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Ensaios-->Pequeno estudo científico a respeito da probabilidade... -- 29/01/2003 - 01:13 (William Henrique Pereira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos



Pequeno estudo científico a respeito da probabilidade matemática e a teoria da comunicação

Algo aconteceu-me recentemente na rua, uma situação corriqueira, à primeira vista, indigna de análise. Mas depois me pus a refletir a respeito da mesma e passei a notar uma série de coisas interessantes que não podem simplesmente ser deixadas de lado.
Tomemos a seguinte situação:
Um sujeito pára em frente de um casal de jovens, na rua, e pergunta:
- Oi. Você tem um cigarro? – dirigindo-se ao rapaz. Este olha sem expressão alguma no rosto e diz:
- Eu não fumo.
Note-se bem que: 1) o rapaz não responde adeqüadamente à pergunta, ou seja, ao invés de dizer “tenho, claro”, ou então “não tenho”, simplesmente, ele desvia-se propositalmente da real pergunta, e responde à seguinte questão:
- Você fuma?
- Eu não fumo.
O que seria completamente coerente. Mas não, o rapaz exprime na resposta, forsosamente, toda o provável orgulho que possui dentro de si de não ser um fumante. Orgulho este talvez alavancado pela presença da namorada, que ele quer fatalmente impressionar.
Como o homem é educado, ele não continua assim a conversa:
- Quem te perguntou?
Talvez, se o sujeito tivesse perguntado por um trocado, o rapaz pudesse ter dito “mas é claro, aqui está”, com um gesto de forçada naturalidade e indiferença, mesmo sabendo que as coisas não estão lá para se ficar dando esmola, há de se economizar, porém, a namorada ao lado...
Isso ressalta bem a falta de coerência e, talvez, entendimento que temos na comunicação hoje em dia, ou seja, divergências entre emissor e receptor de uma mensagem.
2) ao mesmo tempo somos levados a observar que o rapaz não é pecador solitário. O sujeito que o aborda, em uma ocasião diversa, também seria vítima da má comunicação, devido à sua pergunta desonesta. Por que desonesta? Oras, uma pergunta é desonesta quando a fazemos sem realmente termos a intenção de a fazermos de tal forma, quando na verdade nossa vontade é fazer uma outra, mais direta, mais clara. Ele pergunta:
- Você tem um cigarro?
Uma pergunta. Que mostra seu interesse em saber se o rapaz tem. Um cigarro. Ao invés de ser direto e objetivo, e perguntar “Pode me dar um cigarro?”, ele procura saber algo que não vai lhe adiantar em nada, ou seja, saber SE o outro tem o cigarro.
Pra começar, ele especificou a unidade de um cigarro. Não perguntou se ele tem um maço, uma caixa, ou dois, três... quis saber se tinha UM cigarro, e isso é importante. Por que é importante? Porque existe algo chamado pressuposto, um artifício que no nosso dia-a-dia não é muito empregado na fala rotineira, mas que, na propaganda, ou nos tribunais, por exemplo, pode ser utilizada com muita perícia. Trata-se de quando omitimos algo deliberadamente, algo que damos por subentendido ao receptor, sendo que pode ser algo relativo, por exemplo, a um produto. Na relação de informações do mesmo, destaca-se as suas melhores qualidades, e omite-se quaisquer possíveis falhas ou faltas que o mesmo possa ter, e o tem, quase que obrigatoriamente. É como se o publicitário dissesse: “Bem, nós não estamos contando nenhuma mentira. Somente DEIXAMOS de expor algumas coisinhas”. E não se trata de propaganda enganosa, pelo contrário, é um artifício dos mais comuns no meio. São idéias não expressas de maneira explícita, que decorrem logicamente do sentido de certas palavras ou expressões contidas na frase. Vejamos o seguinte exemplo:

Danilo tornou-se um pacifista convicto.

Certo. A informação explícita da frase é que hoje Danilo é um pacifista convicto. Do sentido do verbo tornar-se, que significa “vir a ser”, decorre, no entanto, logicamente a a informação implícita de que anteriormente Danilo não era um pacifista convicto. Se ele o fosse, não se poderia usar o verbo tornar-se. Porém, nada impede que Danilo já fosse um pacifista, porém não era convicto. Tinha suas dúvidas. Mas tornou-se convicto. Ou pode significar que ele não era pacifista coisa alguma, mas se tornou um, e, por sinal, convicto.
Podemos analisar também a existência, na linguagem, dos subentendidos. São diferentes dos pressupostos. Subentendidos são insinuações, não marcadas lingüisticamente, contidas numa frase. Há uma diferença enrome entre um e outro. Pressupostos são informações estabelecidas como indiscutíveis tanto para o falante como para o ouvinte, uma vez que decorre necessariamente de algum elemento lingüístico colocado na frase. Já o subentendido é de responsabilidade do ouvinte. Vejamos, por exemplo, se o sujeito chega e simplesmente pára ao lado do casal e diz, como quem não quer nada:
- Eu fumo e não tenho cigarros.
Ou, ainda:
- Eu preciso de um cigarro.
Isso seria mais provável de acontecer caso algum dos dois namorados estivesse fumando no momento (mas isso será discutido mais adiante). O sujeito disse algo que não força o rapaz ou a moça a responderem alguma coisa, mas SUGERE que está pedindo um cigarro, se estes o tiverem. Eles podem tanto calar-se, continuando o que faziam, como podem atender à vontade oculta do sujeito, dizendo se ele quer um cigarro, ou, ainda, dizendo-lhe que não possuem cigarro. É claro que não adiantaria o sujeito dizer a frase acima em voz baixa e continuar andando. Por isso, ele pára, anda ao redor e diz insinuantemente. Algumas possíveis reações do casal:
- Amor, dá um cigarro pro homem...
- Claro! Ei, homem, aqui está um cigarro pra você!
Ou:
- Não temos cigarro.
Ou ainda:
- E o que nós temos com isso?
A última opção é bem mal-educada, mas é possível também.
O falante pode esconder-se atrás do sentido literal das palavras e negar que tenha dito o que o ouvinte depreendeu de suas palavras, também:
- Que vontade de fumar!
- Aqui está, pegue!
- Por que me dá este cigarro? Eu só disse “que vontade de fumar”! Não lhe pedi um cigarro, pedi?
Ele pode, realmente, não querer um cigarro. Só expressou seu desejo, fez um comentário. Poderia estar falando sozinho, e não com o casal. Além disso, não especificou que queria cigarro. Poderia ser vontade de fumar charuto, cachimbo, ou outras substâncias... ou então ele pode reagir desta forma:
- Estou com vontade de fumar mas não vou fumar, jovem! Estou tentando parar! É claro que tenho vontade, fazem duas semanas que não fumo! E você ainda vem me tentar, me oferecendo esse veneno?! Tenha dó!
Mas é uma possibilidade menos provável.
Outro caso:
- Que vontade de fumar!
O rapaz pode dizer que fumar faz mal à saúde:
- Cigarro mata, meu senhor.
- Concordo. Mata.
E ninguém diz mais nada. Seria perfeitamente natural tal situação. Um disse que sentia vontade, o outro observou que cigarro faz mal à saúde, e o outro concordou. Não pediu cigarro algum.
