dona Joventina desconfiou que seu Antonio estava dormindo demais. Não levantara nem para caminhar. Foi até ao quarto, abrindo a porta devagarzinho para não assusta-lo, viu-o enrolado nas cobertas, tal como o deixou ao levantar-se. Cotucou-o uma vez, duas. Puxou-lhe as cobertas e nada, não se mexia. Resolveu olhar mais de perto, mais de perto e constatou que estava imóvel, pálido, muito frio e enrijecido.
A primeira reação foi de muito espanto. A segunda foi de um grito lancinante que parece, chamou a atenção de toda a vizinhança: mas, ninguém escutou: não sabia o que fazer. O desespero foi tomando conta de sua vida, saiu à porta chamando o vizinho do lado. O choro agonizante era inevitável e as pessoas começaram a tomar providencias. Fazendo ligações telefônicas para vários lugares: filhos, pastor, irmãos da fé. Estava armado um pandemônio. A policia cumpriu seu dever: o corpo de bombeiros retirou o corpo do local: o IML procedeu a perícia e, com tantos procedimentos, voltaram para prender dona Joventina. Acusação? Homicídio culposo.
As providencias de praxe foram tomadas. No sepultamento muito gente presente, menos dona Joventina. Estava sob a custodia da lei. Os filhos a penalizaram não permitindo que a pobre coitada assistisse ao enterro.
Triste destino.
Um anjo me contou que naquela fatídica madrugada, seu Antonio, como sempre roncava muito, não se sabe como, durante a tarde de domingo um mosquito de uma raça africana entrara em seu quarto, segundo pesquisa, este mosquito, embora, muito pequeno, carregava uma forte dose de quinino veneno letal, o qual, provoca morte por asfixia, e deterioração dos tecidos coronários, por indução aos vasos sanguinos. Sua ação é tão repentina que nenhuma chance dá a vítima. Por coincidência, em uma medicina carente de uma atualização e ainda retrogada não existem chances de salvamento. Seu Antonio roncava muito e em razão de seus problemas de respiração, geralmente dormia de boca aberta. Em uma dessa vezes aspirou para a sua garganta o letal mosquitinho, sem que o percebesse, o engoliu. Seu estomago registrou o fato e de imediato liberou as enzimas para destruição do quem sabe, alimento. Espalhou-se pela sua corrente sanguina e daí o sufocamento foi inevitável.
A justiça é cega, porem, seus executores deveriam enxergar não somente o texto da lei, mas a credibilidade de pessoas que trazem em sua historia, tantos predicados que a tornaria incapaz de cometer algum delito.
Dona Joventina está sofrendo porque foi vitima de um destino implacável. Um destino que durante toda a vida não lhe deu a menor chance. E ao final, quando tudo parecia estar dando certo e que ao lado de Antonio viveria até a morte, foi tragicamente separada do amor da sua vida do companheiro de muitos dias e muitas noites e ainda vive a mercê de toda sorte de horrores. Desprezo, incompreensão e abandono dos seus entes mais queridos. Definhando e morrendo numa cela fria e solitária.
Está é a vida.
Autor: Ailton Sanches
TAG – 22/07/2002

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