A mesma coisa quando, em um recinto fechado, duas pessoas conversam. Uma fuma. A outra começa a tossir. A outra deveria subentender que deveria apagar o cigarro ou fumar em outro lugar. Na nossa sociedade agimos assim. Mas um sujeito pode negar-se a admitir ter compreendido a “indireta”. Continua fumando, o outro tossindo, se esgoelando. Até que ele fale “poderia apagar o cigarro, por favor?”, ou “poderia fumar lá fora?”, o outro não tem a obrigação, por lei, de entender o gesto. O sujeito pode estar fumando, o outro tossindo, o fumante diz:
- Que foi? A fumaça o incomoda? Quer que apague?
- Não, não disse nada! Só estou tossindo, dá licença?
- Tudo bem, só quis...
- Estou tossindo! Além disso, a fumaça do cigarro, apesar de eu não fumar, me agrada muito, principalmente quando soltada no meu rosto dentro de ambientes fechados.
- Que curioso...
- É a vida! Fume mais, por favor!
O subentendido serve muitas vezes para o falante proteger-se. Com ele, transmite a informação que deseja dar a conhecer sem se comprometer. Pode ser usado, com eficácia, em julgamentos e inquéritos. O subentendido diz sem dizer, sugere, mas não diz.
Mas voltemos ao “você tem um cigarro?”.
No nosso caso, vejamos: o rapaz poderia “despistar” o sujeito que o aborda, caso não quisesse lhe dar um cigarro. Ele sabe, por causa de uma conseqüência psiclógica e social, que o homem quer um cigarro, não importando quantos o jovem possui consigo, se os tiver. Porém, o rapaz pode alegar ignorância, e é aí que entram os pressupostos. Ele pode responder de diversas maneiras à pergunta, de modo a não ceder um cigarro. Ele pode dizer:
- Não.
Quando, na verdade, ele possui DOIS cigarros em seu bolso, e não UM, conforme o sujeito perguntou. Aí não temos pressuposto, e sim uma mentira. É uma forma de interpretar a pergunta, por que não? “Ele quis saber se só tenho um”, reflete o rapaz, “mas não, eu tenho dois cigarros, não posso lhe ser útil”, mesmo não tendo sido esta a pergunta:
- Oi. Você tem SÓ um cigarro?
Porém, como possuimos uma cultura, e um contexto social, sabemos que ele jamais perguntaria:
- Você tem DOIS cigarros?
O que não é impossível. Não conhecemos a situação, não sabemos se ele, porventura, possui um tique, uma mania, que consiste em ter de fumar dois cigarros simultanamente, por excesso de nervosismo. Improvável, mas não impossível. Ou mesmo se não estaria pedindo dois, um para si e outro para um amigo, ou ainda, um pra agora, outro pra mais tarde. Neste caso, SE o rapaz tivesse dois cigarros no bolso, ele poderia dizer que sim, que tinha dois. Mas aí também vai de sua consciência, se ele quer ou não dizer a verdade. Muito provavelmente, sua namorada SABE se ele possui cigarros, e, se sim, quantos possui. Portanto, além de mentir perante o Senhor (suponhamos que ele tenha uma religião, neste caso), estaria mentindo também ao lado da companheira. Esta, que chamaremos de “eixo social positivo” (devido à mudança de comportamento do rapaz quando se encontra em sua presença, comportamento este que visa a dar uma impressão positiva de sua pessoa), não a conhecemos, mas, dependendo de sua personalidade e tempo de relação com o companheiro, poderia gostar ou não de que o mesmo contasse uma mentira. Muitas vezes a pessoa não se importa. Porém, quando estamos ao lado de um parceiro (a), ou amigo (a), que conta uma mentira a um terceiro em nossa presença, isso cria dentro de nós a seguinte dúvida: “se ele mentiu assim fácil fácil pra ele, por que não viria a mentir, um dia, pra mim também?”. O que, no caso de relações amorosas, se torna algo de maior consideração, pois envolve questões de lealdade e fidelidade. A mesma coisa quando um sujeito amigo nosso diz coisas pelas costas de um terceiro. Apesar de muitos acharem prazeroso ouvir falar-se mal de outro, pensando um pouco mais ele pode concluir que, quando este que está à sua frente for falar a sós com aquele terceiro, talvez ele mesmo possa ser vítima de fofocas e difamações. É preciso que se escolha bem os amigos.
Mas, voltando ao nosso caso, o rapaz poderia, ainda, ter três, quatro ou mais cigarros no bolso, e, dificilmente, o outro iria acertar na primeira vez a quantidade certa:
- Você tem sete cigarros.
- Não. Errou.
- Você tem quatro cigarros?
- Não.
- Cinco? Dois?
- Pera lá. São três chances. Errou todas! Sinto muito.
O que seria um tanto absurdo. Ele ficaria adivinhando até acertar, como um louco. O que nos leva a crer que, o mais acertado e prático, neste caso, seria a abordagem seguida da seguinte questão:
- QUANTOS cigarros você tem?
Porém, alguém que nos chega pela primeira vez na vida, na rua, e nos faz semelhante pergunta não é levado a sério e é logo tachado de retardado mental. Não é o caso de nosso personagem. Até porque, ele nem sabe SE o rapaz tem os tais cigarros.
De qualquer forma, fica aqui provado que tanto o que faz a pergunta, como o que a responde, ambos não o sabem fazer corretamente, e pecam com suas palavras. Não obtém-se resultados satisfatórios por falta de elaboração.
3) A resposta dada pelo rapaz deveria ser:
- Não.
Isso no caso de realmente não os possuir, que é o que somos levados a crer, devido à sua pertinente resposta “eu não fumo”, totalmente desconexa. É o mesmo que perguntar:
- Que dia é hoje?
E obter como resposta:
- Meu tio.
No caso de possuir cigarro, ou cigarros, o rapaz poderia responder:
- Sim, eu tenho.
Essa resposta é vaga. Por que? Primeiro, porque não especifica realmente nada. Mas é uma resposta satisfatória, pois ele usou uma espécie de subentendido. Respondeu à pergunta do homem. Nada mais. Não esticou o braço até a jaqueta, ao até o bolso, procurando pelos cigarros. Disse que tinha e continuou olhando para a frente, mudo. SE o sujeito deseja um cigarro, e SE ele fuma, o mais acertado seria uma segunda pergunta:
- O senhor quer me dar um?
O que NÃO significa, de forma alguma, que ele fuma, e NEM que ele QUER um (ou mais cigarros). Veja bem, a pergunta foi se o rapaz QUERIA lhe dar um. Dependendo da resposta, ele poderia PEDIR um (ou mais cigarros). Ou não. Além disso, poderia, se realmente fuma e quer um cigarro, acrescentar a seguinte informação à segunda pergunta:
- Eu quero um cigarro.
“Eu quero um cigarro”. O que não leva, necessariamente, o rapaz a pegar o cigarro que eventualmente possua em seus bolsos. Na linguagem dos subentendidos, o homem disse que quer um cigarro. “Paciência”, podia falar o rapaz, “eu quero uma Ferrari e um iate”. Afinal, uns querem pouco na vida, outros muito. Isso é filosofia. MAS, para que o sujeito fosse entendido pelo rapaz, o primeiro teria de dar continuidade a uma conversação que, por incompetência de receptores e transmissores, se torna bem reduzida. Ele diria:
- Se você quiser me dar um cigarro, eu o aceitarei.
Mas, como já perguntou antes se o moço QUER lhe dar um cigarro, vejamos as duas possibilidades:
- Não quero te dar um cigarro.
Não quer ou não pode. Tanto pode os ter, como não. Se não tem, não pode e não pode querer. Então está supondo consigo que, SE os tivesse, não iria querer dá-los ao homem, o que é uma grosseria. Mas convenhamos que, ao lado do eixo (a namorada), ficaria-lhe muito melhor ceder um cigarro ao homem, mostrar-se bacana e tudo o mais. E, finalmente, se tem os cigarros, pode também não querer dar nenhum a ele. Pode ser que seja o último, e que não consiga ficar sem fumar, ou que seja mesmo um sujeito mesquinho, arrogante, ou homem de seus princípios. Diria então:
- Cada um sustenta seus vícios.
O que seria uma grande vergonha, talvez, para o homem, bem mais velho que o rapaz. Desmoralizaria o cidadão na frente da moça, e, talvez, justamente por causa dela, pois o eixo provoca reações diversas no rapaz, e o influencia grandemente. Como já disse, isso depende da relação que possuem no momento. Se é uma relação recente, nova, é natural que o rapaz se sinta um tanto inseguro por enquanto, estando junto da parceira. Quer mostrar-se poderoso, capaz, homem. Se a duração tem mais tempo, vai muito também do gênio que possui o moço.
Moço este que poderia, ainda, responder:
- Sim, quero te dar um cigarro.
Primeiro, note-se o número. Um cigarro. Foi o que disse o homem. Se tivesse pedido dois, três, quem sabe não seria presenteado com vários cigarros pelo rapaz. Mas disse um. Entretanto, isso não leva ainda o rapaz a fazer nada. O homem não pediu o cigarro, nem ao menos se sabe se ele fuma, até o momento em que ele realmente acenda uma unidade e puxe sua fumaça. Faz-se necessária outra sentença:
1) – O senhor QUER um cigarro? Aqui está.
- Não quero, obrigado. Só queria saber se o senhor os tinha, e, se os tendo, seria capaz de me dá-los. Vejo que sim. Estou satisfeito. Obrigado.
- OK, até logo.
- Boa noite.

2) - Eu QUERO um cigarro. Me DÊ um cigarro.
Certo, por que ele parece ter sido tão grosso nesta última frase? Só parece, não foi grosso não, ele foi muito coerente e são. Tudo já foi entendido por ambas as partes. O moço já lhe disse que quer lhe dar um cigarro. O homem já disse que o quer. E ele os tem. Portanto, o que sobra nesta equação é uma oração imperativa:
- Me dê um cigarro.
Se isso ocorrer, o mais natural, agora, seria que o rapaz levasse as mãos aos bolsos e entregasse um cigarro ao homem. Este agradeceria, a seu modo:
- Obrigado.
Que pode variar muito conforme a pessoa:
- Valeu, jovem! Te devo essa!
Ou um simples aceno de cabeça. De qualquer forma, ambos teriam desempenhado corretamente o papel da comunicação, como dois cidadãos racionais. Em seguida o homem poderia:
1) Ir embora;
2) Ir embora fumando (note bem: ainda não sabemos se ele fuma!);
3) Ficar parado;
4) Iniciar outra espécie de conversação (principalmente se obtiver o cigarro do rapaz) com o rapaz ou com o eixo (o eixo, a propósito (a namorada), até o momento mostra-se um tanto fechada em si mesma, pois um estranho, em seus padrões de realidade e sociedade, acaba de os abordar na calada da noite. Ela não pretende, no momento, manifestar-se sob nenhuma maneira. Limita-se a olhar de um para outro, os dois homens presentes, somente aguardando o homem ir-se embora para continuar sua vida em curso normal. Não sabemos o que eles faziam antes do encontro: se conversavam, se discutiam, se brigavam, se não diziam nada... ou se fumavam! Sim, aí está uma variável importante em nosso problema. Eles poderiam estar fumando, cada um o seu cigarro, o que seria um motivo a mais para que o terceiro homem requisitasse um cigarro. As probabilidades de o rapaz, ou a moça, os possuir, eram grandes (mas vamos tratar disso mais para a frente). Por isso, o eixo não desempenha nenhuma atividade decisiva durante a conversação. Sua única possível função seria a de influenciar os atos do rapaz (que pode querer mostrar-se diferente de sua verdadeira pessoa junto a ela), e também do homem (que, em respeito à presença da moça, pode omitir palavras grosseiras ou assuntos inapropriados de sua conversa com o rapaz). Gostaria se utilizar uma descrição muito adequada ao tipo de comportamento desempenhado pela moça durante os fatos, a fim de explicar o que é o eixo nesta situação, e para isso vou me valer aqui de um trecho da obra de Carlos Drummond de Andrade, célebre homem, autor de Cadeira de Balanço, uma coletânea dentro da qual se encontra uma pequena crônica, entitulada “No lotação”, de onde pego emprestado uma parte para reproduzir aqui, com devidos créditos ao autor, devido à adequação da situação:
“(...) Só as mulheres ficaram hirtas e neutrais como se não estivessem ouvindo nada, e portanto não fossem obrigadas a tomar atitude. É admirável nas mulheres esse fazer-de-conta, que lhes confere uma dignidade facial absoluta diante daquilo que elas não sabem como interpretar.”
Sim, talvez alguns de vocês conheçam tal conto, aliás, um ótimo conto do grande C. D. A. Porém, quero deixar aqui claro que a referência que fiz não visa menosprezar e tampouco desvalorizar o comportamento do ser humano ou da mulher, pelo contrário, trata-se de uma exaltação que concedo às mesmas, e a esse interessante aspecto da alma feminina no contexto social. No conto, a situação era que, dentro dum lotação, um rapaz cantava em voz alta e todos ficavam constrangidos, sem saber como reagir. As mulheres se portaram de forma distinta da dos homens, tendo estes demonstrado externamente reações ao fato: uns sorriam, por educação, outros ouviam o rapaz intrigados). A moça de nossa situação ficou alheia à participação do namorado na conversação, mas poderia não ter sido assim. Poderia ela se antecipar a ele, dizendo que não tinham cigarro, ou dizer no ouvido do namorado que não desse bola ao homem, ou ainda ceder um cigarro (iremos estudar mais a fundo esta possibilidade), ou dizer ao namorado que desse um cigarro ao homem, ou começar a gritar como louca “Ladrão! Ladrão!”, ou desempenhar a mesma série de respostas possíveis que atribuímos, em nosso exemplo, ao moço. Mas neste caso ela nada faz, até aqui. Só observa);
5) Poderia tentar assaltá-los, sendo assim o cigarro somente um pretexto para ganhar empatia com o casal (o que não diz ainda se ele é fumante ou não);
6) E, finalmente, ter qualquer outra reação incomum ou absurda que, apesar de improvável, não é impossível, como ter um ataque cardíaco naquele mesmo momento e cair desfalecido.
Vamos agora analisar o ato do sujeito que chega. Ele se dirigiu ao casal, como descrevemos logo no início, para solicitar o cigarro. Perguntou sem especificação da pessoa. Isso também é um problema na comunicação. Precisamos ter bem definidos nossos receptores. Quem são eles?
Porém, quem tomou frente para responder foi, obviamente, o rapaz. Nada impede que a moça respondesse antes, tanto para dizer que não tinham cigarros, como para dizer que tinha e, eventualmente, ceder um. Se ela fosse a interlocutora do sujeito, as respostas poderiam variar, ou até serem as mesmas, não se sabe. Todos nós somos seres diferentes, não importando se somos homens ou mulheres, e temos atitudes diversas. Mas, por normalidade em nossa sociedade, inconscientemente disso, foi o rapaz quem o fez. Poderia ele ser fumante, ou sua namorada, ou os dois, ou nenhum.
Suponhamos que alguém, do casal, fumasse durnte a abordagem. O sujeito chega, vê os dois fumando. “Puxa”, ele pensa, “as chances de que eu consiga um cigarro com esses aqui são grandes! Ambos fumam!”. E pergunta. Isso não implica que necessariamente receba um cigarro.
1) Os cigarros fumados no momento podem, fatalmente, serem os últimos que cada um do casal possui.
2) O casal, ou aquele que primeiro se habilitar a responder ao homem, pode mentir e dizer que não tem cigarros, que acabaram, apesar de os terem ambos. Um casal de mentirosos.
3) O casal pode, assim como o homem faz, ter pedido a alguém aquele cigarros.
4) O casal pode ter achado os cigarros na rua.
5) Podem negar-lhe cigarros por estes serem altamente prejudiciais à saúde do ser humano. Neste caso, não deixariam de estar corretíssimos, porém, alguém poderia dizer: “Quem são eles para dizer ao homem que fumar faz mal? Eles fumam!”. Mas uma coisa nada tem a ver com outra. Uma pessoa que fuma, assim como a não fumante, tem o direito de dizer que o cigarro faz mal, é até uma atitude ética, correta. São conscientes do perigo. Não é porque fumam, que não têm esse direito. Os filhos dos fumantes podem ser igualmente incentivados a não fumarem, e aí vale o conselho ainda mais, pois que vindo de pessoas que sabem o que dizem, têm a experiência do cigarro. Isso não significa que é preciso que se prove de tudo até não haver mais volta, com o intuíto de “possuir a experiência”. Muitas vezes o ato pode não ter volta, e entra aí um pouco de senso moral de cada um. Além do mais, o homem que pede o cigarro é bem mais velho que eles. Sua saúde pode ser boa, mas não é perfeita como a dos jovens, muito menos se ele é um fumante, ainda mais se o é há muito tempo. Um conselho pode ser dado também por pessoas jovens, a pessoas mais velhas, por que não? Porém, pode ser também que o casal dissesse isso com a intenção nada aprovável de somente enxotar dali o homem, para não precisar lhe dar cigarros, com o pretexto de que estão salvando a vida dele negando-lhe o cigarro. Mas, neste caso, a mentira pode ser muito mais simples, e o casal pode simplesmente dizer que não tem os tais cigarros.
Observo que atitudes incomuns poderiam ainda acontecer, por exemplo:
a) O casal fumante poderia naquele exato momento jogar seus cigarros fora, pisá-los, pegar o maço, jogar fora e começar, naquele momento, uma campanha contra o cigarro. De repente, a conscientização vem na hora menos esperada. Neste caso o homem poderia, ou não, aderir à causa deles.
b) O casal fumante poderia arremessar longe o maço de cigarros, e os cigarros que fumam, por exemplo, atrás duma moita (consideremos que haja uma moita ali), ou viaduto abaixo. Fica aí em aberto a intenção dos mesmos em tal ato desesperado e desconexo. Podem ser loucos, podem ser farristas e não dispensam uma brincadeira de mau gosto, podem ser pessoas artistas, que vêem neste ato uma representação surrealista, um ato artístico, ou serem ainda artistas loucos, ou somente artistas.


6) Os cigarros podem ser de alguém que não está mais ali no momento (alguém, conhecido ou não do casal, que foi embora, ou se ausentou por algum momento, ou está escondido para não ter que dar cigarros ao homem).
Consideremos esta possibilidade número 6. Os cigarros são, por exemplo, de um desconhecido que os deixou ali e os esqueceu. Não se sabe se voltará para pegá-los, mas, de qualquer maneira, o casal já pegou dois cigarros do maço. O maço pode ter um ou mais cigarros.
- Um sujeito os deixou aqui. Não é nosso, mas pegamos.
- Compreendo. Posso pegar um também?
Seria uma atitude mais justa dar um cigarro ao homem, ainda mais porque o maço nem sequer pertence ao casal. Foi furtado. O casal poderia também ter roubado o maço do bolso de alguém, e, neste caso, sendo eles um casal de criminosos, dificilmente dariam um cigarro ao homem. Ou dariam, não se sabe. Poderiam ou não contar que o maço é roubado. Poderiam ainda ter matado ou violentado uma pessoa para conseguir o maço. Não contariam isso ao homem, que, talvez, pensasse em chamar a polícia. O casal poderia até mesmo assaltar ou matar o homem que pede cigarro, por simples ódio dele, ou por revolta, ou por loucura, ou por desconfiarem que ele viu o crime anterior. Mas são suposições feitas a partir da possibilidade do casal ser criminoso.
O casal poderia dizer que não quer dar um cigarro furtado do muro ao homem.
- Pegamos deste muro. Um homem deixou aqui e não deve voltar para pegá-lo. Estamos fumando, mas não vamos lhe dar um.
Ouvindo isto, do homem ou da mulher, o sujeito poderia se resignar, e sair de lá;
- Tudo bem, seus egoístas... tomara que morram de câncer.
- Vá à merda.
Poderia insistir, com ou sem resultados;
- Por favor, eu imploro, me dêem um, senão morro!
- Ninguém morre porque não tem cigarro.
- Então vou me matar!
Vendo o homem sair correndo em direção à avenida, o rapaz (ou a moça) diz:
- Está bem, calma, pomba. Não se mate. Aqui está. Um cigarro.
- Obrigado... Deus abençoe vocês.
E acenderia, contente, o cigarro. Ou ainda:
- Não adianta ficar fingindo que vai se matar, coroa, isso é blefe!
- Pô... eu achava que estava sendo convincente!
- Nós somos campeões de pôquer, coroa! Sem chance! Sem cigarro!
- Vão à merda, e tomara que morram de câncer.
- Lazarento.
Poderia chamar a polícia, provavelmente sem resultados;
- Aqui estão eles, seu guarda! Roubaram o maço que estava em cima do muro! – diz o sujeito, vingativo.
- Vocês fizeram isso?
- Não.
- Sinto muito – diz o policial ao homem – Não podemos provar nada.
Uma senhora vem correndo com o filho, ambos gritam em uníssono:
- Nós somos testemunhas, seu guarda! Vimos o furto! Vimos o furto!
O casal aguarda, incrédulo.
O policial tem diante de si duas testemunhas de algo que uma terceira pessoa diz ser verdade. Um furto. Ele coça a cabeça e esse movimento dura dez mil anos.
Aqui temos em jogo a moral de um trabalhador. Um policial. Vamos estudar o que ele PODE fazer:
1) Sair correndo e largar tudo, inclusive o emprego;
2) Sair correndo rebolando, cantando, vítima de algum distúrbio mental;
3) Prender o casal, levá-los à delegacia, levar o caso adiante, para um julgamento mais sério (não que isso ocorresse em algum lugar do mundo, mas é uma possibilidade e não pode ser ignorada). Neste caso, iriam todos eles a julgamento, em tribunal, e lá o casal se valeria de seu advogado de defesa, assim como o homem, a senhora e o filho empregariam todos os seus esforços para levar o casal à prisão, ou, pelo menos, ao pagamento de uma multa, ou a prestarem serviços comunitários (penas alternativas). O que se sucederia poderia ser:
a) o casal perderia a causa, e seria levado a pagar alguma das penas acima citadas, incluíndo-se a pena de restituir à vítima do furto a quantia referente a um maço de cigarro, CASO a vítima (o cidadão que esqueceu o maço no muro) fosse encontrada na cidade;
b) o casal ganharia a causa, por quaisquer motivos judiciários, por exemplo falta de argumentos por parte dos acusadores. Estariam livres mas seriam avisados pelo juiz de algumas regras que temos neste país a respeito do roubo, do furto, da propriedade alheia, etc., que tomassem cuidado daí em diante, e que desta vez passava, pois o caso nem era tão grave assim.
Nota: é interessante notar-mos que, provavelmente, o sujeito só chamaria a polícia no caso do casal recusar-se a dar-lhe cigarros. Porque, conforme o costume da maioria de nós, quando somos beneficiados não pensamos em delatar um crime às autoridades. Porém, ele poderia fazer isso mesmo tendo ganho um ou mais cigarros. Porém, neste caso:
a) se ele já souber que os cigarros são roubados, estará incluído na acusação, também é criminoso. Neste caso ele se auto-denunciaria à polícia (pouco provável, não impossível), e mais uma vez teríamos que conseguir testemunhas suficientes para que se desse andamento ao processo. Conseguidas elas, seriam os três levados à delegacia, e o processo poderia ter aqueles mesmos dois finais: ganhariam ou perderiam a causa. Porém, o mais provável é que perdessem, pois entre os acusados está o homem que denunciou a ele mesmo, é um homem muito honesto e, perante a lei, seria imparcial consigo mesmo, confessando o crime ao juiz. Este poderia optar por pena menos rigorosa em função da confissão, exceção dada somente a ele, e não ao casal, ou a todos eles, depende do juiz. Cumpririam a pena então, e TALVEZ depois se sentissem arrependidos e se tornassem bons cidadãos. Ou não.
b) Se ele não sabia que eram roubados, ao fumar o cigarro (ou somente o guardar, afinal, ainda não sabemos se o homem fuma ou não), e descobre depois, e resolve então denunciar os criminosos à polícia, neste caso ele não está incluso na acusação. Portou o cigarro sem saber que era roubado. Mas isso ele não pode provar. Não tem testemunhas que comprovem sua ignorância quanto ao cigarro ser ou não roubado. E o casal pode:
1 – Como ato de vingança, insistir para o policial que o homem sabia, sim, serem os cigarros roubados, e mesmo assim o aceitou e o fumou (ou guardou). Então o caso é levado a julgamento, e no tribunal o homem poderá se defender, alegando sua ignorância, ao mesmo tempo acusando o casal do roubo de cigarros. O casal se defenderá e ainda o acusará. Dependerá do tribunal a decisão final. Tanto podem todos serem punidos, como pode o homem vencer a causa e somente o casal ser punido (ou então um só, o homem ou a mulher, se um destes resolver, no tribunal, jogar seu parceiro contra a lei), ou então só o homem ser punido, se o casal vencer a causa e acusá-lo de inventar toda esta história, ou ainda todos saírem ilesos do tribunal, ao se defenderem. Neste caso, o homem pode guardar para sempre dentro de si o desejo de ver a justiça ser feita corretamente, e adotar como único objetivo, até o fim de sua vida, colocar aquele perverso casal atrás das grades.
2 – O casal pode também admitir à lei que, realmente, o homem que os acusou não sabia que os cigarros eram roubados, e por isso os aceitou. Pelo menos foram honestos nisso. Seriam presos, iriam a julgamento e o mesmo processo se realizaria, com o pormenor de que, aqui, o homem talvez tenha um pouco de compaixão do casal, pois estes disseram a verdade ao policial, que ele não sabia que os cigarros eram roubados, e assim o homem manera nas acusações, diminuindo a pena do casal ou ainda livrando-os, como recompensa, de qualquer punição. Também depende do juiz do caso.
4) O policial pode dizer ainda:
- Deixa pra lá, cara... tem coisa mais importante acontecendo pra gente se preocupar...
- É isso aí – diz o casal – Vai catar coquinho, coroa! Se não tem o que fazer, não amola a gente!
- Vamos todos encher a cara então!
Isso poderia implicar em algo mais sério. O homem, munido ou não de testemunhas, poderia levar adiante um processo, acusando o casal de roubo e o policial de incompetência no cumprimento do dever. O caso iria adiante. Ele poderia ganhar a causa, e assim o casal e o policial seriam devidamente punidos; ele poderia perder a causa, assim o policial e o casal estariam livres e ririam na cara dele. Ou, ainda, só o policial ou só o casal perderiam e cumpririam a pena.
5) O policial poderia fazer um acordo com todos eles, e todos sairiam ganhando:
- Vamos fazer assim, pessoal. Vocês dois, pombinhos, querem se safar desta. OK, fiquem com o maço. Mas, se o homem que o perdeu aparecer, lembrem-se: devolvam a ele! OK? Você, que acusou o casal, você ficou meio aborrecido porque não tem cigarro pra fumar, estou certo?... vamos, dêem a ele três cigarros. Está bom assim? Três está bom? Ótimo! Vejo que todos vocês estão contentes... viram só? Resolvemos o problema numa boa.
- Mas e as testemunhas, seu guarda? – diz o homem.
- Que testemunhas?
- A senhora e o filho dela.
O policial coça a cabeça.
- Aqui. Compra um doce pro filho dela...
- E ela?
- ...Ela, cê deixa comigo... deixa que o papai aqui cuida dela direitinho – diz o policial, puxando o cinto sobre a barriga de chope, e indo em direção à pobre senhora, que, diga-se de passagem, não é tão velha assim e, realmente, ainda dá pro gasto.
Esta possibilidade mostra que existem soluções bem alternativas para os problemas do dia-a-dia que enfrentamos.
Ainda dentro da possibilidade de o casal ter pego do muro o maço, poderiam se arrepender do ato:
- Podem me dar um, por favor? – pergunta o homem a eles.
Eles se olham. Se arrependem. Jogam os cigarros no chão, restituem o maço ao muro, como fora encontrado, para que o sujeito volte mais tarde e encontre-o ali.
- Pronto, estamos bem com Deus agora.
- É!
O homem mais velho, vendo aquilo, pode:
1) Concordar com eles e ir embora, deixando o maço no muro;
2) Discordar deles, pegando o maço do muro e sair correndo até se perder de vista, com o maço no bolso. Notem bem, é a primeira vez que ele tenta algo tão ousado.
Nota: o homem mais velho poderia, em qualquer circunstância já descrita aqui, ou quase todas, pegar o maço à força da mão do casal e sair correndo. Neste caso, se o maço for roubado, o casal não teria razão em sair atrás dele e recuperar o maço. Depois a polícia se intrometeria e descobriria (ou não) que o maço fora primeiramente roubado pelo casal. Mais um caso de julgamento, que pode ter os tão diversos resultados já descritos anteriormente. Poderiam também pegar o maço do homem e ficar por isso mesmo. Na verdade, qualquer um deles pode roubar o maço do outro, a qualquer momento, e sofrer as conseqüências da justiça e da briga física que possam vir a ter. Sendo o maço roubado pelo homem, o casal poderia se resignar e dizer:
- Bem, afinal de contas, nós é que roubamos primeiro! Deixa os cigarros com ele. Tomara que morra de câncer.
- Apoiado. Depois, nós temos dinheiro pra comprar cigarros.
- É. E talvez ele também tenha. Mas o que nos leva ao roubo, então? Não a necessidade, mas um instinto que vem aqui de dentro...
- Precisamos fazer psicanálise...
- Não, precisamos é comprar cigarro. Vem comigo.

Se o sujeito que perdeu o maço de cigarros volta, após dar-se conta da perda

Consideremos agora um cidadão normal. Não especificaremos se ele é homem, mulher, nem nada. Se chama X. Ele perdeu os cigarros no muro. Mais tarde voltou lá pra ver se os encontrava.
1) Ele os encontra.
- Ah! Aí estão! Que bom que ninguém pegou!
Ele olha pro casal que namora perto do muro. Agradece-lhes com os olhos por não terem roubado o maço.
2) Ele não os encontra.
Se não forem fumantes, realmente não roubarão. A não ser que sejam pessoas ruins e peguem o maço só por perversidade. Isso acarretaria as possibilidades do furto, já descritas anteriormente, independentemente de serem eles fumantes ou não.
Se forem fumantes, podem não pegar o maço, pois são bondosos.
- Olha lá. Cigarros!
- Deixa lá, amor... é sacanagem pegar.
- Certo.
Podem ser ou não ser fumantes, pegar o maço e guardá-lo com eles para entregarem futuramente ao dono, se este voltar. Se ele não voltar, e forem fumantes, não sentirão pesar suas consciências ao manter o maço e fumá-lo. Se ele não voltar, e não forem fumantes, deixarão simplesmente o maço no muro, quando forem embora. Se ele voltar, e forem ou não fumantes, e, ainda, se forem bondosos, entregarão ao dono. Se ele voltar, e forem ou não fumantes, e, ainda, se forem maldosos, não entregarão ao dono, e este não desconfiará que eles pegaram. A NÃO SER que neste momento chegue correndo um homem, bem conhecido por nós (o homem mais velho da situação), gritando que aquele casal roubou seu maço de cima do muro. Note-se bem que este homem pode ter, ou não, pedido cigarros ao casal. Se ganhou cigarros, pode assim mesmo denunciá-los (mas é menos provável). Se não ganhou, é mais provável que os denuncie. Se nem chegou a pedir cigarros, pode tanto denunciá-los, como não, tendo visto o ato criminoso. Nem sabemos ainda se o homem fuma. Se não denuncia, fica lá olhando o homem que perdeu os cigarros ir embora. Depois vai, ou não, até o casal, e tenta mais uma vez pedir cigarros roubados a eles, ou então pela primeira vez. Pode ganhar ou não os cigarros. Mas se denuncia o casal ao X, este quer provas. Quer saber se pegaram ou não. O casal pode devolver o maço na hora. Neste caso X pode ou não chamar um guarda. O casal pode negar o roubo. Neste caso X pode chamar ou não um guarda. Se não chama, xinga todo mundo e vai embora sem cigarros. Se chama, o policial revista o casal, acha o cigarro. Certo, nada foi provado, mas o caso vai a julgamento mais uma vez, ou não, depende da capacidade de perdoar que tem X. Se for a julgamento, ocorrem as possibilidades de perda ou ganho já descritas antes.
2) X volta ao local e pega em flagrante o casal roubando seus cigarros do muro.
Ele pode, em primeiro lugar, amarelar e ficar com medo de pedir de volta o cigarro.
Ele pode chamar um guarda, e então o mesmo processo já descrito se realizará.
Ele pode ir até o casal, começar a rir de sua própria estupidez e dizer:
- Que legal! Vocês roubaram meus cigarros! Como eu sou idiota!
E fica rindo que nem bobo, ao lado deles, sem ficar nervoso. O casal pode continuar fumando, ou ficar com tanta pena do pobre sujeito que lhe devolverá o maço. Este pode aceitar, pode recusar e jogar no lixo o maço, ou ficar louco de vez.
Ele pode ir até o casal, dizer que entende os fumantes, e partilhar o maço com o casal, que pode ou não consentir em dividir os cigarros com ele. Se consentirem, ficarão amigos. Se não consentirem, o X pode ficar bravo e violentá-los; pode chamar a polícia; pode tomar à força o maço; pode começar a chorar; pode insistir ainda mais pra obter alguns cigarros. O casal decidirá.
Ele pode chegar lá todo valente e tomar o maço das mãos do casal. Este pode violentá-lo, sofrendo depois nas mãos da lei; podem aceitar o gesto dele; podem começar a rir de X; podem pedir alguns cigarros (ao que X decidirá se concorda ou não); podem ficar sem jeito e explicar que, como o maço estava dando sopa no muro, ficaram tentados a pegá-lo, ao que X poderá ou não perdoá-los.
Ele pode conversar com calma com eles. O casal pode aceitar numa boa e devolver; pode brigar com ele; pode recusar-se a devolver e sofrer nas mãos da lei; pode sair correndo e serem perseguidos, ou não; podem insistir ou tentar explicar a ele o que ocorreu. X decidirá se aceita ou não.
Nota: o homem mais velho, nosso personagem inicial, pode também estar envolvido nisso tudo. Pode ser ele o autor do roubo, pode ser criminoso junto com o casal, pode denunciar o casal, pode ficar calado e parado, olhando, pode defender X e lutar pelo cigarro (com o objetivo de depois ganhar cigarros, ou não), pode chamar o guarda, pode ficar contra X e defender o casal, pode sair correndo, pegar o maço, jogar longe e dizer que cigarro faz mal, pode chegar e pedir ao verdadeiro dono do cigarro se pode pegar um. Possibilidades parecidas com as que se sucederam entre X e o casal se tornariam aptas a se realizarem, então.
Ainda dentro da possibilidade número 6, suponhamos que os cigarros são de um amigo do casal. Este amigo foi fazer algo e já volta.
O casal pode achar que não tem problema algum e dão um cigarro a ele. O homem pode aceitar, agradecer e ir embora, ou ficar por ali batendo papo. Ou pode se revelar:
- Nada disso, não aceito este cigarro. Isto era um teste que quis fazer com vocês. Queria ver se seriam capazes de dar algo que não lhes pertence, e sim, vocês foram. Que vergonha... olha como as pessoas são... seus incompetentes!
Então ele pode ir embora, desiludido com a humanidade, ou ainda esperar que volte o amigo deles (Y), para dizer a este o que se sucedeu. Este pode brigar com os amigos, sabendo de tudo, e ficar amigo do homem, ou não, e pode ir embora magoado, e pode não dar a mínima praquilo tudo, mandando embora dali aquele homem intrometido. E voltaria a conversar com o casal de amigos. Poderia dar ou não um cigarro ao homem, se é que este ainda queria um.
O amigo Y poderia voltar e não encontrar mais o cigarro. O homem teria levado, roubado, ou o casal teria dado ao homem, com dó dele ou para sacanear Y, ou o casal roubaria o maço, ou pra sacanear Y ou para fumar depois, a sós, ou para logo mais entregar a ele dizendo que era só brincadeira. Em todos estes casos o homem mais velho poderia se intrometer, ora aceitando cigarros do casal, ora denunciando o casal a Y. Este poderia brigar com os amigos, se desse ouvidos ao homem, ou não daria bola a ele, e poderia mandar ele sair dali.
O casal pode dizer que não pode dar um cigarro a ele, pois não lhes pertencem. Quando o amigo voltar, perguntarão a ele. O homem pode concordar e aguardar, ou então discordar e roubar o maço (com conseqüências da lei), ou desistir daquilo e ir embora, ou discordar e brigar com o casal (com conseqüências), ou ficar argumentando, discutindo (vencerá ou perderá a batalha) ou ser enxotado pelo casal.
Se ele esperar pela volta do amigo dono dos cigarros, Y, pode ainda roubar o maço, pode dizer que não quer mais porcaria nenhuma, ou o casal pode expor a situação a Y, dono dos cigarros. Este decidirá se dará ou não os cigarros ao homem. Pode dar, o homem agradece e se vai, ou fica mais tempo. Pode se recusar a dar, alegando vários motivos, menos que os cigarros não são dele. Mesmo que fossem de outra pessoa, isso acarretaria um círculo vicioso, e ficaríamos na mesma. O homem pode aceitar e ficar sem cigarro, ou pode ficar insistindo, conseguindo ou não, pode começar a chorar, pode roubar o maço, pode brigar com eles, pode matá-los, pode virar amigo deles e, quem sabe, conseguir cigarros.
Se o homem Y demora muito pra retornar, o homem pode ir embora impaciente, pode ficar esperando, pode armar um escândalo, pode ir procurá-lo. Se encontrar Y, perguntará dos cigarros. Este decidirá se cederá ou não. Se não encontrar Y, se conformará ou continuará esperando. Se ele chegar, tudo bem. Já sabemos o que ocorre. Se ele nunca chegar, sem explicação, o homem pode desistir, pode ficar chocado, pode ficar amigo do casal, pode roubar o maço, pode continuar insistindo até conseguir, ou não, pode ficar louco, pode receber um cigarro do casal. O casal poderá ficar tranqüilo, pois Y sempre some assim; pode ficar desesperado, chamar a polícia, etc., fazer uma busca, encontrando ou não, algum dia, Y. Os cigarros, decidirão se dão ou não ao homem. Se Y morrer, o maço fica pra eles. Jogarão fora ou fumarão os cigarros.
7) Podem ceder o (s) cigarro (s) ao homem, por gentileza, convenção ou por pressão social de outros transeuntes, ou ainda por ato inconsciente.
8) Podem brigar para ver quem cederá um cigarro a ele. Um quer ser mais generoso que o outro, acha bonito ser bom. Brigam e um deles consegue primeiro. Isso pode acarretar futuras brigas, ou não.
- Eu dou um.
- Não, deixa que eu pego do meu!
- Não, que que é isso, eu que sou o homem aqui!
- E daí, seu machista?... que que tem a ver?
- Como disse? Você quer acabar comigo?
- Passe bem!
- Vaca!
Ou entram num consenso e um deles cede o cigarro. Para o sujeito, pouco importa quem o cedeu.
9) Podem brigar porque nenhum dos dois quer ceder um cigarro.
- Dá um cigarro pra ele.
- Eu? Por que eu?! Dá você!
- Não, você é mulher, fuma menos!
- Nada disso! Onde está seu cavalheirismo? Seu machista!
- Vá à merda, sua vadia!
- Estúpido.
Mesmo brigando o casal, podem entrar num acordo e um deles cederá um cigarro ao homem, que agradecerá da maneira que mais lhe for adequada. Ou se sucederá a seqüência de possibilidades já citadas acima, nas quais usamos subentendidos, pressupostos, e algumas perguntas a mais antes de se chegar ao objetivo final.
10) O homem ou a mulher podem dar o maço, ou maços, inteiro (s) que possuem ao homem, pois neste momento acabaram de decidir parar de fumar. É possível. O homem ficaria muito agradecido, mas poderia refletir melhor e ver que, realmente, cigarro faz mal, e poderia, ou não, adquirir força de vontade e jogar o maço fora.
Isso tudo supondo-se que, pelo menos, um dos dois possui, pelo menos, um cigarro. Se um deles possui, ou se ambos possuem, as possibilidades são praticamente as mesmas, em termos de reações que o homem possa ter.
Outra variável seria o tipo de conversa que o casal estava tendo antes do homem os abordar e, ainda, se estavam extremamente de bem um com o outro ou se brigavam e queriam-se ver mortos.
Se estava tudo tranqüilo no namoro, quando o homem os aborda, o mais provável é que o rapaz, ou até mesmo a moça, sejam mais cordiais com o homem, mesmo que não tenham cigarro. Assim, o homem seria mais conformado, também. Se eles tiverem cigarros, são maiores as chances de que o ceda ao homem, quem sabe dois ou três. E para a namorada ver que está tudo bem com a relação deles. Para o homem notar este fato também.
Mas se brigavam, podem se tornar mais grossos para com o homem. Se não tiverem cigarros, podem responder secamente somente. O homem pode se enfezar, ou sair resmungando. Se tiverem nos bolsos os cigarros, podem tanto ceder um ao homem (o que é difícil), como podem mentir a ele, por causa da raiva da situação. Se estiverem fumando cigarros, e o homem os aborda, podem ceder e podem estar tão irritados que dizem que não têm. Podem não ter mesmo. Aí a raiva é maior, se o homem não acreditar na palavra deles. Mas podem até ter nos bolsos, e mentir, pra enxotar o homem dali. Este, ou se resigna logo, ou insiste, com resultados ou não.
A seguir analisaremos algumas opções de resposta que o homem pode manifestar na situação original, reproduzida abaixo.
Tomemos a seguinte situação:
Um sujeito pára em frente de um casal de jovens, na rua, e pergunta:
- Oi. Você tem um cigarro? – dirigindo-se ao rapaz. Este olha sem expressão alguma no rosto e diz:
- Eu não fumo.
- Puxa vida, é uma pena mesmo.
- O senhor fuma?
Propomos aqui ao leitor uma série de respostas à intrigante pergunta realizada pelo rapaz ao homem que lhe pediu o cigarro, com intuito de fazer pensar e filosofar a respeito de coisas que parecem ser simples na vida, mas não são.
1) – Não fumo, eu somente coleciono cigarros avulsos, sabe?
2) – Não. É que estou realizando uma espécie de pesquisa com as pessoas nas ruas, pra ver quantos brasileiros levam cigarros no bolso quando saem.
3) – Não, até parece... só queria puxar assunto.
4) – Não, não, eu gosto de colocar ele na boca e ficar puxando a fumaça pros meus pulmões, de vez em quando soltá-la no ar, acho bonito, é uma mania minha. Cada louco tem a sua!
5) – Não. Ao invés de puxar a fumaça, eu assopro o cigarro.
6) – O céu é azul?
7) – Você é idiota?
8) – Eu por acaso pareço algum idiota?
9) – Vou te dar a chance de repensar a sua pergunta e, se quiser, retirá-la.
10) - Vamos com calma, meu rapaz.
11) - O senhor é homem?
12) - Depois de amanhã.
13) - Não, mas acho bonito pedir um cigarro. Tipo uma frase de efeito...
14) - Vá à merda!
15) - Não, eu COMO cigarros.
16) - Fumo.
Todas elas são perfeitamente possíveis, e representam apenas uma pequena amostra das milhares de possibilidades que poderiam ser propostas.
Outra possibilidade: um dos personagens (o homem, o rapaz e a moça) pode fatalmente vir a morrer durante a conversação, ou no momento da abordagem. Neste caso, o mais provável é que os três ficassem chocados e desesperados, procurando logo um hospital ou polícia ou o necrotério. É ainda possível que o homem fosse muito insensível e continuasse pedindo o cigarro à pessoa que não morreu. Neste caso, poderia ser enxotado dali ou poderia até receber um cigarro, ainda. Se o homem morresse, o casal poderia ficar tão chocado e sensibilizado que resolvesse procurar a família dele (se ele tiver uma), e colocariam talvez um cigarro sobre seu túmulo, na hora do enterro.
Consideremos, ainda, a possibilidade do homem fumar ou não.
Se ele fuma:
Neste caso, procuraria em seguida acender o cigarro (o que analisaremos a seguir). Ou poderia somente guardar o cigarro consigo pra mais tarde, ou porque coleciona cigarros. Poderia jogar o cigarro fora, por ser louco ou por desprezo ao casal. Este ficaria indignado. O homem poderia ainda dizer que não fuma aquela marca de cigarros, ou que já tem aquela marca em sua coleção. Devolveria ao casal o cigarro, e o casal ficaria confuso. Poderiam discutir com ele. Poderia ainda guardar o cigarro, por pura educação ao casal, e jogá-lo fora mais tarde, ou não. Se ele fuma, ainda, poderia sair fumando ou ficar fumando ali perto, e talvez ficar conversando com o casal. Este poderia fumar também. O homem poderia vir a pedir mais cigarros, futuramente, ou mais tarde. Poderia receber ou não, sob vários pretextos do casal.
Se ele não fuma:
Pode ser um colecionador. Guardará o cigarro. Pode igualmente jogar fora o cigarro, alegando que fazem mal à saúde. Pode ser louco. Pode ser seu primeiro cigarro na vida, pois está começando a fumar agora. Neste caso, se o rapaz lhe perguntar se ele fuma, poderá responder:
- Não. É meu primeiro cigarro.
E, depois de ter fumado:
- Agora fumo.
Ou então não gostará do gosto do cigarro e dirá:
- Me arrependi. Não vou fumar nunca mais.
Ou pode fumar o cigarro mais tarde.
Pode interromper o cigarro no meio, e jogá-lo fora. O casal pode ter diferentes reações a tudo isso. Pode ficar calado, pode argumentar, pode incentivá-lo a fumar ou a não fumar.
Pode ser fumante há mais tempo, e parar de fumar pra sempre. Pode ter um ataque. Pode dizer que tem câncer. O casal ficaria constrangido. Pode simplesmente ir embora com o cigarro. Pode não gostar daquela marca e devolver, jogar fora ou fumar mesmo assim.
Note-se que, dependendo de quem é o homem, as reações do casal são diferentes. Se for um policial, dificilmente recusariam um cigarro. Se fosse alguém mais pobre, poderiam dar por piedade, ou não. Se fosse alguém ruim de saúde, poderiam poupar a saúde da pessoa. Se fosse um adolescente ou uma criança, poderiam se recusar a dar o cigarro, ou mentir a ele. Se fosse algum conhecido, provavelmente dariam um cigarro e conversariam. Ou, se não gostam do conhecido, não dariam, talvez. Se o homem é o pai da moça, e é a moça quem fuma, e o pai não sabia que a filha fumava e não a deixava fumar, pode começar a dar-lhe uma bronca, repreendê-la, levá-la embora dali, violentá-la (o que terá conseqüências da lei), ou ainda agir com ironia:
- Oi, filha.
- Oi, pai.
- Tem um cigarro?
Ela pode conceder um cigarro ao pai, que pode ir embora ou continuar ali, e dar-lhe um sermão ou não, e o pai pode fumar o cigarro ou pode jogá-lo fora, ou pode fumar seu primeiro cigarro na vida, pra dar um exemplo à filha de como é ruim fumar.
Ela pode ainda mentir e dizer que não tem cigarros, para se vingar do pai. Este pode insistir, pode dar um sermão, pode ir embora e falar com ela mais tarde, em casa. Ele pode ou não deixar claro ao rapaz que é o pai dela. Esta, depois, poderia ou não dizer a verdade ao namorado. Pode ser que não tenha mesmo mais cigarros, e não possa dar um ao pai. Este irá embora ou dará um sermão. Se ele concorda que a filha fume, pode tanto fumar como não, e tanto pedir um como não.
Vamos finalmente analisar o fator “fogo”. O simples fato de eventualmente o homem pedir um cigarro, ganhar um e agradecer não significa que ele acendeu o cigarro.
Ele pode ir embora, conseguir fogo com outra pessoa. Neste caso, considera-se fósforos ou isqueiro, ou ainda a brasa de outro cigarro aceso.
Ele pode pedir fogo ao casal. Este, se tinha cigarro, o mais provável é que tenha fogo. Se tem fogo:
Pode concedê-lo ao homem, até mesmo através da brasa de seu cigarro, ou emprestar fogo. Mesmo tendo fogo, pode negá-lo ao homem, por motivos diversos. De repente o isqueiro é um Zippo caríssimo e o rapaz tem medo que o homem saia correndo com ele. Mesmo com o cigarro aceso, o homem pode vir a jogar o cigarro fora, ou sair correndo, ou se queimar com a chama. Pode não conseguir acender o cigarro, de repente por ser o seu primeiro. O casal poderia ou não ajudar o homem. Se ajudasse ele ficaria grato. Se não ajudasse, talvez ele ficasse um bom tempo não conseguindo acender. Ou pediria para alguém, ou deixaria pra acender mais tarde, ou conseguiria, ou ainda desistiria de fumar e xingaria o casal.
Para concluir este meu pequeno estudo, temos, finalmente, uma possibilidade intrigante. A história do cigarro pode ser só um pretexto para o homem começar a cortejar a moça, ou o rapaz (não sabemos a respeito de sua sexualidade), ou os dois (pode ser bissexual). A este cortejo, o casal pode:
Aceitar e deixar que ele se iluda um pouquinho, pra depois ir embora; aceitar e conhecer mais a fundo o homem, pois eles também são bissexuais; podem chamar a polícia; podem xingar o homem e mandar ele ir embora; podem se retirar ou fugir dali; podem se ofender seriamente e dizer um monte para o homem. O cigarro, se foi antes dado ao homem, pode ser pego de volta ou não. O homem pode ser fumante ou não. Se não for, jogará o cigarro fora, desiludido. Mas estas reações são imprevisíveis, pois cada um tem sua própria escolha sexual.
E, afinal de contas, aquilo poderia ser somente a encenação de uma peça de teatro, ou algo parecido.
- Corta! – diz o diretor, irritado. O ator reclama:
- Por quê?! Estava ótimo!
- Não! Não! Esperem...
Todos olham para o diretor, que reflete.
- Já sei. Vamos ter que reescrever os diálogos.
- Por quê?! – reclama a moça.
- Estão péssimos! Veja só: o homem pergunta se o casal tem um cigarro! Por que não pergunta logo se pode dar um cigarro a ele?! E a resposta! Pior ainda! Por que o rapaz não responde se tem ou não, ou invés de dizer que não fuma?! Parece que há um grave problema de comunicação na sociedade de hoje...
E os diálogos serão reescritos.



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